INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Fundado em 27 de dezembro de 2006.

VOLUME XIX

Montes Claros
Minas Gerais - Brasil
2017


NOTAS DOS
COORDENADORES DA EDIÇÃO

A ordem de publicação dos trabalhos dos associados efetivos obedeceu à sequência alfabética dos nomes dos autores. Em seguida, foram ordenados os trabalhos dos associados correspondentes e convidados;
A Revista não se responsabiliza por conceitos e declarações expedidos em artigos publicados, nem por eventuais equívocos de linguagem nela contidos.
A revisão dos originais foi feita pelos próprios autores dos artigos publicados.

FINS DO IHGMC

Art. 2º - O IHGMC tem como finalidade pesquisar, interpretar e divulgar fatos históricos, geográficos, etnográficos, arqueológicos, genealógicos e suas ciências e técnicas auxiliares, assim como fomentar a cultura, a defesa e a conservação do patrimônio histórico, artístico, cultural e ambiental do município de Montes Claros e região Norte de Minas.

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INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Sobrado de Dulce Sarmento
Rua Cel. Celestino, 140 - Centro - 39400-014 - Montes Claros/MG
(Corredor Cultural Padre Dudu)

REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Publicação Semestral

Diretor e Editor
Dário Teixeira Cotrim

Conselho Editorial
Dário Teixeira Cotrim
Wanderlino Arruda
Sebastião Abiceu
João de Jesus Malveira

Editoração e Diagramação
Gráfica Editora Millennium Ltda.

Fotografias
Dário Cotrim, Clarice Sarmento, Felicidade Patrocínio, Marilene Tófolo, Sebastião Abiceu, Cláudio Prates, Yury Tupinambá, Alberto Sena Batista, Beto Caldeira e Wanderlino Arruda
Impressão
Gráfica Editora Millennium Ltda.
ISBN: 978-85-67049-81-6


CAPA: Largo da Matriz


SUMÁRIO

Diretoria 2016-2017 - 7
Associados Efetivos - 9
Associados Eméritos - 11
Associados Honorários - 11
Associados Correspondentes - 12
Apresentação - 13

Cláudio Ribeiro Prates
Definido “Seu Romário” - 19
Clarice Sarmento
Adail Sarmento e Maria Guimarães: um casal inesquecível - 24
Daniel Oliva Tupinambá Lélis
Major Domingos Garcia Leal Tupinambá - 31
Dário Teixeira Cotrim
Maria das Mercês Paixão Guedes - 49
Dóris Araújo
Até qualquer dia, Peré! - 53
Felicidade Patrocínio
A “Vitrine Cultural” da escritora Zoraide Guerra David - 57
José Ferreira da Silva
Padre Alcides - 61
José Ponciano Neto
Luiz de Paula, o várzea-palmense que
revolucionou Montes Claros e Região - 64
Leonardo Álvares da Silva Campos
Entrevista para o Informativo do IHGMC - 70
Manoel Messias Oliveira
A crise hídrica - 78
Mara Yanmar Narciso
Montes Claros Memórias do Centenário - 82
Maria Aparecida Costa Cambuy
Mergulho geográfico em Grão Mogol - 86
Maria Clara Lage Vieira
Dona Nenzinha - 97
Maria Lúcia Becattini Miranda
Dr. Dário Rubens Becattini - 105
Marilene Veloso Tófolo
O Boiadeiro - 107
Marilene Veloso Tófolo
O Footing da Rua Quinze - 110
Narciso Gonçalves Dias
O
gado de Fulgêncio - 114
Palmyra Santos Oliveira
A Rua Camilo Prates do meu tempo de menina - 117
Wanderlino Arruda
Meu professor Joaquim Rolla - 121
Wanderlino Arruda
Perdas Irreparáveis - 125
Wesley Soares Caldeira
João Rego: pioneiro do Espiritismo em Taiobeiras - 130
Zoraide Guerra David
Homenagens Póstumas - 140

ARTIGOS DIVERSOS DO IHGMC

Radialista Paulo Roberto - Fundador do primeiro hospital de
Montes Claros - 147


DIRETORIA DO INSTITUTO HISTÓRICO E
GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS


Fundado em 27 de dezembro de 2006.

COMISSÃO FUNDADORA 2006-2007

Dr. Dário Teixeira Cotrim
Dr. Haroldo Lívio de Oliveira
Jornalista Luís Ribeiro dos Santos
Dr. Wanderlino Arruda


DIRETORIA 2016- 2017

PRESIDENTE DE HONRA Palmyra Santos Oliveira
PRESIDENTE Lázaro Francisco Sena
1º VICE - PRESIDENTE Regina Maria Barroca Peres
2º VICE - PRESIDENTE Manoel Messias Oliveira
DIRETOR-SECRETÁRIO Maria Aparecida Costa Cambui
DIRETOR-SECRETÁRIO ADJUNTO Maria do Carmo Durães
DIRETOR DE FINANÇAS José Ferreira da Silva
DIRETOR DE FINANÇAS ADJUNTO Sebastião Abiceu dos Santos Soares
DIRETORA DE PROTOCOLO Wanderlino Arruda
Diretor de Comunicação Social Itamaury Teles de Oliveira
Diretor de Arquivo, Biblioteca e Museu Dário Teixeira Cotrim

CONSELHO CONSULTIVO

Membros Efetivos
Palmyra Santos Oliveira
Edwirges Teixeira de Freitas
Maria de Lourdes Chaves
Membros Suplentes
Terezinha Gomes Pires
Milene A. Coutinho Maurício
Hélio Veloso de Morais

CONSELHO FISCAL

Membros Efetivos
Juvenal Caldeira Durães
Expedito Veloso Barbosa
Eustáquio V. Santos Macedo
Membros Suplentes
Reinine Simões de Souza
Roberto Carlos Morais Santiago Antônio Augusto Pereira Moura

COMISSÃO DE GEOGRAFIA E ECOLOGIA

Zoraide Guerra David
José Ponciano Neto
Magnos Denner Medeiros

COMISSÃO DE HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA

Denilson Meireles Barbosa
Leonardo Álvares da Silva Campos
José Jarbas Oliveira

COMISSÃO DE ANTROPOLOGIA,
ETNOGRAFIA E SOCIOLOGIA

Maria Ângela Figueiredo Braga
Felicidade Maria do Patrocínio Oliveira
Antônio Alvimar de Souza

COMISSÃO DE CLASSIFICAÇÃO E DE
ADMISSÃO DE SÓCIOS

Marilene Veloso Tófolo
Maria Luiza Silveira Teles
Geralda Magela de Sena Souza

COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO E PUBLICAÇÃO

Dário Teixeira Cotrim
Wanderlino Arruda
Ivana Ferrante Rebello e Almeida

COMISSÃO DE VISITA E APOIO

João de Jesus Malveira - Coordenador
Dário Teixeira Cotrim
Edvaldo Aguiar Froes
Ângela Martins Ferreira

 


LISTA DE SÓCIOS EFETIVOS DO IHGMC

CD
Sócios
Patronos
01
Edvaldo de Aguiar Fróes Alpheu Gonçalves de Quadros
02
Escritora Milene A. Coutinho Maurício Alfredo de Souza Coutinho
03
Padre Antônio Alvimar Souza Antônio Augusto Teixeira
04
Maria do Carmo Veloso Durães Antônio Augusto Veloso (Desemb.)
05
Dóris Araújo Antônio Ferreira de Oliveira
06
Prof Marcos Fábio Martins Oliveira Antônio Gonçalves Chaves
07
Professora Maria Aparecida Costa Antônio Gonçalves Figueira
08
Vaga Antônio Jorge
09
Professora Isabel Rebelo de Paula Antônio Lafetá Rebelo
10
Professora Maria Florinda Ramos Pina Antônio Loureiro Ramos
11
Professor Sebastião Abiceu Ary Oliveira
12
Dr Antônio Augusto Pereira Moura Antônio Teixeira de Carvalho
13
Dr Cesar Henrique Queiroz Porto Ângelo Soares Neto
14
Ana Valda Xavier Vasconcelos Arthur Jardim Castro Gomes
15
Jornalista Magnus Denner Medeiros Ataliba Machado
16
VAGA Athos Braga
17
Profa. Marta Verônica Vasconcelos Leite Auguste de Saint Hillaire
18
Vaga Brasiliano Braz
19
Vaga Caio Mário Lafetá
20
Professora Felicidade Patrocínio Camilo Prates
21
Profa.Terezinha Gomes Pires Cândido Canela
22
Dr. Luiz Giovani Santa Rosa Carlos Gomes da Mota
23
Historiador Hélio de Morais Carlos José Versiani
24
José Ponciano Neto Celestino Soares da Cruz
25
Adriana Duarte Borges Aquino Corbiniano R Aquino
26
Vaga Cyro dos Anjos
27
Professora Regina Maria Barroca Peres Dalva Dias de Paula
28
Vaga Darcy Ribeiro
29
Filomena Luciene Cordeiro Demóstenes Rockert
30
Escritora Maria Lúcia Becattini Miranda Dona Tirbutina
31
Professora Clarice Sarmento Dulce Sarmento
32
José Catarino Rodrigues Edgar Martins Pereira
33
Dr Wanderlino Arruda Enéas Mineiro de Souza
34
Profa. Geralda Magela de Sena e Souza Eva Bárbara Teixeira de Carvalho
35
Dr. Antônio Ferreira Cabral Ezequiel Pereira
36
Dra. Felicidade Vasconcelos Tupinambá Felicidade Perpétua Tupinambá
37
Evaldo Gener de Fátima Francisco Barbosa Cursino
38
Professora Maria Inês Silveira Carlos Francisco Sá
39
Ivo das Chagas Gentil Gonzaga
40
Drª Maria da Glória Caxito Mameluque Georgino Jorge de Souza
41
Dr Reinine Simões de Souza Geraldo Athayde
42
Maria Luiza Silveira Teles Geraldo Tito da Silveira
43
Professor Benedito de Paula Said Godofredo Guedes
44
Economista Roberto Carlos M. Santiago Heloisa V. dos Anjos Sarmento
45
VAGA Henrique Oliva Brasil
46
Professora Eliane Maria F Ribeiro Herbert de Souza – Betinho
47
Amelina Fernandes Chaves Hermenegildo Chaves
48
Profa. Maria das Dores Antunes Câmara Hermes Augusto de Paula
49
Prof. José Ferreira da Silva Irmã Beata
50
Jornalista Délio Pinheiro Neto Jair Oliveira
51
Evany Cavalcante Brito Calábria João Alencar Athayde
52
Fotógrafa Ângela Martins Ferreira João Chaves
53
Vânia Rosália Veloso Assis Dias João Batista de Paula
54
Cláudio Ribeiro Prates João José Alves
55
Cel. Lázaro Francisco Sena João Luiz de Almeida
56
Dra. Ivana Ferrante Rebelo João Luiz Lafetá
57
  João Novaes Avelins
58
Profa. Maria Ângela Figueiredo Braga João Souto
59
Luiz Ribeiro dos Santos João Vale Maurício
60
Dr. Manoel Messias Oliveira Jorge Tadeu Guimarães
61
Vaga José Alves de Macedo
62
Profº José Geraldo de Freitas Drumond José Esteves Rodrigues
63
VAGA José Gomes Machado
64
Professora Palmyra Santos Oliveira José Gomes de Oliveira
65
Dra. Maria de Lourdes Chaves José Gonçalves de Ulhôa
66
Arqueólogo Fabiano Lopes de Paula José Lopes de Carvalho
67
Prof. Denilson Meireles José Monteiro Fonseca
68
Vaga José Nunes Mourão
69
Vaga José (Juca) Rodrigues Prates Júnior
70
VAGA José Tomaz Oliveira
71
Dra. Edwirges Teixeira de Freitas Júlio César de Melo Franco
72
Vaga Lazinho Pimenta
73
VAGA Lilia Câmara
74
Vaga Luiz Milton Prates
75
Alceu Augusto de Medeiros Manoel Ambrósio
76
Vaga Manoel Esteves
77
Profª Maria Jacy de Oliveira Ribeiro Mário Ribeiro da Silveira
78
Jornalista Américo Martins Filho Mário Versiani Veloso
79
Vaga Mauro de Araújo Moreira
80
Vaga Miguel Braga
81
Prof. Juvenal Caldeira Durães Nathércio França
82
Josecé Alves dos Santos Nelson Viana
83
Daniel Oliva Tupinambá de Lélis Newton Caetano d’Angelis
84
Dr Itamaury Telles de Oliveira Newton Prates
85
VAGA Armênio Veloso
86
Professora Zoraide Guerra David Patrício Guerra
87
Arnaldo Bezerra Pedro Martins de Sant’Anna
88
João de Jesus Malveira Plínio Ribeiro dos Santos
89
Felipe Antônio Guimarães Gabrich Robson Costa
90
Folclorista Teófilo Azevedo Filho (Téo) Romeu Barcelos Costa
91
Dr Wesley Caldeira Sebastião Sobreira Carvalho
92
VAGA Sebastião Tupinambá
93
Dr Dário Teixeira Cotrim Simeão Ribeiro Pires
94
Dr Luiz Pires Filho Teófilo Ribeiro Filho
95
Profa. Marilene Veloso Tófolo Terezinha Vasquez
96
Yure Vieira Tupinambá de Lelis Mendes Tobias Leal Tupinambá
97
Prof. Leonardo Alvares da Silva Campos Urbino Vianna
98
Dra. Mara Yanmar Narciso Virgilio Abreu de Paula
99
Profa. Virgínia Abreu de Paula Waldemar Versiani dos Anjos
100
Professora Maria Clara Lage Vieira Wan-dick Dumont

ASSOCIADOS HONORÁRIOS
Décio Gonçalves Queiroz
Edilson Carlos Torquato
Irany Telles de Oliveira Antunes
Girleno Alencar Soares
João Carlos Rodrigues Oliveira
José Antônio Correa Mourão
Mardete Dias Silveira
Newton Carlos do Amaral Figueiredo
Pedro Ribeiro Neto
Raquel Veloso de Mendonça

Sócios Correspondentes

Adriano Souto Belo Horizonte - MG
Alan José Alcântara Figueiredo Macaúbas - BA
Alberto Sena Batista Grão Mogol - MG
André Kohene Caetité - BA
Armênio Graça Filho Rio de Janeiro - RJ
Avay Miranda Brasília - DF
Carlos Lindemberg Spínola Castro Belo Horizonte - MG
Carmem Netto Victória Belo Horizonte - MG
Cláudia Correia Costa Carvalho Luz - MG
Cintia Bernes Belo Horizonte - MG
Célia do Nascimento Coutinho Belo Horizonte - MG
Daniel Antunes Júnior Espinosa - MG
Dêniston Fernandes Diamantino Januária - MG
Enock Sacramento São Paulo - SP
Eustáquio Wagner Guimarães Gomes Belo Horizonte - MG
Fernando Antônio Xavier Brandão Belo Horizonte - MG
Flávio Henrique Ferreira Pinto Belo Horizonte - MG
Genoveva Ruisdias Belo Horizonte - MG
Geraldo Henriques (Riky Terezi) New York - USA
Hermano Baggio Pirapora - MG
Honorato Ribeiro dos Santos Carinhanha - BA
Jeremias Macário Vitória da Conquista - BA
João Carlos Sobreira de Carvalho Belo Horizonte - MG
João Martins Guanambi - BA
José Francisco Lima Ornelas África do Sul
Jorge Ponciano Ribeiro Brasília - DF
José Walter Pires Brumado - BA
Manoel Hygino dos Santos Belo Horizonte - MG
Maria da Consolação M. F. Cowen London - England
Maria Estela Kubitschek Lopes Rio de Janeiro - RJ
Maria Isabel M. Sobreira Belo Horizonte - MG
Moisés Vieira Neto Várzea da Palma - MG
Paulo César Oliveira Belo Horizonte - MG
Pedro Oliveira Várzea da Palma - MG
Regina Almeida Belo Horizonte - MG
Reynaldo Veloso Souto Belo Horizonte - MG
Terezinha Teixeira Santos Guanambi - BA
Wellington Caldeira Gomes Belo Horizonte - MG
Zanoni Eustáquio Roque Neves Belo Horizonte - MG
Zélia Patrocínio Oliveira Seixas Aracajú - SE
Zilda de Souza Brandão (Bim) Belo Horizonte - MG

 



Lázaro Francisco Sena
Cadeira N. 55
Patrono: João Luiz de Almeida

APRESENTAÇÃO

Sucedem-se os diretores no IHGMC, mas a produção escrita continua, com o mesmo padrão de excelência alcançado já nos primeiros momentos de sua existência, ao criar e publicar a sua Revista semestral, para registro e difusão dos artigos temáticos construídos pelos seus associados. Ao final de dois anos de nosso mandato como presidente do Instituto, temos a satisfação de anunciar a publicação de mais um número da Revista, o 4° sob nossa direção e 19º no cômputo geral.

É sempre importante ressaltar a liberdade dos associados para escrever os seus artigos de forma espontânea, cujos textos, na forma e no conteúdo, são de sua inteira e exclusiva responsabilidade. Ao conselho editorial compete o ordenamento e a distribuição espacial da matéria, não passando de algumas intervenções de natureza estética, sem, todavia, transgredir a ideia e a criação manifestadas pelo autor.

Na capa da presente edição, aparece a atual igreja Matriz, quando provavelmente já era Catedral, antes da transferência da cátedra diocesana para suas instalações próprias, no belo templo da Praça Pio XII. Era dia de festa e os fiéis se aglomeraram naquele “Largo da Matriz”, por onde não circulava qualquer veículo que pudesse atropelá -los. Certamente é um instante das primeiras décadas do século XX, quando já existia a fotografia, mas automóvel ainda era objeto raro em nossa histórica cidade. Essa foto, ampliada, sobressaiu-se na decoração do estande do Instituto na FENICS do corrente ano.

A lamentar, a inclusão de mais dois associados na galeria do obituário: Maria das Mercês Paixão Guedes e Eustáquio Vicente dos Santos Macedo. Registramos aqui os nossos sentimentos de perda irreparável.

A festejar, a inclusão de cinco novos associados efetivos no quadro do Instituto: Narciso Gonçalves Dias, Evaldo Jener de Fátima, Evany Cavalcante Brito Calábria, José Jarbas Oliveira Silva e Alceu Augusto de Medeiros. Regozijo também pela instituição e publicação dos quadros de associados honorários e associados eméritos. Sejam todos bem-vindos!

Nesta edição da Revista, estão sendo publicados artigos produzidos por vinte e um associados, parcela bem expressiva dos integrantes do Instituto. No campo da Geografia, destaque para a confreira Maria Aparecida Costa, com o título Mergulho Geográfico em Grão Mogol. No campo da História, destaque para os confrades Daniel Oliva e Yúry Tupinambá que, em parceria, apresentaram os feitos do Major Domingos Garcia Leal Tupinambá. São notáveis também as pesquisas biográficas sobre Adail Sarmento e Maria Guimarães, pela confreira Clarice Sarmento, e sobre João Rego, Pioneiro do Espiritismo em Taiobeiras, pelo confrade Wesley Soares Caldeira. Enfim, muitos pontos, feitos e fatos apresentados com a maestria de Cláudio Prates, Dário Cotrim, Dóris Araújo, Felicidade Patrocínio, José Ferreira, José Ponciano, Leonardo Campos, Manoel Messias, Mara Narciso, Maria Clara Vieira, Maria Lúcia Becattini, Marilene Veloso, Narciso Gonçalves, Palmyra Santos Wanderlino Arruda, Wesley Soares Caldeira e Zoraide Guerra. Que o leitor possa assimilar de cada um aquele conhecimento ainda não depositado em seu relicário pessoal.




Cláudio Ribeiro Prates
Cadeira N. 54
Patrono: João José Alves

DEFININDO “SEU ROMÁRIO”

As Escrituras Sagradas definem São José, pai de Jesus e esposo de Maria, com um único adjetivo: José era um homem justo. Caso eu precisasse definir o meu pai, “Seu Romário”, que não é o famoso “baixinho”, mas é um craque na vida, eu precisaria de pelo menos quatro adjetivos para fazê-lo: um homem honesto, alegre, de fé e corajoso.

Quanto à honestidade, sempre me orgulho ao dizer, quando me refiro a ele: “pode existir um homem tão honesto quanto o meu pai, mas, mais do que ele, não conheço, e duvido existir”.

Além da sua honestidade, do seu bom humor (às vezes ácido por demais) peculiar, aprendi com meu pai a ter fé e coragem. Fé em Deus, sempre, e coragem, para encarar novas situações e os desafios que a vida nos apresenta.

Aliás, honestidade, alegria, fé e coragem sempre foram as marcas da vida desde grande homem (em todos os sentidos); estes, certamente são o maior legado, a imensurável herança, que ele deixará a mim e a meus quatro irmãos: Simone, Solange, Márcio e Fabiano; além do Leonardo, meu sobrinho, criado por ele e minha mãe.

Ainda muito jovem, adolescente ainda, ele, o filho caçula, de 17 irmãos, filho de Seu Cincinato e de Dona Querubina (mãe de onze), saiu da sua terra natal, da Fazenda Campo Grande, em Juramento, para estudar e trabalhar em Montes Claros. Viajou pelo Norte de Minas, como dedetizador do “barbeiro” (Triatoma infestans), transmissor da doença de Chagas; trabalhou como vendedor de sapatos; Foi seminarista da Ordem Premonstratense São Norberto, onde estudou e alicerçou a fé que movia - e ainda move - seus passos, até conhecer àquela que o faria decidir-se a não tornar-se um padre: Maria José Ribeiro Prates (dona Zezé: esta merece um outro livro!), filha do seu Manoel e dona Beata. Em 2011, completaram 46 anos de casados.

Após casar-se com minha mãe, mudaram-se para a Fazenda Casa Nova, próxima à Patis, há cerca de cem quilômetros de Montes Claros, onde começariam uma nova vida e onde ele, meu pai, assumiria de vez aquele que se tornaria o seu grande ofício durante a sua vida: o comércio.

Mas, se alguém imagina que o jovem e recém-casado empreendedor iria se acomodar e se tornar um pacato comerciante na Fazenda Casa Nova, no empório que administrou por mais de trinta anos, e que lá se acomodaria, equivoca-se completamente.

Simultaneamente ao comércio “São Sebastião”, na Fazenda Casa Nova, ele montou outro comércio, em Patis; depois outra mercearia, no bairro Vila Ipê, em Montes Claros, a pretexto dos filhos estudarem na cidade.

