NOTAS DOS
COORDENADORES DA EDIÇÃO

A ordem de publicação dos trabalhos dos associados efetivos obedeceu à sequência alfabética dos nomes dos autores. Em seguida, foram ordenados os trabalhos dos associados correspondentes e convidados;

A Revista não se responsabiliza por conceitos e declarações expedidos em artigos publicados, nem por eventuais equívocos de linguagem nela contidos. A revisão dos originais foi feita pelos próprios autores dos artigos publicados.

FINS DO IHGMC

Art. 2º - O IHGMC tem como finalidade pesquisar, interpretar e divulgar fatos históricos, geográficos, etnográficos, arqueológicos, genealógicos e suas ciências e técnicas auxiliares, assim como fomentar a cultura, a defesa e a conservação do patrimônio histórico, artístico, cultural e ambiental do município de Montes Claros e região Norte de Minas.

Montes Claros
Minas Gerais - Brasil
2019


 

INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Sobrado de Dulce Sarmento
Rua Cel. Celestino, 140 - Centro - 39400-014 - Montes Claros/MG
(Corredor Cultural Padre Dudu)

REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Publicação Semestral


Diretor e Editor
Dário Teixeira Cotrim

Conselho Editorial
Dário Teixeira Cotrim
Wanderlino Arruda
Sebastião Abiceu
João de Jesus Malveira

Editoração e Diagramação
Gráfica Editora Millennium Ltda.

Fotografias

Mara Yanmar Narciso, Filomena Alencar Monteiro Prates,
Maria Clara Lage Vieira, Silvana Mameluque, Manoel Freitas Reis,
Internet, arquivo de Dário Teixeira Cotrim e arquivo da ACI.

Impressão
Gráfica Editora Millennium Ltda.
ISBN: 978-65-5002-021-7


70 anos da ACI - Associação Comercial Industrial de Montes Claros


Diretoria 2018-2019 – 07
Associados Efetivos – 10
Associados Eméritos – 12
Associados Honorários – 12
Associados Correspondentes – 13
Homenagem a Associados Falecidos – 15

APRESENTAÇÃO – 17
Dário Teixeira Cotrim
Iracy Pereira Santos – 21
Dário Teixeira Cotrim
Hélio Veloso de Morais – 24
Dorislene Alves Araújo
Toquemos os sinos – 27
Edvaldo de Aguiar Fróes
Crise de Hipoglicemia: Um caso extremamente grave – 30
Felicidade Patrocínio
Um Pouco de Zé – 40
Filomena Alencar Monteiro Prates
A Vida é uma Eterna e Sábia Mestra – 45
Harlen Soares Veloso
A Origem dos Velosos do Norte de Minas – 51
Itamaury Telles
De Dr. Chaves a Darcy Ribeiro – 61
Lázaro Francisco Sena
Os Setenta Anos da ACI – 64
Leonardo Álvares da Silva Campos
Glacial de Jequitaí (ou a possível extinção do Homem) – 72
Mara Yanmar Narciso
Irmã Veerle – 108
Mara Yanmar Narciso
Futebol. Correspondência e Dízimo – 112
Maria Clara Lage Vieira
Maria Maia – 114
Maria da Glória Caxito Mameluque
Maria da Cruz: Uma mulher valente nos motins do sertão –121
Maria do Carmo Veloso Durães
Hoje é dia de Cinema – 125
Wanderlino Arruda
Ivan Guedes o Grande Brasileiro – 133
Wanderlino Arruda
Hélio de Morais – 137
Zoraide Guerra David
Presentes de Deus – 140
José Walter Pires – Associado Correspondente
Cordel é Patrimônio Imaterial do Brasil - 145


DIRETORIA DO INSTITUTO HISTÓRICO E
GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS


Fundado em 27 de dezembro de 2006.

COMISSÃO FUNDADORA 2006-2007

Dr. Dário Teixeira Cotrim
Dr. Haroldo Lívio de Oliveira
Jornalista Luís Ribeiro dos Santos
Dr. Wanderlino Arruda


DIRETORIA 2018-2019


PRESIDENTE DE HONRA Palmyra Santos Oliveira
PRESIDENTE Dário Teixeira Cotrim
1º VICE - PRESIDENTE Lázaro Francisco Sena
2º VICE - PRESIDENTE Sebastião Abiceu dos Santos Soares
DIRETOR-SECRETÁRIO Maria Aparecida Costa
DIRETOR-SECRETÁRIO ADJUNTO Maria da Glória Caxito Mameluque
DIRETOR DE FINANÇAS José Ferreira da Silva
DIRETOR DE FINANÇAS ADJUNTO José Jarbas Oliveira Silva
DIRETORA DE PROTOCOLO Wanderlino Arruda
Diretor de Comunicação Social Silvana Mameluque Mota
Diretor de Arquivo, Biblioteca e Museu Dorislene Alves Araújo

CONSELHO CONSULTIVO

Membros Efetivos
Maria de Lourdes Chaves
Terezinha Gomes Pires
Virgínia Abreu de Paula
Membros Suplentes
Milene A. Coutinho Maurício
Hélio Veloso de Morais
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro

CONSELHO FISCAL

Membros Efetivos
Evaldo Jener de Fátima
Expedito Veloso Barbosa
Narciso Gonçalves Dias
Membros Suplentes
Américo Martins Filho
Antônio Augusto Pereira Moura
Roberto Carlos Moraes Santiago

COMISSÃO DE GEOGRAFIA E ECOLOGIA

Rita de Cássia Oliveira Bichara
José Ponciano Neto
Maria Regina Barroca Peres
Vânia Rosália Veloso Assis Dias
Hermildo Rodrigues

COMISSÃO DE HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA

Denilson Meireles Barbosa
Leonardo Álvares da Silva Campos
Manoel Freitas Reis
César Henrique Queiroz Porto
Paulo Hermano Soares Ribeiro

COMISSÃO DE ANTROPOLOGIA,
ETNOGRAFIA E SOCIOLOGIA

Maria Ângela Figueiredo Braga
Hélio Antônio Maia
Jânio Marques Dias
Frederico Assis Martins
Eliane Maria Fernandes Ribeiro

COMISSÃO DE CLASSIFICAÇÃO E DE
ADMISSÃO DE SÓCIOS

Amelina Chaves
Marilene Veloso Tófolo
Juvenal Caldeira Durães
Zoraide Guerra David
Maria Lúcia Becattini Miranda

COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO E PUBLICAÇÃO

Alceu Augusto de Medeiros
Yury Vieira Tupinambá de Léllis Mendes
Ivana Ferrante Rebello e Almeida
Daniel Tupinambá Lélis
Maria Clara Vieira Lage

COMISSÃO DE VISITA E APOIO

João de Jesus Malveira - Coordenador
Edvaldo Aguiar Fróes
Ângela Martins Ferreira
José Ferreira da Silva
Harlen Soares Veloso
Dorislene Araújo

COMISSÃO DE PROMOÇÕES E EVENTOS

Ana Valda Xavier Vasconcelos
Josecé Alves dos Santos
Teófilo de Azevedo Filho (Téo Azevedo)
Maria de Lourdes Chaves (Lola Chaves)
Augusta Clarice Guimarães Teixeira (Clarice Sarmento)
Mara Yanmar Narciso da Cruz


LISTA DE SÓCIOS EFETIVOS DO IHGMC


CD
Sócios
Patronos
01
Edvaldo de Aguiar Fróes Alpheu Gonçalves de Quadros
02
Milene A. Coutinho Maurício Alfredo de Souza Coutinho
03
Antônio Alvimar Souza Antônio Augusto Teixeira
04
Maria do Carmo Veloso Durães Antônio Augusto Veloso (Desemb.)
05
Dóris Araújo Antônio Ferreira de Oliveira
06
Marcos Fábio Martins Oliveira Antônio Gonçalves Chaves
07
Maria Aparecida Costa Antônio Gonçalves Figueira
08
Jânio Marques Dias Antônio Jorge
09
Narcíso Gonçalves Dias Antônio Lafetá Rebelo
10
Maria Florinda Ramos Pina Antônio Loureiro Ramos
11
Sebastião Abiceu dos Santos Soares Ary Oliveira
12
Antônio Augusto Pereira Moura Antônio Teixeira de Carvalho
13
Cesar Henrique Queiroz Porto Ângelo Soares Neto
14
Ana Valda Xavier Vasconcelos Arthur Jardim Castro Gomes
15
Magda Ferreira de Souza Ataliba Machado
16

Gilsa Florisbela Alcântara

Athos Braga
17
Expedito Veloso Barbosa Auguste de Saint Hillaire
18
Frederico Assis Martins Brasiliano Braz
19
Paulo Hermano Soares Ribeiro Caio Mário Lafetá
20
Felicidade Maria do Patrocínio Oliveira Camilo Prates
21
Terezinha Gomes Pires Cândido Canela
22
Silvana Mameluque Mota Carlos Gomes da Mota
23

Marcelo Valmor Ferreira

Carlos José Versiani
24
José Ponciano Neto Celestino Soares da Cruz
25

Pedro Borges Pimenta Júnior

Corbiniano R Aquino
26
Harlen Soares Veloso Cyro dos Anjos
27
Regina Maria Barroca Peres Dalva Dias de Paula
28
Hélio Antônio Maia Darcy Ribeiro
29

Carlúcio Pereira dos Santos

Demóstenes Rockert
30
Maria Lúcia Becattini Miranda Dona Tirbutina
31
Clarice Sarmento Dulce Sarmento
32
Everaldo Ramos de Oliveira Edgar Martins Pereira
33
Wanderlino Arruda Enéas Mineiro de Souza
34
Geralda Magela de Sena e Souza Eva Bárbara Teixeira de Carvalho
35

Hermildo Rodrigues

Ezequiel Pereira
36
Felicidade Vasconcelos Tupinambá Felicidade Perpétua Tupinambá
37
Evaldo Gener de Fátima Francisco Barbosa Cursino
38
Maria Inês Silveira Carlos Francisco Sá
39
José dos Santos Neto Gentil Gonzaga
40
Maria da Glória Caxito Mameluque Georgino Jorge de Souza
41
Reinine Simões de Souza Geraldo Athayde
42
Kelly Cristine Nery Rocha Gomes Geraldo Tito da Silveira
43
José do Carmo Felício Godofredo Guedes
44
Roberto Carlos M. Santiago Heloisa V. dos Anjos Sarmento
45
Gustavo Mameluque Henrique Oliva Brasil
46
Eliane Maria F Ribeiro Herbert de Souza – Betinho
47
Amelina Fernandes Chaves Hermenegildo Chaves
48
Virgínia Abreu de Paula Hermes Augusto de Paula
49
José Ferreira da Silva Irmã Beata
50
Edilene Marília Miranda Rodrigues Jair Oliveira
51
Augusto César Gonzaga João Alencar Athayde
52
Ângela Martins Ferreira João Chaves
53
Vânia Rosália Veloso Assis Dias João Batista de Paula
54
Cláudio Ribeiro Prates João José Alves
55
Lázaro Francisco Sena João Luiz de Almeida
56
Ivana Ferrante Rebelo João Luiz Lafetá
57
Marilúcia Maia João Novaes Avelins
58
Maria Ângela Figueiredo Braga João Souto
59
Márcio Adriano Silva Moraes João Vale Maurício
60
Manoel Messias Oliveira Jorge Tadeu Guimarães
61
Ildeu Soares Caldeira Jr. José Alves de Macedo
62
José Jarbas Oliveira Silva José Esteves Rodrigues
63
Carlos Renier Azevedo José Gomes Machado
64
Palmyra Santos Oliveira José Gomes de Oliveira
65
Maria de Lourdes Chaves José Gonçalves de Ulhôa
66
Fabiano Lopes de Paula José Lopes de Carvalho
67
Denilson Meireles José Monteiro Fonseca
68
Benjamim Ribeiro Sobrinho José Nunes Mourão
69
Rita de Cássia Oliveira Bichara José (Juca) Rodrigues Prates Júnior
70
José Roberval Pereira José Tomaz Oliveira
71
Edwirges Teixeira de Freitas Júlio César de Melo Franco
72
Júnia Veloso Rebello Lazinho Pimenta
73
Terezinha de Souza Campos Neves
Lilia Câmara
74
Filomena Alencar Monteiro Prates Luiz Milton Prates
75
Alceu Augusto de Medeiros Manoel Ambrósio
76
Manoel Freitas Reis Manoel Esteves
77
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro Mário Ribeiro da Silveira
78
Américo Martins Filho Mário Versiani Veloso
79
Antônio Pereira Santana Mauro de Araújo Moreira
80
Isau Rodrigues Oliveira Miguel Braga
81
Juvenal Caldeira Durães Nathércio França
82
Josecé Alves dos Santos Nelson Viana
83
Daniel Oliva Tupinambá de Lélis Newton Caetano d’Angelis
84
Itamaury Telles de Oliveira Newton Prates
85
André Luís Lopes Oliveira Armênio Veloso
86
Zoraide Guerra David Patrício Guerra
87
Elzita Ladeia Teixeira Pedro Martins de Sant’Anna
88
João de Jesus Malveira Plínio Ribeiro dos Santos
89
José Francisco Lima Ornelas Robson Costa
90
Teófilo Azevedo Filho (Téo) Romeu Barcelos Costa
91
Wesley Caldeira Sebastião Sobreira Carvalho
92
Renat Nureyev Mendes Tupinambá Sebastião Tupinambá
93
Dário Teixeira Cotrim Simeão Ribeiro Pires
94
Gessileia Soares Cangussu Teófilo Ribeiro Filho
95
Marilene Veloso Tófolo Terezinha Vasquez
96
Yure Vieira Tupinambá de Lelis Mendes Tobias Leal Tupinambá
97
Leonardo Alvares da Silva Campos Urbino Vianna
98
Mara Yanmar Narciso Virgilio Abreu de Paula
99
João Nunes Figueiredo Waldemar Versiani dos Anjos
100
Maria Clara Lage Vieira Wan-dick Dumont

ASSOCIADOS EMÉRITOS

Antônio Ferreira Cabral
Luiz Pires Filho
Maria das Dores AntunesCâmara
Petrônio Braz
Waldir Sena Batista

ASSOCIADOS HONORÁRIOS

Alberto Gomes Oliveira
Carlos Henrique Gonçalves Maia
Edilson Carlos Torquato
Irany Telles de Oliveira Antunes
Girleno Alencar Soares
João Carlos Rodrigues Oliveira
José Antônio Corrêa Mourão
José Emídio de Quadros
Luís Ribeiro dos Santos
Mardete Dias Silveira
Newton Carlos do Amaral Figueiredo
Paulo Roberto Xavier da Rocha
Pedro Ribeiro Neto
Raquel Veloso de Mendonça

Sócios Correspondentes

Alan José Alcântara Figueiredo - Macaúbas - BA
Alberto Sena Batista - Grão Mogol - MG
André Kohene - Caetité - BA
Avay Miranda - Brasília - DF
Carlos Lindemberg Spínola Castro - Belo Horizonte - MG
Carmem Netto Victória - Belo Horizonte - MG
Cândida Correia Cõrtes - Carvalho Luz - MG
Célia do Nascimento Coutinho - Belo Horizonte - MG
Daniel Antunes Júnior - Espinosa - MG
Dêniston Fernandes Diamantino - Januária - MG
Eustáquio Wagner Guimarães Gomes - Belo Horizonte - MG
Felicíssimo Tiago dos Santos - Rio Pardo de Minas - MG
Fernando Antônio Xavier Brandão - Belo Horizonte - MG
Flávio Henrique Ferreira Pinto - Belo Horizonte - MG
Honorato Ribeiro dos Santos - Carinhanha - BA
Jeremias Macário - Vitória da Conquista - BA
João Martins - Guanambi - BA
Jorge Ponciano - Ribeiro Brasília - DF
José Walter Pires - Brumado - BA
Liacélia Pires Leal - Feira de Santana - BA
Manoel Hygino dos Santos - Belo Horizonte - MG
Maria do Carmo de Oliveira - Porteirinha - MG
Moisés Vieira Neto - Várzea da Palma - MG
Neide Almeida da Cruz - Feira de Santana - BA
Pedro Oliveira - Várzea da Palma - MG
Reynaldo Veloso Souto - Belo Horizonte - MG
Terezinha Teixeira Santos - Guanambi - BA
Wellington Caldeira Gomes - Belo Horizonte - MG
Zanoni Eustáquio Roque Neves - Belo Horizonte - MG
Zélia Patrocínio Oliveira Seixas - Aracajú - SE
Zilda de Souza Brandão (Bim) - Belo Horizonte - MG




 



Dário Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires

Eis aqui a vigésima terceira edição da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros que continua circulando dentro do prazo ajustado desde a sua fundação, graças a participação de seus colaboradores em favor do desenvolvimento intelectual do nosso povo. O resgate e a preservação da história é um trabalho árduo e gratificante ao mesmo tempo, desde a elaboração dos exemplares até o seu lançamento, a cada semestre. É sempre oportuno ressaltar que, a compreensão e a solidariedade na remessa dos textos enriquecem, de importância a cada publicação. E não é de estranhar que assim seja, pois a cidade da arte e da cultura (Montes Claros) possui a mais bela história dentre todas as outras cidades mineiras.

Nesta edição, comemoramos com muita alegria o septuagésimo aniversário da Associação Comercial e Industrial de Montes Claros, com um belíssimo texto do confrade Lázaro Francisco Sena. Não menos importante, ainda destacam os textos de Dorislene Alves Araújo, Edvaldo de Aguiar Fróes, Felicidade Patrocínio, Filomena Alencar Monteiro Prates, Harlen Soares Veloso, Itamaury Telles, Leonardo Álvares da Silva Campos, Mara Yanmar Narciso, Maria Clara Lage Vieira, Maria da Glória Caxito Mameluque, Maria do Carmo Veloso Durães, Wanderlino Arruda e do associado correspondente, o cordelista José Walter Pires da cidade de Brumado – Bahia.

Dessa forma, o leitor encontrará um farto material sobre a história de Montes Claros e da região do Norte de Minas, assim como os dados genealógicos e biográficos de nossa gente, além de outros temas de interesse geral. Por tudo isso, neste ensejo, manifestamos com especial carinho o nosso agradecimento a todos aqueles que, de uma forma ou de outra, contribuíram para que tornasse viável a publicação desta Revista, pois temos a convicção de que jamais faltará o auxilio e a atenção de quantos valorizam e prestigiam a pesquisa histórica de nossa terra. Enfim, eis aqui o nosso propósito para construção de um mundo mais humano e mais fraterno. Boa leitura!




Dário Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires

IRACY PEREIRA SANTOS

O meu coração está de luto! Um silêncio invade a minha alma ao saber da morte do meu tio Iracy Pereira Santos. Já estava tudo anunciado, é verdade, e mesmo assim nós não conseguimos acreditar nos desígnios do Grande Arquiteto Do Universo, isso porque, a notícia nos tomou de sobressalto neste amargo dia 17 de outubro – dia dedicado ao Santo Inácio de Antioquia, que mesmo depois da morte continuaria a orar pelos seus irmãos junto a Deus dizendo: “Meu espírito se sacrifica por vós, não somente agora, mas também quando eu chegar a Deus. Eu ainda estou exposto ao perigo, mas o Pai é fiel, em Jesus Cristo, para atender minha oração e a vossa. Que sejais encontrados nele sem reprovação”. Iracy, assim como Santo Inácio cuidou dos mais necessitados, você, na infinita bondade do seu florescente coração, também ajudou inúmeras pessoas em todos os segmentos da sociedade guanambiense. Por tudo isso eu insisto em dizer que o meu coração está, completamente, de luto!

Aprendemos na escola-do-tempo que o homem morre, mas que o seu nome permanece imortalizado nas boas intervenções aqui praticadas. O seu currículo, Iracy, é um dos mais fecundos de ações humanas, de muitas caridades, de amor pleno e de amizades profícuas. Por tudo isso os seus legados serão sempre lembrados no batente constante do Banco do Nordeste, nas reuniões festivas do Rotary Clube e da Maçonaria e, principalmente, no seio de nossa família. O seu dinamismo com o colecionismo de carros antigos, a sua participação discreta e firme nas decisões políticas do município, o seu empreendimento robusto em construir pontes sem o bajoujo dos incompetentes, a sua maneira fantástica de preservar a memória das pessoas queridas, em especial o nosso saudoso avô Teixeirinha, tudo isso lhe credencia uma entrada triunfal no céu, sem mesmo pedir licença a São Pedro – você se lembra de Irene? Pois bem, Iracy, você é um homem imortal em todos os sentidos. O povo sertanejo tem por você um respeito incondicional, uma admiração sincera e um carinho imensurável por tudo que você fez em vida e fará na morte.

Nota-se que, durante a minha peregrinação na vida, muitas vezes eu ouvi os seus valorosos conselhos. De certa feita, lhe perguntei sobre a possível dispensa voluntária no Banco do Brasil e você me respondeu categoricamente: “fique lá até você se aposentar”. E eu fiquei. Sorte minha!

Aliás, a tristeza pela sua partida revela em nós o canto estridente e livre de cigarras na escuridão da estrada, ou o doce arrulhar de uma indefesa pombinha fogo-pagou, desgarrada e bem no meio da pobre e fatigante caatinga. Enquanto aqui, os nossos olhos tristes, em chuvaradas de lágrimas, fazem dos espíritos perfeitos os mensageiros de sua triste partida. Lá no infinito dos céus, melhor acolhida lheé reservado no espaço destinado aos homens bons, os que estarão sempre na vanguarda da perfeita sintonia para com a vida aqui na terra. Certamente que os céus ouvirão de você o que há de se fazer no mundo dos mortos em benefício dos vivos deste vasto mundo. Iracy, a nossa cidade de Guanambi lhe deve muito e certamente que o seu nome será gravado no parthenon dos imortais para sempre. Tudo justo e perfeito!



Dário Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires

HÉLIO VELOSO DE MORAIS

A filatelia está de luto. O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros está de luto. De luto estamos todos nós com a partida do confrade Hélio Veloso de Morais. Um filatelista dedicado e totalmente apaixonado pelos selos postais dos Correios. Certamente que neste setentrião norte mineiro não haverá outro filatélico igual a ele por um bom tempo. Convivi muito com o confrade Hélio de Morais nas reuniões do saudoso Clube Filatélico e Numismático de Montes Claros, que eram realizadas nas dependências dos Correios. Lembro-me muito do ilustre companheiro conversando com o associado Francisco Gomes Calaça sobre as novidades no mundo da filatelia. Era comum nos entretenimentos a troca de selos e os elogios direcionados àqueles que mais se interessassem na catalogação de espécimes adquiridas. Era uma festa ao redor de uma mesa grande, festa que contagiava até mesmo aqueles que não se identificavam com a ciência de colecionismo.

Ademais, eu guardo com extremo cuidado, alguns envelopes obliterados pelos Correios e que hoje são peças raras para os novos


Hélio de Morais, Aragão (Correios), Júlia e Dário Cotrim na abertura da Exposição
Filatélica e Numismática na Caixa Econômica Federal de Montes Claros.

colecionadores. Não obstante a minha vocação ser apenas a numismática, ainda tenho um pouco de conhecimento da filatelia e isso se deu em vista da insistência de Hélio de Morais que, vez por outra, me presenteava com selos e envelopes postais, incentivando-me à técnica de catalogá-los com a rígida ordem que o assunto adrede requer.

Para os associados mais jovens, Hélio de Morais distribuía, gentilmente, selos em duplicidade do seu arquivo particular, na esperança de fomentar neles o gosto pelo colecionismo. Ele estudava, com minúcia, cada peça do seu magote sempre com o proposito de contribuir conhecimentos em beneficio da arte de colecionar. Admirados por todos, quando faltava em uma das reuniões, a sua ausência era sentida e questionada pelos membros do Clube.

A primeira exposição de selos e dinheiro (cédulas e moedas) do Clube Filatélico e Numismático de Montes Claros aconteceu no período de 03 a 29 de junho de 1994, na Caixa Econômica Federal, a convite do seu gerente regional, senhor Gilberto Nonato Ferreira da Costa. Naquela oportunidade o mestre Hélio de Morais proferiu discurso sobre a “Arte de Colecionar”, apresentando o nosso trabalho para uma plêiade de pessoas ilustres (entre outros mortais o historiador Olintho Alves da Silveira e sua esposa dona Yvonne de Oliveira Silveira, Dr. João Walter Godoy, José Gonçalves de Ulhôa e Francisco Gomes Calaça, todos os citados in memoriam) e que hoje o recebem para botar o papo em dia.

No Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, o confrade Hélio de Morais ocupava a Cadeira de número 23, que tem como patrono o saudoso o Dr. Carlos José Versiani, grande médico e benfeitor de Montes Claros. A sua presença em nossas reuniões sempre foi motivo de imensa alegria, pois ele nos contava as mais belas histórias do passado de nossa cidade. Hélio de Morais era uma pessoa inteligente e tinha a absoluta convicção da necessidade de resgatar a história antiga do nosso povo. Hoje, ele deixa a vida terrena para gozar as delícias do paraíso celestial ao lado dos que foram antes. O seu augusto nome ficará para sempre na Galeria dos Imortais do nosso egrégio Instituto Histórico e Geográfico.