Algum tempo depois, com a experiência adquirida no passado, como vendedor de sapatos (aliás, meu pai sempre se mostrou um excepcional vendedor. Se o cliente lhe deixasse falar, com certeza levava o produto. Na dúvida, ele oferecia as duas únicas opções: “com caixa ou sem”), o arrojado empreendedor decidiu entrar para o ramo de calçados, desta feita, como comerciante. E, sempre apoiado por minha mãe, “dona Zezé”, seu esteio e complemento, montou duas sapatarias na cidade: Solange Calçados e Simone Calçados (os nomes foram homenagens às minhas irmãs), que perduraram por mais de dez anos. Mas, como acomodação nunca combinou com o corajoso comerciante, meu pai, após alguns percalços, decidiu experimentar algo novo no comércio, desta vez num ramo totalmente diferente dos anteriores. A ideia agora era um restaurante especializado em peixes, tendo como carro chefe o Surubim do São Francisco. Ele acabou por
revelar-se um exímio chef de cozinha, um talento gastronômico.

Assim, em junho de 1987, meu pai e minha mãe inauguraram a Peixaria Laranjeiras (nome sugerido por mim), com um detalhe: montado no bairro Melo, em uma rua sem asfalto e sem saída. Mas, como obstáculos nunca foram empecilhos para aquele “bandeirante” do comércio, pouco tempo depois, seu restaurante se tornaria um dos melhores do Norte de Minas Gerais e um dos mais bem frequentados de Montes Claros, tendo funcionado até o mês de Março de 2011, quando o aventureiro comerciante decidiu “pendurar as panelas” e aposentar-se.

No entanto, em se tratando de “Seu Romário”, meu querido e amado pai, não tenho certeza de que esta aposentadoria durará por muito tempo. Não me assustarei se a qualquer momento ele convocar a família, como sempre fez, e revelar: “Acabo de ter uma grande ideia. Adivinhem o que eu estou pensando em montar?” Esse é o seu Romário! Meu pai; um grande homem! Honesto, alegre, de fé e corajoso; muito corajoso! Obrigado pela sua vida, Seu Romário! Obrigado pelo exemplo, meu Pai!

MEU PAI ROMÁRIO BATISTA PRATES, nascido no dia 27 de Agosto de 1941, na Fazenda Campo Grande, zona rural de Juramento, há cinquenta quilômetros de Montes Claros; filho caçula de dezessete irmãos, sendo seis por parte de pai, do primeiro casamento do mesmo (Olegário, Clemente, Duninha, Angélica, Maria e Santa)


Eu e meu pai Romário

e, onze irmãos do casamento do seu pai, Cincinato Batista de Souza, com sua mãe, Maria Querubina Prates de Souza (Zenóbia (Du), Geraldo, Cincinato (Natim), Antônio Augusto, Messias, Juquita, Laura, Isabel, Marieta e Aparecida). Além do Seminário premonstratense, estudou no antigo Instituto de Educação de Montes Claros. Fez o Tiro de Guerra no ano de 1960. Casou-se com Maria José Ribeiro Prates, no dia 13 de Fevereiro de 1965 (51 anos de casados). Pai de cinco filhos (Simone, Cláudio, Solange, Márcio e Fabiano). Possui sete netos (Leonardo, Anne Beatriz, Caroline Fernanda, Maria Cecília, Daniel, Maria Teresa, Davi e Luiz Otávio). Trabalhou como dedetizador; balconista (Casa Ely); representante comercial de calçados; vendedor; proprietário de três mercearias, duas sapatarias e um restaurante. Torcedor do Clube Atlético Mineiro. Foi goleiro de futebol amador. É integrante do coral e ministro de leitura da Paróquia Nossa Senhora Rosa Mística. Fervoroso devoto da Virgem Maria; reza, diariamente,
há mais de dez anos, o Santo Rosário. Exímio Chef de cozinha, tendo montado e administrado a “Peixaria Laranjeiras” durante 24 anos (1987 a 2011). Hobby: leitura, sauna, natação e caminhada.

CLÁUDIO RIBEIRO PRATES: brasileiro, natural de Montes Claros - MG, casado, pai de três filhos, servidor público federal, professor, escritor, ator e diretor de teatro.


Eu, meu pai, Romário, minha mãe, dona Zezé, minha esposa, Elizabeth, meus filhos,
Daniel, Maria Teresa e Davi e minha madrinha, Zilca Tolentino.



Clarice Sarmento
Cadeira N. 31
Patrono: Dulce Sarmento

ADAIL SARMENTO E
MARIA GUIMARÃES
UM CASAL INESQUECÍVEL

Adail nasceu em Montes Claros, em 1901, filho de Joaquim Sarmento Sobrinho e Maria Augusta Teixeira (Miquita). Terceiro filho do casal (Argentino, Ireni - morreu na infância - e Adail).

Sua mãe morreu aos 21 anos , deixando-o com um ano de idade. Foi criado pelos padrinhos Antônio Rodrigues Fróis e sua segunda esposa, sua tia materna Laudelina Santos (D. Bilú).

Cresceu no chalé dos tios, ambiente tranquilo, entre o perfume das árvores e frutos do pomar , o cantar dos pássaros e o carinho protetor dos tios e tias.

No chalé do casal, Adail viveu até a morte de Antônio Rodrigues, quando D. Bilú retorna ao sobrado de seus pais, na praça da matriz.

A música era uma constante naquele chalé e fazia parte de sua vida. Os frequentes saraus eram frequentados pelos músicos das duas famílias: os Teixeira, da família de sua mãe, com seus instrumentos de sopro, parentes da professora D. Eva Teixeira, inspiradora e responsável pela primeira banda de música ( a Euterpe) e as pianistas da família Sarmento, Lainha, Zinha e Mariquinha, com destaque para a grande Dulce Sarmento, filhas do primeiro casamento de Joaquim Sarmento com D. Afra. A eles se juntavam outros amigos, como Ducho e Artur dos Anjos. Os tios maternos eram os maestros instrumentistas, Antônio Teixeira de Carvalho (Tonico de Naná, clarinetista e compositor) e Augusto Teixeira de Carvalho, Augustão da prefeitura).

Adail era clarinetista. Tocava na Banda Euterpe e em conjuntos musicais ( orquestra Carlos Gomes) em clubes, bailes e cinema, com Dulce e Tio Tonico, Artur dos Anjos e Ducho, entre outros. Seu irmão mais velho, Argentino era flautista.


Bodas de ouro - 1987

Em 8 de dezembro de 1937, casa-se com Maria Guimarães. Para sustentar a família, já que a música não era uma profissão, mais uma fonte de deleite, abriu o “Bar e Café Sarmento”- que era também uma casa lotérica - situado na rua Dr. Santos, em frente ao hotel São Luiz, de D. Nazareth Sobreira. Lugar muito bem concorrido, lá recebia os amigos para um lanche, uma cervejinha e um dedo de prosa...


1934 - Inauguração do Clube Montes Claros- Tio Tonico, Adail Sarmento,
Curió, Benjamim, Pedro, Geraldo Miranda e Cursino.

Adail era uma pessoa tranquila, amável, introspectiva e erudita. Quando não estava no trabalho lia muito, revistas e jornais mas, principalmente, literatura. Ouvia muito música erudita instrumental, de preferência Beethoven e Wagner. Gostava das grandes óperas, das quais conhecia os libretos e árias. Também apreciava ouvir-me ao piano, nas valsas de Zequinha de Abreu e de Mignone.

Homem muito religioso, frequentava a igreja, participava dos sacramentos e praticava a caridade como Vicentino. Sua confiança nas pessoas, até um pouco de ingenuidade, fazia com que fosse, muitas vezes, vítima de aproveitadores e espertalhões.

Sua honestidade era exacerbada, muito louvada por quantos o conheciam, como ilustra o episódio muito comentado na época:

Eneias Mineiro, toda semana, comprava-lhe um bilhete inteiro de loteria, sempre o mesmo número, que era providenciado e levado para resgate na sexta feira, véspera do sorteio. Em certa ocasião Capitão Eneias viajou. Não o preveniu , nem deixou recomendações com seus funcionários. Adail ficou com o bilhete encalhado, como se dizia. Aconteceu que o bilhete foi sorteado com a “sorte grande”. Quando o capitão chegou, papai foi procurá-lo e entregou-lhe o bilhete. Recebeu elogios e muitos agradecimentos.
Só.

Assim era meu pai: íntegro, justo e honrado. Viveu pacificamente e lúcido até os 97 anos deixando-nos seu exemplo, que guardamos como um luzeiro a guiar-nos no caminho do bem e o orgulho pelo privilégio de ter nascido seus filhos.

Maria Guimarães nasceu na roça do Vieira, região assim denominada, formada de fazendas banhadas pelo ainda caudaloso rio Vieira. Seu pai era Joaquim José Guimarães e sua mãe, Augusta Gonçalves .

Sei pouco de sua infância, alguns relatos sem ordem cronológica, pois os adultos não costumavam comentar com as crianças assuntos da família. Sei que seu pai adoeceu na roça, teve febre alta e veio para a cidade, sendo hospitalizado. Sob suspeita de meningite, não sobreviveu ao exame para retirada do líquido espinhal. Tinha só 31 anos.

Não compreendo como não frequentou a escola da roça. Contou-me que aprendeu a ler sozinha, examinado os cadernos de seus irmãos.

Desde cedo, na roça, revelou sua criatividade e tendências artísticas, desfiando panos de sacos e pintando os fios com tintas naturais, feitas com folhas e flores. Alvejava os sacos de mantimentos e bordava toalhas, com agulhas de espinhos de laranjeira.


Formatura do curso de “Corte e costura” em 1935.
Maria, na extrema direita. Ao centro, assentada, Nenzinha Esteves.

Minha avó, viúva e fazendeira, inexperiente, com seis filhos menores, foi convencida por parentes a casar-se novamente, para desespero dos filhos, que não aceitaram bem o padrasto. Minha mãe, com 11 anos, veio para a cidade morar com o padrinho e tio paterno, Francisco (Chiquinho) Guimarães e sua esposa, D. Guili.

Morou com os parentes até a idade adulta. Como não estudou, sofria com a vida acanhada como cozinheira na casa dos tios. Mas a vontade de aprender levou-a a entrar no curso de corte e costura no atelier de Nenzinha Esteves, esposa do deputado Esteves Rodrigues. Lá recebeu seu primeiro diploma (ver foto), ponto de partida para muitos outros cursos.

Ao receber os modestos restos da herança que sobraram da inexperiência e inabilidade do padrasto, comprou uma máquina Singer. Com ela costurava suas roupas e bordava seu acanhado enxoval. Também fazia crochê muito bem: tecia toalhas, colchas, vestidos e blusas. Nesta época, morou certo tempo em casa de Nenzinha Esteves e, depois, em casa de Ducho e da prima Geralda. Lá se casou.

Não imaginava, ao casar-se com Adail Sarmento, encontrar nele um verdadeiro admirador e incentivador de seus talentos, sempre pronto a disponibilizar os meios necessários para a realização de suas aspirações. Cozinhava admiravelmente. Fazia pratos sofisticados, aprendidos nas receitas publicadas na revista “Seleções”. Fazia também apreciados salgados que eram vendidos no bar do marido. Fez cursos de bolos artísticos e aceitava encomendas para festas de aniversários e casamentos para ajudar no orçamento doméstico. Comemorava os aniversários dos quatro filhos, onde exibia seus dotes em bolos temáticos, salgados e doces admiráveis.

Nossa casa vivia cheia. Lá morou nosso avô paterno, Joaquim Sarmento Sobrinho, assim como os tios, filhos do primeiro e segundo casamento de vovó. Assistiu sua mãe e o próprio padrasto doentes, assim como parentes do meu pai (Tio Mingo) e até antigos serviçais (Sa´Ana, sua lavadeira), cuidando de suas doenças até seus momentos finais. Também assistia os vizinhos doentes, parturientes, quem necessitasse. Procurava os também samaritanos Pedro Santos e Dr. Hermes de Paula, parentes do meu pai e os enfermeiros vizinhos, Azurém e Seu Clóvis, sempre prontos a seu chamado.
Apartava brigas, reconciliava casais, dava conselhos e repreensões: usava
a amizade de meu pai com o Cel. Coelho para resolver pendências policiais dos vizinhos. Prestava serviços no Asilo São Vicente e na Casa dos Pobres. Pelo Natal e Páscoa, visitava os presos e preparavalhes uma refeição festiva.

Foi zeladora da Capela dos Morrinhos, onde organizava festas e leilões. Pediu donativos para a compra das imagens e paramentos. Trabalhava compulsivamente e era uma verdadeira líder comunitária.

Maria foi uma mãe maravilhosa para seus filhos, assim como para seus irmãos e para meu pai. Lutadora, enérgica, incansável, defendia com garra e determinação suas crenças e seus princípios.

Hoje, com a distância dos anos a incentivar a análise de sua vida, cresce minha admiração pelo tanto que lutou por nós, seu marido e seus filhos, principalmente. Seu orgulho pelas nossas conquistas que, na verdade, foram só dela. Sua lembrança vive em nossos corações, viva e ainda incentivadora.

Grande Maria! Grande mãe, grande mulher!



Daniel Oliva T. de Lélis
Cadeira n.º 83
Patrono: Cônego Newton d’Ângelis


Yury Vieira T. de Lélis Mendes
Cadeira n.º 96
Patrono: Tobias Leal Tupinambá


MAJOR DOMINGOS
GARCIA LEAL TUPINAMBÁ

Não é de hoje que Montes Claros é uma cidade pólo. Em sua gênese e em seu desenvolvimento, há a marca indelével do forasteiro, daquele que mesmo não nascido na cidade, ou na região, escolheu esta como a sua terra. Tal característica por si só demonstra a riqueza, a beleza, as nuances como estes Montes Claros se desenvolveram e a força e vitalidade que tem hoje. Da mesma forma, resgatar o papel desempenhado por esses homens e mulheres é de suma importância para o entendimento da história regional, sem contar as delícias de se empreender essa viagem de volta ao passado. E é isso que propomos.

O nosso biografado nasceu aproximadamente em 1829 em região próxima aonde hoje é o Município de Urandi (antigo Villa Bella de Umburanas), então pertencente a Caetité, no Sudoeste da Bahia, sendo filho de família abastada, dono de grandes fazendas com enorme criação de gado de corte e muitos escravos, verdadeiro latifúndio da Bahia, com áreas extensas ocupadas por lavouras, inclusive exploração do cacau, que era o forte da época. Era filho de Clemente Garcia Leal e Laudelina Januária de Novaes.


Major Domingos Garcia Tupinambá

O seu pai, Clemente Garcia Leal, foi fazendeiro, comerciante, oficial militar e Herói da Guerra da Independência do Brasil (1822-1824), na Campanha da Bahia (1822-1823), onde lutou ao lado e por convocação de sua parentela, os seus nobres primos, os destacados varões da Casa da Torre: Cel. antônio Joaquim Pires de Carvalho e Albuquerque (que viria a se tornar o Visconde com Grandeza da Torre de Garcia d’Ávila), Cel. Joaquim Pires de Carvalho e Albuquerque - o “Coronel Santinho” (que viria a se tornar o Visconde com Grandeza de Pirajá), e Cel. Francisco Elesbão Pires de Carvalho e Albuquerque (que foi Governador da Bahia e viria a se tornar o Barão de Jaguaripe). Na mesma campanha, também serviu ao lado de personagens históricas como a “Soldado Medeiros” (Maria Quitéria de Jesus Medeiros) e o Major “Periquitão” (José Antônio da Silva Castro, avô do poeta Castro Alves). Descendente dos Garcia D’Ávila, da Casa da Torre, tem como origem mais remota o casal formado pelo nobre português Diogo Álvares (Correa?), o Caramuru (1475-1557), e a índia que ficou conhecida como Paraguaçu1 (1495-1583), batizada na França como a princesa Catarina do Brasil2, pois era filha de Taparica Tupinambá, o Cacique que chefiava a tribo dos tupinambás, que dominavam o litoral baiano. Clemente Garcia Leal descendia de Francisco Dias d’Ávila Caramuru (o 2.º Senhor da Casa da Torre3), filho de Isabel d’Ávila4 e Diogo Dias 5.
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1 - Pela pena do Frei José de Santa Rita Durão, em seu clássico Caramuru: poema épico do descobrimento da Bahia (1781).
2 - Sendo seu verdadeiro nome provavelmente Guaibimpará Tupinambá, a princesa brasílica foi batizada com o nome de Katherine du Brézil a 30 de Julho de 1528, em Saint-Malo, na França, na famosa Cathédrale de Saint-Malo (cujo vigário da época era o monsenhor Lancelot Ruffier), hoje Cathédrale de Saint-Vincent-de-Saragosse, tendo como padrinhos o nobre senhor Guyon Jamyn, reitor de Saint-Jagu, e madrinha Katherine des Granches, e Françoise Le Gobien, filha do procurador de Saint-Malo. Katherine des Granches, a madrinha de Paraguaçu, era esposa de Jacques Cartier, o navegador francês, nascido em Saint-Malo, e um dos primeiros exploradores da América do Norte (Canadá). Esteve na Bahia em 1527, levando Caramuru e Paraguaçu para a França.
3 - A Casa da Torre de Garcia d’Ávila foi, originalmente, denominada por seu proprietário (Garcia de Sousa d’Ávila) como Torre Singela de São Pedro de Rates, em homenagem à cidade natal de seu pai Tomé de Sousa, filho bastardo de Dom João de Sousa, Prior da Igreja de São Pedro de Rates, com Mécia Rodrigues de Faria.
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O Dicionário das Famílias Brasileiras, de Carlos de Almeida Barata & Antonio Henrique Cunha Bueno, em seu Tomo II, à Página 2216, assim diz:

Tupinambá: sobrenome de uma antiga família da Bahia, descendente dos Garcia d’Ávila, e também dos índios Tupinambá, com ramificações em Montes Claros, Minas Gerais, para onde passou, em 1892, o Major Domingos Garcia Leal Tupinambá, natural de Caetité, BA, que deixou descendentes, na Bahia e em Minas Gerais, de seus dois casamentos (HP, MC, 361).

O major Tupinambá possuía uma grande “tropa” (que naquele tempo era a condução disponível) com os melhores animais, todos escolhidos a dedo, o que lhe rendia muitos elogios, que lhe deixavam verdadeiramente orgulhoso, pois na realidade, aquela tropa causava inveja aos ricos fazendeiros da época. Negociante de grosso trato, era muito forte, com espírito aventureiro, e detentor de um apurado tino comercial. Possuidor de vultosos recursos financeiros, com aquela “tropa” viajava muito, por todos os recantos, conhecendo a Bahia de ponta a ponta, fazendo grandes transações comerciais na região do Nordeste do Brasil. Foi fundador e subdelegado do Distrito de Furados, Termo de Caetité (BA) – hoje Distrito de Tauape, no Município de Licínio de Almeida (BA). Era oficial da Guarda Nacional e membro do Partido Conservador (pelo qual já exerceu a vereança), do qual se desligou mais tarde para se dedicar exclusivamente às suas fazendas e negócios comerciais. De seu primeiro casamento, com dona
Bernardina Alves Garcia Leal, teve três filhos e uma filha6. Deixou, no comando do Distrito de Furados, os seus parentes Cel. Marciano Garcia Leal7, o Cap. Clemente Garcia Leal (juiz de paz) e Benedicto Garcia Leal Primo (industrial de alambiques).

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4 - Filha do instituidor do morgado da Casa da Torre, Garcia d’Ávila (filho bastardo de Tomé de Sousa, primeiro governador-geral do Brasil, por sua vez filho bastardo de Dom João de Sousa, abade de Rates e descendente de Martim Afonso Chichorro, filho bastardo do rei Dom Afonso III de Portugal), com a cabocla cujo nome cristão (de batismo) era “Francisca Rodrigues”, esta por sua vez filha bastarda de Diogo Álvares, o “Caramuru”, com uma índia tupinambá.
5 - Filho do nobre português Vicente Dias, natural de Beja, com Genebra Álvares, uma das quatro filhas do casal Diogo Álvares, o “Caramuru”, com a princesa indígena Catarina do Brasil, a “Paraguassu”.
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“TAUAPE, A VILA DOS FURADOS

Autor: Dr. Dário Teixeira Cotrim (Gurungas)

Terra dos verdes campos, em doçuras!
Onde tens, ao longe, os bravios capinzais.
E neles, os gados pastam, sempre mais,
Desde o pé da serra inté as suas alturas.

Na encosta os furados em terras duras
E nas manhãs vêm os ventos dos gerais,
Tangem eles, d’águas, as garças reais
Ah, velho DOMINGOS, quantas brancuras!

Tauápe, em lindas flores amarelas
Surge da história, em terras de Piedade,
Desenhadas em quadros de aquarelas.
Vê: tua velha igreja – quanta saudade!
E o casarão dos Sant’Ana: essas estrelas...
Eis os teus nédios, eis aqui a tua vaidade!”

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6 - Clotildes Garcia Leal, mãe de Deocleciano Lopes da Piedade, falecida em 11 de julho de 1897, sepultada na Igreja de Nossa Senhora da Piedade, fundada e erigida pelo seu pai.
7 - Intendente de Umburanas (equivalente hoje a Prefeito de uma região que incluria os atuais municípios de Urandi e de Licínio de Almeida), capitalista, fazendeiro, agricultor, criador, recenseador, negociante de secos e molhados, industrial de alambiques, Comandante do Estado-maior do 383° batalhão de infantaria da Guarda Nacional etc.
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TAUÁPE – UMA HISTÓRIA BEM CONTADA8

(...)

Aqui, antigamente,
Só a mata existia,
Como de tudo acontece,
Porém chegou o dia;
Dessa mata ter valor,
Pro grande explorador, Vindo do Sul da Bahia

Veio em tropa galopante,
Era a única condução;
Pois carro naquela época,
Não tinha na região.
Pra fazer uma romaria,
O transporte em montaria,
Enfrentava o poeirão.

(...)

Essa história é verdadeira,
Tenho provas, sim senhor;
Revelo nesse instante,
O nome do fundador.
Domingos Tupinambá,
Aqui veio se instalar,
Como grande sonhador.

Parando, fez um barraco,
Bem perto da barragem,
A antiga cachoeira,

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8 - LEAL, Celene Castro Leal. Tauápe – Campos Verdes com Flores Amarelas. Escrito em Tauape, Sudoeste da Bahia, a 10 de agosto de 2003.
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Não é mito nem miragem.
Encantou-se co’a beleza,
Deslumbrado co’a riqueza,
Interrompeu sua viagem.

Abriram muitos buracos,
Em lugares separados,
Por isso mesmo diziam,
O arraial dos furados.
Nem todo mundo queria,
Alguém até mesmo sorria,
Dizendo não. É Surados.

Os dias foram passando,
Ele deixa sua cabana;
Construiu primeira casa,
Do senhor Mário Santana.
Depois de vista tão bela,
Construiu uma capela,
Aumentou a sua fama.

Foi então que aconteceu,
A grande necessidade;
De construir a capela.
Para a felicidade;
Do povo da região,
Cumprir sua devoção,
Com a virgem da Piedade.

A imagem foi trazida,
Porque tinha um ideal;
Abençoar o seu povo,
Livrando-o do mal.

Como nossa padroeira,
Também foi a primeira,
Vinda de Portugal.