Dorislene Alves Araújo
Cadeira N. 05
Patrono: Antônio Ferreira de Oliveira

TOQUEMOS OS SINOS

Yvonne Silveira, antes de tudo mestra... no sentido amplo da palavra, que dos seus feitos não se vangloria, de cultura inigualável, de plena sabedoria. Minha professora na antiga Faculdade de Filosofia Ciências e Letras - FAFIL / FUNM, atual UNIMONTES. Foi ali, no interior daquele casarão, que tive a grata satisfação e a honra de conhecê-la, em 1980... Ano em que me ingressei no curso de Letras daquela Faculdade, onde ela era professora titular de Literatura Portuguesa e Teoria da Literatura. A professora Yvonne Silveira sempre foi uma figura ímpar. Sua energia e dinamismo nos impressionavam. Personalidade marcante na vida de todos nós, seus alunos. Nos fez empreender viagens magníficas pelo universo literário dos grandes escritores e poetas. Nossa grande incentivadora nas artes da declamação e da escrita.

Por seu intermédio conheci o saudoso João Valle Maurício, escritor e poeta, autor de vários livros de prosa e dos mais belos poemas sobre Montes Claros, e pelo qual, eu, desde menina, nutria profunda admiração e respeito. Atendendo a seus convites, ainda na faculdade,

apresentava-me nos mais importantes e significativos eventos culturais de nossa cidade, muitos deles promovidos pela Academia Montes- clarense de Letras, da qual dona Yvonne era membro.

Ao longo do tempo, nosso vínculo de amizade foi crescendo, amadurecendo e consolidando-se. Em 1989, nossa mestra maior, Yvonne Silveira, torna-se Presidente da Academia Montesclarense de Letras, cargo assumido com dedicação e compromisso. Em 1996, com seu apoio, lancei o meu primeiro livro, “A Dança das Palavras”, obra agraciada em 1997 com o “Prêmio Cultura”, do Jornal de Notícias, através da coluna da Jornalista Márcia Sá, “Gente, Empresas e Negócios”.

Em seguida, também com seu aplauso, pleiteei, com suces¬so, uma cadeira na Academia Montesclarense de Letras, tornan¬do-nos assim, além de amigas, confreiras. Em 2002, a presidente da Academia Montesclarense de Letras, Yvonne Silveira, ilustra mais uma vez a minha história, prefaciando com beleza e generosidade o meu segundo livro, intitulado “Canção do Amanhã”.

A professora Yvonne é mesmo uma pessoa extraordinária, dotada de memória e cultura fabulosas. Referência máxima nos meios intelectuais de nossa sociedade. Sócia de várias entidades e instituições, como: Rotary Clube Sul, Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, Academia Municipalista de Letras, entre outras. Fundadora da Associação ‘Amigas da Cultura’ e da Academia Feminina de Letras de Montes Claros. Continua como presidente da Academia Montesclarense de Letras, onde atua com brilhantismo. Recebeu inúmeros prêmios literários, homenagens e títulos, por merecido reconhecimento ao seu valor e à sua infatigável luta em prol da cultura.

Em 30 de dezembro, deste ano, a ilustre e querida mestra completará cem anos! Uma vida longa e prodigiosa. Vida iluminada e iluminadora. A nossa notável professora, aos cem anos de idade (tomando emprestadas as palavras de S. Catarina de Sena), “tem um coração de criança e uma coragem indomável de viver.” Esses cem anos reduziram a audição da nossa mestra; contudo, não enfraqueceram sua fala, que conservou-se firme, clara, ativa e vigorosa, com a sonoridade própria da voz da Yvonne de antanho.

Esses cem anos não diminuíram o brilho dos seus olhos, tornaram seu olhar mais aguçado pela luz das virtudes conquistadas; não tiraram da dona Yvonne sua lucidez, ao contrário, enriqueceram-na com experiências, vivências e conhecimentos, avivando e tornando ainda mais prodigiosa sua memória. Em absoluto, esses cem anos não fragilizaram o seu coração; aprimoraram os seus sentimentos, conservando sua integridade com a energia rejuvenescedora do amor. Amorà cultura, aos amigos, à família, amor indestrutível ao esposo Olyntho Silveira... E amor a Deus, sobre todas as coisas.

Os cem anos de Yvonne Silveira, definitivamente, não significam velhice. Eles significam fundamentalmente sabedoria adquirida, virtude que atua como poderoso elixir de rejuvenescimento do espírito. Toquemos os sinos, todos os sinos... E celebremos o centenário dessa nobre e admirável Mulher. Toquemos os sinos em louvor


Edvaldo de Aguiar Fróes
Cadeira N. 01
Patrono: Alpheu Gonçalves de Quadros

CRISES DE HIPOGLICEMIA:
UM CASO EXTREMAMENTE GRAVE

Todo Médico que atende em Pronto Socorro tem a oportunidade de diagnosticar e tratar, na crise, casos variados de hipoglicemia, seja devido ao tratamento com hipoglicemiantes orais ou injetáveis tipo insulina nos diabéticos, jejum prolongado, anorexia nervosa ou devido a neoplasias, fraqueza extrema, comas, etc. Geralmente, a injeção venosa de glicose hipertônica e a manutenção de soro glicosado a 10% IV e alimentos adocicados por via oral, quando possível, resolvem o quadro agudo.

A enfermeira que trabalhava com Jansen, começou apresentar crises de hipoglicemia que, no início, responderam bem ao tratamento. Entretanto, em uma delas, o quadro persistiu com sudorese fria profusa, sonolência , hipotensão arterial e taquicardia, apesar do uso de glicose hipertônica IV.

Foi providenciado, imediatamente, a sua remoção para um Centro Médico de maior recurso a 50 Km, onde foi internada, com exames laboratoriais frequentes , soroterapia glicosada e hidrocortisona endovenosa (Flebocortid ou Solucortef)- 100mg de 12/12 hs.

Tudo isso, há 02 dias da data do casamento de Jansen, impedindo o comparecimento da amiga e eficiente profissional na cerimônia matrimonial e recepção aos convidados!

Após aquela crise tão prolongada e grave, ela foi encaminhada para avaliação por um renomado Endocrinologista em BH que solicitou a dosagem de Insulina, devido a sua suspeita de tratar-se de Insulinoma (tumor das ilhotas pancreáticas ou de Langerhans).

Naquela época não se realizava em BH a dosagem de Insulina e a paciente foi para São Paulo, para outro famoso Endocrinologista.
A dosagem de Insulina foi normal, afastando-se a suspeita de Insulinoma
e o amigo de Jansen lhe enviou um relatório, sugerindo a hipótese de ingestão compulsiva de hipoglicemiante oral, por se tratar de enfermeira com fácil acesso a medicamentos, o que foi de imediato descartada pelo Médico, pois tratava-se de pessoa da sua irrestrita confiança, de personalidade e conduta invejáveis!

O diagnóstico foi de Hipoglicemia Idiopática ou essencial (termos usados em Medicina quando não se consegue estabelecer a causa de uma patologia)! Interessante comentar que o “terreno genético” desse tipo de hipoglicemia, é semelhante ao da hiperglicemia ou Diabetes e, assim, a paciente passou a fazer controles frequentes da sua glicemia, constatando-se, às vezes, pequenos picos de hiperglicemia, sem necessidade de medicação e quando iniciava os primeiros sintomas da hipo, ingeria alimentos doces. Nada disso impediu a continuação do seu admirável trabalho na bela profissão que abraçou!...


EDEMA AGUDO DO PULMÃO E TROMBOSE MESENTÉRICA


O paciente de 80 anos, cardiopata crônico, pai de um grande amigo de Jansen, começou apresentar dispnéia intensa (falta de ar) e dor abdominal difusa seguida de vômitos escuros e o médico foi chamado para atendê-lo em sua residência em torno da meia noite. Imediatamente para lá se dirigiu, constatando um quadro assustador: sinais evidentes de insuficiência ventricular esquerda, com edema agudo do pulmão, arritmia cardíaca e sopro diastólico no foco aórtico, estertores crepitantes difusos, agitação e cianose nos lábios e polpas digitais, além de dor abdominal e vômitos (hematêmeses) devido a presença de sangue misturado com secreção gástrica. O paciente era portador de insuficiência de válvula aórtica!

Não tendo O2 disponível para catéter nasal, foi feito o garroteamento rotatório dos 03 membros para diminuir o retorno de sangue ao coração insuficiente, com intervalos de 10 minutos e injeção de cardiotônico e diurético venoso ( Cedilanide + Lasix) diluídos em so-ro glicosado hipertônico. Feita sedação com meperidina (Dolantina) intra muscular. Repetiu-se depois mais 1 ampola de Cedilanide e Lasix, observando-se melhora lenta e progressiva do quadro. Somente em torno das 05 horas da manhã o médico recomendou aos familiares a transferência do idoso para um Centro Médico de maior recurso a 50 Km de distancia e se dispôs acompanhá-lo, alertando-os que o caso era gravíssimo, pois o seu diagnóstico para a dor abdominal com hematêmese era de isquemia intestinal, devido trombose mesentérica! E lá se foi uma verdadeira comitiva de carros pela estrada poeirenta, até à Santa Casa, onde foi internado.

Um médico de confiança da família passou a cuidar do caso, tendo havido regressão do quadro cardíaco e a dor abdominal, devidoà sedação do paciente, melhorou aparentemente. E Jansen regressou para a sua cidade, pensativo e preocupado. Aquele médico constatou, no exame do abdômen, uma bexiga muito cheia atingindo o umbigo chamado entre os profissionais da área de “bexigoma”, fazendo uso de uma sonda vesical de alívio e, ao toque retal constatou uma grande aumento da próstata, o que é comum naquela idade, diga-se de passagem!

Concluiu que aquele quadro evoluiria satisfatoriamente, do ponto de vista clínico. Mas o desfecho daquele caso foi péssimo: à noite do mesmo dia, a dor abdominal voltou com grande intensidade e Jansen percebeu, durante o telefonema do filho do paciente dandolhe conta da evolução do quadro, os profundos gemidos de sofrimento do seu pai, que veio a falecer em seguida! Realmente a prática da Medicina nos dá lições frequentemente!

ÚLCERA TÍFICA PERFURADA NO ÍLEO TERMINAL

O paciente encontrava-se internado sob os cuidados do clínico de plantão da semana, ainda sob observação, fazendo exames, quando um acadêmico, estudante de Medicina, solicitou ao experiente Médico já citado, para examiná-lo, pois o quadro estava se agravando.

Na anamnese, registrada na papeleta de internação, havia a história de febre alta, diarréia súbita, vômitos, dor abdominal difusa, anorexia e estado geral bastante acometido. Os exames já realizados, mostraram Leucopenia com anaeosinofilia (global de leucócitos dimiminuida, com ausência de eosiniófilos), com a presença de granulações tóxicas nos neutrófilos e VHS (velocidade da hemossedimentação) aumentada, urina rotina com densidade elevada, anemia moderada. A reação de aglutinação para Salmonella thyphi foi positiva.

O paciente com dieta oral suspensa e hidratação venosa, com uso de antibiótico de largo espectro IV (Clorafenicol - 500mg de 06/06 horas), mas o seu estado geral se agravou com sinais de toxemia e dor abdominal difusa e intensa. O experiente clínico, ao palpar o abdômen, notou contratura muscular de defe-sa e timpanismo à percussão na área hepática, sinal de pneumoperitônio e, imediatamente, selou o seu diagnóstico: perfuração de víscera oca por úlcera tífica!

Mandou transferir o paciente para o Hospital de maiores recursos do mesmo Grupo, solicitou um RX do Tórax que confirmou o pneumoperitônio (presença de ar abaixo da cúpula diafragmática direita) e telefonou para Jansen para operá-lo de urgência. Na Laparotomia confirmou-se a perfuração de úlcera tífica no Íleo terminal, procedendo-se a ressecção da área acometida, com segurança, seguida de anastomose em 02 planos com fios adequados, aspiração de todo o líquido extravazado, com uso de soro fisiológico em abundância para lavar a cavidade, seguida de drenagem com exteriorização do dreno por contra abertura e fechamento usual da parede por planos. Sondas nasogástrica e vesical de demora.

Pós operatório, sob os cuidados daquele clínico e do cirurgião, com hidratação venosa rigorosa, antibióticos (clorafenicol IV na mesma dosagem anterior), analgésicos/ antitérmicos, antieméticos e observação
dos curativos e dreno. O referido antibiótico era o indicado para combater a bactéria causadora da “Febre Tifóide”: a Salmonella Thyphi murium. Houve a necessidade de Transfusão de Sangue Total, durante o ato cirúrgico (500 ml) e 1.000 ml no pós operatório. Tudo isso, numa época que não se dispunha ainda de CTI (Centro de Tratamento Intensivo) na Cidade. O resultado foi satisfatório para felicidade de todos!

UM CASO DE GRAVIDEZ TUBÁRIA ROTA,
ORGANIZADA OU GRAVIDEZ ECTÓPICA

A paciente chegou à consulta, acompanhada do seu esposo, com história de dor no baixo ventre, à direita, iniciada há 30 dias, com pequenos sangramentos vaginais e estado nauseoso, com vômitos esporádicos. Tais sangramentos foram confundidos pela paciente como menstruação. O exame geral mostrou mucosas ligeiramente hipocoradas, com pressão arterial, pulso radial e frequência cardíaca normais, com dor à palpação à direita no hipogastro. Ao exame ginecológico, toque bimanual, notou-se uma massa parauterina direita, dolorosa aos movimentos do útero, que encontrava-se ligeiramente aumentado de volume, com colo amolecido. O Dr. Jansen aventou sua hipótese diagnóstica: gravidez ectópica na trompa direita, provavelmente rota e organizada!

Relatou ao esposo o seu diagnóstico, propondo levar a paciente a um Centro de maior recurso, o que foi feito, acompanhado do Médico.
Foi internada na Santa Casa, onde procedeu-se uma punção no fundo de saco vaginal posterior (Douglas), confirmando-se a presença de sangue na pelve. Realizou-se a Laparotomia, confirmando-se o diagnóstico pré operatório, retirando-se a massa que englobava a tuba uterina direita e limpeza cuidadosa da cavidade com soro fisiológico morno e fechamento da parede. Um colega do Hospital, que auxiliara a cirurgia, encarregou-se do pós operatório até à alta da paciente emótimo estado. Mais um caso resolvido, felizmente, com sucesso...

UM CASO DE TUMORES BENIGNOS
GIGANTES NA PELVE FEMININA

O presidente do Sindicato Rural da cidade, responsável pelas autorizações dos internamentos hospitalares dos trabalhadores rurais, além de vizinho do Hospital tornou-se grande amigo do Jansen, relatando-lhe um caso de uma paciente que vivia numa fazenda distante
e que necessitava de uma consulta, para elucidação da sua patologia.
E, assim, foi agendada a sua consulta, acompanhada por um familiar.

Tratava-se de uma mulher de 45 anos, melanoderma, nulípara, com história de aumento progressivo do volume abdominal, iniciado há quase um ano, com dor tipo cólica e peso, acompanhada de sangramentos frequentes vaginais. O estado geral era satisfatório, constatando-se mucosas hipocoradas. A paciente já havia recorrido a diversos chás caseiros com plantas da região, além de benzeção com curadores e rezas da crença popular, tão difundidas na zona rural!

O exame do abdômen revelou uma gigante massa que se estendia do baixo ventre até a reborda costal, consistência endurecida e bocelada e o toque vaginal constatou colo uterino ginecológico e massa pélvica. Indicada a cirurgia, os exames pre operatórios foram solicitados incluindo-se ABO-Rh, para transfusão de sangue total, durante o ato.

Foi marcado o dia da cirurgia e combinado com o Anestesista e auxiliar da vizinha cidade, com os 03 frascos de sangue devidamente liberados. A laparotomia revelou as presenças de Mioma Uterino bocelado, enorme e um Cisto do Ovário direito de grande volume, líquido citrino no seu interior. Feita o esvaziamento do cisto e ooforectomia direita além da Histerectomia subtotal. O pós operatório transcorreu sem anormalidades, com diurese e cicatrização abdominal normais. Os fragmentos da cápsula do cisto ovariano e do mioma foram encaminhados para exames anátomo patológicos na Capital (BH) e os resultados foram Benignos. Todos satisfeitos, inclusive,é claro o jovem Jansen pelo sucesso do caso, que providenciou um enorme frasco de vidro com formol a 10%, colocando a cápsula do cisto e diversas bossas do mioma, bem tampado, em frente a sua mesa do consultório, com a data e o título da Cirurgia, tão bem realizada naquele pequeno Hospital, mirando o frequentemente, com uma certa dose de orgulho e vaidade, tão naturais naquela idade!

UM CASO DE CÂNCER DE PULMÃO
DENOMINADO DE CABRONCOGÊNICO

O paciente era funcionário da Prefeitura local e procurou o Médico apresentando quadro de Bronquite Aguda pós gripal com tosse produtiva, febre, anorexia e chiado nos peitos (roncos e sibilos à ausculta pulmonar), com um detalhe: era tabagista (fumante) inveterado. O RX de tórax em AP e PERPIL, mostrou imagem arredondada no 1/3 médio do pulmão direito, sendo solicitado o exame de escarro no laboratório do SESP, para pesquisa do b.a.a.r, que foi negativa.

Foi feito o tratamento usual com antibióticos, analgésicos/antitérmicos, repouso, expectorante e líquidos oral, recomendando-se o retorno para controle. Na segunda consulta, o paciente foi encaminhado para um Pneumologista num Centro Maior e o diagnóstico foi de Carcinoma Broncogênico que evoluiu, rapidamente, com Metástases (disseminação da neoplasia), levando ao óbito. É uma das graves consequências do tabagismo, em todo o Mundo!

UM SURPREENDENTE E INESQUECÍVEL AGRADECIMENTO

Num dos seus plantões de sobreaviso, Jansen foi chamado para atender um paciente, no Hospital da UNIMED, encaminhado da cidade de Capitão Enéas, apresentando um quadro de Abdômen Agudo Obstrutivo, devido a uma hérnia umbilical estrangulada: dor tipo cólica intensa na região umbilical, náuseas, vômitos, parada de eliminação de gases e fezes, desidratação e fácies de sofrimento.

E, ao exame abdominal, o cirurgião constatou uma massa irredutível no umbigo, com dor intensa à palpação e história antiga de uma hérnia umbilical que se reduzia facilmente até o início do quadro agudo, após um esforço físico. Instituida soroterapia venosa glicofisiológica, antiespasmódico preparo imediato para Laparotomia de Urgência, pois o paciente já estava em jejum.

Feita secção cuidadosa do anel que prendia as alças do delgado, que se encontravam em sofrimento, cor arroxeada, aplicação de compressas umedecidas em soro fisiológico morno, em abundância, até a completa recuperação das mesmas, com o típico aspecto róseo avermelhado, sem lesões das suas paredes. Após a reposição das alças na cavidade abdominal, procedeu-se ao fechamento da parede com Herniorrafia pela técnica de Mayo (sutura da aponeurose em “jaquetão”, com pontos separados, em U, fio inabsorvível: seda).

O pós operatório transcorreu dentro da normalidade, com alta no 4º dia e marcado o retorno no 10º dia para revisão e retirada dos pontos da pele. A agradável surpresa ocorreu quando Jansen, acompanhado do seu filho adolescente, foi fazer a revisão do caso e retirada dos pontos no mesmo Hospital e o paciente, num gesto surpreendente, exclamou agradecido na singeleza do homem sertanejo: “o senhor me viveu, doutor”. Jansen olhou para o filho e lhe disse, emocionado: aí está a beleza da nobre profissão que abracei! Sempre valerá à pena...


Felicidade Patrocínio
Cadeira N. 20
Patrono: Camilo Prates

UM POUCO DE ZÉ

Há um sentimento visível de felicidade, muitas vezes confessado entre nós, os dez irmãos Patrocinio, devido ao berço de origem e ao amor e princípios que nos legaram nossos pais, Dário e Ditinha.

Como quinta filha e primeira mulher na escala sucessória dos nascimentos, eu tinha o cuidado dos meus irmãos mais velhos, Tuca, Carlinhos, Lô e Zé, e, é claro, eu ajudava no cuidado dos que vieram depois, Zélia, Tião, Fátima, Graça, Donério, Roberto e Márcia. Fátima, ainda criança, antecipou a sua viagem sem volta, e Tuca, o mais velho, companheiro de viagens do nosso pai, tomou a providência de acompanhá-lo, também, na viagem derradeira. Hoje somos dez os que sobreviveram às intempéries do mundo e, embora tenhamos vidas e personalidades diferentes e habitemos localidades distantes, honramos o amor de nossos pais, com a nossa incondicional união e mútua solidariedade.

Dentre todos os componentes desse contexto, quero destacar o Zé pela essência superior do seu ser. Ele é somente um ano mais velho que eu; quer dizer, eu tomei logo cedo o colo que era dele, o que me enche de remorso. No entanto, ao invés de ciúmes, recebi desde o primeiro instante o seu companheirismo. Desde bebês, estávamos sempre juntos. Bagunçávamos o ambiente, por vezes derrubando e quebrando coisas, e, quando descobertos, conforme relatos da velha vó Dadinha, ele logo apontava para mim e dizia: “Foi Dade”.

Olhando para o túnel do passado, lembro-me de uma nossa aventura em Serra Nova, onde nosso pai nos deixou enquanto viajava a trabalho, bem pequenos ainda éramos. Simplesmente desaparecemos, os dois, na mata que cobria parte da Serra Geral, naquela localidade que depois se tornou reserva natural com o nome de Parque Serra Nova. A avó Dadinha, responsável por nossa integridade física estando nós no seu habitat, espalhou os moradores da vila em nossa busca. O dia já findava quando nos encontraram perdidinhos em busca de uma cobra muito linda que tinha balançado um atraente chocalho (uma cascavel). Ao sermos levados à presença da avó em desespero, não adiantou ao Zé dizer “Foi Dade”: ambos apanhamos feio. Para mim, esse salvamento foi a primeira manifestação do poderoso Anjo protetor que acompanha o Zé por toda sua vida.

Rumo à escola, eu sigo os passos de Zé no Grupo Escolar Francisco Sá, onde ele se destacou pela inteligência e aplicação. Ao final do 4º ano, foi premiado com um livro grande, de capa dura, ilustrado, tão belo que acendia faíscas nos nossos olhos. Com esse livro nas mãos, ainda pequenininho, internou-se no Seminário Diocesano de Montes Claros para se preparar para ser padre, e lá permaneceu por muitos anos. O regime do internato era austero e exigia dedicação. O Zé adequou as suas necessidades e aspirações aos objetivos do seminário, imprimindo excelência em tudo que lá produzia. Tinha notas altas, participava com brilhantismo dos concursos de oratória, em línguas. Lembro-me dele vencendo um concurso de oratória em grego. Nas visitas mensais que os familiares podiam fazer ao seminário, éramos brindados com peças teatrais esplêndidas, flashes históricos dos tempos das Cruzadas. Nas férias, quando o Zé vinha para casa, a vizinhança se reunia para assistir a nossas missas. Digo“nossas” porque fui sua sacristã. Lembro-me da vizinha dona Antônia, das avós Sinhá e Dadinha, e mãe, contritas, comungando hóstias de rodelas de banana, enquanto eu batia sonoramente o almofariz de cobre e respondia “Et cum spiritu tuo”. A missa era perfeita, mesmo assim eu, às vezes, por achar graça, soltava uma irreprimível risada no meio da cena, ocasião em que o Zé me lançava um olhar fulminante.

E assim a vida foi passando. O Zé, sempre longe de nós, transferiu-se para Diamantina, em busca do Seminário Maior, onde iniciou os estudos de Teologia e Filosofia. Lá ele decidiu romper com esse projeto e pensar num outro, mais condizente com a sua expectativa de então. O choque inesperado para a família foi superado e o Zé caminhou rumo a novo horizonte.

Mudou-se para Belo Horizonte e morou por um tempo com a família de tio Antônio, cuja finura e generosidade facilitaram essa etapa de sua vida. De lá o Zé foi para Brasília, onde explodiu na liberdade do seu ser sempre contido. Classificou-se entre os primeiros no vestibular para o curso de Economia da Universidade de Brasília (UnB) e, numa época de grande agitação política, foi eleito presidente de diretório estudantil na mesma universidade. Seu compromisso com a ética e a liberdade levou-o a tomar parte em manifestações de repúdio ao golpe de estado de 64 e à ditadura militar, que acabou resultando na sua prisão pelos militares. Nesse momento, vi em minha casa, em Montes Claros, longe de Brasília, os meus pais chorando e rezando, confabulando segredos, queimando livros de capas vermelhas e implorando ajuda e intervenção a deputados. O mano Carlinhos, que estudava Medicina em Uberaba, estava em Brasília e intercedeu, mas também foi preso até averiguação. Nessa passagem, eu percebi mais uma manifestação do poderoso anjo protetor de Zé, que foi libertado sem sofrer torturas.

O Zé, já conhecido e respeitado, tornou-se um namorador contumaz. As moças se apaixonavam facilmente por ele e o disputavam com determinação. Ele não tem a beleza de um galã, mas o seu ser especial, a educação extremada, a atenção que dispensa a todos, a generosidade incansável, sua sabedoria e intelectualidade, até mesmo a sua doçura, cativam e prendem para sempre.

Ao se formar economista, o Zé, através de concurso, foi trabalhar na Receita Federal, iniciando sua carreira no serviço público, para o qual tem grande vocação. Foi selecionado para estudos de pósgraduação na Sorbonne por cinco anos e morou em Paris, onde se casou com a paraibana Hermita Prazim, que para lá foi em busca do seu amor, deixando para trás consultório de dentista. Ao retornar ao Brasil, foi assessor de Mailson da Nóbrega, à época ministro da Fazenda, e desde há muito é consultor legislativo do Senado, sendo muito requisitado na área de tributação.

Tem um filho que adora, o Graciliano, lindo jovem ainda estudante, em quem investe todas as suas expectativas. Adora arte, conhece-a bem e com ela convive estreitamente, chegando a tornarse um colecionador de obras de grandes nomes da história da arte brasileira.

Joga bem o tênis e adora viajar, tendo me concedido a oportunidade de acompanhá-lo em viagens memoráveis ao redor do mundo. E foi nesta circunstância, de companheira de viagem, que passei a admirá-lo e amá-lo mais e mais. Nessas viagens e através de suas pacientes explanações, ele me ofereceu o esplendor do conhecimento de parte do mundo. Assim, compartilhando do seu encantamento, percorri grande parte do Canadá, Estados Unidos, Espanha, Portugal, quase toda a Patagônia argentina e chilena, o Paraguai, e também grande parte do Brasil. Ele adora dirigir nas estradas e todos os perigos enfrentados foram sempre bem contornados com a ajuda nítida do seu poderoso anjo.

Todos os irmãos a ele devem favores. Para beneficiá-los ainda mais, adquiriu e ofereceu à família uma deliciosa casa de praia no sul da Bahia. Assim também com a casa de Serra Nova, vila natal de nosso pai, onde o Zé fez benfeitorias para um povo humilde e promoveu a maior festa que aqueles arredores já viram, para comemorar o centenário de nosso pai.

Para mim, o Zé é um exemplo maior de ser humano. Na sua companhia, presenciei gestos de paciência, educação e tolerância incomuns, para com todos que o rodeiam. Sempre fui alvo da sua generosidade. Houve um tempo em que, devido às dificuldades financeiras, eu estava empurrando carro na rua, sem poder trocá-lo, e o Zé chegou com um carro de presente. Mais à frente, ele trocou este carro dado por outro mais novo e melhor. Ele vive perguntando se estou precisando de dinheiro ou alguma outra coisa, e eu emocionada respondo que sim ou que não. Então pergunto: como não ser feliz tendo um irmão como esse?

Eu, sim, sou muito feliz porque tenho você, Zé, como meu irmão e agradeço a Deus esse privilégio, implorando-Lhe que lhe conceda vida bem longa com saúde, paz, amor e tempo para receber nossa gratidão.


Capa do Livro: Histórias de Serra Nova, em comemoração ao centenário de nascimento do nosso pai Dário Silveira, organizado por José Patrocínio da Silveira e Roberto Patrocínio Silveira.



Filomena Alencar Monteiro Prates
Cadeira N. 74
Patrono: Luiz Milton Prates

A VIDA É UMA ETERNA
E SÁBIA MESTRA

A vida é uma eterna e sábia mestra que está sempre a nos ministrar aulas e trazendo sempre novas surpresas. Surpresas essas como podemos comprovar através desse título de Cidadã Montes-clarense que hoje recebo o que muito me honra, principalmente saber, que a partir de hoje sou uma das mais “novas” (aspas) das irmãs de vocês meus caros amigos de Montes Claros.

De coração já sou mineira há mais de quarenta anos quando aqui cheguei, vindo do Nordeste, deixando para trás aquele povo sofrido e castigado pelas intempéries das estações do ano, quando muitos esperam pelas chuvas e elas vão para outras plagas, causando muitas vezes o caos trazido pelas enchentes, enquanto que no Nordeste o sertanejo continua a olhar para o céu esperando o milagre das chuvas, depositando suas últimas esperanças no dia de São José – 19 de março – que segundo a crença, se chover neste dia a colheita estará assegurada.

Mas, meus amigos, o que me trouxe à Minas Gerais não foi a seca e, sim, a ingratidão da política.

Meu pai era um advogado, com um bem montado escritório; pequeno fazendeiro nas horas vagas, mas, sobretudo, apaixonado chefe político do nada saudoso do Partido Social Democrático – PSD.

Quando Parsifal Barroso foi eleito governador do Ceará, o meu pai apesar de haver sido vitorioso na eleição teve a grande tristeza de ver um ente querido seu, ser assassinado por adversários políticos.

O velho Zequinha Monteiro, na época com sessenta e poucos anos de idade, não pensou duas vezes, fez como o patriarca Noé, reuniu a esposa, filhos, genros, noras e netos e partiu sem olhar para trás em busca do país dos Gerais.

Na época eu cursava a Faculdade de Serviço Social em Fortaleza, no último ano; o então seminarista Antônio Alencar (hoje Padre Alencar)estudava teologia no seminário da Prainha, também em Fortaleza. Veio para o seminário de Diamantina onde completou os estudos, ordenando-se sacerdote no ano de 1962.

Do Ceará meu pai veio direto para a cidade de Coração de Jesus (hoje tão bem aqui representada por meus familiares) onde comecei a lecionar no Grupo Escolar Coronel Francisco Ribeiro como professora primária. No ano seguinte (1959), conheci o jovem advogado Adão Múcio Prates que, ao ser informado pelo seu pai Flaminio Prates da chegada de um outro advogado (o meu pai), na cidade falou: “Esse velho veio atrapalhar meu início de carreira”. Nem pensava que esse mesmo velho um dia tornaria seu sogro.

Fiquei conhecendo Mucio em abril de 1959 e em 31 de julho de 1960 nos casamos. Em Coração de Jesus nasceram meus primeiros filhos: Cid, Célia, Cecília Maria e Carlos Eduardo. Já Ana Cristina e André Felipe nasceram aqui em Montes Claros. O que me torna cada vez mais montes-clarense do coração e por adoção.


Adão Múcio Prates, marido de Filomena

Senhor presidente da Câmara, Dr. Iran Rego, esse título que hoje recebo me dignifica ainda mais por me ter sido conferido por V. Excia., pessoa a quem muito admiro pela sua dignidade e honradez como político e grande devoto e leal discípulo de Hipócrates a quem nunca traiu o juramento feito quando de sua formatura em medicina.

Minha gratidão aos Srs. Vereadores pela aprovação do meu nome; sem deixar de mencionar os nomes dos meus queridos ex-alunos João Hamilton e Lipa Xavier de quem fui professora quando lecionava no Colégio Tiburtino Pena, em Francisco Sá, onde Mucio atuava como juiz da Comarca.

Seria impossível destacar nomes, pois são pessoas tão queridas que não haveria papel que coubesse tão grande lista.

No entanto preciso agradecer a vocês pela acolhida maravilhosa na nossa querida Montes Claros: a família Prates Ataíde por parte do meu marido; a Sociedade Amigos da Cultura e Grupo Lisieux de quem sou um dos mais humildes de seus membros e me orgulho de pertencer.

Portanto meus irmãos montes-clarenses de uma coisa podem ter certeza: estou muito feliz com esse título e tudo farei para honrá-lo e dignificá-lo como Montes Claros bem merece.

Agradeço a presença do meu esposo Adão Múcio, de filhos, genros, netos, irmãos e cunhado que estiveram presentes. (Falar sobre S. V. não fica de pé, no dizer do meu pai)

 

SALVE MONTES CLAROS

Terra acolhedora, quando te conheci já eras centenária.

Quando aqui cheguei vindo do nordeste, era ainda uma velha senhora que andava em passos lentos, mas, sempre buscando dias melhores para teus filhos.

Eles cresceram, saíram para outros lugares em busca da perfeição; nas letras, nas artes, no cinema etc. Ciro dos Anjos, Yara Tupinambá, Carlos Alberto Prates e tantos outros que seria impossível enumerá-los. Olhando para o passado minha bela Montes Claros, vemos quanta coisa mudou. Temos Academia de Letras, Museus, Centro Cultural, Instituto Geográfico, Arquidiocese, Conservatório Musical, Unimontes e muitas outras Faculdades, onde jovens de varias cidades vem em busca das tuas Fontes Culturais, matarem a sede de novos conhecimentos. Morei na cidade de Coração de Jesus, lá me casei e nasceram quatro filhos, os outros dois já nasceram aqui, são Montesclarenses como eu, cujo titulo me foi outorgado pelo ilustre presidente da Câmara Municipal Dr. Iran Rego, uma comenda de que tanto me orgulho. Morei em Porteirinha onde fiz grandes amizades e depois meu marido foi promovido para a Comarca de Francisco Sá, cidade querida e acolhedora onde me tornei “Brejeira de Coração”. Hoje morando aqui nessa cidade, sinto orgulho de pertencer ao Instituto Geográfico ao qual me dedico com grande afeição e à Academia Feminina de Letras, a qual considero uma grande família.

Devo ainda citar com bastante entusiasmo a Academia Montesclarense de Letras, onde seus membros são verdadeiros ícones do saber, sendo que, muitos deles já se encontram em outro Plano Espiritual, mas deixaram seus nomes gravados nos anais da tua historia querida Montes Claros. Sempre que posso participo das reuniões em Casas de Cultura, e recentemente em uma dessas reuniões, adquiri alguns volumes de uma verdadeira Antologia do colega José Ferreira, ao qual parabenizo, e que na sua linguagem simples e autêntica, fala da sua juventude, dos esportes e enaltece a figura de seu pai, Sr. Galdino.

Sou Grata e Feliz por viver e compartilhar com as inúmeras entidades culturais desta cidade, repletas de bons autores, colegas e amigos.

Salve
Montes Claros.


Harlen Soares Veloso
Cadeira N. 26
Patrono: Cyro dos Anjos

A ORIGEM DOS VELOSO
DO NORTE DE MINAS

Cavalhada é o nome de uma tradicional celebração portuguesa que teve origem nos torneios medievais, em que os aristocratas exibiam, em espetáculos públicos, sua destreza e valentia. Envolvia temas do chamado período da “Reconquista”, processo histórico de retomada dos territórios conquistados pelos mouros (berberes que professavam a religião muçulmana) na Península Ibérica.

Conforme expõe em seu blog a jornalista Raquel Mendonça, “A mais antiga notícia sobre as Festas (de Agosto) data de 1839, segundo o grande e saudoso historiador e folclorista, Hermes Augusto de Paula, em seu livro ‘Montes Claros, Sua História, Sua Gente, Seus Costumes’ (...). Ao se comemorar a coroação de Dom Pedro II, em 8 de setembro de 1841, foram permitidos oficialmente vários divertimentos durante três dias: ‘Catopês (...); Cavalhadas, Volantins e quaisquer outros divertimentos que não ofendam a moral pública’. As belas “Cavalhadas” desapareceram com o tempo, assim como a figura do ‘Bumba-meu-Boi’, que integrava o cortejo”.

A propósito dessa esquecida manifestação cultural, encontra-se em registros históricos um interessante conto que descreve o modo como se desenvolvia a sua representação em Montes Claros. A preciosidade literária (de imenso valor cultural e histórico) está publicada no jornal “A Manhã”, do Rio de Janeiro, edição do dia 7 de maio de 1950, suplemento “Letras e Artes”. Seu autor é o montesclarense Antônio Versiani dos Anjos (26/08/1891 - 08/1970), irmão de meu patrono, Cyro dos Anjos. Era farmacêutico (diplomado em Ouro Preto) e escritor. Carlos Drumond de Andrade o definiu como “um narrador cheio de malícia, poder de observação e talento”, na orelha de seu livro “Viola de Queluz” (1956). Para a crítica da época, Antônio Versiani “revivia com suas estórias o homem do interior mineiro, um tipo social de infinitas possibilidades do mais puro aproveitamento literário”.

Sem mais delongas, passo à transcrição do primoroso conto do ilustre conterrâneo (com a grafia original da publicação fluminense).


“CAVALHADA

Iam em quente os últimos preparativos para ser levada a efeito a festa da cavalhada moirana, velha evocação das pugnas entre mouros e cristãos, que se realizava todos os anos nos meados de agosto em Montes Claros, velha cidade mineira plantada num vale cheio de encantos, debaixo de um céu azul marinho de beleza rara, jamais visto em outras plagas que não as daquele sertão.

Os ensaios, que por espaço de dois meses foram feitos com regularidade
na várzea do Motoso já tinham sido dados como terminados, prenunciando-se um êxito completo do drama ao ar livre que ia reconstituir a tomada de Floripa, filha do rei cristão, e lutas que se seguiram até à derrota do rei mouro, sua conversão à fé católica, para finalizar com o casamento do soberano com a princesa.

Havia dois partidos políticos na cidade: o dos ‘estrepes’, que torciam pelo grupo dos mouros, e o dos ‘pelados’, que o faziam com igual entusiasmo, mas pelo lado dos cristãos. É que tomavam parte naquela função pessoas de prol pertencentes aos partidos antagônicos.

Dentre os partidários mais ferrenhos dos cristãos, destacava-se Bento Cafubá, mendigo acatado que tinha assento na farmácia do Nandú, cujos traços marcantes da sua personalidade eram a sua intransigência, gênio irrequieto e linguagem um tanto descomedida.
Lá estava ele refestelado a um canto do gradil, com a sua indefectível manguara, assuntando o tempo, quando aparece o major Exupério, um caboclo de modos estabanados à procura de digestivo. Exupério iria desempenhar o papel de rei mouro nas corridas. Aparece solícito Nandú para atende-lo, enquanto Bento Cafubá o olha de soslaio e, já enervado que nem cascavel em cima da rodilha, à espera da bocada que o ‘estrepe’, sempre que se oferecia oportunidade, lhe ativava.

- Então seu major, que me conta de novo? – disse Nandú.

- Muito ocupado com os ‘apreparativos’ da cavalhada, seu Nandú, ‘mas porém’ acho que o ‘trem’ vai agradar. Me arranja aí um amargo.

A uma ordem do farmacêutico, o caixeiro trouxe a beberagem que o major sorveu de um trago.

- ‘Marga’ que nem ‘fel’, ‘mas porém’, é remédio superior. A gente tomando ‘ele’ em antes, pode comer o que quiser que o estômago‘constroe’. O senhor carece de tirar patente dele antes que qualquer vadio carregue a receita e saia por aí a fazer milagres à sua custa.

Já foi a primeira bodocada para o Bento, que com supremo esforço se fez de distraído para evitar discussão. Não satisfeito, virou-se para ele:

- Tu ainda não foi para o asilo, ‘esse menino’?

- Não senhor. – respondeu Bento. Não quero ir para lá enquanto não assistir a corrida de uns cavalinhos manquitolas que vai ter amanhã, porque quero ver muita gente graúda borrar na retranca.

O Nandú, que é homem de boa paz, procurou mudar de assunto e o major saiu pouco depois cuspindo grosso e olhando de banda para Cafubá, que indiscutivelmente tirou vantagem nesse último embate.

- Mas você pintou com o major. É capaz dele ter saído agastado com aquela sua resposta.

- Uai! Eu estou no meu quieto, o senhor bem viu. Prá que é que aquele besta vem ‘jogar ponto’ por cima de mim? Eu sou pobre, mas não como disaforo nem levo eles para casa. Respondo é no ‘sufragante’.

Continuou resmungando Bento Cafubá, quase em solilóquio, porque Nandú atendia naquele momento a outros fregueses, dessa vez clientes que vinham fazer consultas, como é frequente no interior. O afluxo de gente, nessa ocasião, como sói acontecer em vésperas de festa, era grande.

Não podendo desabafar com o farmacêutico, dirige-se ao coronel Zacarias, velho procurador de partes que acabava de chegar:

- Pois é, coronel. A gente está ‘seus quieto’, chega umas ‘cria’ e entende de fazer pouco caso só porque é rico. Pode ‘insuquir’ os dinheiros dele que eu, graças a Deus, posso passar sem ele porque ainda tenho muitos amigos para me valerem. Não careço de adjutório de ‘estrepe’ nenhum. O mal que ele pensa que eu tenho é ser pobre.
Pobreza algum dia foi defeito coronel?

- Não é defeito não, Bento. É aleijão. – respondeu o coronel galhofeiro, a quem não faltava presença de espírito.

Bento não quis ouvir o resto das gargalhadas provocadas pela piada do advogado. Saiu bufando – ‘Teve melhor’, – disse entre dentes.

Chega o grande dia das corridas. O Largo de Baixo, onde se situava a velha igreja matriz, todo embandeirado, tendo em uma das extremidades da praça, já armado o palanque, à guiza de castelo do Rei cristão, devidamente ornamentado com varas de bambu, festões (trecho truncado) o palanque, à guisa de castelo do trave para argolinha,à semelhança de goal de futebol e, em cada ângulo do largo, os bonecos de papelão espetados em postes para servirem de alvo aos guerreiros, finalmente, a um canto, o rancho de capim do ‘espia’.

A banda de música ‘Euterpe’, tida como a melhor das duas existentes, ricamente equipada com seu instrumental de metal amarelo luzidio, também estava a postos com todas as ‘figuras’ devidamente uniformizadas.

A grande praça se achava estivada de gente de toda a condição social, tipo e raça, indumentária variadíssima, desde a que caracteriza o povo das cercanias até a usada nos sítios mais distantes, numa redondeza de trinta a quarenta léguas, emprestando um colorido heterogêneo e original àquele cenário de festa regional. Não faltavam também os granfinos da cidade e dos burgos circunvizinhos, quase todos desafiando a canícula daqueles dias de verão com ternos de casemira preta tresando a naftalina.

Tudo, porém, na melhor ordem, sem nenhuma necessidade de assistência policial, tão somente na alegre expectativa do torneio que ia realizar-se dentro de alguns momentos.

Havia também em torno da liça uma profusão de bancas de refrescos, onde predominava a gengibirra, ‘quitandas’ (biscoitos e bolos), afora os ambulantes de tabuleiro a cabeça oferecendo toda a sorte de guloseimas e frutos diversos.

- Oólha a gengibirra, feitio do Leolino do Beco! ...
- Oólha os biscoito fofão ...
- Oólha os ‘panam’, cem réis cada um! ...
- Chega freguesia, óia o dinheiro e a vazia! ...
- Oóia as brevidade, feitio de Siá Mariquinha do Ó! ...

De súbito, cessaram os pregões quando a banda de música executou um vibrante dobrado e Neco de Maria Enfeitada começou a queimar os foguetes do Bernardo Calango. Era prenúncio da aproximação dos cavaleiros.

Surgem, afinal, os cavaleiros cristãos em primeiro lugar, em torno do seu rei, embaixador e princesa, todos montados em corcéis ricamente ajaezados, os homens usando dolmans azuis, calças brancas, botas de montaria, armados de lanças enfeitadas de fitas multicores, espadas e pistolas a cinta. Dirigem-se para o lado do palanque, onde se instalam o rei, a princesa e o embaixador. Em seguida aparece o grupo mouro precedido do seu soberano, o major Exupério e respectivo embaixador. Seus dolmans são vermelhos para se distinguirem dos cristãos, assim como o revestimento dos arreios, que é também encarnado.

Compareceram também o ‘espia’, que se foi alojar na palhoça, e o ‘careta’, um cavaleiro avulso, apalhaçado e mascarado, como se fosse o bobo do rei.

O entusiasmo era grande e empolgava a todos sem embargo, entretanto, da bisbilhotice característica do sertanejo, que tudo esquadrinha, comentando a seu modo, mansa e pacificamente, as menores coisas, mas com regular dose de jocosidade.

- Ói, Tião, ói o Bento Cafubá no palanque do Siô Juca Feroz.
Véerge! Ta que nem cabe um alfinete e ‘pelado’ véi dos infernos,somentes porque o coronel Nolasco cumprimentou ele.

Deixe ele, coitado. Está matando a saudade do tempo em que foi embaixador. Hoje, com aquela perna esquecida perdeu o ‘prestígio’ prá correr.

O coronel Nolasco era o rei cristão. Figura desempenada, boa altura e têz clara, usava uma bigodeira bem frisada e um andó. Às vezes, algum ‘estrepe’ mais irreverente se aventurava a chamá-lo de‘barba de bóde’ não encontrando, porém, guarida mesmo entre os seus companheiros. Desempenhava satisfatoriamente o seu papel, o que vinha já fazendo há anos, podendo considerar-se como a figura central daquele tradicional torneio. Sabia na ponta da língua o que teria a dizer quando fosse assaltado o seu castelo pelo rei mouro.

Não acontecia o mesmo, porém, com o major Exupério, caboclo estabanado e bom peão, mas pouco versado em matéria de letras.

Velha ‘diferença’ do Bento Cafubá, este não tirava os olhos do seu adversário sem perder os menores detalhes da sua atuação na doce e ansiosa expectativa de um completo fracasso. Os debates eram longos e não seria possível ao major guardar em sua cachola primária todo o fraseado empolado do dramalhão medieval. Acompanhava com indisfarçável interesse os vai-e-vem das personagens integrantes da cena que ia em breve se desenrolar.

- Ta na hora dos debates, seu Juca. Ancê põe sentido no que vai fazer o véi Exupério. Prá mim, ele vai ter um ‘fracasso’.

Acometem os mouros, seu rei à frente, para tomar ‘de surpresa’ o castelo e levar à viva força a princesa. Seguem-se os primeiros diálogos,
saindo-se com toda a naturalidade o coronel Nolasco. Já o major Exupério, antevendo a breve e inevitável tomada da princesa, deixava-se empolgar pelo arrebatamento emprestando mais ênfase a outras frases que se sucederam, as quais já cheiravam a invectivas:

- ‘Insolente cristão! Não obstante terdes falado atrevidamente, declaro: Eu sou o rei da Turquia, perseguidor dos cristãos! Governo os astros, governo a terra e toda a força humana vem tombar aos meus pés. Nasci pagão e pagão hei de ‘morrerei’. Nas guerras me nutri e nelas prendo a perder o medo da morte’.

Bento Cafubá, esfregando as mãos de contente, grita entusiasmado para o Juca Feroz.

- ‘Hei de morrer’, seu Juca!
- Deixa de ‘bestage’, menino. Ainda é cedo prá isso.
- Não é isso não, seu Juca. É o velho que já começa a errar o papel,‘distiorando’ o tempo do verbo. Já começa a feder o ‘disgramado’. Seguem-se outros lances, ao cabo dos quais a princesa, tentando suicidar-se, é obstada pelo rei mouro, compelida depois a segui-lo.

Exclama:
- ‘Meu Deus! Que será de mim! Amparai-me! ...’
- Nesse momento Juca Feroz não se conteve, desabafando:
- Miserável! Se eu tivesse no lugar de compadre Nolasco, tu não levava a princesa no fácil, ainda que fosse preciso espichar teu couro!
- Não se altere não seu Juca, que isso é do papel. Ela tem que voltar de novo e no fim tudo vai dar certo. – disse o Bento Cafubá para acomodá-lo.

Uma salva de palmas da parte dos torcedores do major Exupério coroou sua saída triunfal levando consigo a princesa, ao som de um dobrado da banda Euterpe e ao espoucar de foguetes. Juca Feroz não deu de mão às armas porque estava desprevenido. Ficara previamente estabelecido que ninguém as conduziria naquele dia, deixando-as em casa.

Bento Cafubá acompanhou lívido o desenrolar dos outros lances antes do entrevero final em que teria lugar a derrota do exército mouro.

Antes de se ferir a batalha houve sucessivas trocas de mensagens verbais por intermédio dos embaixadores de um e outro soberano. O rei mouro, cada vez mais cheio de empáfia, respondia com arrogânciaàs intimidações do embaixador. Sua exaltação atingiu o clímax quando este, usando do mesmo diapasão, disse, brandindo raivosamente a lança em tom de provocação:

- ‘Eu sou o Embaixador Cristão, que venho da parte do meu Rei dizer-vos que entregueis a sua filha ou que vos rendais à fé católica e que, se o contrário fizerdes, estará disposto a atravessar-vos com sua vencedora espada’.

Antes esse ultimatum, o major Exupério perdeu de vez o domínio de si.

Dirigiu-se furioso ao embaixador cristão e começou a gaguejar porque se esquecera naquele momento do que deveria responder de acordo com a deixa:

- ‘Atrevido embaixador... ousadamente me deste a... a tua embaixada. Volta e diz a teu rei que... que... vai à....’

O nomaço saiu com grande estardalhaço sob o estrondo de uma gargalhada contagiante que empolgou toda a assistência.

O embaixador cristão sorriu e disfarçou. Deu de rédea e volveu ao seu soberano para transmitir a resposta, não a real, porque o rei mouro, ao invés de enunciá-la, cobriu de pesado labéu a rainha mãe.

Cessada a agitação motivada pela mancada do major Exupério, as outras partes da peça tiveram seu desempenho normal, rematando a última com a apresentação do rei mouro depois da estrondosa derrota. Humilhado, em frente ao palanque do rei cristão, dirigiu-seà princesa:

- ‘Eis-me submisso aos vossos pés, soberana princesa. Maior dos mortais, fui finalmente vencido por vosso pai porque sómente êle poderia fazê-lo. Eu me sujeito aos vossos preceitos e juro fidelidade às vossas leis’.

Seguiram-se as corridas para tirar argolinha e tudo acabou bem.

Contudo, ainda pairava uma dúvida no espírito de Juca Feroz. Pediu esclarecimentos ao Bento Cafubá:

- No final, esse ‘suplicante’ depois de andar de deu em deu com uma moça donzela ‘arreparou’ o mal? Quero saber como é que ficou esse acerto.
- Uai, seu Juca! Foi batizado e depois se casou.
- Prá mim, não está bem certo esse final. ‘Vadiação’ dessa natureza padece sangue. Compadre Nolasco devera de ‘sentar’ nele a ‘ferrage’ com aquele espadagão que tinha na cintura. Aliás, essas espadas da guarda-nacional, que foram feitas prá brigar, acabam perdendo a serventia. Enfim, como lá diz, ‘em todos causo, causo’. Deixa prá lá.