Por causa da Padroeira,
Os nomes foram trocados,
Usando o nome da Santa,
Ao invés de ser furados,
Com muita seriedade,
Registraram por Piedade,
Mais um dos povoados.

As casas foram surgindo,
Aumentando a população;
As árvores iam sumindo,
Para cada construção.
Foi assim que Piedade,
Virou uma sociedade,
Com o povo da região.

(...)

Não falei sobre a data,
Pois veja, não esqueci;
Foi em mil oitocentos
Setenta e oito, por aí;
Domingos Garcia Tupinambá,
Pra Minas quis viajar,
Mas parou foi por aqui.

Do fundador sou um ramo,
Talvez até a raiz,
Pois pertenço à família,
De um povo tão feliz;
Com orgulho sempre digo,
Mas não corro o perigo,
De empinar o meu nariz.

A humildade da família,
Veja bem e acompanha,
Garcia, família forte,
Como rocha e montanha;
Tem gente no estrangeiro,
Em cada Estado brasileiro,
E também na Piabanha.

Eu refiro a Piabanha,
Não nego o meu natural,
O nome do Coronel,
Registrado na capital;
Veio de família pobre,
Tornou-se nome nobre,
Marciano Garcia Leal.

Domingos Tupinambá,
Veio do Sul da Bahia,
Mas tinha um parentesco,
Que com respeito dizia;
Manteve sempre fiel,
Como primo do coronel,
Senhor Marciano Garcia.

Na base da união,
Da paz e camaradagem,
Resolvia uma questão,
Não perdia uma viagem;

Respeito ali havia,
Coronel Marciano Garcia,
Era homem de coragem.

(...)

Tendo o major Tupinambá ainda muito jovem se enviuvado, e sentindo ainda paixão para viver, aumentou sobremaneira o fluxo de suas viagens comerciais, notadamente para Montes Claros, em Minas Gerais. Nesses longos trajetos, nestas andanças pelo sertão de Minas Gerais, um dos pousos certos da tropa do Major Tupinambá, era em Mato Verde, então distrito pertencente ao Município de Boa Vista do Tremedal (hoje Monte Azul), mais precisamente na estalagem do falecido Sr. Jeronymo Soares. Pois bem! De certa feita, durante uma das viagens, o major (já viúvo), sucumbiu à febre e por dias ficou recolhido à pousada em Mato Verde, onde esteve aos cuidados extremosos da viúva do Sr. Jeronymo Soares da Silva, dona Felicidade Perpétua da Silveira9, agora proprietária da estância. Com a saúde reabilitada, o

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9 - Nascida aproximadamente em 1857, no Distrito de Serra Nova, Município de Rio Pardo de Minas (MG), era filha de Francisca Cardosina da Silveira (falecida a 15 de julho de 1877) com Florentino José da Silveira, cujo consórcio gerou 9 filhos (incluindo Felicidade), dentre os quais Otávio Augusto da Silveira (bisavô do senador Darcy Ribeiro da Silveira), Francisca Cardosina das Chagas Silveira c/c Adelino José da Silveira (bisavós do senador Carlos do Patrocínio Silveira) e Padre José Patrício da Silveira, fundador e primeiro dirigente da Paróquia de Santo Antônio da Rapadura (Mato Verde). Seu pai, Florentino José da Silveira, nasceu em 1808, na Freguesia de São Gonçalo do Rio Preto, Termo de Diamantina (MG), do qual foi Distrito ainda em 1911. Foi Negociante no Distrito de Serra Nova (Município de Rio Pardo de Minas- MG) em 1840, fiscal municipal em 1842, e 4° Juiz de Paz do mesmo Distrito em 1863. Lavrador, ingressou, com sua esposa, aos 08 de setembro de 1843, na Irmandade do SS. Sacramento da Vila. Faleceu a 24 de julho de 1878, em sua Fazenda do Garrote, sendo sepultado em Mato Verde (MG). Foi ele um dos fundadores dos povoados que dariam origem aos atuais Município de Mato Verde (MG) e Distrito de Serra Nova (Município de Rio Pardo de Minas-MG). Seu pai foi o inconfidente João José da Silveira, fazendeiro, comerciante e oficial militar que participou da Conjuração Mineira (1789), fato este que ocasionou a sua fuga para aquela região do atual Município de Mato Verde (MG), estabelecendo-se, no fim do século XVIII ou início do século XIX, na região de São João do Bonito, com alguns ompanheiros que, após terem participado da Inconfidência Mineira, ali chegaram, fugidos da perseguição movida contra os inconfidentes.
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sentimento de amizade, que não era novo, e o de gratidão, esse recente, se transformaram em amor, prontamente correspondido. Tempos depois, já de casamento marcado, o major Tupinambá se despede de todos em Tauape, para rumar, em definitivo, para uma nova vida no sertão mineiro. Preparou tudo para a partida e na saída disse com toda seriedade: “Vou para Minas Gerais em busca da Felicidade”.

Como dito, dona Felicidade Silveira era viúva do Sr. Jeronymo Soares da Silva, de quem teve dois filhos: Gedor Soares da Silveira e Elvina Perpétua da Silveira (que se casou com o sócio do major Tupinambá, Cristiano de Faria). Já da união do major Domingos Garcia Leal Tupinambá com dona Felicidade Perpétua da Silveira, nasceriam três filhos em Mato Verde (Sebastião, Domingos e Tobias) e uma filha em Montes Claros (Felicidade).

Tem-se notícias, ademais, da propositura de nomeação ao Ministério da Justiça, em 1891, do então tenente cirurgião Domingos Garcia Leal Tupinambá para Major cirurgião-mór da Guarda Nacional da Comarca de Boa Vista do Tremedal (atual Monte Azul), bem como do capitão Antonio Garcia Leal10 para Major secretário-geral da mesma corporação.

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10 - Natural da Província da Bahia, o Coronel da Guarda Nacional, Antônio Garcia Leal (nascido entre 1850 e 1852), fixou residência no antigo distrito de Santa Rita, hoje Itamirim (Município de Espinosa). Era filho de Sabino Garcia Leal e Simôa Rosa Luz, ambos baianos. Casou-se duas vezes, e teve 11 filhos. Do primeiro casamento, com a baiana Joaquina Apolinária de Jesus (filiação ignorada), teve 05 filhos:
1) Henrique Garcia Leal (nascido em 1872), casado com Blandina Alves Benjamim.
2) Gerônimo Garcia Leal (nascido em 1875), casado com Francisca Cangussu Leal. Sem filhos.
3) Faustino Garcia Leal (nascido em 1877), casado com Padrelina Angélica de Carvalho. Tiveram um filho: Levindo Garcia Leal.
4) Augusto Cezar Garcia Leal (nascido em 1880), casado com Josefa Vieira da Abadia. Tiveram 08 filhos.
5) Júlia Benvinda Garcia Leal; casada com Antônio Fernandes Balieiro.
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Mas o Major Domingos, dotado de grande visão, e vislumbrando ampliar seus negócios, procurou expandir não somente os seus horizontes, mas o de seus filhos, buscando um centro maior para educá-los. Cheio de entusiasmo e confiança, veio em 1892 para Montes Claros (MG), acompanhado de grande comitiva. Várias famílias arrastou ele consigo, dentre as quais as de: Cristiano Faria, seu sócio; o Cap. Olegário Augusto da Silveira (filho de Otávio Augusto da Silveira), sobrinho de sua segunda esposa (e portanto primo carnal de seus filhos), pai da “Mestra Fininha” e avô do Darcy Ribeiro da Silveira e do Mário Ribeiro da Silveira; Arcelino Ribeiro, pai de Brasiliano, Bráulio e Brasilino Ribeiro; Josué Profeta de Souza; Jacinto Cardoso de Sá; Experidiano Vaqueiro e José Pacheco de Melo, seu ex-escravo e amigo inseparável.

Apesar de bem recebido pelas famílias montes-clarenses, muitas das quais já relacionadas intimamente com o Major Tupinambá, surgiu um impasse, pois havia aqui uma lei drástica contra os mascates, e essa lei definia mascate como negociante de menos de dois anos de residência no município. Ficou assim o Major Tupynambás, recémchegado, enquadrado na classe de mascates e sujeito a um imposto proibitivo.

Resolveu ele então voltar para Mato Verde com as armas e bagagens, de onde veio com toda aquela mercadoria, cerca de oitenta contos de reais já arrumada nas prateleiras. De grande pesar se encheram seus amigos:

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Do segundo casamento, com Ana de Jesus Leal, teve 06 filhos:
1) Adolfo Garcia Leal (nascido em 1885).
2) Filogôno Garcia Leal (nascido em 1902), casado com Maria Júlia Borborema de Souza.
3) Petrina Garcia Leal (1904-1987), casada com Filogônio Pereira de Souza.
4) Rodolfo Garcia Leal (nascido em 1913).
5) Maria Dias Leal (falecida com poucos dias de existência).
6) Levindo Garcia Leal.
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não era possível que proibisse a entrada de elementos de progresso, somente porque uma lei injusta impedia. Devia haver um jeito... e houve. A Câmara Municipal se reuniu extraordinariamente e simplesmente revogou a lei, decidindo que a firma Tupinambá-Faria não era constituída de mascates, podendo, portanto, se estabelecer nas mesmas condições de outros negociantes. Fixaram aqui, então, todos aqueles acima citados e suas famílias11.

O Major Tupynambá então se instalou definitivamente em Montes Claros, como fazendeiro e grande negociante, com casa comercial onde hoje é o antigo Conservatório Estadual de Música “Lorenzo Fernandes”12, no centro da cidade. Uma de suas fazendas, foi a importante “Fazenda do Melo”, que compreendia os atuais bairros nobres do Melo, Jardim São Luiz e Ibituruna... Tudo isso foi uma dádiva para Montes Claros.

O major Tupinambá era extremamente católico. Tanto é verdade que, ao fundar o Distrito de Furados (hoje Tauape), construiu, no ano de 1878, uma capela para a qual mandou trazer, de Portugal, um

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11 - PAULA, Hermes Augusto de. Montes Claros: sua história, sua gente e seus costumes. 2 ed., 1979, Volume II.
12 - A respeito do CELF, insta destacar a importantíssima participação da Família Tupinambá na história do conservatório. Dentre os descendentes (por consanguinidade ou afinidade) do Major Tupinambá, Felicidade Perpétua Tupynambá (neta), Cecy Tupunambá de Ulhôa (neta) e Terezinha Machado Tupynambá (casada com seu neto Antônio Augusto Tupynambá) foram suas co-fundadoras e professoras. O ex-ministro e ex-deputado Oscar Dias Corrêa (casado com sua bisneta Diva Tupynambá Gordilho), quando Secretário de Estado de Educação de Minas Gerais (Governo Magalhães Pinto), foi o responsável pela estadualização do então Conservatório Municipal de Música “Lorenzo Fernandes”. Inúmeros outros de seus descendentes também lá estudaram ou lecionaram, cabendo destaque para suas bisnetas Martha Tupynambá de Ulhôa, Mary Tupinambá de Lélis e Rachel Tupynambá de Ulhôa, esta última também ex-Diretora do CELF.
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potente sino e a imagem de Nossa Senhora da Piedade, que a partir de então se tornou a padroeira do povoado, que desde agosto daquele ano realiza a festa da padroeira, a tradicional Festa de Agosto.

Aqui um adendo se faz necessário. Em agosto de 2016, depois de vários contatos prévios com a escritora Celene Castro Leal, residente em Tauape (e nossa anfitriã) e descendente da parentela do major Tupinambá, marcamos de ir na comunidade, no último dia da tradicional festa da padroeira, festividade essa que foi instituída pelo major Domingos Tupinambá e que naquele ano completaria 138 anos. Ademais, os moradores de Tauape ansiavam por conhecer os descendentes diretos de seu fundador, Domingos Garcia Leal Tupinambá, o que muito nos honrou. E assim procedemos. Saímos de Montes Claros assim que o sol raiou rumo à Bahia. Viagem agradabilíssima, com paisagens deslumbrantes da Serra Geral. Fomos rememorando os “causos” de família, lembrando saudosamente das visitas que fazíamos para nossa prima Ruth Tupinambá, das deliciosas histórias do major contadas pela neta Cecy Tupynambá e pela bisneta Mary Tupinambá de Lélis. E assim fluía o tempo, cortando o território mineiro. Passamos em Janaúba, Porteirinha, Mato Verde, Monte Azul e Espinosa. Já por volta do meio dia, entramos em Urandi, já em terras baianas. Atravessamos a Serra, por onde tantas vezes passou nosso antepassado com sua comitiva, e chegamos ao Município de Licínio de Almeida, de onde nos dirigimos para Tauape. Fomos recebidos calorosamente pela população local, que disputava nossa presença, motivo para nós de grata surpresa e grande honra. Pelo adiantado da hora e por falta de tempo, priorizamos as visitas às escolas locais, à rádio local, à família Santana, mais precisamente ao Sr. Aluízio e à Dona Elvira, respectivamente irmão e viúva do Sr. Mário Santana, primeiro prefeito de Licínio de Almeida; bem como Dona Maria Lúcia. A noite foi de grande emoção. Missa lotada, fogos em homenagem à padroeira, adentramos à nave da igreja, nos dirigindo ao altar, ao som do Hino de Tauape (que saúda a memória de seu ilustre fundador). Devidamente apresentados, discursamos em agradecimento, por tão bela acolhida e por sentir como a memória do Major era por todos, cultuada. Em retribuição, em nome de todos os descendentes de Domingos Garcia Leal Tupinambá, oferecemos à população um quadro do Major Tupinambá. Momentos como esses ficam para sempre marcados na memória!

Continuando no que tange à fé do major Tupinambá, nesse mesmo sentido, vimos em Urbino de Sousa Vianna que:

O altar lateral da esquerda guarda S. Sebastião e ao lado S. Vicente de Paulo, padroeiro da <<Conferência>>; o da direita a imagem de Santo Antônio; aquelle feito às expensas do devoto coronel Gregório José Velloso e este do major Tupynambá 13.

Também a Revista Tempo nos dá nota de que:

A construção da igreja na Praça Portugal foi uma iniciativa de José Joaquim Marques, que, em maio de 1839, solicitou à Câmara Municipal de Montes Claros uma licença para edificar a Capela do Rosário, retirando-a do lugar de origem, a Praça Santo Antônio e mu-

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13 - Monographia do Município de Montes Claros: Breves Apontamentos Históricos, Geográphicos e Descriptivos, p. 303.
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dando-a para a Avenida Coronel Prates, onde se encontra hoje. Em 1887, uma obra de ampliação e reconstrução foi iniciada por Domingos Garcia Tupinambá. Apesar das transformações, a comunidade local julgava a igreja como pobre, sem arte, pequena e mal situada em relação ao alinhamento das ruas 14.

Mas o grande sonho do Major Domingos, era ter um padre na família. Tobias foi o filho escolhido para satisfazer este seu grande sonho. Tratou logo de mandá-lo para o seminário de Diamantina, cidade onde também estudaria seus outros filhos: Sebastião15, Domingos e Felicidade16.

Mas, de volta a Montes Claros para passar as férias com sua família, Tobias logo se interessou pela “Menina do Sobrado”, Josefina Mendonça, a bela filha do Coronel Cassemiro Mendonça. Ao vê-la de longe, na janela de um sobrado da Praça Dr. Chaves17, até hoje existente, por ela se apaixonou. O jovem Tobias, na força dos 17 anos e apaixonado, resolveu se casar. Não voltou mais para o seminário, largando de vez a “batina”. Porém seu pai, muito decepcionado, não aceitava aquele casamento. Achava Tobias muito jovem, inexperiente e que na certa logo esqueceria aquele inocente romance. Mas não foi o que aconteceu. Porém, o major Tupinambá não viveria para ver o desenrolar do consórcio entre o jovem casal. Com 73 anos de idade, aos 6 de novembro de 1902, faleceu o major Domingos Garcia Leal Tupinambá.

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14 - Revista Tempo, Edição n° 68 - set/2011.
15 - Sebastião também cursou o Seminário de Diamantina e fez-se agrimensor prático licenciado pelo Conselho Regional de Engenharia.
16 - Felicidade estudou no colégio das freiras de Diamantina dos 7 aos 13 anos, quando regressou para cuidar da mãe, em razão de adoecimento desta. Casou-se aos 14 anos com Álvaro Augusto de Lélis, com o qual foi morar, após a morte do sogro (Capitão Camilo Cândido de Lélis), ocorrida em dezembro de 1915, em Inconfidência, hoje Coração de Jesus (MG), onde foi professora durante décadas.
17 - Ao lado do hoje Centro Cultural “Dr. Hermes de Paula”.
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Três dos seus quatro filhos se tornaram patronos de cadeiras de entidades culturais norte-mineiras: Sebastião Leal Tupynambá (Patrono da Cadeira nº 92 do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros e da Cadeira nº 28 da Academia Montesclarense de Letras), Tobias Leal Tupinambá (Patrono da Cadeira nº 96 do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros) e Felicidade Perpétua Leal Tupinambá (Patrona da Cadeira nº 09 da Academia de Ciências, Letras e Artes de Coração de Jesus). Também sua neta Felicidade Perpétua Tupynambá se tornou a Patrona da Cadeira nº 36 do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. Seu neto Antônio Augusto Tupynambá descobriu as espécies Panstrongylus tupynambai e Phlebotomus tupynambai, que levam o sobrenome da família na Taxonomia Científica Internacional em sua homenagem; além de ter sido co-fundador e professor da Faculdade de Medicina da Unimontes, professor da Faculdade de Medicina da UFMG e co-fundador e 3º presidente da Sociedade Rural de Montes Claros (MG). Seu filho Eduardo Machado Tupynambá, portanto bisneto do Major Tupinambá, é Doutor em Direito Civil pela Université de Sorbonne (Paris – França), por cuja tese foi premiado pelo Ministério das Relações Exteriores francês, e ex-Diretor da Faculdade de Direito da Unimontes. Outra bisneta do Major Tupinambá, a artista plástica Yara Tupynambá, ex-Diretora da Escola de Belas Artes da UFMG, foi aclamada como a Primeira-Dama da Arte Mineira, tendo se tornado um símbolo da mineiridade e transformada até mesmo em personagem literária e de telenovela da Rede Globo (Hilda Furacão, 1998). Sua irmã, Diva Tupynambá Gordilho, também bisneta do Major Tupinambá, casou-se com o ex Deputado Estadual e Federal, ex-Ministro da Justiça (Governo Sarney), ex-Secretário de Estado de Educação de Minas Gerais (Governo Magalhães Pinto), ex-Ministro (Vice-presidente eleito) do STF, ex-Ministro-Presidente do TSE e Imortal da Academia Brasileira de Letras, Prof. Dr. Oscar Dias Corrêa, com o qual é mãe do ex Juiz do TRE-MG e ex deputado estadual, federal e constituinte, Dr. Oscar Dias Corrêa Júnior; e avó do deputado estadual e ex-Secretário de Estado de Esportes e Juventude de Minas Gerais, Dr. Gustavo de Faria Dias Corrêa, respectivamente trineto e tetraneto do Major Tupinambá. Também trineto do Major Tupinambá, o consagrado Marcelo Lélis é um premiado escritor, desenhista, ilustrador, cartunista e quadrinista brasileiro com projeção internacional.

Cabe dizer, por derradeiro, que inúmeros dos descendentes (por consanguinidade ou afinidade) do Major Tupinambá se destacaram, de uma forma ou de outra, na vida social, política, intelectual, artística e cultural da sociedade mineira.


Dário Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires

MARIA DAS MERCÊS
PAIXÃO GUEDES

Enquanto o véu da noite enlutava as nossas vidas, com um momento de infinita tristeza, o céu se preparava para receber, com júbilo divino e a suprema emoção, a ilustre confreira Maria das Mercês Paixão Guedes. Não é, pois, uma questão de morrer, senão o de renascer para Deus, um atributo normal para os que cultivam e cultivaram, aqui na terra, a semente do amor e da caridade. Como não cabe na feição deste pequeno elogio fúnebre, uma explanação mais longa, para o seu pleno merecimento, onde se fixassem todas as suas atividades realizadas, principalmente no ambiente sócio/comunitário, dizemos apenas que a alma generosa de Maria das Mercês sempre esteve presente, para atender o que lhe pedia – insistentemente – o bondoso coração. Neste momento de dor e saudade, no egrégio Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros os seus associados estão tristes e todos chorosos. Não é só por isto, mas porque choramos todos nós com a certeza de que, nem mesmo a morte poderá interromper os seus ideais de servir a Deus. Graças o seu amor dedicado a nossa querida cidade de Montes Claros e, também, ao povo montes-clarense, a acadêmica Maria das Mercês, como disse muito bem o escritor Wanderlino Arruda, tornou-se uma condiscípula atuante nos meios literários de nossa terra. Descanse em Paz!

UM POUCO MAIS SOBRE MARIA DAS MERCÊS

Natural de Bocaiúva, MG, era filha de José Ladislau da Paixão e de dona Maria do Amparo Figueiredo Paixão, casada com Ivan de Souza Guedes, empresária, escritora e mãe de quatro filhos Leonardo Paixão Guedes, Lyntton José Paixão Guedes, Luciano Frederico Paixão Guedes e Leandro Ivan Paixão Guedes e avó de oito netos. Estudou na Faculdade de Direito do Norte de Minas – FADIR (Unimontes), graduando-se no ano de 1969.

PUBLICAÇÔES: Publicou o excelente livro “Magnificat”, escrito em parceria com a acadêmica Milene Coutinho Mauricio. Belo Horizonte. Editora Lutador. 2002. Também a biografia da professora Lilia de Andrade Câmara 1896 – 1973. Pela Editora Digipix de Belo Horizonte. Participou da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros no I e II volumes. (Gráfica Editora Millennium Ltda. 2007/2008). Maria das Mercês ainda publicou vários textos em jornais e revistas de Montes Claros e do Estado de Minas Gerais.


Livro de Maria das Mercês Paixão Guedes sobre a biografia
da farmacêutica Lília de Andrade Câmara.

CERTIFICADOS E CURSOS: Certificat D’etudes Du 3º Degré L’Alliance Française de Montes Claros, em 1968; Certificado do I Congresso Nacional sobre Ensino Audiovisual de Francês, da Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, no ano de 1974; Certificado do Curso de História da Arte e Arte Contemporânea; Curso de Base de Atração Convivencial Humana, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Montes Claros - FAFIL, no ano de 1974; Curso de Atualização em Direito e Processo do Trabalho, da Fundação Universitária Norte de Minas, Montes Claros, no ano de 1975; Curso do Direito do Trabalho para Executivos, pela Fundação Universitária Norte de Minas, Montes Claros, no ano de 1976; Curso de Terapia e Integração Pessoal, na Pontifica Universidade Católica de Minas Gerais, em Belo Horizonte, no ano de 1987.