Acabou-se a festa memorável. Bento Cafubá, impando de satisfação, reassumiu seu lugar na farmácia do Nandú, onde se vingou das humilhações do major Exupério fazendo com incontida alegria a narrativa do seu fracasso”.



Itamaury Telles de Oliveira
Cadeira N. 84
Patrono: Newton Prates

DE DR. CHAVES A DARCY RIBEIRO

Montes Claros, cidade “da arte e da cultura”, numa síntese genial cunhada pelo saudoso jornalista e teatrólogo Reginauro Silva, sempre foi um celeiro de grandes talentos.

Não é de hoje que a gente forjada no sertão norte - mineiro vem-se destacando não só em meio aos montanheses, mas muito além das montanhas de Minas, deixando rastro luminoso de perene brilho, nos variados campos do saber.

Tirante o evidente “jucapratismo” - bairrismo que nos é peculiar, inaugurado pela destacada figura de Juca Prates, para quem, devido ao seu acendrado amor pela terra natal, Montes Claros e seus números demográficos e econômicos eram vistos sempre com lupa de alta capacidade de ampliação -, a cidade é berço de destacadas figuras.

O montes-clarense de maior expressão nacional, que a história registra, e até hoje insuperado, é o jurista Antônio Gonçalves Chaves, filho do Cônego Chaves – que administrou a cidade por 12 anos ininterruptos. O Dr. Chaves, que seus conterrâneos o homenagearam dando seu nome à principal praça da cidade – a da Matriz -, foi Presidente das Províncias de Santa Catarina e de Minas Gerais (cargo que equivale ao de Governador, atualmente). Em 1890, foi eleito ao Congresso Constituinte Nacional, sendo aclamado primeiro Presidente da Câmara dos Deputados Federais. Quando se organizou o Código Civil, ficou a seu cargo o capítulo sobre “Direito de Família”. Rui Barbosa, em discurso, certa vez, chamou o Dr. Chaves de “mestre de Direito Civil”. Foi depois eleito Senador Federal pelo Estado de Minas Gerais, exercendo o mandato até 1903. Foi um dos fundadores e Diretor da Faculdade de Direito de Minas Gerais. Em 1906, foi eleito para o Senado Estadual Mineiro, cuja presidência ocupou, até sua morte, em 1911.

No jornalismo, muitas estrelas montes-clarenses brilharam em redações de jornais belorizontinos, com destaque para Newton Prates, que acolheu e orientou, no extinto Diário da Tarde, o imberbe Rubem Braga, e o transformou no maior cronista brasileiro. Em determinada cerimônia, quando Braga recebia os louros de ser o Príncipe dos cronistas brasileiros, não se esqueceu de agradecer àquele que considerava o Rei da Crônica, o montes-clarense Newton Prates.

Também nos Diários Associados, mais especificamente na redação do Estado de Minas, até hoje é lembrado um dos mais destacados editorialistas daquele jornal, o montes-clarense Hermenegildo Chaves, conhecido mais pelo epíteto de Monzeca.

Em tempos mais recentes, muitos repórteres, egressos de O Jornal de Montes Claros e do Diário de Montes Claros, atuaram, com raro brilho, em redações de jornais da Capital, conquistando prêmios de abrangência nacional com suas reportagens.

Nas letras, escritores como Cyro dos Anjos e João Valle Maurício ocuparam uma cadeira na Academia Mineira de Letras. Atualmente, o grande representante de Montes Claros, na Academia Mineira,é o jornalista e escritor Manoel Hygino dos Santos – um prolífico cronista diário, autor de livros de grande aceitação pelo público leitor.

Onde Montes Claros se destaca, em nível nacional, todavia, é na Academia Brasileira de Letras. A cidade é das poucas do interior do País a ocupar, por duas vezes, uma cadeira na Casa de Machado de Assis. Primeiro, com o escritor Cyro dos Anjos, que ocupou a cadeira no. 1, em 1969; depois, com o antropólogo Darcy Ribeiro, eleito para ocupar a Cadeira no. 11, em 1992.

Enquanto os romances de Cyro dos Anjos foram equiparados, em qualidade, aos de Machado de Assis, Darcy Ribeiro - com obras traduzidas para diversos idiomas - figura entre os mais notórios intelectuais brasileiros.

Como se vê, é com sobra de razão que o montes-clarense se ufana com a grandeza de sua gente...

Ao contrário de outras cidades, que erigem monumentos a seus imortais, Montes Claros está em débito não só com Cyro dos Anjos, mas também com Darcy Ribeiro. Ambos merecem estátuas em logradouro público, para que seus admiradores possam fazer “selfies” interagindo com “eles”.

Sugeri, há tempos, que Cyro fosse homenageado com estátua, sentado em banco a contemplar o Solar dos Oliveira – onde morava a“Menina do Sobrado”; e Darcy, com estátua na entrada do “Campus” da Unimontes – que leva o seu nome – com aquela imagem descontraída que ilustra a capa de “Confissões”, seu último livro.

Numa era em que a Prefeitura enche praças e avenidas com gigantescas borboletas metálicas, homenageando destacadas figuras femininas locais, está na hora de serem lembrados os imortais da Academia Brasileira de Letras, que nasceram sob a sombra de tuas asas...


Lázaro Francisco Sena
Cadeira N. 55
João Luiz de Almeida

OS SETENTA ANOS DA ACI

Dia 30 de dezembro deste ano de 2019, a Associação Comercial, Industrial e de Serviços – ACI de Montes Claros está completando 70 (setenta) anos de fundação e exercício de suas atividades nesta cidade. É um marco notável, que precisa ser registrado nos anais do Instituto Histórico e Geográfico – IHGMC, para conhecimento da posteridade.

A cidade de Montes Claros, pela sua privilegiada situação geográfica, já nasceu sob a égide de entreposto comercial da região, desde os tempos coloniais do ouro e do diamante, quando se transformou no maior fornecedor de produtos agropecuários para exploração e manutenção das minas. E o exercício dessa sua pioneira vocação logo despertou a necessidade de criação das primeiras indústrias, muitas delas de caráter rudimentar e artesanal, como eram os curtumes para couros de gado bovino. Mas o “campo” era propício para o desenvolvimento das duas atividades, tanto a comercial como a industrial, criando-se logo a necessidade de organização e controle, para evitar a desordem em seu crescimento.

EXPERIÊNCIAS ANTERIORES

Conforme registram os historiadores Hermes de Paula, em sua obra “Montes Claros: sua História, sua Gente e seus Costumes”, e Henrique de Oliva Brasil, com a sua “História e Desenvolvimento de Montes Claros”, há mais de setenta anos a cidade já vivenciara a criação de algumas entidades associativas voltadas para as atividades comerciais, sem lograr continuidade, por motivos diversos. Em 1905, por iniciativa de Antônio Augusto Teixeira, foi criada uma entidade patronal associativista, que nem iniciou suas atividades, talvez em razão da inexperiência e falta de conhecimentos específicos dos associados. Em 12 de setembro de 1920, o professor Cícero Pereira reuniu alguns comerciantes, para retomar o ideal de associativismo, levando adiante o ideal de Antônio Augusto Teixeira e criando a primeira associação de Montes Claros, contando com nomes importantes da época para sua diretoria, como o presidente Francisco Ribeiro dos Santos. Sabe-se que uma de suas conquistas foi o fechamento do comércio aos domingos, depois do meio-dia. Embora com bom trabalho, essa entidade também não prosperou. Em 14-01-1935, criou-se mais uma instituição, denominada Associação Comercial de Montes Claros, sob a presidência de João Paculdino Ferreira. Essa associação apresentou bom desempenho, como foi a criação da Escola de Comércio da cidade, mas não motivou os seus associados, encerrando suas atividades, por falta de interesse e frequência. Só mais tarde, por iniciativa do Rotary Club, a associação voltou ao debate público, como órgão necessário ao desenvolvimento de Montes Claros.

O RENASCIMENTO

Consta do artigo 1º de seu estatuto que a entidade associativa foi “reorganizada aos trinta dias do mês de dezembro do ano de 1949”, com o nome de “Associação Comercial de Montes Claros”. Essa, portanto, seria a data oficial de sua “reorganização”, consideran

do que outra entidade homônima já então existira, “fundada” em 14 de janeiro de 1935. Acredita-se que essa última data não prevaleceu, em razão da falta de um estatuto próprio, que fosse registrado em cartório.

A seguir, transcrição dos artigos 100 e 101 do estatuto em vigor, com termo de aprovação pela Assembleia Geral realizada em 28 de janeiro de 1951. O nome do secretário não aparece no termo, mas a grafia apresenta alguma semelhança com a assinatura do presidente Plínio Ribeiro dos Santos. Embora se faça referência à ata da reunião, que teria sido lavrada em “livro competente”, tal livro não foi localizado na sede da ACI:

***
SEDE PRÓPRIA: O GRANDE DESAFIO

Conforme se pode verificar na relação de assinaturas do termo de aprovação de seu estatuto, a nova Associação Comercial de Montes Claros renasceu forte, pela presença e participação das principais lideranças da cidade na assembleia geral realizada em 28 de janeiro de 1951. O passo seguinte seria a construção da sede própria. Após exercer a presidência durante o biênio 1950/1951, o professor Plínio Ribeiro passou o cargo para o comerciante Antônio Loureiro Ramos, que assumiu a responsabilidade por aquela obra. Com esforço, dedicação e exemplos, o novo presidente conseguiu o apoio e a colaboração dos associados e, durante os cinco anos de seu alongado mandato, conseguiu construir um majestoso prédio de três pavimentos, situado na rua Carlos Gomes, nº 110, mesmo local onde ainda se encontra, por sinal, bastante imponente. A inauguração da sede própria aconteceu a 16 de julho de 1955, em solenidade festiva, com a participação do governador do Estado, o doutor Clóvis Salgado, que substituiu o titular Juscelino Kubitschek, em campanha para a eleição de presidente da República.

A SUDENE COMO PARCEIRA

A partir de 1959, com a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste-SUDENE, cuja área de abrangência incluía também o Norte de Minas, a Associação Comercial se transformou em parceira daquela autarquia federal, pois as duas instituições visavam a um mesmo objetivo: o desenvolvimento econômico e social da região. Quando a SUDENE aqui chegou, instalando o seu escritório em 1965, já encontrou uma Associação Comercial consolidada, conhecedora dos problemas regionais que emperravam o seu desenvolvimento, como era a carência de energia elétrica para implantação de grandes projetos. Essa questão, porém, ficou solucionada, com a ligação da rede de transmissão diretamente de Três Marias, naquele mesmo ano de 1965. Estava, portanto, criada uma parceria bastante promissora. Como a maioria absoluta dos projetos aprovados com os incentivos fiscais e os benefícios da SUDENE eram de caráter industrial, não restou outra alternativa à Associação Comercial senão assimilar esse novo segmento do progresso e transformar-se em Associação Comercial e Industrial. A consequência esperada da parceria logo se fez sentir, com a cidade se transformando em metrópole regional a exigir o surgimento de inúmeras prestadoras de serviços, pelo seu progresso e crescimento. Mais uma transformação, agora para Associação Comercial, Industrial e de Serviços – ACI de Montes Claros.

FENICS: EVENTO MAIOR

A Feira Nacional da Indústria, Comércio e Serviços – FENICS de Montes Claros, realizada anualmente pela ACI, transformou-se em evento de caráter nacional, trazendo para a cidade as amostras mais notáveis das inovações tecnológicas que promovem o desenvolvimento e gerando um ambiente de negócios altamente favorável para todos os participantes. Neste ano de 2019, entre os dias 12 e 15 de setembro, realizou-se a 24ª edição da FENICS, no parque de exposições

João Alencar Athayde, ocupando uma área de 12.000 metros quadrados,
somente para a instalação dos 250 estandes, todos eles comercializados
para os expositores interessados. Assim como as “Festas de Agosto”, a “Exposição Agropecuária” e a “Festa do Pequi”, a FENICS já se incorporou ao calendário dos grandes eventos anuais capazes de mobilizar toda a sociedade montes-clarense.


Newton Carlos Amaral Figueiredo

PARABÉNS, ACI, PELO SEU ANIVERSÁRIO!

O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, como observador do processo desenvolvimentista do presente, para se transformar em guardião da memória histórica no passado, vem cumprimentar essa mola mestra do desenvolvimento regional, a Associação Comercial, Industrial e de Serviços – ACI, pelo seu aniversário, na pessoa de seu atual presidente, o doutor Newton Carlos Amaral Figueiredo.

Não importa quanto tempo de atividades estamos festejando, mas a marca dos setenta anos de trabalhos ininterruptos e produtivos realmente merece muita comemoração.



Leonardo Álvares da Silva Campos
Cadeira N. 97
Patrono: Urbino Viana

GLACIAL DE JEQUITAÍ
(OU A POSSÍVEL EXTINÇÃO DO HOMEM)

A expressão era do gelo, ou idade do gelo, período glacial ou era glacial designa um período geológico de longa duração de diminuição da temperatura na superfície e atmosfera terrestres. Nela se verifica uma expansão dos mantos de gelo continentais e polares, como também dos glaciares alpinos. No decorrer de um período glacial de longa duração ocorrem períodos com clima extra-frio, conhecidos por glaciações. Em termos glaciológicos, o termo era do gelo mostra extensos mantos de gelo em ambos os hemisférios, norte e sul. A Terra ainda se encontra numa era glacial, uma vez presentes os mantos de gelo da Groelândia e da Antártida.

Era do gelo diz respeito ao mais recente período de frio extremo, com extensos mantos de gelo sobre a América do Norte e Eurásia. O último máximo glacial se deu há cerca de 16 mil/20 mil anos, ocasião em que enorme área onde hoje estão Nova York, Boston, Montreal e Vancover, na América do Norte, estava totalmente coberta de gelo, o qual se estendia por grande parte da Europa e o norte da Ásia. Na Suécia, a última glaciação se deu há 9.000 anos, e na região sul de Ontário, há 13.500 anos.

Por ocasião de maior recrudescimento verificado quando do final da glaciação de Würm, entre 16.000 a.C. e 11.000 a.C., o homem asiático, ou mongoloide (Homo sapiens primitivo), atingiu a América do Norte pelo Esteito de Bhering. Regredindo então o fenômeno, há cerca de 10.000 a.C., passando o continente americando a tropicalizar-se vagamente, esses asiáticos caçadores já tinham se espalhado pelo planalto, Centro, norte e Sul, formando-se na Amazônia, ainda desabitada, sua floresta tropical que persiste até presentemente.

A propósito, “Luzia” não passou de um blefe, ou mesmo uma fraude científica, a manipulação de um crânio do homem pré-histórico de Lagoa Santa, por imagens computadorizadas, dando-o como um tipo negroide, isto agora, em pleno Terceiro Milênio.

A população primeva de lagossantenses sempre foi estudada e respeitada nos meios científicos como de ascendência asiática, o que sempre subsistiu desde os tempos do seu descobridor, o naturalista dinamarquês Peter Lund, isto ainda no século XIX.

Cientistas norte-americanos viam a deturpação por computadores do tipo morfológico uniforme de um asiático para negroide com bastante reserva. O restabelecimento da verdade veio depois com uma nova reconstituição da face do nosso primeiro ameríndio, além de exames de DNA em fragmentos do crânio de “Luzia”, quando tudo voltou ao status quo ante: eram todos mongoloides (asiáticos).

A fraude mais conhecida envolveu o “Homem de Piltdown”, em 1912, quando se teria achado na cidade inglesa de Piltdown o crânio do “elo perdido” na evolução de supostos macacos para o homem. Somente 40 anos depois, percebeu-se que aquele crânio de Piltdown, então escondido dos pesquisadores, não passava de um embuste visivelmente
grosseiro. Ele não passava de um crânio humano moderno com uma mandíbula de orangotango. Somente em 1983 chegou-se ao provável responsável pela fraude. Seria sir Arthur Conan Doyle, autor de romances policiais.

Sítios arqueológicos entre 12 mil e 7/8 mil anos multiplicamse. Na hoje chamada região arqueológica de Lagoa Santa, o que se constatou foi a presença de uma população homogeneamente de origem asiática, denominada de “homem de Lagoa Santa”, inclusive na Lapa Pintada, na parte setentrional de Minas Gerais (Montes Claros).

Há dados de uma população mais recente e de características diferentes em Januária, Itacarambi e Montalvânia, porém, de tempos mais recentes, com o achado de dois esqueletos humanos e silos para guardar mandioca, milho, feijão, urucum, coquinho e até folhas de fumo para secagem.

Saliente-se mais que as glaciações e perídos interglaciais sempre acompanharam a Terra, mesmo antes do aparecimento de mamíferos, como nós, surgindo nela ciclicamente. Registre-se, de passagem, que quase 50 teorias tentam explicar a ocorrência cíclica de tal fenômendo em nosso planeta.

Possivelmente entre 750 e 580 milhões de anos atrás, este planeta esteve completamente congelado. Calcários formados naquele período comprovam sua formação em águas bastante geladas, sendo que os minerais apresentaram falta de oxigênio, condição climática glacial responsável pela extinção de quase toda forma de vida de então. A fronteira entre o Permiano e o Triássico registra a maior extinção em massa verificada na Terra, com 95 por cento das espécies dizimadas.

A segunda maior extinção em massa da histórica física da Terra se deu há 450/440 milhões de anos. Durante o Período Ordoviciano (compreendido entre 488 a 443 milhões de anos, sucedendo o Cambriano
e precedendo o Siluriano), mais de 75 por cento das espécies marinhas desapareceram coincidindo com um período glacial, ocasião em que as temperaturas diminuíram e as geleiras dominaram a paisagem.

O estudo do paleoclima se mostra difícil para aquilatar as mudanças na temperatura dos oceanos e nos blocos de gelo continental, mas o somatório de tudo é importante para explicar a extinção em massa, uma vez que, com mais água congelada, o nível do mar diminui, reduzindo o habitat marinho.

O período Carbonífero terminou com uma era do gelo que atingiu a maior parte do hemisfério sul. E no início do Permiano, o mesmo hemisfério sul ainda permanecia tomado pela mesma era do gelo. Quando esta terminou, os continentes foram dominados por um período desértico, com florestas virando desertos.

Seth Finnegan, da equipe de pesquisadores liderada pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), principal autor de artigo publicado na edição on-line da revista especializada “Science”, tratou da relação de mudanças climáticas com a extinção de organismos vivos:

“Descobrimos que taxas elevadas de mudanças climáticas coincidem com a extinção... Mas, na época das glaciações, os termômetros baixaram cinco graus, fazendo com que as geleiras crescessem no continente Gondwana mais de 150 milhões de quilômetros cúbicos – um tamanho maior do que as geleiras que cobriam a Antártida e o Hemisfério Norte durante a última glaciação da era moderna, há cerca de 20 mil anos. Nosso estudo fortalece a ideia de que a mudança climática foi responsável pela extinção.”


Esclareça-se que Gondwana era a porção sul da Pangeia, cuja parte norte ficou conhecida como Laurásia. Com o movimento continuo de suas placas, Gondwana chegou ao que temos hoje: a América do Sul separada da África; a Índia se juntou a Ásia; e Oceania se tornou um continente cheio de ilhas, com a Austrália sendo uma porção bem distinta. A Antártida se isolou no polo sul, ali se encontrando até hoje.

Outra extinção em massa por força de mudança climática se deu há 50 mil anos, quando os grandes mamíferos praticamente foram desaparecendo da Terra. Bisões, cavalos selvagens, mamutes, rinocerontes lanosos, renas e bois almiscarados, animais comuns na América do Norte e Eurásia (continente que reunia as atuais Europa e Ásia), começaram a declinar entre 36 a 72 por cento. Foi quando tivemos a última era do gelo, durante o Pleistoceno, que durou de 2 milhões a 12 mil anos atrás.

Foi em um período glacial que apareceu o Homo sapiens neanderthalensis, entre 100 mil e 40 mil anos atrás, ocupando pequena faixa do Velho Mundo, entre a Europa Ocidental e Oriente Médio, região geográfica em que seus traços biológicos se mostram de forma incontestável, como no “velho” de La Chapelle-aux-Saints. Seu primeiro esqueleto foi encontrado numa caverna do Vale de Neander, na Alemanha, em 1856.

Era estupendamente especializado para ocupar regiões geladas de sua respectiva era glacial. Entre meados e o declínio propriamente dito do fenômeno, ele ainda se miscigenou com outros tipos humanos, desaparecendo então.

Mas deixou em praticamente toda a atual população mundial alta carga de seus genes, como foi comprovado por estudos recentes usando DNA antigo e a sequenciação do genoma do Neanderthal. Assim se comprovaram variantes genéticas semelhantes aos neandertais em populações atuais de europeus e asiáticos.

Acresce notar que inúmeros fósseis humanos classificados como Homo erectus ou Homo sapiens primitivo (Homo sapiens neanderthalensis) acabaram sendo considerados formas transicionais entre as duas espécies. O Homem da Rodésia, tido a princípio como um“neandertal tropical”, acabou classificado como forma de transição generalizada. Na melhor vertente neandertalense estão os homens de Steinheim e Swanscombe.

O homem de Cro-Magnon, que foi o Homo sapiens mais antigo, também enfrentou o mesmo período glacial, convivendo com animais, agora extintos, como mamutes, leão das cavernas e cervos gigantes, entre outros. Acredita-se que os frequentes combates dele com os neandetais é que levou os últimos ao desaparecimento.

O que é hoje a América do Sul, na qual está o território brasileiro, passou por diversos efeitos decorrentes da ascensão e recuo do nível do mar. As geleiras são parte integrante desse ciclo da água, registrando as condições climáticas globais ou localizadas dos continentes respectivos.

O território brasileiro guarda testemunhos de diferentes glaciações, algumas delas ocorridas há milhares de anos, e outras, há milhões de anos. Entre as mesmas, sendo umas mais duradoras e outras menos, tivemos algumas de abrangência mundial e outras, limitadas a certas regiões do atual território brasileiro.

Tilito é o nome dado à rocha endurecida que teve origem no acúmulo dos detritos levados por uma geleira, e, tratando-se de rocha ainda não consolidada, formada recentemente, o nome que recebe é till. No verão, ou na época mais apropriada para o degelo, há enorme sedimentação de grãos sílticos. A este sedimento rítmico consolidado tem-se a designação do varvito.

Em Itu, Estado de São Paulo, o varvito tem exploração para pavimentação, sendo vulgarmente conhecido por laje de Itu. O varvitoé encontrado frequentemente associado a seixos glaciais, estes originados
da fusão de blocos de gelo que boiavam sobre os lagos onde se sedimentava o varvito.

Rochas moutonnés, de origem glacial, são registros típicos da erosão glacial, ocorrendo entre os atuais municípios de Salto e Itu, em São Paulo, conhecendo-se apenas outra, de mesma idade, na Austrália.
Há cerca de 250 milhões de anos, o Sul-Sudeste da América do Sul possuía amplas geleiras, estendendo-se a outras áreas do globo,
que deram origem a tais rochas moutonnés. Vimos essa ocorrência em Salto. Existe nesse município paulista o Parque da Rocha Moutonné, em antiga pedreira de varvito, rocha sedimentar que, refrisando, é de origem glacial.

“Descobrir os vestígios dessas ocorrências, descrevê-los e caracterizá-los constituem uma especialidade dos estudos geológicos e da tectônia.
E as teses defendidas pelos pesquisadores nem sempre são concordantes nas suas conclusões. O que vem trazer uma nova pitada de mistério neste aspecto da história da Terra”, conforme Afonso José de Almeida-Manso, em seu trabalho “O Jequitaí das Geleiras” (parte integrante da coletânea“Geleiras, flores e velhos caminhos”, BN/EDA/DF, 2011, nº 234).

O autor acrescenta, trazendo à baila um desses fenômenos no atual setentrião mineiro, em lugares que visitamos com frequência há anos, em observações de conglomerados diversos de origem glacial remontando ao Pré-Cambiano Superior:

“O vale do rio Jequitaí, situado na região central de Minas Gerais, guarda significativos testemunhos de uma glaciação ocorrida há milhões de anos, conforme estudos publicados por cientistas de universidades...
Segundo alguns pesquisadores, tal fenônemo teve lugar durante o intervalo sturtiano da idade proterozoica, há mais de 700 milhões de anos. Ou seja, durante o denominado ciclo brasileiro, que se estendera entre 1.050 milhões e 450 milhões de anos atrás.

E, cabe lembrar, esse ciclo constituiu fase essencial do processo de formação da placa tectônica que veio a dar origem ao atual continente sul-americano. Uma longa história, portanto. Assim, não deixa de ser admirável que, ainda hoje, marcas, testemunhos, ícones daquele fenômeno climático possam ser constatados e facilmente observados nos terrenos dos municípios de Jequitaí e Francisco Dumont.”

Condições climáticas e deposicionais do Meso/Neoproterozoico da borda oeste do cráton São Francisco revelam registros de destaque na Formação Jequitaí, situada na base do Grupo Bambuí. Em talformação, na região do município de Vila Boa, existe uma ocorrência que se mostra em contato dissonante nas diversificadas unidades que compõem o Grupo Paranoá, com descontinuidade lateral. Estudos demonstraram uma sequência basal de camadas métricas de arenito e grauvacas sobrepostas por uma camada decamétrica de diamictito maciço, seguindo-se uma camada métrica de arenito calcífero.