ASSOCIAÇÕES: Ocupou o cargo de presidenta na Associação das “Damas de Caridade”, em Montes Claros, durante o biênio de 1987/88 e na Associação das “Amigas da Cultura” de Montes Claros, no biênio de 1997/98. Sócia efetiva do egrégio Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, onde ocupava a Cadeira nº. 73, que tem como patrona a saudosa professora Lilia de Andrade Câmara e, ainda, da Academia Feminina de Letras de Montes Claros, onde ocupava a Cadeira nº. 37, que tem como patrona Zenília Paixão. Sócia Benemérita da augusta Academia Montes-clarense de Letras.



Dóris Araújo
Cadeira N. 5
Patrono: Antônio Ferreira de Oliveira

ATÉ QUALQUER DIA, PERÉ!

“As lágrimas até aqui derramadas equivalem ao mar de imorredouras saudades em que estamos todos mergulhados.” ( Haroldo Lívio)

Luís Carlos Vieira Novaes, o Peré, nasceu em Montes Claros, aos 25 de dezembro de 1953. Grande jornalista, radialista e notável escritor. Laborou em vários jornais e rádios em Montes Claros e também em nossa cidade vizinha, Janaúba.

Trabalhou por mais de dezesseis anos como editor - chefe no Jornal de Notícias.

Em 2009, publicou, através do Grupo Oficina das Letras, primeiro consórcio literário de Montes Claros, o livro de crônicas Sapo na Muda.

Membro da Academia Montes-Clarense de Letras, ocupando a cadeira de número 05; membro do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, ocupando a cadeira de número 57.

Aos cinco de outubro de 2014, parte o nosso estimado confrade Luís Carlos Novaes, o nosso tão querido Peré.

Eu queria muito endereçar- lhe algumas palavras... No entanto, tomada pela emoção, perco- me sem saber como e o que dizer. Dizer o quê, Peré? O que dizer? Dizer simplesmente que você é mais um dos queridos amigos que nos antecedem à viagem de regresso ao mundo espiritual, à verdadeira vida. Dizer que já sentimos saudades... Dizer que nos deixou um bonito legado: exemplo de coragem, afabilidade, generosidade, competência, e um valoroso e reconhecido trabalho em prol do Jornalismo, da Cultura : suas crônicas. Suas geniais crônicas, várias delas, condensadas no esplêndido livro intitulado” Sapo na Muda”. Obra muito aplaudida por aqueles que admiram a boa literatura, pelos críticos e por seus pares no caminho das letras.

Um belo livro pelo qual tivemos o prazer e o privilégio de concentrar força e energia em favor do seu lançamento no memorável projeto Livros na Praça, onde éramos seus coordenadores ( meu esposo - o professor Sebastião Abiceu, o escritor Dário Cotrim, que na ocasião era o diretor da Biblioteca Municipal Antônio Teixeira de Carvalho e eu). Projeto idealizado por nós e abraçado pela Secretaria Municipal de Cultura, na administração do prefeito Luiz Tadeu Leite. Evento que causou grande repercussão, realizado em uma festiva manhã de domingo, na Praça da Matriz, no stand do Livros na Praça,
onde inúmeros amigos e notáveis personalidades estiveram presentes para prestigiá-lo, pois, com seu carisma, Você conseguia, sem embaraço algum, congregar uma multidão em seu entorno. Esse seu lançamento foi um grande sucesso.

Lembro-me bem das inúmeras vezes em que, casualmente, nos encontrávamos, você vinha irradiando sinceridade e otimismo. Chegava sorridente, satisfeito, de banho recém tomado, cheirando à fragrância de Patchouli. Um cheiro de alma limpa e generosa, de gente do bem, cheiro de poeta, de cronista, cheiro incorruptível do jornalista respeitado. O admirável Jornalista, memorialista, sabedor dos fatos, senhor das ideias, conhecedor do poder das palavras, mediador da comunicação. Dono de um estilo graciosamente leve, jocoso, bem humorado, cativante!


Fotografia do nosso arquivo pessoal / Projeto Livro na Praça

As nossas conversas geralmente giravam em torno do literário, assuntos gerais, amenidades... O nosso diálogo finalizava sempre com um gostinho gostoso de quero mais...

Obrigada, amigo, pelas incontáveis vezes em que nos recebeu em seu trabalho, colocando- se à nossa disposição, dispensando- nos um espaço em seu jornal para que publicássemos nele as nossas tímidas crônicas ou acanhados poemas. Obrigada por compartilhar conosco generosa fatia de suas amizades, de sua alegria, de sua vida.
Obrigada pelo carinho, pela confiança, pelo incentivo!

Seu perfume inconfundível continuará ininterruptamente a nos envolver... não deixando nenhum intervalo, nenhuma fenda, nenhum espaço vazio, nem mesmo uma brecha para o esquecimento...

Suas obras o tornarão imortal em nossa memória, em nosso coração.

Paz e luz, querido amigo! E até qualquer dia...

Dê por nós um bom abraço em todos os amigos que o antecederam e que, certamente, o estarão aguardando com luminosa alegria!

Até qualquer dia, Peré! Até!



Felicidade Patrocínio
Cadeira N. 20
Patrono: Camilo Prates

A “VITRINE CULTURAL”
DA ESCRITORA
ZORAIDE GUERRA DAVID

Encheu-me de contentamento o convite para elaboração do prefácio do livro “VITRINE CULTURAL da escritora ZORAIDE GUERRA DAVID. Certamente que este privilégio deve-se mais aos laços de amizade do que à capacidade do meu texto. Mesmo assim, com simplicidade, agradeço a honra e tento desincumbir-me de tão gratificante obrigação.

Para tal, iniciarei colhendo na própria fala da autora uma citação significativa, e aqui, muito pertinente “Os dons nos são dados para o serviço”-( São Paulo.)

Esta reflexão ilustra de maneira completa o ser de Zoraide Guerra David e sua relação com sua obra literária. Ao desatar os avatares do seu ser criativo, Zoraide, ainda na juventude, descobriu-se escritora e dentre suas múltiplas capacidades neste vetor, o da palavra escrita; a poesia, a crônica, a prosa, ela priorizou a história, percebendo certamente, que esta é o “grande espelho da vida”. Percebeu, desde o inicio, que seu olhar atento de escritora, seria capaz de perseguir os fatos em busca de verdades nos exemplos de vidas, e registrando-as poderia perenizá-las para a posteridade. Nada fácil, mesmo assim enfrentou o desafio. Ao somar sua reveladora intuição de biógrafa com boa dose de talento literário, aliando aí uma pertinaz vocação de servir assim como o sentimento de obrigação, o seu esforço levou-a à produção de uma obra vasta e de grande importância no cenário da literatura e da história das regiões norte de Minas, sul da Bahia e outras. De olho nas metamorfoses esperadas e inesperadas do tempo, confirmou a direção que lhe apontava sua sensibilidade e comoção e começou a registrar histórias de cidades, histórias pessoais, o que traduz a sua compreensão de que na memória da humanidade está a memória do individuo.
A sua eloquência perceptiva procura captar nas entrelinhas, um dito essencial, nas emoções mais escondidas ou disfarçadas, o cerne que constitui o ser humano de suas personagens vivas e é capaz, também, de reconstituir no presente o brilho de presenças pretéritas.


Zoraide Guerra David e sua obra literária

Eu definiria esta produção que ora prefacio, acertadamente denominada de “VITRINE CULTURAL” como o mapa de um tesouro, pois ela nos descortina a riqueza imensurável da produção literária da autora, e desperta em nós, desejo e curiosidade para ir em busca de todo esse manancial literário e por fazê-lo, nós, que vivemos no presente da escritora, já comemoramos o que o futuro agradecerá. Passarão os nossos sonhos, a nossa dor e alegria, assim como os nossos feitos, mas, os exemplos de vida registrados com esmero pela escritora Zoraide, permanecerão. Serão como faróis a iluminar modos de ser e viver em um contexto já perdido na voracidade de Cronos. A síntese que nos apresenta “VITRINE CULTURAL”, chama a atenção para o caminho percorrido pela autora, que não é outro senão o do registro da realidades e personalidades com as quais estamos vivendo e convivendo e que nem sempre observamos. Através da original ideia de nos apresentar neste, as introduções de cada um dos seus livros, onde é presença a ternura lírica da sua alma, assim como os prefácios dos mesmos, escritos pelos nomes mais significativos da cultura local, alguns vivos e atuantes, outros que já se foram, do Dr. João Vale Maurício ao Padre Murta que a aclamaram como baiana guerreira e, historiadora, diante da qual nós somos obrigados a nos ajoelhar. De Wanderlino Arruda, ao Dário Cotrim, à inesquecível presidente da Academia Montes-Clarense de letras D. Yvonne de Oliveira Silveira, à Manoel Hygino que disse que os livros de Zoraide acrescentam um imprescindível capítulo à história de Montes Claros, a escritora Zoraide presta-nos o serviço do conhecimento da dimensão da sua
obra. Paralelo à competência como escritora, não podemos omitir, que habita em Zoraide Guerra David, um ser de grandeza impar, perfazendo aquilo que todos, que almejam transcendência, gostariam de ser. Apesar da sua estatura física delicada, até mesmo mingnon, quando quero fitá-la devo elevar os olhos.

Amantíssima dos seus familiares, leme e força do seu inseparável marido, o Dr, Ayer David Cerqueira, ela é, dos amigos, amiga de presença e participação incomparáveis. Nos gestos, sempre, a finura e generosidade. A beleza espiritual de sua alma se materializa nas páginas que escreve, onde registra o resultado da colheita dos dados dos seus biografados. Seu nome tornou-se um uníssono quando se quer um trabalho de registro perfeito da vida de uma pessoa ou de uma instituição, para o conhecimento do presente e da posteridade. Assim foi com a ACI, com a história do Corpo de Bombeiros de Montes Claros, com a vida do intelectual poeta Patrício Guerra, seu pai, do bem sucedido Ivan Guedes e outros.

Para não alongar, embora me apraza muito percorrer o itinerário desta pessoa tão especial, a quem admiro profundamente, volto às sábias palavras de São Paulo ditas no inicio, em alusão aos talentosos e concluímos que Zoraide, apenas com o que produziu até agora, já correspondeu plenamente aos dons recebidos. Sua terra foi lavrada, semeada, plantada, regada e a urdidura da sua faina fez florescer e frutificar abundantemente, a árvore da sua literatura. Resta a nós, felizes leitores, completar o conhecimento da mesma e amparados pela leitura deste selecionado feixe de textos do livro “Vitrine Cultural”, partir para a leitura individual dos livros que neste, são apresentados.



José Ferreira da Silva
Cadeira N. 49
Patronese: Irmã Beata

PADRE ALCIDES

Padre Alcides, um grande sacerdote Alcides Francisco Cericato, nasceu no dia 28 de janeiro de 1928, na Comunidade de Ciríaco, distrito de Campo do Meio, município de Passo Fundo, Rio Grande do Sul. Padre Alcides é o primeiro dos 11 filhos do casal Antônio Abelino Cericato e Maria Ferri. Seus avós paternos, Francisco Cericato e Luiza Friches, e avós maternos, Celeste Ferri e Pierina Cechin nasceram na Itália. Alcides Cericato foi batizado no dia 20 de abril de 1928, na paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Passo Fundo, pelo Pe. Rosenfeldt Palotino, tendo como padrinhos Pedro Cericato e Virgínia Cericato. Mais tarde, no ano de 1932, do dia 9 de novembro, foi crismado na Capela de Santa Terezinha de Ciríaco pelo Bispo de Santa Maria - RS, Dom Antônio Reis, e seu padrinho foi seu avô, Francisco Cericato. Aos 9 anos fez a primeira comunhão, sendo celebrante o Pe. Henrique Hittingen MSF e a sua catequista, a sua bondosa mãe. Em 1935 entrou para a escola primária em Ciríaco, e no dia 26 de fevereiro de 1942 entrou para o Seminário Sagrada Família em Santo Ângelo, mas uma dupla pneumonia o atacou. Por este motivo retornou para casa. No ano de 1943 retornou para o seminário, que tinha como reitor o Pe. João Maria Arnd. Concluiu o 2º grau em 1949 e iniciou o noviciado em 11 de fevereiro de 1950. Seus votos aconteceram no dia 11 de fevereiro de 1951 e os votos perpétuos no dia 11 de fevereiro de 1954. O subdiaconato aconteceu no dia 9 de junho de 1955 e o diaconato no dia 12 de junho do mesmo ano. A ordenação sacerdotal ocorreu no dia 8 de dezembro de 1955, na catedral de Passo Fundo das mãos de Dom Cláudio Coling. Padre Alcides presidiu a primeira missa em Ciríaco em 11/12/1955.

O Padre Alcides não se limitou ficar em seu estado, trabalhou em vários estados do Brasil como verdadeiro missionário de Deus sem priorizar estados e paróquias do nosso imenso país. Podemos citar algumas cidades que ele trabalhou ao longo dos 60 anos de sacerdócio: Ibiaçá, Santo Ângelo e Catuipe no Rio Grande do Sul; Caibi e Maravilha em Santa Catarina; Jucás, Carius e Arneiros no Ceará; Patu, Natal e Alecrim no Rio Grande do Norte; Buique em Pernambuco; Bairro Saúde, Rio de Janeiro; finalmente Januária e Montes Claros em Minas Gerais.

O impressionante na vida desse missionário ao longo do seu sacerdócio foi a disponibilidade e o desprendimento à sua missão. Dizia ele que o motivo principal de tantas transferências foi um propósito no tempo de seminário de estar sempre à disposição dos superiores e de não prender-se a lugares e pessoas.

Depois de uma incansável trajetória por várias cidades e paróquias do sul ao norte do Brasil, finalmente chega a Montes Claros em 2007, fixando residência na Paróquia Menino Jesus de Praga até a sua morte em 23 de abril de 2017.

Felizmente, convivi com o Padre Alcides durante 9 anos como ministro extraordinário da eucaristia e observei que ele foi verdadeiro missionário de Jesus, pois era um homem simples, humilde, prestativo, carismático, sensível às necessidades dos fiéis, pontual, sério, contador de histórias e agradável. Por isso, podemos afirmar que a vida do Padre Alcides foi como São João Maria Vianney declara que o sacerdote é o amor do coração de Jesus. Faleceu no dia 23 de abril de 2017, deixando-nos um grande exemplo do cumprimento da Palavra que nos fortalece para a vida eterna no paraíso celeste.



José Ponciano Neto
Cadeira N. 24
Patrono: Celestino Soares da Cruz


LUIZ DE PAULA
O VARZEA-PALMENSE
QUE REVOLUCIONOU
MONTES CLAROS E REGIÃO

“Chegar aos 100 anos é empreender uma travessia pelo mundo lá fora e dentro de si. É da vida: o tempo e a lucidez se (e nos) encontram com o passar dos anos”.

Luiz de Paula Ferreira nasceu em 27 de Junho de 1917 em Várzea da Palma - MG um Povoado de Pirapora-MG. Seus pais o Sr. Joaquim de Paula Ferreira (comerciante na localidade) e Emília Mendonça de Paula. Época que surgia a Estrada de Ferro.

Este menino nasceu, e logo veio o tétano neonatal, mais conhecido como o “mal de sete dias”. Temendo que o filho morresse “Pagão”; no dia 30/06/17, a pedido da sua esposa, Sr. Joaquim procurou as pressas o homem mais religioso de Várzea da Palma para batizá-lo. Ainda dentro de casa, ao lado da cama onde Dona Emília cultivava o “resguardo” - sob os auspícios de Deus - o menino foi levado aos braços de Sr Bertulino P. Ribeiro e de Dona Alzira Ponciano V. Ribeiro – bisavô e avó deste escriba – no qual me orgulho.

Graças às orações dos pais, do ferreiro Sr. Bertulino e a vontade de Deus o menino se salvou da doença. Depois da primeira batalha vencida, meses depois o neófito foi oficialmente batizado na Igreja de Pirapora e recebeu o nome de Luiz de Paula Ferreira – inicialmente iria receber o nome de Luiz Gonzaga de Paula Ferreira – o Sr. Joaquim não gostou do “Gonzaga”, que foi retirado no momento do registro. É o que foi narrado pela minha avó, Dona Alzira Ponciano.

O certo que o menino nasceu, depois curou-se e saiu para o mundo para trabalhar e estudar.

Tornou-se Contador, Deputado Federal (1967/70), Advogado, compositor, escritor, historiador e um grande visionário empreendedor.

Casou-se com a Mestra Isabel Rebello de Paula, mulher de uma civilidade e humildade imensurável. - Certo dia fui à casa da família situada à Rua Dr. Santos para resolver uma demanda da empresa que trabalho, e lá encontrei Dona Isabel com os afazeres de casa na maior simplicidade do mundo. Aquela imagem deixou-me admirado, devido a sua posição social e financeira. Somente a intelectualidade de uma pessoa pode engrandecê-la daquela forma. É uma grande mulher.

Sr. Luiz de Paula começou muito cedo suas andanças pelo o mundo trabalhou com seu pai, o Tio Basílio de Paula, de balconista nos comércios dos amigos da família, que lhe rendeu uma experiência meteórica.

Ainda criança (nos anos 30) foi trabalhar em Juramento – MG em uma casa de armarinho.

A sua chegada ao povoado foi narrada em um dos seus livros: - “A chegada a Juramento foi decepcionante. Eu viera a cavalo, desde Glaucilândia. Ao descer o Morro da Barriguda, abarquei com a vista o povoado. Era um pequeno aglomerado de casas, no fundo de uma depressão, no vale do Rio Juramento, cercada por serras e morros. A população, como vim, a saber mais tarde, pelo censo de 1940, era de 545 pessoas na sede do povoado e mil e poucas na zona rural”. Diz o menino Luiz.

Ali, o menino trabalhou por algum tempo, seguiu para Glaucilândia/ MG, onde trabalhou em casa comercial tipo “tem-tudo” – foi trabalhador braçal e aprendiz na agência da Estação da Estrada de Ferro, com o pequeno salário pagava suas diárias na pensão.

A vida foi passando, este menino cresceu virou adulto, começaram surgir novos desafios. Em 1936/7 fundou o Rotary Club em Montes Claros, voltou para Juramento–MG como sócio-gerente de uma Casa Comercial, e logo retornou a Montes Claros.

Com o apoio do Rotary Club Internacional – no qual foi Governador - inicia uma série de benfeitorias para o Norte de Minas.

Lembro-me da famosa Algodoeira Luiz de Paula (foto). A Algodoeira possuía um ramal ferroviário à sua porta e uma plataforma para carga e descarga de algodão, um escritório, onde, de vez em quando, eu ia receber os erários das notinhas dos serviços prestados aquela empresa pelo meu avô Sr. Ponciano e meu Sr. Manoel Ponciano – ferreiros de profissão como era o Sr. Bertulino.

Hoje a Algodoeira foi transformada em um Educandário. O ensino foi sempre o foco do Sr. Luiz de Paula. Vejamos a Faculdade de Filosofia Ciências e Letras – FAFIL, que originou outras faculdades que fomentaram a criação da Fundação Norte Mineira de Ensino Superior – FUNM e posteriormente a Unimontes. A criação da antiga Fafil, instalada em 1963 e que, inicialmente, teve como mantenedora a Fundação Educacional Luiz de Paula – FELP –, sendo incorporada à FUNM em 1966. Tendo como um dos fundadores, Padre Jorge Ponciano Ribeiro ao lado das professoras Isabel Rebello de Paula, Maria
Florinda Pires, Maria Isabel (Baby) Figueiredo Sobreira e Maria da Consolação (Mary) Figueiredo.


Luiz de Paula Ferreira

Sr. Luiz de Paula também fez a doação de um quarteirão na Av. Dulce Sarmento, com 5.000m2; além de dinheiro, para a construção da Escola do Ensino Profissional do SENAI, hoje ainda funciona muito bem.

Sr. Luiz de Paula sempre foi um grande visionário. Ele não enxergava o setentrião mineiro encapelado pelo o Sol ardente e a falta d’água, como o Cabo das Tormentas. Com a visão de Vasco da Gama e com a experiência exitosa da Algodoeira, ele conseguiu transformar o Norte de minas em Cabo da Boa Esperança.

Com foco na indústria, este “caixeiro viajante” do desenvolvimento econômico e social da região, ingressou a sua terra natal (Várzea da Palma) na era da industrialização; com o apoio do Rotary Internacional, maçonaria, outras instituições e, sempre a frente, o Sr. Luiz de Paula implantou na cidade várias indústrias.

Com o Polo Têxtil do Norte de Minas não foi diferente. Face da habilidade e a coragem adquirida ao longo do tempo, o idealizador da Coteminas fez a doação do terreno de 150 mil metros quadrados em frente ao antigo aeroporto, para a construção da maior empresa empregatícia da cidade.

Mas, para que o seu sonho fosse realizado, foi necessário o apoio do Rotary Club junto á SUDENE e a parceria com José Alencar Gomes da Silva proprietário da fábrica de confecções Wembley em Ubá-mg.

A Coteminas foi implantada em 1971 e inaugurada em 1975 com as presenças do então Prefeito Moacir Lopes e do Governador do Estado Rondon Pacheco. Como várias outras indústrias da época, a empresa também foi beneficiada com incentivos de ordem creditícia, na forma de financiamentos diretos, tendo como contrapartida empregos que privilegiavam os montes-clarenses.

Outros benefícios vieram por meio do prestigio do empresário Luiz de Paula Ferreira, além de todas as indústrias contemporâneas, o asfaltamento da BR-135, trecho Curvelo - Montes Claros - Colonização de Jaíba - Asfaltamento da BR-365, no trecho Pirapora – Canoeiros (BR-040) - Recursos para a construção da estação de passageiros do Aeroporto de Montes Claros - por intermédio do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, liderou um projeto para implantação do Frigorífico Norte de Minas – Frigonorte, e muitos outros.

A este irmão da Ordem Maçônica, obreiro da Loja Maçônica Deus e Liberdade, e confrade da Academia Maçônica de Letras do Norte de Minas e do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, compositor da canção Montes Claros Centenária, sinceramente Ir,’, gostaria que a genética mudasse as combinações dos genes, e o contemplasse com, pelo menos mais 50 anos de vida, para Montes Claros voltar a crescer.

Feliz centenário!


Algodoeira Luiz de Paula S.A.


Leonardo Álvares da Silva Campos
Cadeira N. 97
Patrono: Urbino Vianna

ENTREVISTA PARA O INFORMATIVO DO IHGMC

Leonardo Álvares da Silva Campos nasceu em Montes Claros, em 03 de junho de 1953, filho de Bento Álvares da Silva Campos e de Terezinha Peres Álvares da Silva Campos. Estudou nos Colégios São José, Dulce Sarmento, São Norberto e CB-MOC, concluindo o curso de Direito na Faculdade de Direito do Norte de Minas - FADIR, da Fundação Universidade Norte de Minas - FUNM, hoje Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES.