A observação sedimentar sugere a existência de depósitos glaciogênicos
assim mantidos em paleovales, os quais, preteritamente, passaram por rápidas inundações posteriormente à sua deposição. Panorama assim indica o registro de geleiras terminais ainda em condições continentais erodindo o Grupo Paranoá anteriormente à geração do Grupo Bambuí. Os registros petrográficos dessas rochas psefíticas vêm mostrar diamictitos ressedimentados e possíveis tilitos localizados.

São as conclusões do referido estudo e outros desses vestígios de uma glaciação que, nos primórdios da Terra, tingiu do branco das geleiras (como vemos hoje nos glaciares polares e alpinos) Jequitaí, Claro dos Poções (no seu distrito de Água Boa, sentido Triângulo Mineiro) e Francisco Dumont.

Também no núcleo populacional de Santa Bárbara, no município de Augusto de Lima, entre o Norte e região Central de Minas Gerais, cuja predominância é a Serra do Cabral e seus respectivos contrafortes basicamente em quartzitos, numa rápida visita que ali fiz entre os dias 30 e 31 de agosto de 2019, junto da minha filha Monalisa Álvares da Silva Campos, descobri uma pequena ocorrência de diamictito poucos metros atrás do lado direito da antiga fábrica de tecidos do lugar, tendo um lixão à sua frente e que impediu uma maior aproximação da minha parte. Avistei mais dois blocos com cristas de onda (riplles), testemunhando a existência de um mar interior em tempos antanhos, abaixo da cachoeira que existe no resort de Santa Bárbara. As respectivas ocorrências foram fotografadas por Monalisa Campos.

Obtive de um nativo a informação de ter sido descoberto nas proximidades das águas termais do resort um diamante negro com tamanho razoável, isto nos anos 90 do século passado. Este é um mineral formado de carbono puro, sendo a mais dura e brilhante das pedras preciosas. Após o achado, outros moradores andaram buscando mais desses minerais no lugar, não logrando êxito.

O corte de um morro, na Serra das Porteiras, quando das obras de construção da BR-365 (Triângulo Mineiro – Montes Claros), em Minas Gerais, é que trouxe à baila enorme formação rochosa cristalina, sob a forma de uma lente oval, esta, na verdade, retratando uma seção da formação rochosa que aí se estenderia por centenas de metros
de comprimento.

“Esse mesmo estudo aponta que junto ao Km 66 daquela rodovia (ou seja, a cerca de 30 quilômetros ao norte do acesso a Jequitaí), uma pedreira, ora desativada, fornece outro bom exemplo do diamictito formado pelas geleiras. Nesse local, o diamictito apresenta-se com aparência muito homogênea, de rocha muito endurecida, exibindo uma matriz cinza onde se espalham incrustações de pequenos clastos avermelhados”
(Afonso José de Almeida-Manso, estudo citado).
“Passando a ponte da MG-208 sobre o rio, à saída de Jequitaí para Francisco Dumont” – continua – “o viajante irá observar que o corte no morro, feito para dar passagem à rodovia, trouxe à mostra a constituição rochosa dessa elevação, o diamictito. Tratam-se de clastos, bolderes e seixos de constituição rochosa ou mineral variada, inseridos, em maior ou menor abundância, numa matriz feita de argila, silte e areia, tendo sido, toda essa massa, submetida ao peso e a ação da geleira que aí se assentava. Esse diamictito formara-se, portanto, na base da geleira. Em termos figurados, constitui-se a partir de massa barrenta e pedregosa que se encontrava à superfície, ou que então fora erodida, ou, ainda, que fora raspada do embasamento rochoso pré-existente e comprimida e empurrada pela imensidão de gelo que a tudo cobria.” (idem).

“Diamictito (sin. tiloide = semelhante a till). (Conf. Paraconglomerado).
Rocha conglomerática, com fragmentos grandes imersos e
dispersos em abundante matriz lamítica, síltico-argilosa, lembrando um tilito (tiloide), não ou mal classificada, não ou mal estratificada, siliclástica geralmente. O termo, usado por alguns autores como sinônimo de paraconglomerado, não tem implicação genética direta, aplicando-se a rochas de várias origens tais como tilitos (glaciais), paraconclomerados periglaciais, olistostromas (associados a deslizamentos e correntes de turbidez, por exemplo, lamito conglomerático elúvio-coluvional, lamito conglomerático de deslizamentos gravitacionais em áreas vulcânicas)”, conforme M. Winge (home page “Glossário Geológico”).

Diamictito é termo cunhado em 1960 para rochas pobremente selecionadas ou laminadas, sendo o termo puramente descritivo, sem conotação genética. Tem aplicação a rochas diversas, como, por exemplo, o tilito glacial.

Em que pese as referências aqui já feitas à Glaciação Jequitaí como base do Grupo Bambuí, em seu trabalho “Estratigrafia e Tectônica do Grupo Bambuí no Norte do Estado de Minas Gerais”, dissertação de mestrado (UFMG/Instituto de Geociências/Programa de Pós-graduação em Geologia), o autor Mário Iglésias Martínez, com orientação de Alexandre Uhlein, considera que aquela glaciação pretérita registrada no que é hoje o setentrião mineiro deveria ser vista como unidade em separado e discordante em relação ao Bambuí. Registrou:

“Couto e Bez (1978) discutiram a problemática da Glaciação Jequitaí e a sua inserção como base do Grupo Bambuí. Concluíram que a formação portadora de tilitos deveria ser considerada como uma unidade em separado, discordante em relação ao Grupo Bambuí. Na base do grupo ficariam apenas os conglomerados descontínuos e de pequena espessura, como o conglomerado Carrancas. Os tilitos Jequitaí passaram a pertencer ao grupo Macaúbas. Assim, esses autores confirmaram as observações de Oliveira (1967), que, baseado em critérios estratigráficos e paleoclimáticos, considerou a formação Jequitaí como unidade discordante em relação ao Grupo Bambuí. No presente trabalho tem-se optado pela exclusão da Fm. Jequitaí do Grupo Bambuí tomando em consideração esses mesmos argumentos.”

Referido trabalho, porém, traz abaixo uma tabela conforme Dardenne (in Lima, 2005), mostrando a divisão litoestratigráfica do Grupo Bambuí, ali constando a Formação Jequitaí, ao lado de outras cinco, como sendo de ambiente de sedimentação glacial, tendo como características litológicas paraconglomerado com matriz argilosa esverdeada e seixos de quartzitos, calcários, dolomitos, cherts, gnaisses, micaxistos, granitos e rochas vulcânicas.

Enfim, segundo J. G. Parenti Couto e Lauri Bez (in “A Glaciação Jequitaí: um Guia Estratigráfico para o Pré-Cambriano Superior no Brasil”, texto publicado na “Revista Brasileira de Geociências”, volume 11, 1981):

“A propriedade em se definir como “Glaciação Jequitaí” o fenômeno climático ocorrido no Brasil, no Pré-Cambriano Superior, deve-se em primeiro lugar à primazia da sugestão de Branner; em segundo, por situarem-se na região de Jequitaí as provas mais convincentes dessa glaciação; e, finalmente, por possibilitar, mais do que em quaisquer outros lugares, condições para se precisar o real posicionamento de tal período com base em novos dados geocronológicos do Grupo Bambuí (Couto, et al., op. cit.).
Os dados concretos sobre essa glaciação devem-se a Isotta et. al.,
que, em 1969, apresentaram provas convincentes de uma origem glacial para os conglomerados de Jequitaí, conforme assinala Hettich (op. cit.), que acrescenta, com ampla documentação, novas provas em favor dessa concepção. Assim, a região que bordeja a Serra do Cabral e se estende até pouco ao norte da localidade de Jequitaí, localizada na parte central de Minas Gerais, situa-se como o local onde mais se acumularam provas de
uma origem glacial para os inúmeros conglomerados do Pré-Cambriano Superior, tidos como de origem glacial, que ocorrem espalhados pelos Estados de Minas Gerais, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.

A idade dessa glaciação situar-se-ia, portanto, entre 640 milhões de anos (idade da base do Grupo Bambuí que se sobrepõe aos tilitos em Jequitaí) e 950 milhões de anos-1 bilhão e 350 milhões de anos (idade dos estromatólitos que se sobrepõem aos tilitos em Couto Magalhães).”


Registros de geleiras atuais do hemisfério norte revelam a formação de rochas pela atividade erosiva de rios subterrâneos. Estes correm sob as geleiras, em temperaturas diferentes, sendo que com a erosão da superfície são misturados os mais variados minerais, barro e areia, com o que novas rochas se originam.

Geleira, em outras palavras, é uma grande e espessa massa de gelo formada em camadas sucessivas de neve compacta e recristalizada, de várias épocas, em locais nos quais o acúmulo de neve é superior ao degelo, provocando erosão e sedimentação glacial.

Mister esclarecer que entre as características geológicas decorrentes das geleiras estão as morenas, ou moreias, terminais ou frontais, mediais, de fundo ou as laterais, que são cristas ou depósitos de fragmentos de rocha transportados pela expansão do gelo.

A presença de registros dessa vetusta geleira em Jequitaí e redondezas nos dá uma noção desse interessante fenômeno. A mencionada pedreira desativada em Jequitaí, junto ao km 66 da rodovia, fornece ótimo exemplo do diamictito formado pela referida glaciação: uma rocha homogênea e endurecida, de cor cinza e na qual se espalham incrustações de pequenos clastos avermelhados.

Visitamos uma pequena caverna em Coração de Jesus, no Norte de Minas Gerais, em meados de 2018 e fevereiro de 2019, município em que predomina o calcário.

De antemão, esclareça-se que o nosso calcário é uma rocha sedimentar
do Grupo Bambuí da Formação Sete Lagoas, datado do Pré-Cambriano Superior, no caso restringindo-se a 600 milhões de anos.

O Pré-Cambriano é a mais antiga e longa das eras geológicas, estendendo-se desde a formação da Terra, há 4,5 bilhões de anos, até 570 milhões de anos atrás. Foi nela que os cientistas acreditam que o mar se desenvolveu, tendo abrigado os mais importantes eventos da história da Terra, como o início do movimento das placas tectônicas; o início da vida; o aparecimento das primeiras células eucarióticas; a formação da atmosfera; o aparecimento dos primeiros animais e vegetais; a formação de escudos cristalinos (rochas magmáticas e metamórficas) e dos escudos cristalinos (brasileiro e guiano); a formação de minerais metálicos; a formação das rochas mais antigas; e a formação das Serras do Mar e da Mantiqueira.

O grupo Bambuí ocupa quase 1/3 de Minas Gerais e detém importantes recursos minerais, como zinco, chumbo, fosfato, ardósia, fluorita, calcário (predominância de mais de 30% de carbonato de cálcio), calcário dolomítico (quando o mineral nele predominante é a dolomita), etc. A época de deposição do Grupo Bambuí é atribuída ao final do Pré-Cambriano.

A Formação Sete Lagoas, que tem enorme predominância sobre a Formação Bebedouro (também do Pré-Cambriano Superior), é tão grande que se torna praticamente a única representante do Grupo Bambuí. Essa rocha sedimentar estende-se do karts de Lagoa Santa rumo ao Norte de Minas Gerais e Sul da Bahia.

No entanto, tal caverna, descoberta por Ubirajara Macedo e que batizamos de Caverna Glacial, é sui generis, porque formada por depósitos glaciogênicos em um paleovale, após cujas deposições ela sofreu rápidas inundações, o que denota ali uma geleira terminal.

Ou seja, há registros no local de depósitos glaciogênicos em um paleovale, que passou por uma ou mais inundações após as deposições. A origem e idade dessa caverna inusitada, ao que tudo indica, estão entrelaçadas com o final da Glaciação Jequitaí (geleira terminal).

O recuo das geleiras fez surgir um provável ambiente marinho, como se comprova pelas marcas de onda (riplles) encontradiças em Jequitaí e circunvizinhanças, coincidindo com o início da formação propriamente dita dos maciços calcários do Grupo Bambuí, há 600 milhões de anos.

Ainda em Coração de Jesus, não muito distante da entrada da Caverna Glacial, quando muito 300 metros andando por esse mundo subterrâneo, alcançamos uma formação geológica de natureza totalmente diversa.

Isto é, deixando para trás aquelas paredes e tetos deposicionais, como quem vira uma página de um livro, chegamos a corredores e tetos inteiramente calcários, porém pobres em espeleotemas, havendo ainda uma claraboia (saída para o mundo exterior pelo teto).

Na verdade, são duas cavernas entrelaçadas e de naturezas distintas. A da entrada, formada no final da Glaciação Jequitaí, antecede em idade (640 milhões de anos ou pouco mais) a subsequente (pouco menos de 600 m.a.). Esta última é cerca de 2/3 maior, sendo constituída de rochas carbonáticas da Formação Sete Lagoas do Grupo Bambuí. Existe um riacho que, cortando ambas, chega ao mundo exterior pela boca da Caverna Glacial (ressurgência).

A exemplo da diversidade de rochas raspadas pela ação erosiva de rios subterrâneos sob as geleiras do hemisfério norte, a cavidade ora tratada é algo similar ao mesmo fenômeno, o que é possível concluir pela diversidade mineral arrancada e agregada àquilo que parece ter sido uma fenda na parte mais profunda de um paleovale, talvez então um mar interior raso.

Estão presentes nesse conglomerado sedimentar pequenos componentes arredondados, predominando seixos calcários (também registrados na Formação Jequitaí), seixos polidos de rochas diversas, também pouco quartzo hialino, algo parecendo argila endurecida e outros minúsculos minerais enegrecidos, escorrimentos no teto daquilo que na época foi um líquido cor de ouro muito brilhante, além de uma concha parcialmente recoberta de calcário, tudo ligado por material aluvionar.

A propósito de ouro, palavra a que nos referimos acima, estivemos mais uma vez na cidade de Jequitaí, nos dias 09 e 10 de agosto de 2019, quando ganhamos de presente do amigo, conterrâneo e excolega de escola, Edaílson Cordeiro, no segundo dia, um fragmento de diamictito com uma profusão de ouro em pó nele agregado.

O pedaço da citada rocha conglomerática com inclusão de ouro em pó foi encontrado em Jequitaí mesmo, algum tempo antes, por um garimpeiro, que erroneamente pensou tratar-se de uma rocha de granito. Imediatamente associamos esse achado com o líquido cor de ouro que observamos na Caverna Glacial de Coração de Jesus, município que não é aurífero.

E, pela manhã do segundo dia daquele passeio, nadando no Rio Jequitaí, que é dominado pelo diamictito, coletei na margem esquerda deste manancial uma inclusão de quartzos hialinos em tapanhoacanga, ou canga, esta uma concreção ferruginosa misturada com argila e areia, inteiramente imprestável à extração de ferro. Essa canga não existe nos diamictitos de Jequitaí, mas é extremamente comum em Coração de Jesus, relembrando mais as pequenas ocorrências do mesmo quartzo hialino nas laterais e teto da Caverna Glacial.

Tais achados seriam, com certeza, um elo da era do gelo entre as duas localidades, Jequitaí e Coração de Jesus.

Já a concha, alongada, assimétrica e côncava, com uns cinco centímetros, na qual se percebe nitidamente seu revestimento por uma “nata” calcária – ou seja, um calcário ainda líquido originariamente, o que presentaria seu estágio de formação, envolvendo o outro corpo e nele endurecendo como se fosse uma pintura minúscula -,foi ligada ao mundo marinho pelo físico, professor e entendedor de moluscos, o nissei Shigueo Watanabe, o qual não conheci e que esteve na caverna em questão com Ubirajara Macedo.

Mini Aurélio”, 8ª. “Concha [Latim. conchula.] sf. 1. Zool. Invólucro calcário ou córneo de muitos moluscos...” (edição, 2010, pág. 184).

A peça acima referida, segundo aquele estudioso, seria do Paleozoico (unidade de tempo geológico composto por eras), com início entre 542/416 milhões de anos atrás. Seu início compreende o Siluriano, Ordoviano e Cambriano, seguindo-se outros três períodos: Devoniano, Carbonífero e Permiano. Ou seja, ele teve uma duração de aproximadamente 540 milhões de anos a 250 milhões de anos atrás.

O período Cambriano é que registrou o surgimento de animais com carapaça, sendo os trilobites (grupos extintos de artrópodes marinhos paleozoicos) os principais, com 70 por cento dos fósseis de então.

A Terra se mostrava com domínio de seres microscópicos no Paleozoico. E, num período relativamente curto para a história do planeta, de cerca de 40 milhões, a evolução deu um salto, conhecido por “explosão cambriana”, começando a surgir seres pluricelulares e, depois, seres macroscópicos, como as plantas e os animais que alteraram profundamente o meio ambiente então existente.

Dito escorrimento de calcário por certo só se registrou exatamente no princípio da formação de tal rocha sedimentar, entre 620 milhões a 680 milhões de anos atrás, o que se sabe por análises isotópicas em regiões variadas do Grupo Bambuí.

Shigueo Watanabe também é de opinião que a concha, que creditou ter sido de algum molusco marinho, um animal invertebrado que ali teria vivido por volta de 600 milhões de anos atrás, ainda carece de maiores estudos para sua datação precisa. Mesmo porque o que se tem como certo é que os primeiros moluscos surgiram há uns 550 milhões de anos. É sugerida mesmo a existência do filo desde o período Pré-Cambriano.

Com efeito, se essa concha tem idade de mais de 540 milhões de anos, tendo sido quase que totalmente revestida por um calcário ainda solúvel, a mesma remontaria ao tempo da formação do nosso calcário Bambuí. A hipótese levaria a concha para antes do início do Paleozoico.

Os primeiros invertebrados provavelmente habitavam a areia e o lodo do fundo do mar há uns 600 milhões ou um pouco mais. O ambiente era propício para se esconderem e encontrar bastante alimento, que afundava na água. Há cerca de 550 milhões de anos, surgiram os primeiros moluscos (mollis = “mole”). Mesmo assim, há apenas hipóteses sobre a origem dos moluscos, sem convergência de opiniões.

Os invertebrados, o segundo maior grupo de animais em número de espécies (aproximadamente 100.000 espécies, suplantados apenas pelos artrópodes), foram representados mais cedo no registro fóssil, em curto tempo, o que é problema à análise de sua sequência evolutiva.

A classe dos cefalópodes, ou Cephalopoda, também é chamada de gastrópodes. Possui umas 700 espécies ocupando reservatórios ou seu fundo. A classe é dividida em duas subclasses. Os primeiros são o extinto amonites e nautiluses, que representam Chetyrekhabberny. A segunda categoria inclui choco, lula e polvo. Estes representam uma subclasse de coluna dupla. Frise-se que o corpo de moluscos distingue-se pela simetria bilateral. A concha está presente apenas em formas antigas, enquanto em outros representantes é rudimentar. Investigadores da Universidade de Bristol descobriram em Marrocos o fóssil de uma lesma com 480 milhões de anos, o que contribui para esclarecimentos pertinentes acerca da evolução dos moluscos, conforme
trabalho recentemente publicado na revista Nature.

Os sambaquis da costa brasileira, que são conchas e moluscos ali depositados por populações anteriores ao período histórico, encontram-se, em sua maioria, na região meridional. Enquanto os moluscos serviam de alimento, rico em proteína, suas conchas eram e ainda são utilizadas como ornamento. São hoje coletadas e mesmo cultivadas, daí a existência de indústrias de pérola e de adornos de madrepérola em diversos países.

Conclusivamente a este respeito, a bióloga graduada Mariana Araguaia arremata:

“Representantes do filo Mollusca. Os moluscos são animais predominantemente marinhos e de vida livre, podendo, inclusive viver fixos ou enterrados. Embora exista grande diversidade de espécies, todos apresentam um mesmo plano estrutural e funcional. São conhecidas aproximadamente 50.000 espécies viventes, divididas em oito classes - entre as quais se destacam a classe dos gastrópodes, pelecípodes e cefalópodes - e 35.000 fósseis.

Gastrópodes são representados por caracóis, lapas, lesmas terrestres e marinhas, búzios, lotirinas, lebres-do-mar e borboletas-do-mar.É a classe mais diversificada do filo. Quando possuem concha, é uma peça única, podendo ser enrolada. São geralmente vagarosos, devido ao peso desta, principal forma de defesa. Para alimentação, todos utilizam
rádula (órgão que permite ao animal raspar o alimento).

Pelecípodes, também conhecidos como bivalves, são representados pelos mexilhões, vieiras, ostras e teredos. Seus pés possuem forma de machado e há a presença de concha com duas valvas. A maioria são comedores de materiais filtrados e não possuem cabeça nem rádula.

Na classe dos Cefalópodes, lulas, polvos, náutilos e sibas são representantes, podendo ter conchas internas ou ausentes. São predadores ativos, encontrados em altas profundidades.

Este filo abriga animais de corpo mole (molusca) e com simetria bilateral; triblásticos (três folhetos embrionários) e não segmentados; com corpo revestido por um epitélio simples, com cílios e glândulas mucosas. Além disso, são protostômios (no desenvolvimento embrionário, formam primeiro a boca e, depois, o ânus) e possuem celoma, um espaço preenchido por líquido no interior do organismo que, no caso dos moluscos, está localizado ao redor do coração e ao redor das gônadas e dos rins.” (...).


Giro outro, fósseis de animais pluricelulares destituídos de conchas, chamados de anêmonas do mar e provenientes das Montanhas Mackenzie, no Canadá, existiram no período Ediacarano, que muitos cientistas preferem incluir no Paleozoico, ao invés do Pré-Cambriano. Vem do Folhelho Burgess, exatamente no Canadá, um conjunto especial de fósseis, mas nenhum parecendo se encaixar numa classificação estabelecida; chama a atenção a Wiwaxia, lembrando uma lesma coberta com uma malha de ferro.

O Ediacarano registrou seres estranhos com corpo mole, na Austrália e na Inglaterra. Mas minerais formados nesse período de tempo apresentam falta de oxigênio, sugerindo uma condição climática glacial a provocar o desaparecimento de quase toda forma de vida.

A concha encontrada aderida ao teto da Caverna Glacial suprarreferida,
com efeito, carece de maiores estudos, mesmo porque o
nissei antes mencionado sequer a classificou por seu nome científico.
De mais a mais, pelo que andamos verificando em parca bibliografia,
ela mais se parece às de mexilhões, e não de lesmas. Pelo menos foi a
nossa impressão.

Importante salientar que mexilhões vieram e vivem em conchas. No livro “Fóssil” (Editora Globo, ano não informado), nas páginas 10/11, podemos ler:

“1. MEXILHÃO VIVO. O mexilhão prende-se às rochas e superfícies duras por meio de filamentos bissais. As partes moles são envolvidas por duas conchas calcárias. Cada indivíduo pode passar a vida toda no mesmo lugar. Se se desprender, pode morrer, especialmente se for colocado em ambiente diferente. 2. DETERIORAÇÃO. Ao morrer, as conchas abrem-se como “borboleta”. As partes moles logo começam a apodrecer ou são devoradas por animais predadores. 3. O RIJO PERMANECE. Quando as partes moles já deterioraram, a concha, que é a parte rija, permanece. 4. PARA FOSSILIZAR. Conchas vazias às vezes são carregadas pela correnteza e acabam se misturando a seixos e areia para formar praias pedregosas. Alguns dos espécimes têm seu par de conchas ainda unido por um forte tecido (ligamento); em outros, esse ligamento partiu-se. O movimento constante do mar quebra as conchas e os pedaços podem ser enterrados e fossilizar lentamente. 5. MEXILHÃO FÓSSIL. Aqui, uma argamassa mineral liga os grãos sedimentares às conchas fósseis, dificultando o trabalho do pesquisador para retirar as conchas.”

De outro ângulo, ante a total ausência de diamictitos na Caverna Glacial (pelo menos em minhas pouco demoradas visitas naquele lugar nada percebi em tal sentido) e em suas proximidades, não se pode falar no peso de uma geleira em seu auge para a formação na sua base dessa rocha conglomerática. O “cimento natural” da Caverna Glacial lhe dá inteira sustentação. Ela aparenta ser muito frágil porque formada da agregação de materiais esparsos “cimentados” pela própria natureza, inexistindo uma rocha sólida inteiriça, como o calcário, para lhe dar sustentação, mormente quanto a seu teto, que parece prenunciar um desabamento num futuro próximo.

Estivemos em cima desse teto, portanto a céu aberto, e o cenário era de pastos, árvores miúdas e duas ou três reses. A região de Coração de Jesus está inserida no domínio das savanas-cerrados/campos gerais tropicais, conforme sua classificação fitogeográfica. Passando por baixo de uma cerca, descobrimos na outra manga após a estrada a saída da claraboia da caverna calcária.

A concha, encontrada no teto da Caverna Glacial e recolhida posteriormente para o museu de Coração de Jesus, se mesmo marinha, vem referendar, por outro lado, a origem de determinadas marcas de onda deixadas no sítio das geleiras, em Jequitaí, conhecidas nos meios acadêmicos como ripple marks: em sedimentologia, ondulações em forma de onda ou marcas de ondulações em forma de onda em sedimentos - arenito, calcário, siltitos e dunas, indicando agitação pela água ou vento.

Enfim, trata-se de uma caverna com rebotalhos de toda ordem,
alguns por certo arrastados de lugares distantes, o que é típico de uma
“terra arrasada” como causa ou efeito do recuo de uma geleira.

Demonstração de que a Caverna Glacial antecede a formação propriamente dita dos enormes maciços calcários anotados em Coração de Jesus é que, a poucos metros dela, existe a caverna inteiramente calcária denominada Maria Cobra, que percorremos por diversos metros, no final dos anos 70, e desistimos após determinada distância ante sinais da existência em suas galerias extremamente úmidas do letal monóxido de carbono.

Pela exiguidade de tempo, não pudemos percorrer as imediações daquela abertura subterrânea, para que dúvidas não restassem, em busca de uma possível nova ocorrência de diamictito, ao contrário de um pequeno registro que percebemos na região da Serra do Cabral, em Santa Bárbara, no município de Augusto de Lima, conforme informado antes. Anos atrás, encontramos uma pedreira dessa natureza bem próxima do distrito de Água Boa (município de Claro dos Poções). Em linha reta, a distância entre ela e a Caverna Glacial é de aproximadamente 10 quilômetros ou pouco mais.

Um conglomerado polimítico propriamente dito, correspondendo a um paleocanal das coberturas terciárias, foi identificado no município norte-mineiro de São João das Missões, mostrando clastos de arenito quartzoso, calcário micrítico, calcário esparítico, gnaisse e grãos de quartzo, feldspato e mica.

A classificação de conglomerados de tal ordem, os quais levam em conta sua granulação, composição e tipo de cimento natural unindo os clastos, diz respeito ao ambiente originário: conglomerados marinhos, fluviais ou glaciais. Encontramos uma dessas estruturas sedimentares decorrentes de um mar interior em Jequitaí, ostentando com magnífica perfeição moldes do balanço de ondas, ora no nosso acervo.

A Serra do Cipó, por exemplo, perto de Belo Horizonte, tem sua pré-história remontando há mais de um bilhão de anos. Os quartzitos, rochas arenosas predominantes naquela região, se formaram pela deposição marinha em tempos geológicos que o homem sequer conheceu. Os ripple marks, isto é, marcas formadas pelas ondulações da areia ao sabor das ondas, ali são comuns. Hoje, na rocha já consolidada,
suas marcas permanecem como testemunhas inapagáveis de um oceano pré-histórico.

Milhões de anos depois do afastamento de suas águas e soerguimento das montanhas que formam a atual Serra Geral, ou Serra de Minas (também chamada de Serra do Espinhaço), a alteração das rochas deu origem aos solos onde hoje o cerrado, a Mata Atlântica e os campos rupestres constituem algumas das riquezas daquela serra.

Devo frisar aqui, a propósito da Serra Geral, considerada reserva mundial da biosfera, que a mesma também é conhecida como Serra do Espinhaço, nome que lhe foi dado pelo barão alemão Ludwig Wilhelm von Eschwege, no século XIX, ao fundamento de ser responsável pela divisão das redes de drenagem do Rio São Francisco e as dos rios que correm diretamente para o Oceano Atlântico.

Mas há quem ache errada a denominação de “Espinhaço”, uma vez que a sua orografia central, lembrando sua espinha dorsal a de um quadrúpede, não seria divisor de água de duas vertentes contrapostas. Em Itacambira, por exemplo, ela se encontra inteiramente na Bacia do Jequitinhonha em extensão considerável. Por conseguinte não existiriam duas bacias hidrográficas que separa, daí a alegada impropriedade do seu nome.

A Serra Geral (seu nome usual hoje), aurífera e diamantífera em trechos que se multiplicam por sua extensão, na verdade, é um conjunto de serras de certa forma individualizadas formando a cordilheira brasileira, com pouca variação longitudinal. Corta nosso território no sentido Norte-Sul, desde o Quadrilátero Ferrífero, no centro de Minas Gerais, até a Chapada Diamantina, na Bahia, em mais de 1.000 quilômetros de extensão.

Divide, na verdade, o território mineiro nas terras a leste (Mata Atlântica) e nas terras a oeste, cobertas pelo cerrado. Há uma lacuna ao norte, seguindo-se a elevação da Chapada Diamantina, em meio à caatinga.

O município de Salinas, no setentrião mineiro seguindo para o Estado da Bahia, também guarda registro de um mar interior, que recuou deixando em suas terras o sal-gema, daí o nome do município. Sua acumulação se deu pela evaporação da água dos mares em época pretérita da história física da Terra.

Na zona rural do município norte-mineiro de Francisco Sá, percebemos também, junto a um sítio paleontológico de animais extintos da fauna pleistocênica, no leito seco de um córrego temporário, esse sal de terra, denominação dada pelos caboclos para as eflorescências salinas, onde o gado fica por ali lambendo-o.

Fui entrevistado pela TV Globo sobre tal ocorrência e também sobre o sítio arqueológico ao lado, de animais extintos da nossa fauna pleistocênica, no antigo Brejo das Almas, matéria veiculada em seu“Jornal Nacional” e no “Fantástico”.

Na Alemanha são realizados os principais estudos teóricos e práticos sobre o sal-gema, na jazida de Stassfurt.

Quem possuía em sua casa uma mão-depilão elaborado em diamictito, com um minúsculo diamante nela incrustado, também proveniente de Jequitaí, era o historiador montes-clarense Simeão Ribeiro Pires. Mão-de-pilão foi um instrumento lítico utilitário produzido pelo nosso homem primitivo. Também percebemos possíveis inclusões de diamante em diamictitos dinamitados - para utilização nas obras de construção da BR-365 – muito próximos do trevo de acesso à cidade de Jequitaí.

Há registro de marcas de onda (ripples) em siltitos nas proximidades de Miravânia (município vizinho de Montalvânia, Cônego Marinho, São João das Missões e Manga).

Por fim, pesquisadores descobriram microfósseis de origem marinha na atual região do Alto Paranaíba, cujos dados só conseguimos encontrar no jornal belo-horizontino “Hoje em Dia”, de 08/09/1996, na página 15, de “Ciência & Tecnologia”, como se segue:

“Na era dos dinossauros, o mar invade o Brasil e chega a Minas Gerais. Deixa ali alguns animais microscópicos, de apenas uma célula.
Passados 100 milhões de anos, eles reaparecem como fósseis. Parece roteiro de filme de ficção, mas não é. O estudo de um pesquisador brasileiro e de um norte-americano concluiu que a atual região do Alto Paranaíba foi coberta por águas marinhas durante um breve período do final da“era dos dinossauros”, o Cretáceo.

O carro-chefe da constatação de uma invasão marinha foi a descoberta
de radiolários, que são animais exclusivamente marinhos”, diz Dimas Dias-Brito, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro (SP). Segundo ele, a invasão do mar nessa região teria durado pouco tempo. A rocha onde foram encontrados os radiolários, animais do mesmo grupo das amebas, é “fina”. “Ainda não há nenhuma evidência de um ‘pacote marinho’ espesso abaixo e acima desse silexito (rocha). A ideia é que o mar teria se retirado rapidamente.

Há cerca de 140 milhões de anos, no início do Cretáceo, a África e a América do Sul estavam coladas. Mas, entre 130 milhões e 110 milhões de anos, começou a se abrir uma fenda entre os continentes. Com o alargamento dessa fenda, surgiu o Oceano Atlântico, há cerca de 115 milhões de anos. Entre esses dois momentos o mar invadiu o Brasil. A ideia de que a região teria sido coberta pelo mar surgiu em 1991, quando a pesquisadora Senira Kattah encontrou evidências de que algumas rochas da região da cidade de Patos de Minas (Alto Paranaíba) teriam radiolários.

Em 1995, Dias-Brito e Emile Pessagno, da Universidade do Texas, voltaram à região e confirmaram a descoberta de Kattah e classificaram os microfósseis. Eles estavam “presos” no silexito, um tipo de rocha conhecida popularmente como ‘pedra-fogo’.

Ao estudar os fósseis, os cientistas depararam com um grande problema: de onde teriam vindo as águas que cobriram Minas? Uma das hipóteses propostas por eles é a de que teria sido o Oceano Pacífico o“invasor”. Isto porque um dos radiolários existentes no silexito pertence a um gênero comum há cerca de 130 milhões de anos. Nessa época, o Atlântico Sul ainda não havia completado sua formação. A água deve ter vindo do Sul. Também há 130 milhões de anos, radiolários como os de Minas estavam presentes em latitudes iguais ou maiores do que 22 graus. Portanto, os pesquisadores acreditam que a invasão tenha acontecido a partir de águas mais austrais.

A outra hipótese é a de que o próprio Atlântico teria invadido o continente. A ideia é baseada na datação de pólens encontrados em camadas inferiores ao silexito mineiro, cuja idade é de 115 milhões de anos, época em que o Atlântico já havia se formado.

Para Antônio Carlos Rocha Campos, paleontólogo do Instituto de Geociências da USP, “essa pode ser a primeira evidência de que a formação geológica Areado (onde foi encontrado o silexito) é de origem marinha”. “Segundo se acreditava, as informações do Cretáceo eram inteiramente continentais”, disse. Mas, segundo o pesquisador, é preciso
que se aprofunde o estudo para que se descubra de onde veio a invasão.
“É preciso achar a trilha que o mar teria deixado”.

Além dos cardiolários, os pesquisadores também encontraram espículas de esponjas presas no silexito, rocha formada por sílex. As espículas, cuja forma lembra a de agulhas, são uma espécie de “esqueleto” de sustentação dos animais. “Essa associação é classicamente encontrada em sedimentos do Jurássico e do Cretáceo em todo o mundo”, disse Dias-Brito. Para Rocha Campos, a presença dos radiolários já é suficiente para dizer que houve mesmo uma invasão, já que eles são marinhos.”


Lado outro, a deposição do Grupo Bambuí foi iniciada em ambiente marinho raso, redundando no término das rochas da Formação Jequitaí. Isto possibilitou o soerguimento da plataforma carbonática da Formação Sete Lagoas, quando foram depositados os calcários. Daí notamos que, em meio ao diamictito da Formação Jequitaí, o calcário não abunda nem tem tamanho destacado.

E, não nos alongando mais, uma regressão marinha na Formação Lagoa do Jacaré permitiu a deposição de lentes de calcário na região norte-mineira de Lontra.

“O gelo é o mais formidável exemplo de agente natural capaz de “raspar” totalmente uma área. Na superfície terrestre, nenhum outro agente é capaz de realizar movimentos mecânicos tão vigorosos sobre as rochas... Se existem solos ou materiais menos resistentes nas encostas das montanhas, o gelo os remove e, às vezes, origina exposições de grandes massas de rocha, com estrias e sulcos paralelos ao sentido de movimentação. As rochas por onde passam as massas de gelo são submetidas à intensa raspagem. Com o resfriamento, o gelo tende a “grudar” na superfície da rocha. Com o tempo, pedaços desta vão sendo arrancados. Surgem então formas arredondadas, lembrando carneiros deitados (rochas moutonnés), ou semelhantes ao dorso de baleias (drumlins)”, conforme trabalho de Fernando Flávio Marques de Almeida e Celso Dal Ré Carneiro,“Geleiras no Brasil – Os Parques Glaciais de Salto e Itu (SP)”, publicado na revista “CiênciaHoje”, volume 19, número 112, página 26).

Por outro lado, a geologia nos mostra que se há alguma parte da superfície da Terra coberta por gelo, nós já estamos vivendo em uma era glacial. Temos hoje aproximadamente dez por cento da Terra sob geleiras e glaciares (no ápice de uma glaciação, tal proporção fica em trinta por cento). Evidencia-se que, na maior parte de sua existência, o planeta teve uma temperatura média de oito a 15 graus Celsius acima da atual, o que impediu que qualquer área da Terra permanecesse congelada.

Entretanto, em seu último bilhão de anos, nosso planeta enfrentou cinco períodos glaciais. O atual é o sexto, com seu início há aproximadamente dois milhões de anos. No decorrer de certo período glacial, a temperatura nem sempre é a mesma. Para cada 100 mil anos de muito frio, passamos por cerca de 10 mil anos com temperatura mais amena. A Terra encontra-se há oito mil anos em um desses períodos de menor expansão de sua camada de gelo. Contudo, a previsão é que daqui a dois mil a quatro mil anos terá início outro aumento da nossa cobertura de gelo.

Há previsão de chegada próxima ao Brasil de nevasca, que atingiu Santiago em 1971, trazendo intenso frio para as regiões do Sul, Sudeste, Centro-Oeste e sul da região Norte, como indica o Instituto Nacional de Meteorologia do Brasil (INMET).

Não bastando, meteorologistas do National Oceanic and Atmospheric Adminstration (NOAA), órgão ligado à NASA, responsável por monitoramento de condições atmosféricas oceânicas ao redor do globo, chegaram a projetar a possibilidade de precipitação de neve para o Sul do Brasil em 2017 (ocorrências repetidas em 2018 e 2019).

A ciência ainda não precisou o que provoca uma era glacial. Existem teorias buscando explicar esta variação entre fases mais frias e mais quentes no decorrer de uma glaciação. A principal delas tem como base as diversas mudanças registradas nas órbitas terrestres. Primeiro, o eixo de rotação da Terra não forma um ângulo perfeito de 90 graus com a linha do Equador: o planeta está ligeiramente inclinado. O ângulo dessa inclinação sofre alterações devido à influência da força gravitacional dos demais planetas. Essa é uma das mudanças. Segundo, o eixo de rotação também gira em torno de si mesmo como se fosse um pião, por influência da atração do Sol e da Lua. Em terceiro lugar, o movimento em torno do Sol não é sempre igual, também devido à força de gravidade dos planetas. O somatório destas mudanças faz com que exista variação na quantidade de energia que chega do Sol, o que provoca o esfriamento.

Mostradas essas teorias entrelaçadas com as órbitas terrestres, em contrapartida é afirmado que uma glaciação é um fenômeno intitulado“Paradoxo da Hibernação Solar”.

Como exemplo tivemos o esfriamento do clima global que provocou a Pequena Era do Gelo (1400 – 1650). Esta, trazendo penúria e desnutrição à população, foi prenunciada pela horrorosa peste negra, pandemia mais mortal da história e que entre 1347 e 1352 eliminou entre 30 e 50 por cento da população europeia.

Na hibernação solar, a atividade da nossa estrela é tão precária que não há ejeção de matéria da sua coronal em direção ao espaço. Ou seja, as tempestades solares desaparecem ou são praticamente nulas, o que leva aquele astro a um estado de calmaria.

Cientistas que acompanham o fenômeno anotaram que a atividade solar máxima vem enfraquecendo presentemente, com o que o período de mínimo solar se estende.

Artigo na publicação científica “Annales Geophysicae” assegura que se ocorrer uma menor atividade do Sol e uma fase de mínimo solar ampliada, ocorrerá uma nova glaciação. A Terra gelará: o que hojeé subtropical se tornará clima temperado e quanto mais próximo aos polos, maior o avanço do frio.

“O Paradoxo da Hibernação Solar é o caminho contrário ao aquecimento global. O Sol, que é a principal fonte de energia em forma de calor, agora estaria colaborando para o esfriamento. A estrutura magnetizada tanto do planeta como da estrela vive numa disputa equilibrada. Quando há mais atividade solar, menor é a penetração de raios cósmicos na atmosfera terrestre. As partículas solares impedem esse ingresso da radiação espacial, que chegam até a 10 quilômetros na troposfera e ionizam essa parte da atmosfera terrestre.” (“Annales Geophysicae”).

Resta claro que a redução da atividade solar não depende do aquecimento global causado pela atividade humana – esta ocasionando o efeito estufa, desmatamento e emissão de gases, o que não quer dizer que não tenhamos de relegar ao esquecimento nossas responsabilidades ambientais, esperando um resfriamento global por conta do Sol.

No Encontro Nacional de Astronomia, pesquisadores aventaram sobre uma possível era do gelo em 2030. O estudo, anunciado pela professora Valentina Zharkova, da Universidade de Nortúmbria, se baseou em modelos computadorizados de manchas solares, os quais mostraram 97 por cento de acertos no mapeamento de movimentos anteriores da atividade solar.

Estando certas essas previsões, por volta de 2022, uma parte de ondas deverá se mover até os hemisférios norte e sul do Sol, o que reduziria essas atividades. Eventualmente as duas ondas estariam em sincronia, entrando em seu pico ao mesmo tempo, porém em hemisférios opostos. Isso provocaria o que é denominado por climatologistas de mínimo de Maunder – período de 70 anos, entre 1645 e 1715, quando o Sol produziu poucas manchas solares, provocando outra pequena era do gelo em partes da Europa e continente norte-americano. O rio Tâmisa, em Londres, permaneceu congelado durante sete semanas. Essas condições são esperadas para os próximos anos, até a era do gelo propriamente dita.

A seu turno, uma dupla de cientistas russos, Raulf Galiulin e Vladimir Bashkin, fez previsão de queda gradual na temperatura da Terra a partir de 2014, bastante lenta num primeiro momento, devendo culminar em uma nova era do gelo dentro de um período de 50 anos.

A variação da temperatura da Terra encontra-se, indubitavelmente, associada aos ciclos das atividades solares, já em processo de redução e devendo esta diminuição da temperatura afetar todo o mundo.

Aquecimento global decorrente da atividade humana, que provoca elevação de temperatura, não deve ser confundido com atividade solar, a qual se sobrepõe à sina predatória ambiental do homem. Já existem sinais de frio intenso na Terra, fazendo nevar, por exemplo, em 2018 (pela terceira vez em 40 anos) em pleno deserto do Saara.

Pode-se afirmar que o homem moderno construiu sua civilização numa época de calmaria solar, ou seja, num período interglacial iniciado por volta de 11 mil anos atrás, coincidindo com o término daúltima era do gelo. Mas a cada 11/16 mil anos alternam-se períodos de grande intensidade solar, com as suas manchas bastante desenvolvidas, com períodos de baixa atividade. Portanto estamos entrando no período de baixa atividade, uma vez decorrido o lapso temporal de 11/16 mil anos.

Contudo, há pouco tempo, a NASA mostrou imagens nas quais se observava a ausência de manchas solares. Se para um leigo isto pode não significar nada, a seu turno cientistas mostram-se alarmados. A conclusão mais provável é que o Sol esteja entrando em outra fase fria, um novo Solar Minimum, trazendo consigo uma nova era glacial, ou então uma mini-era glacial, a ser iniciada em 2019/2020.

Astrônomos especialistas daquela agência espacial afirmam que a atividade das manchas solares funciona como um pêndulo, balançando de trás para a frente ao longo das eras geológicas. O contrário de um prenúncio da proximidade de nova era glacial seria que a superfície volátil de nossa estrela estivesse coberta de manchas solares.

Mas, refrise-se, não é o que está acontecendo, pois a ausência de manchas solares significa um período de baixíssima intensidade magnética do Sol, processo que deverá continuar pelos próximos anos até mudar drasticamente o clima terrestre. Calcula-se que o novo congelamento perdurará durante um mínimo de três ciclos solares (30 anos). E a nossa espécie não estaria preparada para outra era do gelo, mínima ou de maior amplitude.

Por fim, durante os últimos milhões de anos tivemos diversas eras glaciais com frequências de 40.000 a 100.000 anos. Destacam-se a Glaciação Donau, há cerca de 2 milhões de anos; a Glaciação Günz, há cerca de 700 mil anos; a Glaciação Mindel, há cerca de 500 mil anos; a Glaciação Riss, há cerca de 300 mil anos; e a Glaciação Würm, há cerca de 150 mil anos.

Reiterando a existência de determinadas circunstâncias a indicar que estamos próximos de uma nova era do gelo, porque a Terra atravessa aproximadamente 10.000 anos de temperatura quente a cada 90.000 anos de uma glaciação, por outro lado, mercê da ação do homem com suas agressões ambientais, o planeta atravessa, em tempos recentes, um contínuo período de aquecimento global sobremodo acelerado, ao invés de estar iniciando sua fase de esfriamento a anteceder a próxima era do gelo.

Se de um lado temos pesquisadores e/ou cientistas que acreditam que esse efeito estufa adiaria uma nova glaciação e seus efeitos danosos por longo período de tempo ainda, de outro lado o aumento da temperatura planetária traz consigo a enormidade de desastres ecológicos que estamos assistindo, como incêndios na floresta amazônica e no Pantanal, furacões e tornados, secas e queda na diversidade biológica. Como quer que seja, o aquecimento provocado pelo homem não significa aumento de temperatura em toda a Terra, mas da temperatura global média. Em outras palavras, o período de baixíssima
intensidade magnética do Sol independe do efeito estufa, desmatamento
e emissão de gases.

Numa visão mais otimista, esta conjuntura faz com que o derretimento das calotas polares altere as condições presentes das correntes marítimas, provocando longos períodos de forte glaciação no hemisfério norte (América do Norte e Europa, em especial), ao passo que o hemisfério sul sofreria um forte aquecimento.

Como exemplo desta visão otimista, podemos frisar que o eixo da Terra encontra-se hoje numa posição similar e de outras eras glaciais, e mesmo assim o Ártico, recebendo o mínimo de energia solar, não estaria dando indícios de uma glaciação próxima, que assim seria adiada para os próximos 100 mil anos.

Não pairam dúvidas acerca da gravidade do atual aquecimento global. Os seis anos mais quentes do atual Holocento (que pessoas dos meios científicos buscam denominar de Antropoceno, mas sem consenso) foram registrados entre 2014 e 2019. Se o aquecimento global hoje enfrentado teria o condão de adiar o próximo glacial para começar daqui a 100 mil anos, há outra corrente de pesquisadores acreditando que o homem sucumbiria antes, pelas já assustadoras consequências do progressivo aquecimento global. Isto significaria a antecipação do apocalipse.

Como quer que seja, vindo o nosso planeta a registrar temperaturas elevadíssimas, em total detrimento da vida, após tal fenômeno, sobre terras então esturricadas, se precipitaria a esperada próxima glaciação.
Se já finda a calmaria presente do Sol, a esperada era do gelo aconteceria em estágio semelhante futuro, e sem mais contar com a presença da espécie Homo no planeta.

O artigo que se segue, de José Eustáquio Diniz Alves, originariamente publicado em “EcoDebate”, trata com precisão das consequências desairosas do aumento do aquecimento global, como se segue.

“Os 6 anos mais quentes do Antropocentro: 2014-2019.

“Na ausência de um ajuste significativo da maneira como bilhões de seres humanos vivem, partes da Terra provavelmente se tornarão próximas a inabitáveis e outras partes terrivelmente inóspitas, antes do final deste século.” David Wallace-Wells (09/07/2017).

O mundo tem apresentado temperaturas cada vez mais altas ao longo do tempo, sendo que a atual década tem batido todos os recordes das décadas anteriores. O aquecimento global é uma realidade inques tionável. Os 6 anos mais quentes do Antropoceno aconteceram entre 2014 e 2019.

O ano mais quente do século XX foi 1998, que apresentou uma temperatura 0,63º Celsius acima da média do século. Porém, nos anos seguintes houve redução da anomalia e somente em 2005 a temperatura
bateu novo recorde, de 0,66º C acima da média do século XX. Novo recorde aconteceu somente em 2010 com 0,70º C. Em 2011 houve desaceleração do aquecimento global e a temperatura média de 0,58º C (acima da média do século XX) ficou abaixo daquela apresentada em 1998. As temperaturas de 2012 e 2013 ficaram abaixo dos valores de 2010.

Todavia, o quadro mudou radicalmente a partir de 2014, pois, além de bater novo recorde com 0,74º C, a temperatura média do referido ano passou a se constituir em um novo piso para a série histórica que começou em 1880. Em consequência, os 6 anos compreendidos entre 2014 e 2019 são os mais quentes já registrados. Aponta-se para a possibilidade de 2019 ser o segundo ano mais quente da série.

De fato, os meses de junho, julho e agosto foram os mais quentes já registrados, com variação de 0,95º C, em relação à média do século XX. A Europa teve duas ondas recordes de calor em 2019, uma em junho e outra em julho. Diversas cidades tiveram temperaturas elevadas e nunca antes registradas. Portugal e outros países sofreram com os incêndios florestais. Nestes dois meses, vastas extensões de latitudes do norte da
Terra ficaram em chamas. O clima quente tomou conta de uma enorme porção do Ártico, do Alasca à Groenlândia e à Sibéria. Isso ajudou a criar condições propícias para incêndios florestais. Alguns deles foram realmente enormes e queimaram de maneira singular e sem precedentes.
Artigo de Crunden (15/07/2019) mostra que as mudanças climáticas estão agravando os incêndios florestais.

Dados da NOAA mostram que, no período janeiro a julho, a temperatura mais alta aconteceu em 2016, com 1,1º C acima da média do século XX. As outras duas marcas mais altas aconteceram em 2017 e 2019, ambas com uma anomalia de 0,95º C acima da média do século XX, para os primeiros sete meses do ano. A linha de tendência mostra que a temperatura está subindo 0,21º C por década no século XXI (quando estava subindo 0,08º C por década entre 1880 e 2019). Isto quer dizer que o aquecimento global está se acelerando e, no mínimo, vai subir 2º C no atual século, mantida a tendência das duas últimas décadas. Mas o mais provável é um aquecimento cada vez mais intenso, como alerta o IPCC.

Apesar de todos os alertas, o mundo continua consumindo combustíveis
fósseis, liberando metano na agropecuária e agravando o efeito estufa. Continua também desmatando e destruindo os ecossistemas. Assim, cresce a concentração de gases de efeito estufa e aumenta o nível de CO2 na atmosfera, que, em 2018, foi de 408,52 partes por milhão (ppm), e está aumentando em 2,4 ppm ao ano na atual década (mas pode passar de 3 ppm em 2019). Sendo que o nível seguro é 350 ppm.