Entrou para o jornalismo aos 16 anos de idade, no jornal “Diário de Montes Claros” (hoje extinto), a convite de um de seus proprietários, Júlio César de Melo Franco, tendo iniciado na página policial e depois na editoria de cidade, sendo seu preceptor o também jornalista Jorge Silveira. Chegou a editor desse jornal, assinando também as colunas “Vida Estudantil”, em substituição a Itamaury Teles de Oliveira, e “Passado & Presente”, editando ainda a “Página Literária”, fundada por João Valle Maurício, em substituição a Jorge Silveira.

Também foi editor dos jornais “Jornal do Norte” (já extinto), de propriedade de Américo Martins Filho e Jorge Antônio dos Santos, e “O Gorutuba”, de Janaúba, então de propriedade do jornalista Raimundo Brandão. Entre os anos 70 e 80, foi colaborador do suplemento de cultura do jornal belo-horizontino “Estado de Minas”. Foi um dos fundadores da Academia Juvenil de Letras de Montes Claros – ACAJUL, sendo também membro da Academia Montesclarense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. Lecionou ainda, como professor substituto do civilista Sidney Chaves, a matéria Introdução à Ciência do Direito, na mesma FADIR em que se formou. Advoga na área cível desde setembro de 1983. Foi sócio correspondente da Sociedade Orquidófila de Belo Horizonte, sendo presentemente sócio e um dos fundadores do Clube dos Amigos dos Pássaros de Montes Claros e do Norte de Minas - CAPAMN, cujo estatuto é de sua lavra.

Em 1979, participou, como conferencista, do XIII Congresso Nacional de Espeleologia, promoção da Sociedade Excursionista e Espeleológia, da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto. Apresentou ainda o trabalho “Grutas e Abrigos na Memória Nacional” durante o I Seminário Regional sobre Conservação da Natureza - SERCON/Norte (Montes Claros), de 31 de agosto a 03 de setembro de 1981, promovido pelo Governo do Estado de Minas Gerais, Prefeitura Municipal de Montes Claros e Núcleo de Tecnologia em Ciências Agrárias, da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, dentro do tema de abertura, “A Natureza na Preservação da Memória Nacional”. Foi conselheiro e vice-presidente do Conselho Consultivo do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural de Montes Claros (1990/1991), e também membro da Comissão de Cultura da Ordem dos Advogados do Brasil – Subseção de Montes Claros (MG), na gestão do presidente Francisco Alencar Carneiro. Lançou os livros “O Homem na Pré-História do Norte de Minas” (único original selecionado em concurso nacional pela Comissão de Apreciação do Mérito das Publicações, da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, em 15 de fevereiro de 1982); “A Inacabada Família Humana”, pela Editora Armazém de Ideias, de Belo Horizonte, em 2008; e “Saluzinho, Luta e Martírio de um Bravo (A Sociologia dos Conflitos Agrários no Brasil)”, pela D’Plácido Editora, em 2014, 1ª edição de 3.000 exemplares esgotada – esta última obra lhe valeu o “Prêmio Projeção e Oscar de Minas” como “obra literária do ano”, promoção do colunista social João Jorge (jornal “O Norte”/Programa “Revista Gerais”, Canal 2, Montes Claros), em 09 de maio de 2015. No Concurso Norte-mineiro de Poemas, Contos e Crônicas, realizado em Janaúba, em 20 de fevereiro de 1987, promoção da mídia local e Prefeitura Municipal, ficou em primeiro lugar em crônica, com “Flor de Pólvora”, e em segundo lugar em conto, com “2001”. Participou do Curso de Aperfeiçoamento em Informações Turísticas, ministrado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC, no período de 20 de maio a 07 de junho de 1974, em Montes Claros, dentro do Programa Intensivo de Preparação de Mão de Obra no Vale do São Francisco (convênio SUVALE/PIPMO/ABCAR). Recebeu o “Diploma Jair de Oliveira”, da I Delegacia Regional do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais, em 24 de fevereiro de 1984, pelos seus relevantes serviços prestados à comunidade montesclarense, nas comemorações do primeiro centenário da Imprensa local.

Recebeu mais o “Diploma de Mérito Godofredo Guedes”, da Sociedade Cultural Montes-clarense (então formada por músicos, atores, artistas plásticos, escritores, compositores, bailarinos, produtores de moda, desportistas, agentes de viagem, artesãos, educadores, intelectuais e demais formadores de opinião de Montes Claros), em 21 de dezembro de 1995, por méritos comprovados no campo da Espeleologia, área de Patrimônio Histórico. Recebeu três vezes o “Prêmio Parnaso de Cultura”, em 2004, 2014 e 2016, promoção anual do escritor José Luiz Rodrigues, em Montes Claros. Foi homenageado com um poema, ao lado dos também escritores e pesquisadores Arthur Jardim de Castro Gomes e Simeão Ribeiro, pelo literato José Prudêncio de Macêdo, em seu livro de poemas “Entre outras coisas... Eva”, na parte “Perfilando Acadêmicos”, Editora Gráfica Polígono, Montes Claros, 1986. Participou com artigos e/ou trabalhos literários nas seguintes publicações: “Montes Claros, sua História, sua Gente, seus Costumes”, Hermes de Paula, Minas Gráfica Editora Ltda., volume 2, 1979 - “Antologia montes-clarense”, pág. 262 (“Pisa sertaneja”); “Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais”, Imprensa Oficial de Minas Gerais, volume XXI, 1986/1991, págs. 370/373 (“Da Pangeia à quica-d’água, uma nova explicação para a dispersão dos marsupiais”) e 375/377 (“O ermitão dos socavões”); “Antologia da Academia Montes-clarense de Letras”, edição comemorativa dos vinte anos de sua fundação (1966/1986), volume II, Barvalle Ind. Gráficas Ltda., págs. 141/143 (“Um Homem Justo”), 144/145 (“O ermitão dos socavões”), 145/146 (“Penas amarelas, lindas, mortas...”), e 146/148 (“Sinfonia de Nadinha”); “Sesquicentenário da Vila Diamantina”, Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1983, págs. 273/279 (“Assim nasceu Diamantina, berço de JK e onde ‘reinou’ Chica da Silva”); “Dados Históricos & Lei Orçamentária” – Coração de Jesus,
1984, págs. 19/20 e 23/24; “Menino Pescador”, Reivaldo Canela, editora não informada, 2008, págs. 02/05; “Os Filhos do Dragão Cospem Fogo”, editora não informada, 2012, págs. 131/132 (“E-mail enviado pelo escritor Leonardo Campos”), 133/136 (“A Ética e a Moral”), 137/141 (“Eta mulher sem vergonha”), 143/145 (“Demônios que vêm com a noite”), 305/310 (“Encruzilhada das línguas viperinas”) e 311/321 (“Nunca estaremos com a morte”); “Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros”, volume XIII, 2º semestre de 2014, págs. 79/84 (“As Múmias de Itacambira Explicadas”); “Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros”, volume XVI, 1º semestre de 2016, págs. 53/56 (“O Falso Dr. Douville”).

Como especialista em paleoantropologia - A paleoantropologia é o estudo do homem primitivo, sua origem e evolução, dentro do limite do tempo pré-histórico. Seu surgimento se deu na África, num período entre 2,8 milhões e 3,2 milhões de anos, quando ali pululou uma série de hominídeos, entre os quais o homem, o único que estreou naquele cenário dotado de inteligência. Tratava-se do “Homo habilis”, sucedido pelo “Homo erectus”, há 300 mil anos, e, por fim, pelo “Homo sapiens”, que somos nós. O homem de Neandertal era um tipo especializado para enfrentar o período glacial do seu surgimento, desaparecendo, contudo, com o pós-glacial, mas sem antes ter-se miscigenado com o “Homo erectus”, conforme irrefutavelmente comprovado com as pesquisas do genona humano. Foi o “Homo sapiens” primitivo que conseguiu realizar a travessia Ásia/América, deixando a Sibéria e chegando ao Alasca, no último glacial, através do Estreito de Bering, há cerca de 13 mil anos. Todavia, pesquisas em São Raimundo Nonato, na Serra da Capivara, no Piauí, têm mostrado uma ocupação acima de 50 mil anos passados e talvez se estendendo há 100 mil anos, provavelmente mercê de uma travessia pelo Oceano Atlântico procedente da África, que então atravessava um período de seca tremenda. A América mostra dois tipos morfológicos, pelo estudo de diversos crânios, inclusive em Lagoa Santa (MG): negroides e mongoloides (asiáticos). Foram as primeiras levas destes últimos que penetraram o continente americano pelo Estreito de Bering.

Livros publicados. - O meu primeiro livro publicado, “O Homem na Pré-História do Norte de Minas” teve seus originais selecionados, a nível nacional, pela Comissão de Apreciação do Mérito das Publicações, da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, em 1982. É uma obra eminentemente de paleoantropologia, não deixando de passar um pouco pela espeleologia (estudo de cavernas) mineira, uma vez que os nossos primeiros ameríndios ocupavam abrigos calcários, inclusive em seus rituais religiosos e fúnebres. São abordadas a origem, evolução e disperção do homem da África, Ásia, Europa e continente americano, sua sobrevivência, costumes, alimentação e manifestações parietais (sinalações rupestres).

O segundo, “A Inacabada Família Humana”, publicado pela Editora Armazém de Ideias, foi escrito entre 2004 e 2008. É uma obra envolvendo sociologia, filosofia, crimes contra a humanidade, relações homem-mulher, ecologia, etc., sendo também semiautobiográfico. Nelas não são citados nomes, mas inúmeros personagens do passado recente e do presente de Montes Claros, ora chamada de País de Tropicana, ora de Necrópolis, estão ali retratados em número considerável: advogados, juízes, escritores, colunistas sociais, políticos, homens tidos como probos, intelectuais e moralistas, etc. Enfim, é o oposto do chamado “jucapratismo”.

O terceiro e último, “Saluzinho, Luta e Martírio de um Bravo (A Sociologia dos Conflitos Agrários no Brasil)”, Editoria D’Plácido, 2014, teve esgotada a sua primeira edição, de três mil exemplares, sem contar a comercialização de e-book, principalmente em outros estados, com vendas pela Saraiva e Cultura. A segunda edição deverá ser lançada até o final deste ano. Saluzinho, um sertanejo que obteve notoriedade no ano de 1967, ao enfrentar armado policiais militares de Montes Claros e destacamentos de municípios das redondezas de dentro de um abrigo calcário situado em Varzelândia. Deu-se a contenda por quatro dias e quatro noites, na Serra da Onça. Ao final, a Polícia Militar não obteve êxito, porque Saluzinho somente se entregou a um delegado do DOPS, que lhe garantiu a vida. Ele defendia sua posse, por sucessão do seu falecido pai, enveredando-se o livro, no pormenor, pelo Direito Agrário, explicando, à luz do nosso ordenamento jurídico e jurisprudencial, que a terra devoluta nunca é necessariamente do Estado, mas, sim, de quem nela primeiro faz posse (a terra adéspota, ou “nullius”, precisamente o caso de Saluzinho defendendo suas terras de grilagem de fazendeiro abastado da época.

Os movimentos culturais de Montes Claros. - Os movimentos culturais em Montes Claros, presentemente, encontram-se de roupagem nova e mais alvissareira, mercê de instituições voltadas para os mesmos, mormente o Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros e a Academia Montes-clarense de Letras, e o interesse também de particulares e grupos ligados ao folclore e serestas, passando ainda pelo “Psiu Poético”, que sobrervive ante a luta elogiável de Aroldo Pereira, e ainda por artistas plástico de renome, como Yara Tupinambá, Carlinhos Araújo, Afonso Teixeira e outros. É ainda pífio o apoio de setores da vida pública, como União, Estado (com exceção de determinados setores da Unimontes) e Município (exceção também para a Secretaria Municipal de Cultura, administração de Antônio Lafetá Rebello, Ruy Muniz e o atual chefe do Executivo municipal). Lembrando rapidamente nomes de peso cultural do passado, como Hermes de Paula, Plínio Ribeiro, Simeão Ribeiro Pires, Geraldo Tito Silveira e Olyntho Silveira, Arthur Jardim, José Alves de Macedo (que era radicado em Coração de Jesus), Yvonne Silveira e Nelson Vianna, José Luís Rodrigues e Raphael Reys, têm-se presentemente os continuadores dos nossos melhores movimentos culturais, como Dário Teixeira Cotrim, Wanderlino Arruda, Lázaro Francisco Sena (presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros),

Raquel Mendonça, Mara Narciso, Amelina Chaves, Ubirajara Macedo (radicado em Coração de Jesus) e João Rodrigues (secretário de Cultura) e muitos outros. Enfim, para que não se incorra no risco do esquecimento por lapso de memória, devo frisar, como baluartes dos nossos movimentos culturais, todos os membros do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, Academia Montes-clarense de Letras, Academia Feminina de Letras e instituições outras similares.

O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros é, a todas as luzes, a instituição cultural que precisava, vindo para preencher a lacuna da inexistência de organismo a congregar os verdadeiros
historiadores e geógrafos de Montes Claros e região. Ganhou Montes Claros, porque na troca de ideias e congraçamento dos verdadeiros pesquisadores, da história e da geografia, brotam incentivos maiores a que se possa penetrar mais e mais nas ocorrências do passado, que é o alicerce do presente e futuro. Quem não conhece seu passado provavelmente terá dificuldades em sua formação moral e ética para somar numa nação melhor de se viver. Sempre sonhei com uma instituição de tal naipe entre nós, a qual, agora, vem dando passos largos para fazer brotar outra necessidade premente, qual seja a criação de um museu da imagem e do som neste setentrião mineiro.



Manoel Messias Oliveira
Cadeira N. 60
Patrono: Jorge Tadeu Guimarães

A CRISE HÍDRICA

“Louvado seja, meu Senhor, pela irmã água, que é muito útil, humilde, preciosa e casta”. (São Francisco de Assis)

Os mais antigos filósofos gregos já afirmavam que tudo provém da água e a ciência tem demonstrado que a vida se originou na água e que ela constitui a matéria predominante em todos os corpos vivos.

“Pede leite a tua camela, um filho a tua mulher, mas água só para Deus”. É o que um antigo provérbio tribal nômade nos fala da água que procuramos e precisamos para saciar nossa sede.

Pouca gente sabe que cerca de apenas 0,008% do total da água do nosso planeta é potável. Assim, num futuro próximo, poderá faltar este precioso líquido para o consumo de grande parte da população mundial. A situação é tão séria que a ONU, em 1992 criou o “Dia Mundial da Água”, e o consagrou como sendo “22 de março”, destinado à discussão dos diversos temas relacionados a esse importante bem natural. Discussão que envolve reflexão, análise, conscientização e elaboração de medidas práticas para a solução do problema.

Destarte, sem dúvida, nos dias atuais precisamos refletir, e muito, sobre o tema.

Além do subsolo, grande parte da água que consumimos vem dos rios, lagos e barragens; fontes que estão sendo continuamente contaminadas, poluídas e degradadas pela ação predatória do homem. Esta situação é preocupante, no entanto, temos que nos habituar a ela.

Conviver com a falta de água tornou-se uma realidade inegável.

O progresso tem um preço, o povo está agonizando com sede e o clamor é geral. O alerta foi dado e a luz amarela já está acesa. A Secretaria de Estado para o Desenvolvimento e Integração do Norte de Minas Gerais – SEDINOR, tem se esforçado a fim de amenizar a situação ou evitar que se agrave mais. As autoridades municipais e os órgãos competentes em todos os níveis, também estão atentos e pedem que evitem o desperdício.

Nos últimos anos vêm se repetindo longos períodos de estiagem, alterando substancialmente a estrutura econômica e social, nem só nos meios rurais, mas e, principalmente, nos aglomerados urbanos como as cidades, distritos e povoados.

De onde provêm as águas?

Provêm de várias origens, é uma das substâncias mais difundidas na natureza. Encontramos água em quase tudo o que nos cerca: no ar, no solo, nas plantas, nos animais e até nos alimentos que consumimos. Não podemos viver sem ela. A vida depende da água. No entanto, se encontra ameaçada pela poluição, pela contaminação, pelo uso irracional, pelo desperdício doméstico e nas indústrias, pelos projetos arrojados de irrigação e pelas alterações climáticas.

É preciso pensar e manter viva a consciência ecológica que deve nortear, prioritariamente, o indivíduo. E, neste sentido, entender a necessidade de retirar o sustento da natureza sem prejudicar o ecossistema.

Os antigos supunham a existência no interior da terra, de grandes reservatórios de água que, interminavelmente, se escoariam, através dos mananciais naturais em direção aos oceanos que, como reservatórios maiores formariam grandes rios; os menores dariam origem a rios pequenos, regatos, córregos e lagos. Aristóteles que viveu três séculos antes de Cristo criticava essas teorias. Dizia ele que, se os rios tivessem as suas origens em cavidades determinadas, o volume total da Terra não seria suficiente para conter todas elas.

Sabe-se hoje que o ciclo das águas, ou ciclo hidrológico, está intimamente ligado ao ciclo energético terrestre, isto é, a distribuição da energia proveniente do sol. Essa energia é a responsável pelo transporte da água do mar e da própria Terra para as grandes altitudes, de onde se derrama na forma de chuva sobre os continentes. A maior parte infiltra-se no solo, preenchendo os espaços vazios existentes entre os grãos de argila, de areias ou de rochas mais consolidadas, constituindo depósitos de águas subterrâneas que retornam gradativamente à superfície, naturalmente pelas nascentes, ou por meio dos poços artesianos tubulares, escavações de cisternas e cacimbas.

Se as chuvas responsáveis pela reposição faltarem, ocorrerá a diminuição na capacidade dos depósitos e, consequentemente, faltará água para o consumo em todas as vertentes das necessidades terrenas.

São muitos os desrespeitos e violências contra a natureza. Mas, apesar de tantos fatos lamentáveis, ainda há bastante coisa boa, muita gente disposta a ajudar o próximo, um monte de pessoas lutando por uma vida melhor para todos. Quando estiver desanimado, procure lembrar de todos bons exemplos que você conhece principalmente aqueles concernentes aos cuidados que as empresas concessionárias empregam para deixar a água própria para o consumo humano. Os pensamentos negativos em nada ajudam.

Água potável significa “que se pode beber”. Para ser ingerida é essencial que não contenha elementos nocivos à saúde. Mas não é só isso. Para ser bebida pelo ser humano e utilizada no preparo dos alimentos e na sua higiene corporal, torna-se necessário que atenda a certos requisitos estéticos, isto é, que não possua sabor desagradável, odor ou aparência comprometedora.

Água é saúde. Água é vida. Vamos conservar as nascentes e economizar este precioso líquido, para não faltar.


Mara Yanmar Narciso
Cadeira N. 98
Patrono: Virgílio Abreu de Paula

MONTES CLAROS
MEMÓRIAS DO CENTENÁRIO

Quando Montes Claros fez 150 anos foi possível ver a lista dos 150 homenageados, com muitos nomes de rua, que desfilaram, como se saíssem da história e viessem nos assombrar com os seus feitos, e gente de hoje, pessoas que trombamos nas esquinas. Então, se passou uma década e Montes Claros fez 160 anos.

Meus pais gostavam de Montes Claros. Minha mãe, Milena Narciso, natural de Montes Claros, cantava pra mim: “Montes Claros/ Vovó Centenária/ está tão bonita/ de vestido novo/” (Luiz de Paula Ferreira), e explicava que a música do Centenário contava como a população se preparou, pintando suas casas para festejar os cem anos da cidade. Maria Inez Narciso, minha tia, ainda criança tinha aberto o desfile do Centenário, vestida de formiga para homenagear o nome primitivo da cidade, que era Vila Montes Claros de Formigas.

Meu pai, Alcides Alves da Cruz, mudou-se de Januária para Montes Claros aos 15 anos, e nunca houve nenhum “montes-clarense” mais fanático do que ele, natural da Bocaiúva. Foi contador, jogava futebol, era amigo do Dr. Hermes de Paula, que dirigiu o Cassimiro de Abreu Futebol Clube e também foi presidente do Centenário. Pai nos explicava que o nome do Pentáurea Clube, outra criação do Dr. Hermes, significava cinco bodas de ouro, referentes aos 250 anos de fundação (1707 a 1957).

Então, o Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros lança o livro “Montes Claros: Memórias do Centenário”, de Rogério Othon e Luciano Pereira, professores da Unimontes, com prefácio de Dário Teixeira Cotrim, e traz na capa a foto de Maria Inez Narciso, à frente do desfile. Modestos, os autores dizem abrir uma janela para que outros trabalhem o assunto com maior detalhamento. Nada foi falado sobre o papel da Rádio ZYD-7, fundada em 1944. Como teria sido sua atuação?

O livro é uma imersão no passado, na qual o leitor irá encontrar os nomes de rua em plena ação em prol de, com o Centenário, dar uma injeção de desenvolvimento na cidade. Isso aconteceu de forma mais marcante na década de 1970, com um período de industrialização e isenção de impostos proporcionada pela Sudene – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste e asfaltamento da rodovia para Belo Horizonte, expectativas semeadas no Centenário.

Em 1955, após longa pesquisa, o Dr. Hemes da Paula descobre os 250 anos de fundação (Sesmaria recebida por Antônio Gonçalves Figueira em 1707, que “afazendou-se” na Fazenda Montes Claros) e os cem anos de cidade a ser comemorados em 3 de julho de 1957. Houve reserva das autoridades ao lembrar que a emancipação teria ocorrido em 1832 e que o centenário já tinha sido comemorado. O escritor Haroldo Lívio escreveu sobre o “inventor do Centenário” de forma elogiosa, explicando a veracidade do fato.

Os preparativos duraram dois anos, um livro de 600 páginas foi escrito por Hermes de Paula: “Montes Claros, sua história, sua gente e seus costumes”, obra importantíssima, sendo a mais pesquisada e citada em âmbito acadêmico; foi construído o Colégio Marista São José e o Parque de Exposições João Alencar Athayde; aconteceram avanços urbanísticos e uma arrancada civilizatória, colocando Montes Claros no mapa.

Era presidente da república Juscelino Kubitscheck e governador de Minas Bias Fortes, que vieram ao evento, sendo prefeito de Montes Claros Geraldo Ataíde. A cidade não tinha como hospedar figuras tão ilustres, então as autoridades ficaram nas casas dos organizadores da festa, que constou de desfiles, representações folclóricas, rodeios, leilões de gado, baile de gala e muitas promessas.

O livro “Montes Claros: Memórias do Centenário” explica toda a festa, ocorrida há 60 anos, mostrando reportagens da época do evento, especialmente do Jornal Gazeta do Norte, já extinto, como também publicações em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro - Distrito Federal. Também trouxe crônicas sobre os cem anos de cidade nas letras bonitas de Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, Anderson Magalhães, Maria Antônia Alkmim, Haroldo Lívio, Yvonne Silveira, Hermes da Paula e outros.

Quem ama Montes Claros vai se apaixonar pelo passeio ao Centenário, e quem ainda não ama, vai amar.


Maria Aparecida Costa Cambuy
Cadeira N. 07
Patrono: Antônio Gonçalves Figueira


MERGULHO GEOGRÁFICO
EM GRÃO MOGOL

“O brilho das pedras fascinou, levou riqueza e muitas mortes.” Quem visita o interior de Minas Gerais fica maravilhado com esta região, especialmente atraente do “Espinhaço”, com espetaculares formações rochosas, picos, sítios arqueológicos, chapadões, rios e quedas d’agua, campos rupestres e bucólicas cidades, entre elas, o antigo sítio da cidade de Grão Mogol.

Em Grão Mogol, surgida no século XVIII/1839, destacam a igreja de Santo Antônio, cadeia pública, muros e calçadas de pedras, e hoje, o surpreendente Presépio Mãos de Deus, a céu aberto. O município é um encantador tesouro destas terras norte mineiras, onde tudo nos convida à contemplação, ao estudo e ao mesmo tempo à aventura e ao turismo.

Nas décadas de 80 e 90 estivemos, por duas vezes, professores e alunos do curso de geografia da Faculdade de Filosofia/FUNM, hoje Unimontes, realizando trabalhos de campo de reconhecimento e in locum, constatando-se as informações teóricas obtidas, sobre este impar laboratório natural. Inicialmente, situou-se o município, traçou-se o roteiro de viagem e elaborou-se o perfil geomorfológico. Coube aos alunos, com este material em mãos, localizarem as referências chaves do estudo, as quais, estão incluídas neste breve relato, que se segue.

GEOMORFOLOGIA

Na depressão: Superfícies aplainadas com desnudação periférica realizada pela drenagem da Bacia São Franciscana, apresentando interflúvios tabulares e colinas com vertentes ravinadas.

Após Franciso Sá: Passando pela escarpa da linha de falha e entrando no Espinhaço com planaltos e áreas dissecadas da Bacia do Jequitinhonha.

Entrando no Espinhaço: Superfícies aplainadas Terciárias, apresentando cristas com vertentes ravinadas, vales encaixados e superfícies tabulares, limitados por escarpamentos, superfícies onduladas e planalto de escoamento superficial.

Em Grão Mogol: Presença de Serras, patamares e escarpas do Espinhaço (Serra do Barão), testemunhos escalonados de superfícies aplainadas tendo dobras e falhas e extensos escarpamentos, superfícies aplainadas com cristas e picos esparsos. Área de maciço antigo.

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Texto: Professora Maria Aparecida Costa e Professora Marina de Fátima Brandão Carneiro.
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PERFIL GEOMORFOLÓGICO
ROTEIRO MONTES CLAROS – GRÃO MOGOL


Adaptação: Professora Marina de Fátima Brandão Carneiro - 1991

Um pouco de história: O povoado “Serra de Santo Antônio do Itacambiruçu” teve sua origem durante o período colonial, no ano de 1839, com a descoberta de diamantes, que atraíram aventureiros do país, bem como estrangeiros, dentre estes, Portugueses, Franceses e Alemães, também viviam índios, selvagens da região norte e nordeste de Minas, que segundo Nelson de Sena, o bandeirante Fernão Dias, foi intitulado “O Conquistador do Reino dos Mapaxós”. A exploração e o comércio cresceram. No ano de 1840, o arraial passou a ser Vila Provincial e logo transformada em Distrito. Somente em 1859, Grão Mogol recebeu a categoria de cidade e tornou-se, por décadas, a cidade mais importante da região.


Igreja de Santo Antônio

A decadência da exploração das lavras em Grão Mogol coincide com o desmembramento de terras do município para a instalação dos municípios de Itacambira, Cristália e Botumirim, onde, também, já se exploravam riquezas minerais.

A geografia: O município de Grão Mogol tem 3.888,59 km ² de área, dista 141 km de Montes Claros e 560 km de Belo Horizonte. São limites de Grão Mogol os municípios de: Francisco Sá, Capitão Enéas, Riacho dos Machados, Padre Carvalho, Josenópolis, Cristália e Botumirim. Regionalmente, o município de Grão Mogol faz parte da Microrregião de Grão Mogol e da Mesorregião localizada ao norte de Minas Gerais, conforme o IBGE. Sua população em 2016, em estimativa, era de 15.870 habitantes. Ainda hoje, seus moradores cativam a todos com seu modo simples e acolhedor.

O clima tropical se caracteriza por baixas temperaturas no inverno com médias de 18 º centigrados, e freqüentes nevoeiros, sendo agradável e com chuvas de verão.

No município ocorre variedade mineralógica, sendo de maior valor econômico: diamante, ouro e minério de ferro, por estar situado na unidade Estrutural “ Serra do Espinhaço/ Planalto Proterozóico” onde predominam quartzitos, filitos, calcários e xistos, com idade aproximada de 1.3 bilhões de anos. Ali, também, estão granitos, gnaisses e migmatitos, com idade de até 3,2 bilhões de anos, formando o substrato (Arqueozóico). Há ocorrência de relevo com serras e morros, muitas vezes representando blocos de formas bizarras, conforme “Guerra-2001”.

As maiores altitudes do município de Grão Mogol são superiores a 850 metros, correspondendo às cristas quartzíticas do Espinhaço, formadas por dobramentos e falhamentos do pré-cambriano, apresentando rochas do super grupo espinhaço. O sítio urbano de Grão Mogol está sobre um platô de 829 metros de altitude.


ROTEIRO MONTES CLAROS - GRÃO MOGOL


Escala :1:1.000.000 - Adaptado por: MARIA APARECIDA COSTA- 1991

O relevo é ondulado, forte ondulado e montanhoso, coberto por vegetação de caatinga hiperxerófila, campo cerrado, formação rupestre e de transição para a caatinga, sobre um solo podzólico vermelho - amarelo de textura argilosa média, eutrófico e ainda, solos litólicos álicos (Arenosos). São denominações locais da Serra Geral: Bocaína, Barão, Ventania e Morro do Pagão. O Parque Estadual de Grão Mogol tem sua maior extensão na serra Bocaína. Destaca no município o rio Itacambiruçu e o Ribeirão do Inferno, este atravessa o núcleo urbano possuindo águas escuras.

Na economia existe agricultura de subsistência, a agroindústria de cachaça e farinha de mandioca, pecuária extensiva, mineração de cristal, diamante, pedras ornamentais, reflorestamento de eucalipto, artesanato e o turismo com o carnaval, festa do Divino Espírito Santo, Juninas e o Presépio Mãos de Deus. O minério de ferro e o ouro, também, a serem explorados em escala comercial estão inclusos no projeto da Sul Americana de Metais e a Mineração Minas Bahia, apresentando um potencial de exploração de 25 milhões de toneladas, a cada ano.

Em parceria com a Unimontes vem se realizando a cada ano o Festival de Inverno. O Município se estrutura para desenvolver o turismo, já possuindo a Casa do Artesão, a Casa da Cultura e Secretaria de Turismo. E as rodovias, MG-307 asfaltada, que se interliga a BR-251, ambas necessitando de manutenção. Estimula o turismo a recente definição pelo IPHEA/2016, Grão Mogol Patrimônio Cultural, o Presépio Mãos de Deus e o Parque Estadual de Grão Mogol.

Em consulta ao material da Microrregião Grão Mogol, divulgado pela Unimontes/2012, numa produção cientifica de professores e equipe de estudos e pesquisa, repasso algumas informações que considero vitais e que enriquecem este texto. As atividades econômicas em Grão Mogol estão assim distribuídas: Comércio (41,61%),Serviços (31,49%),Agricultura (17,30%),Indústria (8,14%), Construção (1,46%). A administração Pública é a responsável pelas grandes empresas, entre 500 a 999 empregados. Os trabalhadores têm faixa etária entre 25 a 49 anos, predominando de 30 a 39 anos. O salário varia entre meio a três salários mínimos. Sobre a população, a Expectativa de Vida é de 72 anos. A renda per capta e a Mortalidade Infantil da microrregião são respectivamente, R$ 253,56 (duzentos e cinqüenta e três reais e cinqüenta e seis centavos) e 19,73 por mil habitantes. A escolaridade é baixa: sem ensino médio 65% da população e apenas 28% com ensino médio completo, o que levou a ser instalada uma escola técnica através do Programa Brasil Profissionalizante que tem retomada de construção em 2017.

O maior número de analfabetos tem idade entre 50 a 64 anos e conferem às s mulheres com curso superior completo a maior porcentagem 64%. O índice de envelhecimento da população é de 24,30 por mil, o que define a necessidade de políticas públicas voltadas à natalidade, o seu controle, e também, voltadas à terceira idade. Em setembro de 2013, retornei-me a Grão Mogol para conhecer o presépio Mãos de Deus quando fiquei surpresa com o que vi: “O maior presépio natural do mundo, num trabalho precioso, envolvendo a natureza e a sensibilidade do filho da terra, Lúcio Bemquerer. O planejamento, a persistência e a tecnologia, produziram este presépio digno de ser visitado”. Conheça Grão Mogol, a visita nos permite voltar às origens de Minas Gerais.

Curiosidades: O Barão de Grão Mogol, Gualter Martins Pereira, Coronel da Guarda Nacional, foi homenageado por Dom Pedro II, recebendo este título. Viveu entre o Império e a República, e influenciou na história do Brasil, como participante do 7º Batalhão de Voluntários da Pátria (1865), para lutar na Guerra do Paraguai. Foi explorador de diamantes e dono de escravos, construiu um casarão no centro histórico e faleceu em São Paulo, em 1890, com 64 anos. Nasceu em 1826 na Fazenda Santo Antônio/Cafezal. O Barão foi importante vulto do sertão mineiro, chefe do partido Liberal, Presidente da Câmara (1861) e Vereador várias vezes. Tinha idéias abolicionistas, libertou todos os seus escravos muito antes da lei Áurea, homem honesto, dividiu sua parte da fortuna e reconheceu 15 filhos que teve com escravas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Guerra, A.T e Guerra, AJT - Dicionário Geológico- Geomorfológico- Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2001.

COMIG- Mapa geológico de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2003.

BELEM, R.A- Conceitos Básicos da Geologia e Geomorfologia do Norte de Minas, Revista Cerrados/Unimontes.

Revista Cerrados, vol 10, nº 1, Departamento de Geociências/Unimontes,
2012.

Getúlio Barbosa, Estudos de Morfoestrutura de Minas Gerais, 1965.

SUDENE- Levantamento Exploratório de Minas Gerais. Versiane Sindeuax, Roney- Microrregião de Grão Mogol, Observatório do Trabalho no Norte de Minas – Grupo de Estudos e Pesquisa em Administração/Unimontes – Boletim 2012.
Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, 2016.
Revistas, panfletos, jornais diversos e pesquisa Google Acadêmico.


Presépio Mãos de Deus


Vegetação Típica do Espinhaço/Grão Mogol.


Todas as fotos cedidas pelo jornalista: Alberto Sena Batista



Maria Clara Lage Vieira
Cadeira N. 100
Patrono: Wan-dick Dumont

DONA NENZINHA

É gratificante conhecer mulheres extraordinárias, que marcaram a história de Bocaiuva. Pesquisar sobre a sua vida e o seu trabalho é uma aventura fantástica.

Otília Caldeira Pimenta é uma dessas representantes femininas que adornaram a vida da cidade.

Mulher simples, mas decidida e enérgica, mostrou-nos que o coração alegre e temente a Deus realiza maravilhas no ambiente em que vive.

Otília nasceu aos 22 de fevereiro de 1911, na Fazenda dos Poções, município de Bocaiuva, filha de Manoel Ferreira Pimenta (fazendeiro) e de Regina Caldeira Pimenta. Sob o número 131, ficou registrado o seu batistério, que informa o local e a data do batismo: Fazenda dos Poções, aos 21 de março de 1911, assinado pelo Pro-Pároco, Cônego Maurício Gaspar.

Viveu sua infância na fazenda de seu pai e, desde cedo, mostrou-se interessada em conhecer o mundo e seus mistérios. E aí adquiriu o hábito de dar graças a Deus por tudo e, mais tarde, tentaria passar para seus filhos e netos essa aprendizagem.


Dona Nenzinha

Casou-se com Gilberto Caldeira Brant, aos 14 de fevereiro de 1928, muito jovem, pois ainda não tinha completado 17 anos. Seu pai se encontrava doente e esta foi a maneira que ela encontrou para poupá-lo, fazendo-o se sentir seguro junto dela. A tenra idade não a impediu de assumir as responsabilidades do matrimônio.

Sendo seu marido cidadão bocaiuvense, dedicado ao desenvolvimento cultural e econômico de sua terra, tornou-se político forte, tendo sempre, no sucesso e nas intempéries, o apoio da esposa

O casal teve onze filhos, a saber:

1 - Maria Virgínia de Jesus Caldeira (falecida), casada com Bento Caldeira Alkmim (falecido);

2 - Zélia Pimenta Caldeira (falecida), casada com José Geraldo Bandeira de Melo (falecido);

3 - Paulo Caldeira Brant, casado com Nerilda Brito Silva Caldeira Brant;

4 - Mary do Rosário Caldeira, casada com Marcos Caldeira Brant (falecido);

5 - Elza Caldeira Brant, casada com Mauro Araújo (falecido);

6 - Célia Caldeira Brant, casada com José Epifânio Costa;

7 - Regina Cléria Caldeira Brant (falecida), casada com Mozart Pereira Monteiro (falecido);

8 - Maria Lúcia Caldeira Brant, casada com Marcílio Abreu (falecido

9 - Carlos Caldeira Brant (falecido), casado com Elizabeth Geralda Araújo Caldeira Brant;

10 - Márcio Caldeira Brant (falecido), casado com Eliane Lage Cotta;

11 - Mário Caldeira Brant, casado com Maria Aparecida da Silveira Brant.

Onze filhos criados com muito carinho, mas também com energia.

D. Nenzinha, como ela era chamada afetuosamente – talvez porque seu marido fosse tratado como “Seu Nem” – fez de seu lar a primeira escola para seus filhos. Ensinava-lhes os bons princípios que devem nortear o comportamento das pessoas de bem e ensinava-lhes também os primeiros conhecimentos e noções de história, geografia, ciências. À noite, quando as crianças eram pequenas, gostava de reuni-las para contar histórias, o que sempre agradou a elas. Iam para a praça, brincavam um pouco ali e, quando o sono chegava, corriam para casa, ansiosas por ouvir as histórias que a mãe contava.

Tendo herdado de seus pais a mansidão e a bondade, ela refletiu esses dons em seu lar com o esposo e os filhos.

Cultivou, entre os seus, um amor incondicional, que mantinha a união com o marido e irradiava, não só dentro da família, mas também entre todos que se aproximassem dela e gozassem de seu convívio sempre disponível. Ajudava a todos que necessitassem de um apoio.

Mantinha em sua casa a mesa farta, as portas abertas. O ambiente acolhedor para quem chegasse. Na sua simplicidade, conservava um coração forte, que não se abatia por causa das tristezas, que sabia perdoar, que tinha compaixão pelas pessoas.

Quantas vezes a comunidade assistiu a seus gestos corajosos com que tentava sanar o mal, o sofrimento por que alguém estivesse passando!

D. Nenzinha foi uma grande mulher que se manteve ao lado do marido o tempo todo e lhe deu forças para superar os contratempos.

Mansa e bondosa, destemida, valente, sempre apoiou o trabalho do esposo e nunca perdeu a ternura.

O casal enfrentou várias dificuldades, inclusive tendo que se mudar para Belo Horizonte, num período em que a vida em Bocaiuva tinha se tornado insustentável para os dois. Entretanto, ela nunca deixou que os problemas anuviassem a infância de seus filhos ou interferissem nas amizades deles.

As pessoas que conviveram com ela lembram-se de que ela era bonita por fora e por dentro. Guardavam na memória sua beleza interior, sua serenidade, bondade e simplicidade de pessoa do campo que traz nos gestos e nas palavras a sabedoria e o amor pela natureza. Testemunharam a sua capacidade de sacrificar-se para proteger seus filhos, netos, familiares, amigos e outras pessoas que necessitassem de apoio e proteção.

Seus filhos nunca presenciaram nela algum gesto ou atitude que demonstrasse aflição, angústia, tensão ou desespero. Eles percebiam o quanto de controle e disciplina era necessário para conservar a calma, a mansidão, a serenidade, que eram características marcantes dela;

Nos momentos difíceis de sua vida, como quando os meninos adoeciam, ela dizia, com aquela sabedoria que lhe era peculiar: ”Mãe tem que por o coração à larga e se entregar nas mãos de Deus.”

E foi esta fé e esta entrega que a sustentaram e a mantiveram serena e preparada, durante toda a sua vida. Ela sempre agradecia a Deus por tudo. Quando alguém reclamava de uma mágoa, uma dor, um sofrimento, ela sugeria que a pessoa olhasse ao redor de si para ver que outros seres humanos também sofriam e, muitas vezes, problemas maiores. Então, ensinava-lhe que nós sempre temos motivo para agradecer. As pessoas de seu relacionamento ficavam sempre agradecidas porque as suas palavras ajudavam a cultivar a gratidão, a alegria e o entusiasmo diante de tudo o que a vida nos apresenta.

Em casa, D. Nenzinha sempre ajudou nas despesas da família. Fazia doces, empadinhas, pastéis, mingau de milho verde, que eram vendidos no bar.

Faleceu aos 28 de dezembro de 1984.

Essa foi Otília Caldeira Pimenta que, depois de casada, passou a assinar Otília Caldeira Brant.

Mas, para nós, que tivemos a alegria de conhecê-la, para os amigos, para as pessoas que ela sempre acolheu e ajudou, essa mulher maravilhosa e autêntica foi D. Nenzinha, que viveu fazendo o bem e que coloriu a história de Bocaiuva com as cores da bondade, da paciência, da alegria, do amor.


A primeira casa em que morou Dona Nenzinha, onde é hoje o Banco do Brasil


Nenzinha com os pais e dois irmãos


Infância



Maria Lúcia Becattini Miranda
Cadeira N. 30
Patrona: Dona Tiburtina

DR. DÁRIO RUBENS BECATTINI

Dr. Dário Rubens Becattini nasceu em Curvelo - Minas Gerais, no dia quatro de fevereiro de 1909. Filho de Lourenço Becattini e de dona Tereza Becattini, formou-se em Medicina em 1935 pela Faculdade de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. No dia 08 de Dezembro de 1985 completou o seu cinquentenário de formatura e foi agraciado pela Associação Médica de Minas Gerais com o diploma de “Honra ao Mérito”. Em sessão solene ele foi também homenageado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais pelos muitos serviços prestados na área da medicina em favor do povo mais necessitado. Toda a sua profícua vida foi dedicada à profissão que escolheu. Casou-se com dona Clotilde Becattini e tem seis filhos, dez netos e oito bisnetos. Sempre devotou ao povo de sua terra, com o maior carinho, os seus cuidados médicos e seus conselhos de amigo. Na política atuou durante vinte anos seguidos como vereador e por diversas vezes foi presidente da Câmara Municipal de Curvelo. Trabalhou no hospital Santo Antônio, durante trinta e seis anos servindo com muita dedicação aos indigentes. Trabalhou também na

fábrica de tecidos Maria Amália e Cedro Cachoeira, em Inimutaba. Ótimo cirurgião, ele exerceu clínica geral com entusiasmo e alegria, as suas marcas características. Transferiu-se para Belo Horizonte no ano de 1971, onde trabalhou na primeira junta de recursos do INAMPS, hoje INSS. Sua vida de perfeita dedicação à Medicina e o amor ao próximo é exemplo para todos aqueles que o conheceram, tanto na profundidade do seu caráter como na bondade do seu coração eternamente jovem. (Texto de Adriano).

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NOTA. Parabéns Adriano pela bela e justa homenagem ao meu saudoso pai, Dr. Dário
Rubens Becattini- Lúcia Becattini
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Marilene Veloso Tófolo
Cadeira N. 95
Patrono: Terezinha Vasquez

O BOIADEIRO

Com a leitura deste texto de autor desconhecido resolvi escrever sobre o mesmo.

“Você me conhece? Eu já fui boiadeiro...

Conheço estas trilhas, quilômetros, milhas, que vê e que vão pelo alto sertão, que agora se chama não mais de sertão, mas de terra vendida, civilização.
Ventos que arrombam janelas e arrancam e arrancam porteiras, esporas de prata, riscando as fronteiras...
Um abraço apertado e um suspiro dobrado não têm mais sertão...
Tem mais não, ô peão...
Tempos e vidas cumpridas, pó, poeira, estradas, estórias contidas, mas encruzilhadas, em noites perdidas, no meio do mundo...
... Existe uma vida, uma vida vivida, sentida e sofrida...”

Este texto de autor desconhecido trouxe-me a figura do boiadeiro...

Quem é ele? È aquele que acorda cedo, respira o ar do sertão, desce e sobe montanhas, não tem medo da chuva, do sol e da estiagem. É um homem acostumado as lides do campo...

O boiadeiro, no seu cavalo arisco, toca-o com a espora, corre atrás da rês extraviada... Ela, esperta, corre, corre e esconde junto à gruta, onde o rio corre devagar, e sobre serras e colinas, e esconde-se no grotão...

O boiadeiro faz um aboio, sente-se cansado, olha a colina, e confia no senhor, que há de encontrar a fujona...

Onde estará a novilha perdida? O patrão espera por ela, e os dias vão passando...

O boiadeiro olha pra o céu, acelera o passo do cavalo, com sua espora que canta, com o vento que passa, com a tarde que chega, e as aves que cantam...

Que tristeza no horizonte, com o canto dos pássaros do entardecer. O boiadeiro faz uma prece ao criador e espera encontrar a rês perdida.

Ele olha pra o lado, procura-a por todo o vale, e nada dela aparecer.

Pássaros param de cantar, o sol se põe, o boiadeiro está quase desistindo, mas faz uma ultima tentativa de encontrar a rês desgarrada...

Olha o horizonte, reza, espera o cavalo e na última tentativa o boiadeiro, é antes de tudo, “um forte”, sorri feliz, pois a sua rês desgarrada bebe tranquilamente no rio que desce da serra, e o boiadeiro com seu laço pega a foragida que tanto trabalho lhe deu...

Mais uma vitória para aquele na sua lida, que conseguiu cumprir a sua missão com sucesso.



Marilene Veloso Tófolo
Cadeira N. 95
Patrono: Terezinha Vasquez

O FOOTING DA RUA QUINZE

Montes Claros, cidade norte mineira, na década de 60 (sessenta), era uma idade como todas as outras, perdidas no sertão...

Situada entre Bocaiúva e Francisco Sá, cidades também que viviam pacatas no interior mineiro... As viagens que eram feitas nesta época eram para Belo Horizonte, capital mineira e raramente para o Rio de Janeiro.

Esta divagação sobre as citadas cidades é para situar os acontecimentos a que me refiro, sobre a vida dos que viviam nestas regiões.