Artigo de Matt McGrath, na BBC (24/07/2019) mostra que o alerta do IPCC sobre o prazo de “12 anos para salvar o planeta” se transformou em 18 meses. A necessidade de reduzir as emissões em 45% até 2030 para manter as temperaturas globais abaixo de 1,5º C neste século se antecipou e agora o prazo é o final de 2020. A sensação de que o final do próximo ano é a última chance de mudança climática está se tornando mais clara o tempo todo. Com base em evidências científicas, ele escreve: “Acredito firmemente que os próximos 18 meses decidirão nossa capacidade de manter a mudança climática em níveis de sobrevivência e restaurar a natureza ao equilíbrio que precisamos para nossa sobrevivência”.

A velocidade do aquecimento global nunca foi tão rápida quanto é hoje e está afetando o planeta inteiro simultaneamente, pela primeira vez em, pelo menos, dois milênios. Uma pesquisa, publicada na revista Nature Geoscience (24/07/2019) reconstruiu a temperatura média da Terra nos últimos dois milênios, destacando a surpreendente taxa de aquecimento generalizado do nosso planeta no século passado e, em especial, nas últimas décadas.

Desta forma, se este quadro não começar a ser revertido urgentemente,
o colapso ambiental pode se tornar inevitável. O aquecimento vai provocar o degelo do Ártico, da Antártida e da Groenlândia, elevando o nível dos oceanos, o que ameaça bilhões de pessoas que moram nas áreas costeiras. O aquecimento também deve provocar o degelo dos glaciares do Himalaia e o leste e o sul da Ásia, lar de bilhões de pessoas,
vão sofrer com a falta de água. O aquecimento global é um dos elos fracos do Sistema Terra e pode provocar um grande desastre ecológico. No longo prazo, pode ser o apocalipse para todos os seres vivos do Planeta, incluindo a espécie que é culpada e vítima deste processo: a humanidade.

Como disse o cientista David Suzuki: “Se quisermos que a Terra permaneça habitável para os seres humanos e para outras formas de vida que nos tornam possíveis, devemos fazer escolhas difíceis, promover soluções e nos envolver mais politicamente (04/08/2019).” (...).

Sem dúvida, cientistas de todo o mundo alertam para a situação de emergência climática. E como diz, acertadamente, a garota e ativista sueca Greta Thunberg: ‘Eu não quero que vocês estejam esperançosos. Eu quero que vocês estejam em pânico. Quero que vocês ajam como se a casa estivesse pegando fogo. Porque está!’.”

Pelo sim, pelo não, a retração do calor solar não deixará de ser danosa, mais cedo ou mais tarde, para toda a Terra, e mesmo os defensores do aquecimento global também têm certeza que a baixa na atividade solar ainda afetará o clima planetário, mas apostando com uma hipotética prorrogação da próxima era do gelo, como posto antes.

Trata-se, enfim, de um terreno ainda completamente desconhecido por nossa espécie, não passando de especulações a previsão de que a próxima era glacial estaria sendo adiada. Tanto é verdade, como já salientado antes, que contamos com cerca de 50 teorias a tentar explicar a ocorrência cíclica das glaciações terrestres.

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(1). Mexilhão é nome comum, sem valor taxonômico, que identifica diversas espécies de moluscos bivalves. Ditas espécies, de grupos filogenéticos distintos, se caracterizam por apresentar conchas alongadas e assimétricas, as quais ficam presas ao substrato por um feixe filamentoso (o bisso).

(2). A matéria menciona o período atual como Antropoceno, o qual não passa ainda de uma tentativa, sem consenso nos meios científicos, de se estabelecer uma nova era na escala geológica marcada pelas ações da nossa espécie, ou como um sinal de alerta para as intervenções humanas sobre os mais variados sistemas da Terra. Ou seja, esta nomenclatura não persiste, porque estamos no Holoceno, nome dado aos últimos 11 mil anos da história da Terra, portanto pós-glacial, marcado por temperaturas de mornas para quentes. O Holoceno, assim, é a época atual do presente período Quaternário.

(3). Entre os incêndios florestais de 2019 no planeta, precisamos incluir, talvez como o de proporção mais alarmante e grave, o mesmo fato registrados na Amazônia sul-americana, com seu auge em agosto deste mesmo ano.
(Agosto de 2018/setembro de 2019)
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Mara Yanmar Narciso
Cadeira N. 98
Patrono: Virgílio Abreu de Paula

IRMÃ VEERLE

Bem adiante na vida, na pós-maturidade, quando já doente, olha-se para trás, o que se vê? Obras, ações, atos de caridade, alguns notáveis. As omissões não existiram. As bondades exigem reconhecimento, e lá está alguém, que se dá ao extremo, que se despe das suas vontades para cuidar das demais, na mesma toada. Assim é Irmã Veerle, conhecida como Irmã Verla.

Registrada como Joanna Maria Juliana Vandekeybus, Irmã Veerle diz que sua pátria, a Bélgica, é pequena, e não existem grandes fazendas. Filha de sitiantes, com duas irmãs e um irmão, conta que era costume não se colocar nos filhos o sobrenome da mãe, apenas o do pai. É da região norte, cidade de Essen, onde nasceu em 26 de novembro de 1937. Após aprender enfermagem, veio para Montes Claros em 09 de fevereiro de 1968 para trabalhar na Santa Casa de Caridade, em todos os setores, e depois se dedicar à Pediatria. Familiares e amigos do seu país e da Holanda enviavam recursos financeiros para a Santa Casa, sendo responsáveis por várias benfeitorias na entidade.


Irmã Veerle

Na Bélgica, um país católico, era comum as moças entrarem para o convento. A cidade natal de Irmã Veerle fica perto da Holanda, de Etten-Leur onde nasceu e partiu para Montes Claros Willelmina Lauwen, depois Irmã Maria Beatrix, conhecida como Irmã Beata. Irmã Veerle pertence à Congregação das Irmãs do Sagrado Coração de Maria de Berlaar, e não a conheceu, pois Irmã Beata morreu em 1952.

Devido a sua idade, doença e fragilidade, Irmã Veerle foi proibida de trabalhar, mas, inquieta, quer sair, porém, faltamlhe forças. Quando perguntada, não fala de si, e sim sobre os que a cercam. Conta do falecimento de algumas freiras da Santa Casa, como Irmã Irene, Irmã Malvina e Irmã Luciene. Ainda hoje, o que a move é ajudar.

Eu visitei Irmã Veerle em seu singelo quarto, com campainha, catre, armário, duas mesinhas e uma cadeira. Quando eu soube que ela, a incansável, a indestrutível, a mais apta de todas, sempre pronta a correr e atender meio mundo, estava doente, fui lhe dar um abraço apertado, nela que acudiu quem precisou, ou seja, todos que conseguiu alcançar. Pedi para ver seu documento de identidade, disfarçou, e, discreta, não me mostrou, então eu a pedi que escrevesse seu nome, para que eu, enfim, pudesse saber seu sobrenome. Assim ela fez, mas não revelou que fora batizada como Joanna.

É coisa de grande admiração, desde quando Milena, a minha mãe, estudava Medicina. Algumas vezes eu acompanhei Milena à Santa Casa, para ela fazer partos de madrugada, e via Irmã Veerle na enfermaria da Pediatria. Parecia morar lá e jamais descansar. Em 1975, por volta das três horas, esquentava água no ebulidor, e dava banho nas crianças. Nós passávamos e a cumprimentávamos, no que ela respondia sorridente. Por mais cansada que estivesse, sorrir era fácil para ela, no entanto, falar Português foi inviável, e se expressa de forma incompreensível.

A agilidade física e mental que tinha, a capacidade de trabalho que demonstrava, o saber e a experiência que acumulava eram impressionantes, por isso falo com alegria dessa pessoa iluminada e desprovida de vaidades. Dr. Konstantin Christoff, cirurgião da Santa Casa, já falecido, e que se confessava ateu, também se encantava com esse labor, e lhe dizia: Caso não exista céu, o que a senhora vai fazer, Irmã Veerle?

De 1991 a 2001, os dez anos que trabalhei nas urgências/ emergências de Endocrinologia da Santa Casa, vi o ímpeto caridoso e trabalhador de Irmã Veerle, que, atenta, me ajudava, suspeitando de complicações, especialmente a temida hipoglicemia, glicose baixa, tormento dos que lidam com diabetes. Certa manhã, quando a freira chegou à Pediatria, viu que Josemar, um menino carente de cinco anos, que tinha diabetes e se internava com frequência, não tinha


Irmã Veerle e Eli Penido

acordado. Comunicou-me e fui correndo, enquanto ela tentava lhe pegar uma veia para injetar glicose. Não teve êxito, e começaram as convulsões, então sugeri, como medida heróica, passar uma sonda retal no menino para lhe aplicar soro glicosado hipertônico no intestino. Em minutos estava feito, e logo ele acordou. Irmã Veerle estava lá.

Durante mais de cinco décadas, as paredes da Santa Casa viram Irmã Veerle ser a primeira a correr e voltar com o recurso necessário, levando conforto espiritual e material. Também testemunharam a freira pedir ajuda para a sua infindável lista de protegidos. Enquanto exalto sua importância, vejo emanar do seu, no momento frágil corpo, junto com um sorriso, essa luz, esse dom, essa bondade interminável.



Mara Yanmar Narciso
Cadeira N. 98
Patrono: Virgílio Abreu de Paula

FUTEBOL, CORRESPONDÊNCIA
E DÍZIMO

As produções intelectuais de José Ferreira da Silva foram apresentadas por ele mesmo, afinal ninguém mais do que ele sabe como foram conseguidos seus conteúdos. Falou no Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros em maio. Comentou que os colegas o consideram um memorialista e não um historiador, mas acredito que essas duas funções se mesclem em José Ferreira. Investiga com dedicação e imenso gosto pelo que faz. Sua obra “Família Guarani – 50 anos de História”, versa sobre seu time de futebol, no qual jogou durante onze anos como lateral direito em Porteirinha. Sua paixão perma-nece, pois tinha 40 minutos para palestrar e gastou mais da metade do tempo falando desse livro, uma pesquisa que consumiu viagens e entrevistas, e o resultado foi documentação farta em fotos e depoimentos de jogadores, torcedores e dirigentes, inclusive ele.

Depois veio “Correio Galdino – Um homem de ferro”, sobre a vida do seu pai, um estafeta particular, que viajava a pé e à noite, de Porteirinha a Grão Mogol, sede da comarca, levando documentos, dinheiro e o que mais houvesse. A meu ver, foi um precursor do Sedex. Não concordava em ir a cavalo e caminhava 138 km. Ia por dentro, e, destemido, nada o amedrontava. O filho-autor demonstra admiração pela coragem do pai, que quando chegava da viagem se embrenhava na roça para puxar enxada e sustentar sua grande prole de três casa-mentos.

Homem de igreja, “Dízimo – Lei áurea da prosperidade” é seu livro mais recente, que atende a toda a crença cristã, com sucesso nas vendas, fato destacado pela sua esposa Maria Mendes Pereira e Silva. É um assunto raro, sendo José Ferreira o único leigo em Minas a escrever sobre o tema, começando no que diz a Bíblia, indo até os dias atuais. O Arcebispo Dom José Alberto Moura ungiu a obra, o que alegrou o autor.

O nosso confrade, além de pessoa de extrema correção, como ex-professor de Português, cuja mãe o levava à força para escola, inclusive
distribuindo-lhe tabefes, tornou-se um incansável pesquisador, escritor e palestrante, pois durante a apresentação hipnotizou uma platéia atenta e participativa.


Maria Clara Lage Vieira
Cadeira N. 100
Patrono: Wan-dick Dumont

MARIA MAIA

O mundo é carente de afeto, de carinho, de sentimentos nobres, de ações edificantes. Constantemente, somos espectadores de atos que atentam contra a vida e a dignidade humanas.

Felizmente, ao pesquisar sobre a vida de pessoas que participaram da construção da história de Bocaiuva, temos encontrado seres maravilhosos que deixaram sua parcela de contribuição para o engrandecimento da terra em que viveram.

Assim foi Maria Maia, a primeira enfermeira do hospital de Bocaiuva.

Maria das Dores Maia Caldeira nasceu em Bocaiuva, MG., aos 22 de março de 1935, filha de Odilon da Silva Maia e Joana Pereira de Oliveira Maia.

O pai era viúvo, trazendo para o segundo casamento seus filhos:
Geraldo da Silva Maia,
Nelson da Silva Maia,
Maria de Lourdes da Silva Maia,
Luiza da Silva Maia e
João da Silva Maia.
Maria foi a segunda filha do segundo matrimônio de seu pai.
Seus irmãos:
José de Oliveira Maia,
Neide Pereira de Oliveira,
Antônio de Oliveira Maia,
Pedro de Oliveira Maia,
Sinval de Oliveira Maia,
Dulce da Silva Maia,
Dirlene de Oliveira Maia,
Carlos Luiz Maia e
Marcos Afonso Maia.

Podemos, desta forma, compreender o contexto de sua vida: uma família de numerosa prole, agraciada com também numerosas bênçãos de Deus, pois os filhos foram todos criados na fé e no temor do Senhor e nela nasceu o nosso querido Padre Maia (Antônio de Oliveira Maia), que, com sua vivência, formação religiosa e sabedoria, tem sido amigo e conselheiro nas diversas circunstâncias que a vida proporciona a cada pessoa.

Maria Maia, como era conhecida na sua difícil e generosa tarefa de enfermeira, viveu sua infância na simplicidade da zona rural, na fazenda Mocambo, região além do povoado de Sentinela.

Ela desfrutou das belezas naturais existentes. O lugar, até hoje,é muito bonito. Como toda criança de sua época, brincou de bonecas que eram confeccionadas por ela e por sua irmã Neide. Viveu uma infância feliz, em que podia correr pelos campos, nadar nos rios.

Bem cedo, aprendeu a cozinhar e a cuidar dos irmãos menores e cuidava deles com tanta responsabilidade e com tanto amor como se fossem seus filhos.

A inexistência de escola no lugar fez com que sua própria mãe a alfabetizasse. E ela era tão atenta que, com 6 anos de idade, lia fluentemente.

Aos 7 anos, foi matriculada no Grupo Escolar Coronel Fulgêncio, que hoje se intitula “Escola Estadual Genesco A.C. Brant”

Ela frequentou o catecismo, preparando-se para a Primeira Comunhão, na igreja Matriz do Senhor do Bonfim.

Na escola, era considerada boa aluna, o que lhe valeu ser aprovada para o segundo ano e, depois, para as séries seguintes. Obteve uma aprendizagem de qualidade, firmada nos princípios cristãos que lhe foram transmitidos pelos pais e desenvolvidos na escola.

Assim, ela se tornou uma cidadã bem preparada para a vida, que não lhe foi fácil.

Em 1952, Bocaiuva foi presenteada com a construção do Hospital do SESP (Serviço Especial de Saúde Pública) e Maria foi escolhida para fazer parte do corpo de funcionários daquela instituição.

Preparou-se durante 6 meses no hospital de Pirapora, recebendo ali, com seus colegas, os primeiros ensinamentos sobre a prática da enfermagem.

Retornando a Bocaiuva, com o hospital já inaugurado, os funcionários dedicaram-se ao ofício de auxiliar os médicos, no empenho de aliviar as dores e males de tantos enfermos que, até então não tinham na cidade um atendimento hospitalar e muitos sucumbiam por falta de recursos.

Como sempre foi dedicada, desde criança, ao esforço de executar da melhor forma possível, as tarefas que lhe foram confiadas, Maria Maia ofereceu sua vida ao SESP. Na função de auxiliar de enfermagem, emprestou ao seu trabalho a responsabilidade e dignidade que lhe brotavam do coração. Foi sempre humilde, paciente, carinhosa com os doentes que eram confiados aos seus cuidados.

Era uma pessoa generosa, sempre pronta para ajudar e sempre com um semblante sereno e uma palavra de conforto. Era tão atenciosa com as parturientes que estas, comovidas, lhe confiavam seus filhos como afilhados de Batismo.

O trabalho de uma enfermeira exige atenção, paciência, coragem, dedicação. É um trabalho árduo e cansativo e que retorna com poucas alegrias, a não ser a consciência de que o dever está sendo cumprido.

Maria Maia nunca se esquivou das dificuldades e, mesmo nos seus períodos de descanso, atendia prontamente às necessidades do hospital.

Ainda jovem, casou-se com José Floriano Caldeira, filho de Américo Caldeira Brant e Adélia Soares. Ele era comerciante. Desta união, nasceram 7 filhos, sendo dois já falecidos. São seus filhos:

Eustáquio José Maria Caldeira,
Eliane Adélia Maia Caldeira,
Elenice de Jesus Maia Caldeira,
Elana Maria Maia Caldeira e
Edilaine Helena Maia Caldeira.
Elenice casou-se com Roger Faro.
Elana casou-se com Carlos Marques.
São netos de Maria Maia:
Cláudia Fernanda Caldeira de Morais,
Roberto Henrique Maia Caldeira,
Luana Maria Maia Caldeira,
Maria Augusta Maia Marques,
Mayara Maia Faro e
Maria Luiza Maia Faro.

Quando o marido faleceu, Maria Maia ainda trabalhava no SESP. Enfrentou sozinha a continuidade de sua existência com a mes ma garra de sempre, procurando preparar e encaminhar os filhos na vida. Sua dedicação era tão grande e tão autêntica que ela se esqueceu do cuidado com a sua própria saúde. Em campanhas de vacinação, enfrentou regiões inóspitas, carentes de boa vigilância sanitária. Nessas
circunstâncias, ingeriu água sem tratamento, armazenada em potes ou diretamente das barrocas, contaminada, o que motivou que ela contraísse esquistossomose.


Maria das Dores Maia aos 18 anos de idade

Na época, ainda não haviam descoberto algum agente capaz de debelar o mal e ela, em consequência do mal que lhe acometeu, sofreu de cirrose.

Aos 59 anos, Maria Maia faleceu em São Paulo, sendo seu corpo
trasladado para Bocaiuva.

Após 30 anos dedicados a tentar aliviar os doentes de seus males, Maria Maia deixou um exemplo de coragem, disponibilidade, amor, dedicação, compaixão.

Em um livro de leitura infantil, certa vez, encontramos um poema cujo teor é o seguinte:

Uma criança, estudando, encontrou a palavra “heroi” e se encantou com ela.

Seu pai trabalhava na roça, de sol a sol, para garantir o sustento da família. Só voltava à noitinha. Era esse o tempo que tinha para conviver com a esposa e os filhos.

Ao chegar em casa, a criança lhe perguntou:

- Pai, que é um heroi?
O pai, cansado do trabalho, pacientemente respondeu:
- Ah! Meu filho, heroi é muito importante. Ele ajuda as pessoas e faz coisas maravilhosas, enfrenta perigos e conquista a vitória. É difícil para nós conhecer um heroi.

E, na sua humildade, aquele pai não percebeu que heroi era ele próprio.

Esta história me lembra Maria Maia: simples, responsável, humilde, amorosa. Nunca lhe passou pela cabeça o fato de que ela foi uma heroína, aliviando aqui, higienizando ali, sorrindo, confortando uma multidão de pessoas que precisaram e receberam a sua atenção e o seu cuidado.

Bocaiuva se orgulha de ter em sua história a figura ímpar de Maria das Dores Maia Caldeira!



Maria da Glória Caxito Mameluque
Cadeira N. 40
Patrono: Georgino Jorge de Souza

MARIA DA CRUZ : UMA MULHER VALENTE NOS MOTINS DO SERTÃO

A história de minha terra, São Romão, localizada no Norte de Minas Gerais, às vezes se confunde com a história de Maria da Cruz Porto Carreiro ou simplesmente Maria da Cruz. Embora sua figura seja pouco conhecida, foi a única mulher a participar dos “Motins do Sertão”, que alguns historiadores preferem chamar de “A Conjuração do São Francisco.”

Para se entender melhor a atuação de Maria da Cruz é necessário que voltemos à história das Minas Gerais : em 1735, tendo Gomes Freire tomado posse no Governo de Minas, deu início à reforma dos quintos, questão que desagradava aos habitantes daquela região. Nas Minas, o desvio do ouro que deveria ser recolhido era visível e por esse motivo o Governador perseguia os fundidores irregulares e ordenava a cobrança de dívidas antigas, mesmo sob pena de prisão ou confisco. Criou ainda uma taxa sobre indústrias e profissões, que recaía sobre escravos, negros, mulatos e mamelucos. Apesar da insatisfação popular, mantinha-se simpático e continha os ânimos. Sendo designado a se deslocar para o Rio, transfere o governo para Martinho de Mendonça, que não possuía a habilidade do seu antecessor. Crescia a revolta em Minas, pelas cobranças absurdas. Esse sopro de revolta chega à região do Rio São Francisco, também atingida pelas taxas de captação. Diante da situação, os ideais de independência contra a Colônia foram surgindo no meio do povo sertanejo. Reunidos em conselho para organizar-se uma rebelião, entregaram a Pedro Cardoso a distribuição de postos superiores e este instalou um governo provisório.

Pedro Cardoso era filho de Maria da Cruz. Para Diogo de Vasconcelos, in História Média de Minas Gerais, “nenhuma figura mais relevante se destaca em todo aquele sertão que a de Dona Maria da Cruz, figura que somos felizes em retirar hoje da fria e apagada cova em que jazia morta, esta menos umbrosa que a do esquecimento.”

A morte prematura do seu esposo Salvador Cardoso deixou-a viúva com três filhos, dos quais Pedro Cardoso era o único homem. A todos mandou educar na Bahia. As filhas casaram-se, uma com Aleixo Gomes, seu parente, da mesma família da Torre, e foi dos mais abastados fazendeiros do sertão baiano; a outra, com Domingos Martins Pereira, comerciante, irmão do vigário-geral do arcebispado.

Maria da Cruz, em falta do marido assumiu a gerência de sua casa, composta de vasto latifúndio do Capão, tendo por vizinho seu cunhado o tenente-coronel Matias Cardoso em uma outra fazenda, ao lado do rio.

A têmpera varonil de Maria da Cruz não lhe tirava a natural doçura. Tinha o respeito de todos. O arraial das Pedras chegou a ser o mais próspero, contendo teares de algodão, curtumes e oficinas de couro; tendas de ferreiro, escolas de leitura e de música, armazéns de fazenda com gêneros, tecidos de algodão e produtos de engenhos de cana e de mandioca.

Por ter sido seu filho Pedro Cardoso um dos responsáveis pela rebelião, houve denúncia de que os principais cabeças teriam sido: Domingos do Prado, Dona Maria da Cruz e seu filho Pedro Cardoso.

Maria da Cruz era a alma do povoado Pedras de Baixo. Seu filho foi o único que aceitou a liderança do movimento, tendo ela se envolvido nos planos. Tendo fracassado os Motins do Sertão, Maria da Cruz e seu filho estavam escondidos. Foi nomeado um ministro, Manuel Dias Torres para prender os principais, mas usando de um estratagema, tornou público que El-Rei só puniria os principais réus presos e que os outros seriam ouvidos, para encerrar o caso. Confiantes, os dois voltaram para casa, tenho até o ministro hospedado em sua casa. Este convenceu-a a ir com ele a São Romão, sede do Julgado e exigiu que mandasse chamar o seu filho Pedro Cardoso para acompanhá-la. Ela percebendo que se tratava de um golpe, mandou avisar a seu filho que fugisse, mas ele, movido por seu amor filial, veio ao encontro de sua mãe.

“Nobre e heroica esta mulher, que se poderia dizer uma soberana decaída e prisioneira, só com o filho à vista deu sinais de fraqueza e debulhou-se em lágrimas, apertando-o convulsivamente nos braços, só se queixou de que ele viesse por ela sacrificar-se.” (Vasconcelos, Diogo de. História média de Minas Gerais)

Maria da Cruz sai de casa em direção ao porto, enquanto mulheres choravam e, altaneira entrou na barca de sua propriedade. Não houve julgamento em São Romão e ela e o filho foram conduzidos à Vila Rica e daí para o Rio de Janeiro sob recomendação que os encerrassem em uma fortaleza segura. Além de Maria da Cruz e seu filho, foram presos 17 conjurados, remetidos acorrentados à Vila Rica.

Pedro Cardoso foi degredado para a Capitania de Rios de Sena, em Moçambique e Maria da Cruz foi indultada em 1745.

Hoje, o antigo Arraial de Pedras de Baixo é a cidade de Pedras de Maria da Cruz, às margens do Rio São Francisco e o Governo de Minas Gerais instituiu o Dia dos Gerais, transformando a cidade de Matias Cardoso na Capital Simbólica de Minas Gerais, a cada 08 de dezembro. Instituiu ainda a Medalha Maria da Cruz como reconhe cimento cívico de personalidades femininas, que de modo diferenciado, tenham contribuído para o desenvolvimento econômico, social e cultural do Norte de Minas.

O grande historiador Diogo de Vasconcelos, no seu livro “História Média de Minas Gerais” assim termina suas considerações a respeito de Maria da Cruz:

“Na história de Minas, há mulheres que se imortalizaram, fosse pela sua beleza ou por seus talentos, fosse também por martírios sacrossantos. Mas digam-nos agora se alguma foi, mais do que esta, digna de memória em nossos fastos. O tranquilo esquecimento, a causa maior de sua morte, apagou seu nome, conservado apenas no velho e obscuro arraial à beira do grande rio.”