Nas cidades do interior mineiro, as pessoas de cidades vizinhas, vinham fazer compras em Montes Claros, e faziam parte da vida comercial e social da mesma.

Nos fins de semana, a cidade recebia pessoas de toda a região, que participavam da vida comercial e social da referida cidade.

Durante o dia, o comércio girava ao redor da rua quinze, onde a boneca de Leonel, uma grande boneca de roupa de “chita” colorida, circulava pelas ruas, fazendo propagandas, com um homem movimentando a mesma, e circulando pelas ruas centrais.

Mas ao que me refiro é o movimento à noite, onde a “Rua Quinze”, estava cheia de moças e rapazes, que iniciavam os seus primeiros namoros. Os rapazes ficavam conversando nas esquinas, as moças desfilavam com as amigas pelas calçadas, onde algumas músicas eram tocadas, e iam para o cinema São Luiz, que situava-se no quarteirão do povo.

Os passeios não eram só de alegria, porque alguns rapazes, que as moças pretendiam estavam conversando com outras donzelas. Ai era só tristeza, e procuravam outros rapazes para enamorarem...

Com um passeio pela rua quinze, sabia-se de tudo, quem estava só, quem estava acompanhado, e as últimas fofocas e acontecimentos locais. Era o termômetro da cidade, social, político e amoroso... O tempo passava breve, porque a hora de chegar em casa não podia passar das 9 horas, e saíamos correndo quando o relógio do marcado marcava as horas.

Saudades do barulho da rua, do pouco movimento de carros, dos amigos, das amigas, daqueles que não estão mais entre nós, que se foram com o vento, com a brisa, com o sol, morar em outras paragens, em um lugar seguro perto de Deus, longe das tristezas e dissabores deste mundo.

O sol nasce todos os dias, se põe e traz consigo o hoje, mas o ontem dorme escondido no interior de cada um, e ao levantarmos o véu das lembranças, a vida passa depressa, a saudade não morre, e eu consigo retratar como numa tela pintadas, a alegria, a tristeza, a pureza, a esperança de uma rua que se foi com o vento....


Ontem: Rua XV - Hoje: Rua Presidente Vargas

RUA QUINZE

Marilene Veloso Tófolo

Numa rua de Montes Claros,
a cidade do interior mineiro,
recebia pessoas e forasteiros,
no seu comércio rotineiro!

As pessoas andavam devagar,
conversando e trocando cumprimentos,
subiam e desciam, fazendo negócios,
ora parados nas calçadas!...

O tempo passou, a rua mudou,
levando saudades e acontecimentos,
de uma cidade que transformou-se
em princesa do Norte!...

Negócios, passeios, acontecimentos,
eram narrados nas esquinas,
em dias e noites que se foram,
tocados pelo tempo!...

Tempo de alegrias, saudade e tristezas,
levados por ele que não perdoa,
que passa célere como o vento,
nas esquinas do tempo!

Olho o calendário e penso,
como tempo passou depressa,
levando com a vida,
as pessoas, amores no vento!...

Foi como um vendaval,
que levou todas as arvores e flores,
deixando o seu rastro sinistro
na poeira do tempo!...

Nada restou do ontem,
de saudades, alegrias e esperanças,
de algo que ficou nas estradas
junto com a poeira do tempo
22 de julho de 2017.


Narciso Gonçalves Dias
Cadeira N. 9
Patrono: Antônio Lafetá Rebello

O GADO DE FULGÊNCIO

Fulgêncio morava na Lagoinha, nos arredores do Rebentão, povoado monte-azulense, terra de extremo potencial produtivo, de pouca chuva, é verdade, mas mesmo assim, um terreno que o tempo o fez aprender a se virar com a pouca água. Racionando-a para dar substância às plantas que ali teimam em fixar suas raízes. Fulgêncio era o típico caboclo que iniciava seu labor com o aparecimento do sol e concluía com os últimos raios da luz natural. O tempo retirado à força para por no bucho um pouco de alimento para sustentar-se, é tempo considerado perdido, é tempo que bem podia ser utilizado para consertar as cercas, roçar a pastagem, fazer aceiros, buscar água na cacimba e tantas outras atividades essenciais nas múltiplas atividades diárias do sítio. Mas o que que se há de fazer? A natureza faz-se superiora e exige que parte do seu precioso tempo seja gasto com o comer, o beber e as necessidades fisiológicas. Êita tempo perdido Sô! Fulgêncio, temeroso e muito religioso não ousava contradizer nada. Mas sempre matutava consigo mesmo: Prá que que pobre quer fiofó? Só serve para atrapalhar. Se não cagasse a comida podia durar muito mais tempo dentro do estômago. Que bela economia.

No início de agosto, Fulgêncio reuniu sua boiada, composta de dez vacas, um reprodutor, seis bezerros e duas bezerras, todos curraleiros, ditos pé-duros, gado rústico, fruto de gerações e gerações de consanguinidade. Filho cruzava com mãe, neta com avô... O gado definhava em termos de qualidade, mas ganhava resistência... As vacas do Sítio São Fulgêncio, pariam e cuidavam das crias sozinhas, no mato, no ermo, na solidão das noites. Eainda se protegiam a si e as crias, contra os predadores da natureza.

Fulgêncio se babava todo, maravilhado com a natureza, de uma perfeição sem tamanho. Tudo era feito de maneira a se resolver sozinho... Ele só precisa dar uma mãozinha, para tudo se ajeitar e sair nos conformes.

No pequeno curral, a minúscula boiada estremecia o chão, as varas do curral pareciam pestes a desabar com o tremor sem fim, o gado tremia de medo, de impaciência. O clima era tenso e desesperador...
O grupo de animais se espremia e girava em num único sentido, como se adivinhassem que Fulgêncio, naquele instante, ia vender os seis bezerros e duas vacas, que resumiria o rebanho em onze cabeças, número que comportava o pequeno terreno que lhe fora destinado na partilha feita com a morte do seu pai. O gado inquietava e aguardava o desfecho daquela inesperada reunião.

O sitiante após prender o rebanho, sentou-se no vão da cerca, perto do curral e fazendo um pito, picava o fumo nas mãos ressecadas, trincadas e sujas... Resultado de uma vida de penúria e sofrimentos, mas repleta de orgulho por ser um homem livre.

A espera terminou com a chegada de Ontonho de Orora, comprador de gado que já chegou ao curral, cumprimentou Fulgêncio com um abaixar de rosto, disse algo parecido com bom dia e já se dirigiu ao curral para vistoriar e avaliar o gado. Fulgêncio já conhecia de cor e salteados todos aqueles grunhidos e movimentos destinados a fazer o sucesso da transação comercial que se iniciava. Todos os anos o espetáculo se repetia. Ontonho era uma raposa esperta e estava no ramo de compra de gado há coisa de trinta anos.

Ontonho de Orora, após minucioso reparo, sem levantar os olhos, pigarreia, tosse seco oferece a quantia de dois mil reais pelos oito animais. Fulgêncio da mesma forma, de olhar perdido no horizonte diz que está fechado o negócio... Prá que iniciar uma luta com Ontonho... Aquilo era uma autoridade no ramo do gado... Ele é quem sabe o quanto vale o fruto do trabalho do povo... E se ele falou...tá falado!

Ontonho enfiou a mão no bolso, sacou um camaço de notas de cem reais e se dirigiu a Fulgêncio para efetuar o pagamento. No ato de estender a mão para o criador de gado, numa fração de segundos, o gado ao ver o dinheiro, avançou na mão do pobre Ontonho e numa agilidade sem par, comeu as vinte cédulas que estavam na mão do comprador de gado... Ontonho não acreditava... Atônito e abestalhado, olhava para os animais que engoliam as cédulas como um prato exótico e obviamente caro... As lágrimas caiam e em prantos o infeliz Ontonho diz para Fulgêncio:

- Fulgêncio, amanhã cedo eu volto para buscar o dinheiro que vai sair na bosta do boi e concluir a compra!

O dono do Sítio São Fulgêncio, responde calmamente: Amanhã não digo, esse gado é de pouco cagar, pois a comida aqui é muito pouca. Mesmo assim, sabendo ter perdido uma fortuna, Ontonho sempre que encontrava Fulgêncio, no mercado municipal de Monte Azul, perguntava:

- O gado já cagou o dinheiro?

Recebendo como resposta um sorriso safado de quem pelo menos uma vez na vida teve o prazer de ver um rico ser punido. E nunca mais Fulgêncio questionou o motivo da existência do fiofó. Pelo menos o do gado.



Palmyra Santos Oliveira
Cadeira N. 64
Patrono: José Gomes de Oliveira

A RUA CAMILO PRATES
DO MEU TEMPO DE MENINA

A Rua Camilo Prates é formada somente de quatro quarteirões. Ela começa na Praça Coronel Ribeiro e termina na Praça Dr. Carlos Versiani. A casa de Dona Mariquinha Serradeira foi a primeira construção depois substituída pelo escritório do Dr. Antônio Eustáquio Tolentino, advogado e que foi prefeito da cidade de Porteirinha. Nessa casa morou a dona Caçula Mendes (Idalgisa Mendes), que era mãe do Sr. Alcides Mendes e também foi prefeito de nossa Porteirinha. Hoje é uma Drogaria que ocupa esse lugar. Um pouco abaixo – arruando ao norte - do mesmo lado morava o Sargento, pai de Da Luz e de José Maria, uma criança que um dia quando eu estava varrendo na frente da casa da minha mãe, ele ao ver “Sapudo”, um mudo doido que perambulava pelas ruas de Montes Claros, disse que “Sapudo” ia me pegar. Eu devia ter uns seis anos e ao virar-me depressa para entrar em casa, a vassoura que tinha um prego no cabo bateu na cabeça de Zé Maria. Ele quando viu o sangue começou a chorar e foi para sua casa. A sua mãe veio dar queixa lá em casa. Mas, a minha mãe vendo que eu estava amarela de medo, disse que não ia me bater.

Andando um pouco mais abaixo ficava o quartel da Polícia Militar e logo em seguida o prédio da Cadeia, pintado de amarelo e muito bonito. Todos os dias eu ia lá com a minha amiga Efigênia Câmara, para visitar os presos. Os aprisionados sempre nos presenteavam com macaquinhos, cadeirinhas e mesinhas de madeira e outras quinquilharias mais que eles fabricavam na prisão.

Em frente do prédio da Cadeia ficava um cartório anexo com a casa do Dr. João Luiz de Almeida e sua esposa dona Iolanda, cuja filha pequena, subiu na cama do casal, pegou um revólver em cima do guarda-roupa e suicidou-se.

Mais adiante era a casa da minha colega Veninha Veloso e do seu irmão Raimundo Nonato Veloso (Nonatinho), onde eu comprava cajás. Em frente, em posição subsequente era a casa de dona Mariquinha Padeira, avó de Denizar, onde eu comprava as mais deliciosas bolachas crocantes. Adiante ficava a casa de dona Maria que com o jovem Hermano (Padre Dudu) rezaram pedindo a Deus proteção para “seu” Juca de Chichico ganhar na loteria. Pois ele ganhou duzentos contos de réis e estabeleceu a sua farmácia.

Na esquina a seguir ficava a pensão de dona Geracina, irmã de Dr. Santos. Na outra esquina, a casa de dona Taúde, a nossa professora de Desenho e de Trabalhos Manuais, que morava com seus pais. Quase na frente à casa de dona Taúde morava a família de minha amiga Haidée irmã de Dely, Milton e Dásio. Ao lado morava a mãe de Rita Souza, também minha inesquecível amiga. Abaixo era a casa de Dra. Lourdes Pimenta, professora da Escola Normal e de sua irmã Esterzinha, minha amiga que se mudou para a Rua Thompson Flores, em Belo Horizonte. Um pouco abaixo morava um deputado com a sua família.

Na esquina morava o Sr. Antônio Augusto Teixeira comprador de gado (Niquinho Teixeira ou Niquinho de Rapadura) pai dos meus amigos Walquíria, Mércio e Márcio. O Mércio possuía uma fazenda na Jaíba, o Márcio morreu de acidente aéreo. Na outra esquina ficava a residência de dona Leila Veloso Pacudino. Em frente foi erigido o prédio da farmácia do Dr. Plínio Ribeiro, o nosso ilustre professor de Ciências Naturais, ali reuniam as pessoas para a conversa noturna de todos os dias. Em frente ficava também a farmácia do Dr. Mário Veloso, ele que era marido de dona Nieta que também foi a nossa professora de Desenho na Escola Normal.

No final da Rua Camilo Prates esquina com a Praça Dr. Carlos Versiani ficava a loja do Dr. Herculano Trindade, tio de estimada minha colega Lia Trindade. Era assim a Rua Camilo Prates do meu tempo de menina. Quantas saudades!



Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza

MEU PROFESSOR
JOAQUIM ROLLA

Minha primeira lembrança é do dia em que meu pai me conduziu para a sua escola, na rua de baixo. Foi no início de 1942, acredito no mês de janeiro. O mestre Joaquim Rolla vestia uma bata de professor de cor clara, não sei mais se branca ou em tons cinza. Um homem alto, magro, rápido nos passos, olhar firme e penetrante o tempo todo, com uma régua de madeira, pronta para descer no lombo de quem não estudasse direito ou não desse as respostas certas nos algarismos ou na pronúncia das palavras. No bolso, um lenço grande para secar o cuspe e limpar as lousas que todos nós tínhamos desde o primeiro dia de aula.

As lousas, também chamadas de pedras, eram de ardósia, com moldura de tábuas, utilizadas dos dois lados com lápis do mesmo material. Serviam para escrita de pequenos textos e principalmente para as contas, somas, subtrações, multiplicação e divisão. Os exercícios eram tantos, que nenhum pai podia comprar todos os cadernos necessários, naquele tempo muitos caros. Com seis meses de aprendizagem, eu multiplicava e dividia por doze números, coisa difícil de fazer hoje até com as maquininhas eletrônicas. As somas chegavam a trinta parcelas, conferidas pelo menos duas vezes para evitar o impacto da régua e da palmatória. Só não apanhávamos, se tudo estivesse certo para merecer nota dez. Um nove dava puxão de orelha e coques na cabeça.

Eli, filho de João de Bita e de Dona Anísia, era o mais velho da turma. Cristóvão, seu irmão, sentava comigo na mesma carteira e usava o mesmo tinteiro. Um grande colega, mas que me atrapalhou, porque eu colava dele, mesmo não precisando. Durante os meses que estivemos juntos, eu estudei menos do que precisava. Uma pena, pois depois dele, nunca mais deixei de ser o primeiro aluno de qualquer classe, porque estudar muito e caprichar eu sempre soube.

Vou introduzir aqui um texto que escrevi em 1978, quando lancei em São João o meu primeiro livro, Tempos de Montes Claros, e narrei uma visita que fiz a Cristovina. Ei-lo: “Foi num mês de fevereiro, trinta e dois anos depois, que voltei a rever a minha terra, São João do Paraíso. Foi bem naquele fevereiro brabo de tantas enchentes, estradas intransitáveis, com um mundão de dificuldades para chegar lá, partindo de Taiobeiras. Foi depois de longa viagem por Valença e Nazaré, por Itaparica e Salvador, andanças de muito laudar pelo céu e pelo mar. Em São João, entramos num dia de intensa luz, depois das chuvas. E comigo estavam Olímpia, Rízzia e Gracielle, ao mesmo tempo que bons amigos como Joaquim da Caixa Econômica, Mário Português e meus cunhados, Anderson e Nelmy, todos para dar maior prestígio ao filho que voltava à cidade natal. Nas ruas, o Lauro, colega de curso primário, fazia a surpresa com muitas faixas de saudação, tudo muito grato, bom demais para os olhos e para a alma.

Visitas, encontros, apresentações, um rememorar de saudades, o reviver de velhas e bem guardadas lembranças, uma alegria aqui, uma decepção ali, porque nem tudo que o coração registra fica imune à ação do tempo. Jovens transformados em velhos, velhos já não na vida. A paisagem já não a mesma e, ainda que melhorada pelo progresso, diferente. Não mais a ponte dos banhos de meninos pelados e jovens lavadeiras; não mais o canavial sem fim; não mais a serra verde escura ligada às nuvens; não mais a igrejinha do alto do morro, nova em folha; a grama da praça, substituída por pavimentação e postos de gasolina; o matagal do cemitério já bairro novo. Tudo mudado. Os olhos procuram, o coração deplora toda a ausência de eternidade nas coisas e nas pessoas! Quanta falta!

À noite, o lançamento do meu livro, na Matriz, o louvor dos discursos, as explicações, os abraços, o rolar de tranquilas lágrimas de gratidão ao passado, a riqueza das lembranças boas que só a infância pôde dar, o olhar reverente de jovens professoras ao camarada mais velho, amadurecido pelas dores da vida. Olímpia me pergunta baixinho o que me passa pela cabeça, enquanto olho a velha igreja, ouço o antigo sino, sinto a paisagem pisada por pés descalços em tempo distante. O que responder? As coisas que passam pelo sentimento não podem ser analisadas, não são lógicas. As imagens são superpostas, principalmente as do meu pai, ainda novo, do meu avô Vicente, de longas barbas brancas, e da tia Raquel e de D. Adelina, gorda e clara.

Vem o segundo dia e, enquanto dia, uma viagem pelo Mato Cipó para visitar os tios Júlio e Diolina, a passagem pela Lagoa da Viada, pelo rio, pelos mangueiros, a procura de velhas estradas por onde costumava passar, indo para a casa de Maria de Silvina, o caminho da fazenda do doutor Osório. A cada lembrança, uma fotografia, a promessa intima de pintar um quadro. Na volta, à noite, depois do jantar, a palestra na Escola, uma espécie de acerto de contas, um desfiar de vivos sonhos, um voto de confiança e um incentivo às novas gerações. Mais tarde, o passeio pelas ruas, o mingau de milho na sala de jantar de D. Benzinha, o café com biscoitos a convite do padre João, madeirense culto, amigo solícito.

Foi durante um café, sentados em duros bancos, braços sobre uma mesa comprida sem toalha, daquelas feitas com madeira fornida, que resolvi fazer um comentário sobre meu primeiro professor, o velho Joaquim Rolla, mestre de régua e palmatória, de lousa e tabuada, de norma e abecê. Falei da escola, falei dos alunos, descrevi os objetos. Quando ia mostrar que me lembrava também dos móveis, Cristovina, a anfitriã, sorriu maliciosa, e com brilho no olhar me fez arrancar de dentro a mais querida das lembranças, pois aquela mesa, aqueles bancos, todo aquele ambiente era a minha primeira sala de aula. Havia eu, por acaso, me esquecido de que ela era a filha do professor?

Estava ali o maior presente ao meu coração...



Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza

PERDAS IRREPARÁVEIS

EUSTÁQUIO MACEDO

Natural de Montes Claros, participante de família numerosa, Eustáquio Macedo nasceu em 30 de janeiro de 1946. Segundo grau no Colégio Estadual Plínio Ribeiro, quando ainda era Escola Normal, foi aluno de pleno destaque. Leitor sempre interessado e pesquisador de muitos recursos, foi um brilhante aluno da FADIR -Faculdade de Direito do Norte de Minas, hoje Centro de Ciências Humanas da Unimontes – Universidade Estadual de Montes Claros.

Funcionário do Banco do Brasil, quadro de advogados, Eustáquio também se destacou em todos os setores. Logo depois de aposentado, voltou à terra natal, Montes Claros, mais precisamente à Rua Januária, onde transformou sua residência em um moderno museu, fonte e destino de arte e cultura, fruto do seu bom gosto e plenitude de capacidade inventiva. Cada desenho, cada imagem concretizada, uma verdadeiro obra de arte.

Convidado pelo presidente Itamaury Teles de Oliveira, do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, eleito por unanimidade, teve uma cerimônia de posse grandemente prestigiada, fruto de muitos amigos e admiradores. Inteligente, culto, observador em tempo integral, disciplinado nos estudos e leituras, Eustáquio Macedo foi frequentador cem por cento de todas as nossas reuniões de trabalho e solenidades.

Sua passagem para o mundo espiritual deixou-nos mergulhados em uma ausência irreparável, uma vez que acostumados ao seu brilho, não conseguimos fazer de nossa imensa saudade uma substituição aos seus méritos.

LUIZ DE PAULA FERREIRA

Nascido em 27 de junho de 1917, Luiz de Paula Ferreira é um milagre. Tudo na sua vida deu certo. Tudo: sonhos e realidade, jeito de ser e de viver. Comportamentos, atitudes, hábitos, numa receita sábia, e manhosamente aviada desde os velhos tempos de Roma: “Não basta ser, é preciso parecer”. Luiz – em todos os decênios que marcaram a idade do menino, do jovem e do adulto – foi e pareceu inteligente quase por um dever de fé e destinação. Querendo - quem sabe - até sem querer, jamais pôde fugir das luzes de uma generalizada admiração de próximos e distantes. Conservador e revolucionário, sempre teve como medida o comedimento, coisas de antigo PSD, que não fazia reunião sem antes de tudo estar resolvido. Luiz sempre soube ver e antever, vestido e revestido de inigualável poder de avaliação. Sabido, tranquilo, atualizado, sempre pronto para enfrentar o futuro.

Em seus livros – conjunto fantástico de retalhos intensamente coloridos da vida interiorana brasileira do Século XX – Luiz de Paula é narrador e personagem, iluminador e fotógrafo, ao mesmo tempo retratista e retratado em cenas que ele próprio sempre se inseriu. Dono de poder material e imaterial, produziu textos mais do que vivos - do seu e do nosso agrado – encarnando e reencarnando uma tradição oral de esperteza, que muito será discutida no futuro, quando as máquinas e os chips ocuparem com primazia a diretiva humana. Os relatos, as crônicas, a prosa poética, até os contos que ele - por segurança e sabedoria, diz de ficção - representam o que a Literatura pode ter de melhor na fixação de imagens e vivências, conteúdo importante porque só possível aos que o viveram com entusiasmo.

Um pouco mais novo que Luiz, tendo vivido pelo lado de dentro e de fora de uma casa comercial - ouvinte e visualizador atento - bem sei do quanto o relar o umbigo no balcão valeu para nós. Ali nada passava despercebido no universo das pessoas e das coisas, seja ouvindo uma sanfona de oito baixos, seja engraxando sapatos ou controlando os movimentos sinuosos dos bêbedos. Era a vida imitando a vida, para criar memórias que só a escrita pode fixar, resumindo um musicar e um cantarolar de lembranças que só um bom narrador consegue pôr no papel.

Purista corajoso do idioma, Luiz de Paula Ferreira conduz o leitor à excelência da fala brasileira, com todo o condão de quem sabe fazer mágica com a inteligência e o gosto do verdadeiro contador de causos. No que toca à missão do homem no viver e conviver, no amar e no sonhar. Experimente-o como quem sabe sugar o sumo doce de uma jabuticaba bem madurinha, o andar de bicicleta em tempo de Primavera e o ver e ouvir o sapateado de um cantador de coco.