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Referências:
BRAZ, Brasiliano: São Francisco – nos caminhos da História, 1977.
PEREIRA, Antônio Emílio: Memorial-Januária Terra, Rios e Gente.Mazza Edições, 2004
VASCONCELOS, Diogo de: História Média de Minas Gerais
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Maria do Carmo Veloso Durães
Cadeira N. 04
Patrono: Antônio Augusto Veloso

HOJE É DIA DE CINEMA

O cinema em Montes Claros começou na década de 30, com o Cine Theatro Montes Claros, da empresa Gomes e Lucrecio, dos Srs. Aristides Lucrecio de Oliveira e Manoel Gomes de Oliveira, em 1931 essa empresa pertencia ao Sr. José Paculdino Ferreira e Filhos. O Cine Montes Claros encerrou suas atividades, sendo reinaugurado na década de 70, no mesmo local do antigo cinema, pela empresa Cinemas do Norte de Minas, que já havia inaugurado, em 1944, o Cine Cel. Ribeiro, cujo nome era uma homenagem à memória do industrial Filomeno Ribeiro dos Santos.

Formaram-se, em Montes Claros-MG, duas empresas de cinema, a Empresa cinematográfica Euler de Araújo Lafetá, com dois cinemas (Cine Teatro Fátima e Cine Lafetá) e a sociedade Cinemas do Norte de Minas, criada em 1966, tendo como sócios o Dr. Mário Ribeiro da Silveira e José Paculdino Ferreira Filho. Com essas duas empresas, Montes Claros passou a contar com sete cinemas: Cine Cel. Ribeiro (Praça Cel. Ribeiro), Cine Montes Claros (Rua Governador Valadares), Cine Fátima (Rua D. Pedro II), Cine São Luís (Rua Simeão Ribeiro), Cine Ipiranga (Rua Melo Viana), Cine Lafetá e Cine Nova Olinda (Av. Ovídio de Abreu).

A sociedade Cinemas do Norte de Minas também inaugurou salas de cinema em outras cidades do Norte de Minas: Pirapora, Brasília de Minas, São Francisco, Corinto, Francisco Sá, Janaúba, e Várzea da Palma. Essa empresa de cinema era gerenciada pelo tio de Dr. Mário, Sr. Otávio Silveira, que tinha um escritório de Contabilidade na Rua Barão do Rio Branco.

Em princípio os filmes eram projetados em telas pequenas, em 1953 a Twentieth Century Fox criou o Cinemascope, uma tela panorâmica com o tamanho quase duas vezes maior que a tela anterior. Esse novo formato de tela foi apresentado aos telespectadores em 1955 e em 1960 foi inaugurado em Montes Claros, pelo Cine Teatro Fátima.

Por serem muito compridos, os filmes eram divididos em cinco ou seis rolos, em latas de alumínio. Antigamente era comum dois projetores se revezarem, enquanto um rolo era projetado em um cinema, o outro era carregado pelo operador. Em Montes Claros, os filmes passavam quase simultaneamente em mais de um cinema e assim era uma correria para transportar as partes de um cinema para outro. Os cinemas do Norte de Minas contavam com um funcionário, chamado Jacó, que corria de bicicleta de um cinema para outro, transportando os rolos de filmes em latas de alumínio e, nas matinês, quando um filme parava, a criançada gritava “EI JACÓ!” Às vezes esse grito chegava até à sessão noturna, com um ou outro telespectador mais extrovertido, mas isso raramente acontecia, Jacó era muito eficiente e rápido.

Os cartazes dos filmes eram afixados nas paredes em ruas centrais da cidade, com molduras fixas e vidros para proteção, mas eles eram também espalhados nas calçadas das ruas, em suportes de madeira.
Quando o filme era famoso, campeão de bilheteria, formava-se grandes filas para aquisição do ingresso e depois para entrar no cinema. Havia um selo estadual e todos os ingressos eram selados e, ao entrar, o ingresso era rasgado pelo porteiro, que o depositava em um recipiente próprio, com pequena abertura, como se fosse um cofre.


Cine Fátima


Cine Coronel

Quase todos os cinemas tinham Bombonière, que eram pequenas lojas onde vendiam balas, pirulitos, bombons e pipocas, para se degustar, enquanto se assistia aos filmes, mas havia também os baleiros, que eram funcionários que vendiam essas gostosuras dentro do cinema, até durante a sessão era possível comprar.

Os filmes de longa metragem eram divididos em duas partes, com um bom intervalo para trocar ideias e comprar mais doces e pipocas. Os filmes épicos eram verdadeiras aulas de história. Também havia os filmes bíblicos, durante a Semana Santa, os cinemas mostravam filmes sobre a vida e morte de Jesus. Havia outros per- sonagens lendários e maravilhosos, como Moisés e Ben-Hur. Alguns filmes eram transportados para álbuns de figurinhas, que comprávamos na Agência Thaís, livraria do Sr. Ducho. As figurinhas vinham em envelope lacrado, assim muitas eram repetidas, então trocávamos figurinhas entre amigos. Também havia o jogo das figurinhas repetidas, que as crianças, sentadas nas calçadas, batiam com a palma da mão, ganhava-se a figurinha, quando ela virava. Existiam as revistas especializadas do cinema, entre elas, a “Cinelândia”, que traziam as novidades do mundo encantado da Sétima Arte, com as fotos dos famosos artistas.


Cine Montes Claros

Cada cinema tinha uma música tema para marcar o início do filme e, antes do filme, eram exibidos os Trailers anunciando os próximos filmes. As músicas tema do Cine Fátima eram “Sweet Melody” e “Vous qui passez sans me voir”, do álbum “Doucement”, de Jean Paquet, o Cine Cel. Ribeiro apresentava “O Pescador de Pérolas” (“The Pearl Fishers”, de Georges Bizet ), com a orquestra de Werner Muller... Na sessão das duas, antes do filme começar havia sempre um capítulo de um seriado, assim as crianças não perdiam mais esse filme, que era apresentado em algumas sessões.

Além da música tema, ainda tinham as famosas logomarcas das companhias cinematográficas, que eram exibidas antes dos filmes: MGM Metro-Goldwyn-Mayer com leão, que rugia. A 20th Century Fox, com flash de luz e música. A Paramount em cima de uma montanha, a Hank com um homem, tipo gladiador, que batia com um grande martelo em uma chapa de metal. A Warner Bros com um escudo e as sigla WB (Warner Brothers, dos quatros irmãos Warner). A Colúmbia apresentava uma deusa grega com uma tocha acesa na mão. A Universal com o globo terrestre com o nome Universal girando... O símbolo mais interessante era da Condor, que aparecia pousada e, de repente, alçava voo, enquanto a criançada gritava “xou, xou”. O cinema brasileiro também exibia as suas logomarcas, a Vera Cruze apenas uma placa com o nome e a Atlântida apresentava várias fontes de água jorrando. Os filmes mais antigos eram da RKO Radio Picture, com uma torre parecendo a Torre Eiffel.

A sessão das duas era para a garotada, que fazia muito barulho durante o filme. Depois vinha a sessão das 16h00 frequentada quase sempre por adolescentes. À noite era a sessão dos namorados. As moças se arrumavam como se fossem para uma festa. Antes da sessão havia o “footing”, as pessoas ficavam passeando, os casais de mãos dadas e as solteiras procurando o par. Nesse passeio, que precedia aos filmes, muitos namoros começavam... E, durante o dia, após as matinês, a criançada se divertia, trocando os gibis, as revistas em quadrinho ou trocando as figurinhas dos álbuns de cinema. Antes ou depois dos filmes, era comum também frequentar as sorveterias próximas do cinema, a Cubana, a Montanhesa, a Cristal...


Cine Ypiranga

Os filmes tinham censura, quando eram livrem, todos podiam assistir, mas quando eram proibidos para menores de 14 ou 18 anos, os fiscais do juizado de menores ficavam na portaria para controlar e os telespectadores, quando não aparentavam a idade, precisavam mostrar os documentos. Lembro-me de que já fui barrada várias vezes. Não pude assistir àquele filme “Adeus às Ilusões”, com Elizabeth Taylor, porque o filme era impróprio para a minha idade, anos depois eu assisti a esse filme e fiquei sem entender, pois hoje, nas sessões da tarde, passam filmes realmente impróprios, nas emissoras de televisão e as crianças assistem sem nenhuma censura, nem dos pais, nem do Juizado de Menores.

Além dos filmes, as salas dos cinemas serviam também para festas de colação de grau, das escolas secundárias e, mais tarde, da FUNM – Fundação Norte Mineira de Ensino Superior (Fafil, Fadir, Fadec, Famed), hoje UNIMONTES – Universidade Montes Claros.

Montes Claros é terra do cinema, já foram rodadas aqui, cenas de um filme, com o galã Paulo José, outro filme realizado aqui foi o “Cabaré Mineiro”. Ainda hoje, festivais de cinema acontecem na cidade. Afinal, Montes Claros é considerada a Cidade da Arte e da Cultura e, além de compositores, intérpretes, escritores, poetas, historiadores, jornalistas, artistas plásticos, artesãos, folcloristas, atores, atrizes, a cidade conta também com os cineastas, entre eles, Paulo Henrique Veloso Souto, Carlos Alberto Prates Correa, Alberto Graça e os irmãos Ricardo e Maurício Gomes Leite. Além desses citados, existe hoje uma turma de jovens, que está investindo na área cinematográfica.

Hoje as antigas salas de cinema se transformaram em lojas e até em igrejas evangélicas. Ainda existe cinema nas galerias dos Shoppings, mas sem aquele estilo e charme dos grandes cinemas do passado...


Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza

IVAN GUEDES
O GRANDE BRASILEIRO

Louvemos as pessoas, em primeiro lugar, pelas obras com que beneficiam o tempo e o espaço e que beneficiam cada movimento do bom viver e da boa convivência. Consideremos, sobretudo, seus atos de fé, seus gestos de gentileza, sua atuação perante a família e os amigos. Consideremos, com o melhor da nossa consciência, os que vivem sempre para o progresso dentro e fora do trabalho. Benditos os que permitem a esperança, os que têm palavras de estímulo, os que são e que estão no caminho do bem e do socorro ao próximo.

Bem-aventurados os que, mesmo nos gestos simples de cada dia, se tornam benfeitores, que têm a felicidade não como estação de chegada, mas como um modo de se movimentar para o futuro. Para estes, não existem cargas mais leves, mas sim ombros fortes e apropriados à tarefa de cada dia; não há ponto final no amor, porque o amor é vida e a felicidade é o melhor jeito de ser e de viver.

Mesmo conhecendo com minúcias a vida do amigo e do meu mais considerado colega de escola, surpreendo-me com “IVAN DE SOUZA GUEDES, este grande brasileiro”, livro fruto das pesquisas e da lavra literária da historiadora Zoraide Guerra David, lente e foco ao mesmo tempo de uma vida cheia de grandeza, sincero retrato de corpo inteiro para o agora e para o sempre: Ivan e família – fundamento sólido; Ivan e Montes Claros, terra dadivosa; Ivan , o empresário; Ivan e a expansão da Minas Brasil; Ivan e sua inter-relação humana e comunitária; Ivan nas comemorações especiais e nas homenagens que tem recebido; Ivan, uma referência e o reconhecimento público. Tudo de vida e ação, tudo de fé e esforço, tudo certeza no valor do trabalho, e acima de tudo, uma confiante esperança de quem sabe o que quer e a que veio. O importante não é passar pela existência, é viver!

Minha confreira Zoraide foi bastante feliz em todos os registros da biografia de Ivan, o filho do alfaiate baiano e intelectual Nino de Souza Guedes e de D. Maria do Carmo, bocaiuvense da melhor estirpe, excelente mãe de família e educadora; Ivan, o marido da doutora Mercês Paixão Guedes e pai dos jovens administradores Leonardo, Lyntton José, Luciano Frederico e Leandro Ivan, tudo gente do melhor que a vida de trabalho pode oferecer, uma verdadeira equipe. Em realidade, uma biografia fértil e bem apropriada diante da riqueza de informações bastante conhecidas, sempre presenciadas por amigos e clientes desde a antiga Farmácia São José, de Juca de Chichico, onde Ivan vendia remédios durante o dia e aplicava injeções durante a noite, parte por ser balconista, parte para ganhar mais uns trocados para ajudar a família e para pagar os estudos no Colégio Diocesano e no Instituto Norte Mineiro de Educação, escolas em que fizemos o segundo grau e concluímos o curso de Contabilidade. Sempre de pé, sempre olhos nos olhos, sempre se movimentando, Ivan nunca se negou a ouvir um cliente em necessidade de um conselho ou do aviamento de uma receita médica. Atendimento nota dez, o selo do sucesso!

Como deixou claro Alberto Einstein em alguns escritos, “Não podemos viver felizes, se não formos justos, sensatos e bons; e não podemos ser justos, sensatos e bons sem sermos felizes”. “Evidentemente, nós existimos em primeiro lugar para as pessoas queridas, de cujo bem-estar depende a sua felicidade e a nossa; depois para todos os seres, nossos semelhantes, que não conhecemos pessoalmente, aos quais, entretanto, estamos ligados pelos laços da simpatia e fraternidade humana.” Se o amor não é eterno, eterna tem que ser a capacidade de amar. Para Cora Coralina, “Todos estamos matriculados na escola da vida, onde o mestre é o tempo”, pois como bem disse Benjamim Franklin “A melhor coisa que você pode dar ao inimigo, é o seu perdão; ao adversário, sua tolerância; ao amigo, sua atenção; aos filhos, bons exemplos; ao pai, sua consideração; à mãe, comportamento que a faça sentir orgulhosa; a todas as pessoas, caridade; a você próprio, respeito.”

Inteligente, empreendedoramente fértil, determinado, consciente no ser e no agir, Ivan nunca teve um dia sem proveito de aprendizagem e da realização do bem. Sempre ao lado de Mercês e, ultimamente, dos filhos, cresceu e multiplicou ao mesmo tempo em que Montes Claros progrediu em tamanho e em qualidade. Das pequenas drogarias das ruas D. Pedro II e Camilo Prates, fincou pé na Doutor Santos com Padre Augusto e, hoje, lidera o comércio farmacêutico no centro e praticamente em quase todos os bairros da cidade, cada ponto comercial com mais recursos e mais modernidade. Viajante internacional bom observador, soube, juntamente com Mercês, e mais tarde com os filhos, fazer todas as adaptações que o seu comércio permitia e o conforto da clientela podia exigir. O último feito foi a instalação de uma luxuosa perfumaria, que nada deve à praticidade eà beleza das encontradas nos modernos shoppings e nas lojas duty free dos melhores aeroportos do mundo. Progredir é qualificar-se para o presente e para o futuro.

Bonita, admirável, material e espiritualmente encantadora a vida de Ivan, meu companheiro, meu amigo próximo em quase sessenta anos, seja na escola, seja na vida. Bem sei das quantas dificulda des teve que superar, do quanto teve que se esforçar, do quanto teve que aprender ao longo da vida. Agora, que Zoraide Guerra David grava em letras e imagens este portentoso registro, muito mais justiça será feita por quem o conhece no dia-a-dia ou por quem tiver notícia deste livro “IVAN DE SOUZA GUEDES, ESTE GRANDE BRASILEIRO”. Ivan e sua família têm todos os merecimentos. E que Deus os conserve sempre e sempre!



Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza

HÉLIO DE MORAIS

Quando em 27 de dezembro de 2006, Olímpia e eu recebemos pouco mais de meia dúzia de amigos e companheiros para a fundação do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, os nomes de Hélio de Morais - e de seu irmão Necésio - foram dos primeiros a entrar na lista de intelectuais formadores da Instituição. Velhos conhecidos meu e de Haroldo Lívio, Hélio e o professor

Necésio de Morais tiveram sempre o prestígio de possuidores de elogiável
memória, além de terem sido testemunhas ou participantes dos principais fatos de história da cidade e da região. Bancário de elite da antiga agência do Banco Mineiro da Produção, Hélio foi o primeiríssimo a receber convite para a administração do recém-fundado Banco do Nordeste do Brasil. Por uma razão muito simples: era considerado o grande cérebro da contabilidade bancária, além de conhecedor profundo da mecânica de financiamentos comerciais, agrícolas e pecuários. Um mestre!

Haroldo e eu também conhecemos Hélio como um dos maiores entendedores do Rotary International – administração e funcionamento– associado do Rotary Club de Montes Claros desde março de 1946. Chegavam a ser exagerados os seus conhecimentos rotários, principalmente pelo grau de exigências que ele demonstrava na escolha de novos sócios. Acompanhamos nas décadas de cinquenta e de sessenta suas funções de secretário e orientador nas governadorias de Luiz de Paula Ferreira e Luiz Pires Filho, inclusive no planejamento de viagens, quando o Distrito 452 era quase todo o estado de Minas, maior parte das estradas ainda sem asfalto.

No Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, Hélio de Morais foi sempre um frequentador assíduo e participante, enquanto a idade lhe permitiu subir e descer as íngremes escadas do sobradão dos Versiani Maurício, sede da Secretaria de Cultura. Ponderado, seguro nas opiniões, muito ajudou em nossa formação institucional. A seu cargo ficou sempre a história da Santa Casa Nossa Senhora das Mercês, ele que foi Diretor por muitos anos, além de cuidador dos arquivos e documentos. Era como se fosse também, juntamente com o doutor Carlos Versiani e cônego Antônio Gonçalves Chaves, um dos fundadores, há quase cento e cinquenta anos.

A Hélio de Morais, o notável colega do presidente Dário Teixeira Cotrim no campo da Numismática, os nossos mais sinceros agradecimentos pela participação ativa e pela honra que nos deu como confrade, companheiro e amigo!


Danie Antunes, Dário Cotrim, Hélio de Morais e Wanderlino Arruda.



Zoraide Guerra David
Cadeira N. 86
Patrono: Patrício Guerra

PRESENTES DE DEUS

Dentre os inúmeros cuidados de meus progenitores na minha formação, o cultivo da gratidão se sobressai: Conforma isto, a minha oração do amanhecer:

- Obrigado Senhor, pelo dom da vida!

Além desse presente os meus complementos expressos em: família, amizades, realizações, momentos vivenciados que lhe dão sentido e se evidenciam como “Presente de Deus”. Ele, por sua imensurável misericórdia, brinda-nos constantemente.

Dia “24 de novembro de 2018” motivada pela convocação e prazer em participar de reuniões sadias que são realizadas no Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros – IHGMC, adentrei sua instalação, sob caloroso acolhida dos confrades e confreiras, gesto característico daquela agremiação cultural, aplicado a todos os sócios e visitantes.

Após alguns minutos na sala de recepção, fomos convocados a dirigir-nos ao salão de reuniões, onde um lanche recheado de calor humano abastece o corpo e os prepara para como espírito em consonância harmoniosa deleitar-se com palestras, testemu8nhos, projetos culturais que dignificam cada participante e cultuam a memória dos que nos antecedem como: pesquisadores, fotógrafos, historiadores, memorialistas, eternizando fatos e pessoas, o que faz jus a Montes Claros a alcunha de “Cidade da Arte e da Cultura”.

Como parte integrante, ocupo a Cadeira número 86, cujo patronoé o poeta Patrício Guerra – meu saudoso pai.

Em constante reforma física o IHGMC brinda-nos com exposição de quadros, fotos, obras literárias, objetos vários com referências informativas e assim, retrocedemos no embalo da admiração e saudade, tomando consciência da necessidade de atuarmos no presente para preparamos a continuidade do processo histórico no futuro.

mbora seja rotineiro o meu prazer em frequentar aquele ambiente cultural, sobressai-se o experimentado na data que destaco neste pronunciamento quando ao adentar o salão, fui surpreendido com um mural fotográfico que expõe meu patrono.

Intimamente e entre lágrimas que deslizaram em minha face, expressei com amor e gratidão: obrigado meu pai, porque graças a Deus o senhor valorizou o saber, escreveu inúmeros e belos poemas, os quais o credenciam a ser integrante do IHGMC, como patrono da Cadeira que Ocupo, e aqui presente em espírito e foto, alegra-me para a responsabilidade do que escrevemos, porque se tornam eternizados os informes que registramos.

Numa espontânea homenagem, declamei silenciosamente este trova de sua autoria:

"Saudade não se biparte
Como, pois, se justifica
Que ela vá com quem parte
Sem se apartar de quem fica?

No embalo da gratidão que se apossou de minha alma, comuniquei-me com o Mestre dos mestres, suplicando ânimo e vitórias para todos que compõem o corpo cultural do IHGMC

E retornei ao meu lar feliz, muito feliz!


O Poeta Patrício Guerra


 


 


José Walter Pires
Associado Correspondente - Brumado/BA

O CORDEL É PATRIMÔNIO
IMATERIAL E CULTURAL DO BRASIL

Alvissareira notícia! Já fazia por merecer esse reconhecimento. O cordel tem uma gloriosa história. Vindo de além-mar, a bordo das caravelas, ancorou no Nordeste, onde encontrou terreno propício para germinar a semente, enxertada pelas características miscigenadas de um povo em formação, que haveria de florescer, de forma genuína, graças às mãos laboriosas daquele cujo nome é consensual entre os grandes pesquisadores cordelistas da atualidade, nacionais e internacionais, Leandro Gomes de Barros, isso a partir do final do século XIX.

De lá para cá, adubado pelo engenho poético e criativo, desse “pai”, desse “pioneiro” desse “príncipe”, não quero me prender ao que o chamam, mas aceitar, plenamente, uma dessas designações, o que haveria de ser batizado de “cordel brasileiro”, ou “literatura de cordel” evoluiu e ganhou forma e contornos que haveriam prevalecer ao longo da sua trajetória, daí para frente.

Outros nomes igualmente valiosos, incorporaram-se à aventura dessa literatura popular em versos, escrita, produzida de forma artesanal e impressa em tipografias que iam surgindo nas diversas cidades nordestinas, ou quando oral, divulgada pelos cantadores de viola e repente, nos desafios que ocorriam nos longínquos recantos sertanejos.

Sofrida e tortuosa estrada palmilhada por esses intrépidos “severinos”, enfrentando toda sorte de dificuldades, de preconceitos, de restrições, sem apoio oficial, mendigando patrocínios, mas que não deixaram arrefecer a crença no seu poder criativo ao divulgarem a sua arte, nos livretos que narravam as mais belas histórias encantadas, de reis, rainhas, príncipes e princesas, que povoaram reinos distantes, das histórias dessas florescente Nação, onde valentes, espertos, beatos, vingadores, jagunços, cangaceiros, heróis e heroínas, políticos, vigários e outros, misturaram-se, transformando-se nos personagens intérpretes das nossas raízes históricas, do nosso folclore, dos nossos mistérios, das nossas lendas, enfim desse imaginário como só o cordel foi capaz de revelar.

Mas, aos trancos e barrancos, o cordel, debruçando-se sobre mais de cem anos passados, e graças a renitência de tantos velejadores, quero pedir permissão aos cordiais amigos e confrades cordelistas, para dizer que um nome nos representa, na atualidade, e seja, sem ciúmes ou queixumes, e mereça o protagonismo da luta pela sua institucionalização
e reconhecimento, que é o de Gonçalo Ferreira da Silva, aí pelo alto dos seus oitenta ou mais anos, nosso ilustre e decano Presidente da Academia Brasileira de Literatura de Cordel – ABLC, que neste mês de setembro, completa trinta anos de existência.

— O cordel virou gente!

Que feliz expressão a do meu velho amigo, guru e confidente, Manoel Monteiro, pelas mãos de quem fui levado à ABLC, procurando fazer por merecer a glória da imortalidade, desde 2010, com a posse em Campina Grande – Paraíba.

Por tudo quanto dito acima, não quero ser soberbo e dizer que não estou, satisfeito com a definitiva consagração do cordel como Patrimônio Imaterial e Cultural do Brasil. Como não poderia sê-lo!?
Regozijo-me com isso!

Mais do que corrente literária, mais do que qualquer outra fonte da manifestação escrita da literatura brasileira, m ais do que qualquer outra forma de contar as vivências dessa “gente bronzeada”, sob o enlevo das emoções, de tamborilar versos, dando sintonia e musicalidadeàs estrofes construídas, de fazer gemer a viola dos cantadores em um galope à beira mar, de eternizar romances, como fizeram Leandro Gomes de Barros, Joaquim Batista de Sena, o meu patrono na ABLC, João Martins de Ataíde, Silvino Pirauá, José de Melo Rezende, outros e mais outros, que foram pelas mais variadas temáticas, desde os gracejos às traquinagens de João Grilo e Chicó, de Pedro Malazarte, de ver Lampião desafiando o satanás, e não para por aí, porque a versatilidade do cordel não tem limites, não tem fronteiras, nem se restringe a escolas, fases, períodos, como se fez a literatura canônica..

Pois bem: tornado patrimônio há de se esperar que esse novo status, consumando-se o que, de fato, já o possuía, mas agora de Direito, imponha-se e possa exigir dos Órgãos Oficiais a efetividade de ações estruturadas e direcionadas em prol do cordel e à sua inclusão no cenário nacional. Ou seja: presença em Faculdades, bibliotecas, livrarias, feiras, encontros, bienais, eventos culturais e educativos, compêndios de Literatura, grades curriculares, cadastramento de cordelistas, orientação acadêmica etc.

Ou tudo isso é querer demais? Creio eu não!

O trabalho doravante será bem maior do que se pensa. Devemos agradecer, mas ao mesmo tempo colocar as nossas barbas de molho, para que “tudo não continue como dantes, neste país de Abrantes”, para encerrar as minhas palavras e não deixar a esperança que nunca haverá de morrer em nós.

VIVA O CORDEL!

 


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