Concluo, afirmando que seus livros são desafios, trabalho em espanto de vida, aceitação de mistério. Suas páginas foram escritas em áureo e doce dealbar de músicas e de sonhos. Tudo plural: douradas iluminuras nas capas e, no interior, lindos coloridos, tudo bem serenado em universo de ideias. Um luxo!



Wesley Soares Caldeira
Cadeira N. 91
Patrono: Sebastião Sobreira Carvalho

JOÃO RÊGO: PIONEIRO DO ESPIRITISMO EM TAIOBEIRAS

João Batista Rêgo nasceu em Lagoa Dantas, perto de Caculé, na Bahia, provavelmente em 6 de novembro de 1886 - tomada em consideração anotação sua de que estava com 88 anos, em agosto de 1975, registro incluso num texto de memórias, lançado num pequeno caderno[1]. Era um dos sete filhos do primeiro casamento de Martinho Antônio Rêgo (1851/1911), descendente de portugueses e tropeiro dinâmico.

Em 1894, João Rêgo ficou órfão de mãe, com o falecimento de Dona Olímpia Secundina de Viterbo Garcia. No mesmo ano[2], o casamento entre seu pai e Dona Jovita Secundina Rêgo (1873/1973) determinou a mudança para Taiobeiras; melhor dizendo, para o então Sítio Bom Jardim, local de parada de tropeiros e cavaleiros, do qual seu pai foi adquirindo partes da terra entre 1901 e 1910 [3]. A abundância de taioba — planta que serve para ornamentação e consumo — nomearia o futuro povoado de Bom Jardim das Taiobeiras[4] (1923) e, adiante, a cidade de Taiobeiras (1954).

João Rêgo escreveu no citado caderno de memórias: “Chegamos de muda no arraial no dia 5 de janeiro de 1895, só havia 26 casas cobertas com telhas e os ranchos de pindoba” (página 10). Na página imediata, ele relatou a dramática luta pela sobrevivência na época:

“Em 1889 apareceu a grande crise, foi tanta a fome! Passava os baianos deixando os filhinhos mortos e vivos pelas estradas. Os tropeiros com os burros magros iam até a Mata de Santa Maria, buscarem víveres, trasia farinha de milho foi uma calamidade: lembro-me que serto dia avirarão-nos [avisaram-nos] que havia uma mulher morta em um rancho de pindoba, para lá fomos, uma porca muito magra já havia comido o rosto da mulher e a filhinha estava chupando o peito da mãe, não lembro quem tomou conta da creanca. Encontrava as ossadas das pessoas morta da fome nas beiras de estradas.” (sic)

Conta-se que, aos onze anos, João Rêgo saiu a passear com um bodoque, e acertou um passarinho. De volta ao lar, disse: “Já posso me casar. Já sei caçar e, assim, consigo sustentar uma esposa”.

João se tornou, em verdade, tropeiro, como o pai, cortando terras da Bahia e Minas Gerais, até Buenópolis e Curvelo, levando e trazendo mercadorias para mascatear.

O tropeirismo foi de grande importância para a economia brasileira entre o Século XVII e início do Século XX. Extensas áreas eram atravessadas, transportando-se gado e mercadorias, gerando a abertura de estradas e a criação de vilas.

Pai e filho continuaram tropeiros, mesmo depois de se tornarem fazendeiros.

Martinho Rêgo foi também delegado de polícia, chefe político do povoado e seu primeiro vereador, em Rio Pardo, de que era distrito, no ano de 1898. “Espírito progressista, imbuído de invulgar ânimo, lutou tenazmente pela consolidação e desenvolvimento do lugarejo”, avaliou Rafael Ângelo Miranda, filho daquela terra. Em 1907, Martinho Rêgo abriu um empório, em Taiobeiras, onde se venderia de fumo a remédio.


João Rêgo

João Rêgo, igualmente, abriria uma casa comercial, para a venda de produtos sortidos, especialmente tecidos, e, na porta, manteria uma bomba de gasolina. Era ele de aparência agradável e incomum: alto, magro, moreno, de traços finos, nariz afilado e olhos verdes, lembrando aos indianos. Com 28 anos de idade, casou-se com Fidelcina Leonídia Cangussu (1901/1975), de Caculé, com quem teve sete filhos: Dedy, Nelmy, Laury, Andersy, Anderson, Janete e Olímpia. Antes de casar-se teve três filhos: João Batista (Joãozinho), Conceição e Mery, todos criados juntamente com os filhos do casal. Não frequentou escola. Foi de esforço próprio que aprendeu as letras e os números, por isso sua escrita apresenta algumas deficiências, reconhecidas por ele:

“[...] não venho a imitar escritores, sou um simples escrevedor — preciso dizer o que passa comigo, desde quando vi com os olhos a claridade da luz do sol [...]”[5]

“[...] agora que já não posso diser que desponho de uma vida longa como a que conto até hoje, oitenta e oito anos. Não deixasse escrito estas linhas — dignas da crítica literária, mas receberei de bom grado por que não aprendi rabiscar de outro modo — a crítica ficará com quem não escreveu e criticou.”[6]

Mais tarde, ele procuraria oferecer a todos os filhos esmerada educação. Ele e seu irmão Teófilo Rêgo mandaram buscar da Bahia a primeira professora de Taiobeiras[7], e outras posteriores. Aos filhos que desejaram, custeou-lhes os estudos, até na capital mineira.

Era ele que redigia as correspondências do povo de Taiobeiras, e para o seu nome eram remetidas as cartas, a fim de que as entregasse aos verdadeiros destinatários, sobretudo do campo.

Certa vez, no Rio de Janeiro, João Rêgo se encontrava numa livraria. E lá estava ninguém menos do que o dr. Rui Caetano Barbosa de Oliveira. Isso mesmo: Rui Barbosa, o eminente jurisconsulto e polímata. Ambos, coincidentemente, compravam o mesmo livro. O célebre erudito e estadista havia sido candidato à presidência da República. Um só voto lhe foi confiado no Norte de Minas. E esse voto fora de João Rêgo, na cidade de Salinas, num tempo em que Taiobeiras era seu distrito. João se apresentou a Rui, e se declarou o autor daquele único e solitário voto.

Após completar cinco décadas de existência, quando nasceu sua caçula Olímpia, João Rêgo decidiu, para seu prazer, ler apenas em francês, pois já contava com reconhecida eficiência. As lições sobre a língua de Victor Hugo ele as obteve de um pintor francês (judeu fugido para o Brasil e radicado em Taiobeiras), que contratou para pintar um quadro. Leitor e falante, seguiu como autodidata.

Desde menino, João Rego se mostrou dotado de um dom singular: ver os espíritos, as almas dos mortos. Contava ele que essa faculdade lhe trouxera muitos desconfortos, pois a comunidade, reacionária, não lhe oferecia condições para relatar suas experiências. Muitas vezes, na igreja local, ele, que, inicialmente, teve formação católica, viveu momentos de angústia, pois se espantava com a quantidade de espíritos que via, e, logo que seu pai fechava os olhos para alguma fase da missa, o menino vidente saía para fora, procurando alívio psíquico.

Ele escreveu sobre isso:

“[...] eu que sou comunicador com os meus irmãos do espaço
[...]”[8]

“As vezes eu estou a faser meus calcos, como é comum todos nós ter nossos afaseres e só estou comigo: vão entrando pessoas conhecidas e também desconhecidas, cada qual conversa o que tem para conversar, trocamos conversas etc; acontece irem saindo outrora saem de véz, ai é que eu sinto que estava rodeado de espíritos desencarnados, reunidos em palestra.”[9]

“O doido não conhece ao seu estado de loucura: penso se estas coisas que vejo, sinto, percebo, pesquiso, não as domino, são espontanhas. Sei firmemente que elas existem são reais, não são palpaveis porque são fluidicas. A carne comunica com a carne. E o espirito comunica com o espirito.”[10]

“Por que se eu passasse a escrever tudo que passa neste sentido tudo que vejo e ouço, não teria onde arrumar a papeleta. [...]. Tambem me lembro de coisas passadas comigo em outras vidas.”[11]

Quando chegou a primeira professora em Taiobeiras, ela introduziu o protestantismo na cidade, fundando a primeira igreja evangélica, em 1924, a Presbiteriana. João se tornou devotado presbiteriano, ao lado de Teófilo e Maciel Rêgo (seus irmãos), Antonyno Almeida e Olympio Ribeiro - todos, futuros espíritas. Quantas vezes, ante à pregação do culto, quando o pastor afirmava que os mortos não retornam, João Rêgo confidenciava aos íntimos a contradição: o ministro religioso negava o que seus olhos frequentemente viam.

No início dos anos de 1940, Andersy, um de seus filhos, na altura dos treze para quatorze anos, revelou o mesmo dom, a mediunidade, que irrompeu desafiadora, e nada o harmonizava.

Por esses tempos, Teófilo Rêgo (1891/1977), primeiro dentista de Taiobeiras, graduado em Juiz de Fora/MG, tinha residência em Belo Horizonte, e, junto com João Rêgo, matinha relações comerciais com Bady Curi, famoso espírita e futuro presidente da União Espírita Mineira.

Bady Elias Curi (1903/1962) imigrara do Líbano e havia iniciado
suas atividades espíritas no Brasil, em Barra de Piraí/RJ, em 1921. Depois, em Belo Horizonte, estabeleceu-se no comércio e se tornou vice-presidente da União Espírita Mineira, a partir de 1948, e presidente, em 1955. Entre 1937 e 1940, um montes-clarense “pelo coração”, Cícero Pereira, foi presidente da centenária instituição.

Levado para a capital, Andersy, o filho de João Rêgo com dificuldades no trato com sua mediunidade, foi apresentado a Bady, que propôs que o jovem fosse examinado por um médico, mas perguntou a João Rêgo se não gostaria de lhe acompanhar a um núcleo espírita para que o rapaz recebesse também assistência espiritual. Andersy restabeleceu o equilíbrio psíquico rapidamente.

Estreitados os laços de amizade com Bady Curi, João Rêgo conheceu o Espiritismo, em fonte límpida, não tardando a fazer visitas a Chico Xavier, em Pedro Leopoldo.

É possível que João conhecesse Chico anteriormente, possibilidade extraída de duas circunstâncias:

Chico Xavier passou por Taiobeiras, a caminho de Pedra Azul (a antiga Fortaleza), a fim de representar a Fazenda Modelo (órgão do Ministério da Agricultura em Pedro Leopoldo) numa exposição agropecuária da cidade das maravilhosas turmalinas azuis. Nessa ocasião, Chico foi hospedado por João Rêgo, em Taiobeiras. Num momento em que os dois conversavam, as filhas de João, pequenas, faziam algazarra por perto. O pai recomendou-lhes silêncio, e Chico conciliou o ânimo do anfitrião, lembrando-lhe: “Deixai vir a mim as criancinhas”.

De outra vez, João Rêgo esteve em Pedro Leopoldo, na Fazenda Modelo, para tratar da consignação de um cavalo campolina com seu diretor, o Dr. Rômulo Joviano, amigo e benfeitor de Chico Xavier. Um animal foi cedido e se tornou o reprodutor de um plantel que se disseminou na região de Taiobeiras, Salinas e Pedra Azul.

Esses dois fatos aconteceram antes ou depois da amizade com Bady Curi? As opiniões divergem.

O pesquisador Rafael Ângelo Miranda encontrou no livro Sementeira de paz[12]—composto de mensagens psicografadas por Chico Xavier entre 1946 e 1948, em reuniões domiciliares acontecidas na casa do Dr. Rômulo Joviano, para o culto do Evangelho no lar— duas mensagens espirituais do pai do Dr. Rômulo, o senhor Arthur Joviano, que fizeram referência a uma viagem profissional do Dr. Rômulo e de Chico Xavier ao Norte de Minas, em torno do fim de setembro de 1948. A mensagem mediúnica datada de 8 de setembro de 1948 recebeu o título “A solidão é útil à prece” (capítulo 94), e diz, a certa altura:

“Muito fruto valioso advirá de sua viagem ao norte mineiro. Em todo o trabalho digno, a palavra funciona por bendita semente de renovação. Deus abençoe os seus esforços”.

Na mensagem seguinte, “Experimentação para a vidência” (capítulo 95), psicografada em 15 de setembro de 1948, o espírito Arthur Joviano se refere novamente a uma viagem, sem deixar indicação do destino, e que pode se tratar da citada viagem ao Norte de Minas:

“Em vésperas da viagem nova a que se veem compelidos pelo imperativo da missão atual, rogo ao Senhor lhes conceda, como sempre, alegria e bom-ânimo no desempenho do dever edificante. Desnecessário dizer que estaremos juntos tanto quanto me for possível. Com o auxílio divino, espero tudo nos corra segundo a nossa expectativa de satisfazer os superiores desígnios.”

Entre as crises psíquicas de Andersy e a datação da viagem mencionada no Sementeira de paz há um intervalo de cerca de oito anos. Talvez as crises de Andersy tenham ocorrido mais tarde do que o lembrado pelos depoimentos da família. Ou, quem sabe, a viagem de Chico Xavier a Pedra Azul, hospedando-se em Taiobeiras, com João Rêgo, tenha sido anterior àquela noticiada no Sementeira de paz.

Quando João Rêgo regressou de Belo Horizonte, após a melhora surpreendente do seu filho, trouxe uma mala cheia de livros espíritas, e declarou a todos sua conversão ao Espiritismo, para escândalo de muitos taiobeirenses e a oposição ferrenha do líder religioso do lugar: frei Jucundiano de Kok[13].

As reuniões de estudos e de práticas mediúnicas ocorriam na sua própria casa, na Avenida da Liberdade. Segundo as testemunhas, eram reuniões memoráveis, de uma atmosfera única, inesquecível.

Médiuns surgiram na própria família Rêgo. A produção de curas, notadamente a libertação de pessoas da influência nociva de espíritos desequilibrados, atraia muita gente. João Rêgo tinha expressiva autoridade moral sobre os espíritos desequilibrados. Certa vez, uma mulher chegou num estado de tal desordem mental que precisou ser levada amarrada. Sem preâmbulos, João pediu que a soltassem. Feito isso, ele falou ao espírito que aturdia a pobre criatura: “Deixe-a”. E a mulher não mais reincidiu naquelas terríveis crises.

A mesma autoridade lhe amparou, em 1927, quando “A Coluna Prestes”, de Luiz Carlos Prestes, avançou pelo Norte de Minas e chegou a Taiobeiras. Quase todos fugiram; e não era para menos. Os revoltosos praticavam atrocidades e causavam terror. Muitos integrantes desse movimento foram arrebanhados das cadeias das cidades por onde a Coluna passava. Em Taiobeiras, os revoltosos também deixaram mortos. João Rêgo, porém, ficou no seu lar. Sem resistência, disponibilizou sua loja e alimentou aqueles homens. Ao final, quando Luiz Carlos Prestes se despediu, entregou a ele uma bota, com moedas mais que suficientes para cobrir as despesas. [14]

Não tardou e foi fundado o primeiro centro espírita de Taiobeiras, chamado “Joanna D’arc”. Ele funcionou na via principal da cidade, a Avenida da Liberdade, em casa que pertencia a Teófilo Rêgo.

João Rêgo não se ilhou em sua caminhada espírita. Relacionava-se com espíritas de Belo Horizonte e também de Montes Claros, sendo amigo, aqui, de Sebastião Sobreira de Carvalho (meu patrono, Cadeira 91), do professor Ezequiel Pereira e de Joel de Abreu.

Quando a “Caravana da Fraternidade”, coordenada por Leopoldo Machado, esteve em Montes Claros, no final de 1950, recolhendo assinaturas de adesão ao Pacto Áureo de 1949, que uniu os espíritas do Brasil, João Rêgo estava presente e aderiu ao Pacto.

A filha Janete, ao se casar com Heber Rêgo, passou a morar em Montes Claros, a partir de 1956. Olímpia, casada com o confrade Wanderlino Arruda, veio no ano seguinte. Laury Rêgo se estabeleceu aqui por volta de 1960. Isso, claro, intensificou a presença de João Rêgo em Montes Claros.

Após a fundação da Sociedade Espírita Allan Kardec, de Montes Claros, em 1966, João Rêgo acostumou-se a visitar essa instituição, e se faziam filas de pessoas para conversarem como ele e pedirem sua orientação. Ilustre casal da terra, que há muito esperava, em vão, por uma criança, submetendo-se a todos os tratamentos tradicionais, procurou-o um dia, e João Rêgo já foi dizendo aos dois: “Deve ser menina, pois está de vestidinho branco!”. Logo, o casal completava a felicidade do lar, e o espírito que se mostrara a João, na forma infantil e de roupinha branca, passou a enfeitar a vida dos esposos.

João Rêgo estava adiantado no tempo. Foi pai amigo e disponível para os filhos e as filhas, avô com colo e paciência para as perguntas dos netos. A neta Cynthia, por exemplo, encontrava o avô na porta da loja, em Taiobeiras, subia no seu colo, e o flechava de perguntas, que ele, paciente, ia respondendo. Era ponderado, sábio e simples. Treinado como bom tropeiro, sabia cozinhava até muito bem. E tinha uma incomum consciência ecológica, sendo extremoso protetor do meio ambiente em suas terras. Ele escreveu em suas memórias:

“V. já vio da janela da sua vivenda, ao sol entrar por tras do morro, o sabiá dar a ultima bicada no restante da goiaba madura e levantar a cabeça despedindo do crepusculo, soltar mavioso canto de notas musicais tão sonoras tais enegualaveis, que não se escuta nas outras aves com tanta suavidade?”[15]

“É muito bonito ver uma floresta o vento soprando a balançar os seus ramos e a suavidade do perfume despreendidos das flores e o aroma agreste.”[16]

Ele deixou o plano físico em 13 de maio de 1982, por volta de 95 anos de idade.

João Batista Rêgo, fundador do movimento espírita de Taiobeiras, foi mais, foi um dos pioneiros do Espiritismo no Norte de Minas.


Zoraide Guerra David
Cadeira N. 86
Patrono: Patrício Guerra

HOMENAGENS PÓSTUMAS

Em 1996 a escritora Yvonne de Oliveira Silveira, então Presidente da Academia Montesclarense de Letras, com propriedade externou seu conceito de homenagem ao tecer o posfácio do livro “PATRÍCIO GUERRA – Vida e obra” que escrevi para homenagear in memoriam meu pai, ao ensejo do primeiro centenário de seu nascimento

“O homem imortaliza-se pelas ações que o dignificam (...) Realizando grandes coisas com pequenas ações na vida cotidiana, torna-se exemplo de amor ao próximo”.

Confirmando sua expressão, estas homenagens póstumas, ou seja, expressando gratidão e louvor a pessoas amigas falecidas que merecem ser resgatadas pelos seus exemplos de vida, através destes acrósticos impregnados de saudade.

MARIA DAS MERCÊS – UM NOME SINGULAR

Confirmando sincera amizade, minha homenagem in memoriam
a Maria das Mercês da Paixão Guedes

Maria das Mercês? É profecia,
A teus pais revelada. Que riqueza!
Rainha dispensando mil favores,
Ignea cristã, modelo de beleza,
Acalanto de tantos sofredores.
Deus – o Artista que te fez,
Arte pura em ti manifestou,
Sobressaindo a arte do AMOR.
Maria das Mercês, eis que teu nome
Ensina a combater o egoísmo.
Repartes com carinho, amor e fé!
Como bem expressou o teu esposo,
És “presente de Deus”, pois que teus gestos,
São exemplos que erguem e põem de pé.

Analisando suas idéias, sentimentos e ações conclui que seu
nome é singular. Os sinônimos perfeitos confirmam Maria dos
favores; Maria da benignidade; Maria da disposição favorável para
ajudar o próximo.

RECORDANDO COM GRATIDÃO

Homenagem à memória do saudoso amigo Padre Henrique
Munáiz.


Pontevedra – Espanha. Lá ele nasceu!
Ao mundo um presente especial.
Deus o assistiu constantemente.
Realizou campanhas contra o mal.
Exemplo de fé e amor ardente.

Hoje, com saudade agradecemos
Esse belo evangelho do amor.
Núncio da paz a tantos corações,
Reconfortava com perseverança,
Iluminando com suas ações.
Querido do adulto e da criança,
Unia os fiéis num só rebanho.
Ele o Pastor aureolado de esperança!
Meditando sobre sua vida.
Uma conclusão nos advém:
Não apegar aos bens materiais,
Amar a Deus que é nossa proteção,
Imitar Cristo como ele fez,
Zelando solidário o nosso irmão.

PERFIL REAL

Com saudade e gratidão a Deus, minha homenagem in memoriam
a Jovino Pereira de Brito.

Jesus e Maria - força e luz em sua vida.
O seu lema era o amor em ação.
Vivência de paz com sua família tão querida,
Inspirando coragem ante a missão.
No lar, na Igreja ou no lazer.
O modelo de um fiel cristão.
Embora o coração esteja imerso na saudade sinto-me reconfortada
pela esperança explicitada no evangelho Lucas 6,21: “Bem-aventurados
vós que agora chorais, porque vos alegrareis!”





RADIALISTA PAULO ROBERTO
FUNDADOR DO PRIMEIRO HOSPITAL DE MONTES CLAROS

PAULO ROBERTO - O médico e radialista José Marques Gomes (o nome de batismo de Paulo Roberto) nasceu em 10 de outubro de 1903, na localidade mineira de Dom Silvério. Antes de ser radialista, dedicou-se exclusivamente à medicina, tendo morado em Montes Claros, onde fundou o primeiro hospital da cidade. Ao retornar ao Rio de Janeiro, sentiu-se atraído pelo rádio, que, aos poucos, ia se consolidando como um extraordinário meio de comunicação. Na época, o médico e o radialista trabalharam juntos. Especializou-se em obstetrícia. Na Rádio Nacional, lançou a campanha “Dêem árvores ao Brasil!” Sua voz atingiu o país através de programas da mais alta qualidade, como Bandeiras da Liberdade, Gente que brilha, Nada além de dois minutos, Honra ao mérito, Obrigado, Doutor e A lira do Xopotó. Compositor, é autor de “Vagalumeando”, música gravada por Elizete Cardoso. Paulo Roberto era um humanista e foi um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro. Talvez, por isso, em 1964, tenha sofrido perseguições políticas, sendo demitido, com tantos outros companheiros, da Rádio Nacional. Segundo Renato Murce, “Paulo Roberto foi um dos maiores radialistas desta terra. Todas as suas criações traziam a marca da inteligência, da cultura e de um profundo sentimento humano, difícil de ser igualado e muito menos ultrapassado”. Paulo Roberto morreu em fevereiro de 1973, aos 69 anos de idade. Foi, sem dúvida, um dos expoentes do rádio brasileiro. No livro A Era do Radio é dedicado um capítulo inteiro a Paulo Roberto. Vale a pena saber um pouco mais sobre este grande brasileiro! (Texto: autor desconhecido)


Paulo Roberto



 

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