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Irmandade Nossa Senhora Mercês de Montes Claros

 


 

NOTAS DOS
COORDENADORES DA EDIÇÃO

A ordem de publicação dos trabalhos dos associados efetivos obedeceu à sequência alfabética dos nomes dos autores. Em seguida, foram ordenados os trabalhos dos associados correspondentes e convidados;

A Revista não se responsabiliza por conceitos e declarações expedidos em artigos publicados, nem por eventuais equívocos de linguagem nela contidos. A revisão dos originais foi feita pelos próprios autores dos artigos publicados.

FINS DO IHGMC

Art. 2º - O IHGMC tem como finalidade pesquisar, interpretar e divulgar fatos históricos, geográficos, etnográficos, arqueológicos, genealógicos e suas ciências e técnicas auxiliares, assim como fomentar a cultura, a defesa e a conservação do patrimônio histórico, artístico, cultural e ambiental do município de Montes Claros e região Norte de Minas.


Montes Claros - Minas Gerais 2021


INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Sobrado de Dulce Sarmento
Rua Cel. Celestino, 140 - Centro - 39400-014 - Montes Claros/MG
(Corredor Cultural Padre Dudu)

REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS

Publicação Semestral

Diretor e Editor
Dário Teixeira Cotrim

Conselho Editorial
Dário Teixeira Cotrim
Wanderlino Arruda
Hermildo Rodrigues
Mara Yanmar Naciso Cruz
Silvana Mameluque Mota

Editoração, Diagramação e Impressão: Gráfica Editora Millennium Ltda.

Fotografias: Arquivo de Dário Teixeira Cotrim, Eliane Maria Fernandes Ribeiro, Harlen Soares Veloso, Hermildo Rodrigues, Leonardo Álvares da Silva Campos, Maria Clara Lage Vieira, Manoel Messias Oliveira, Landulfo Santana Prado Filho, Maria do Carmo Oliveira, Silvana Mameluque, Américo Martins Filho, Mara Narciso, Valdevi, Facella e Internet.

Impressão
Gráfica Editora Millennium Ltda.
ISBN: 978-65-86024-19-7


Capa: Santa Casa Montes Claros - 150 anos na linha de frente


SUMÁRIO

Diretoria 2020-2021– 07
Associados Efetivos – 10
Associados Honorários – 12
Associados Eméritos – 13
Associados Correspondentes – 13
Homenagem a Associados Falecidos – 15

APRESENTAÇÃO – 17
ARTIGOS DIVERSOS DOS ASSOCIADOS EFETIVOS DO IHGMC

Alceu Augusto de Medeiros | Árvore Genealógica de Alceu – 21
André Luiz Lopes Oliveira | Da Cadeia Pública de Montes Claros ao Presidio: Registro Histórico da Transição das Estruturas de Gestão Prisional - 29
Antônio Pereira Santana | Nave de Passagem – 33
Dário Teixeira Cotrim | Aldemar Marques da Silva – 36
Leonardo A. da Silva Campos – 38
Harlen Soares Veloso – 40
Américo Martins Filho – 42
Edvaldo de Aguiar Froes | Mudança para um Centro Maior: Montes Claros – 45
Fabiano Lopes de Paula | A Arte da Fotografia, sua Influência nas artes plásticas e o trabalho de fotógrafos do século XX no Norte de Minas – 53
Filomena de Alencar Monteiro Prates | Meu Guri – 68
Gustavo Mameluque | A Escravidão Rememorada – 70
Harlen Soares Veloso | Sobrado da Fazenda Lambari e a Família Maurício – 73
Landulfo Santana Prado Filho | O que é o Som – 75
Leonardo Álvares da Silva Campos | A Verdadeira Origem do Homem
(Adeus, Lucy) – 88
Manoel Messias Oliveira | Ancestralidade Folclórica e o Catopês de
Montes Claros – 126
Mara Narciso | Eu sou o Rio São Francisco e o Cerrado - 132
Maria da Glória Caxito Mameluque | Major Saint-Clair Fernandes Valadares
e a Emancipação Política de São Romão – 136
Silvana Mameluque Mota | O Radioamador – 141
Wanderlino Arruda | Paulinho Ribeiro – 143


DIRETORIA DO INSTITUTO HISTÓRICO E
GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Fundado em 27 de dezembro de 2006.
COMISSÃO FUNDADORA 2006-2007
Dr. Dário Teixeira Cotrim
Dr. Haroldo Lívio de Oliveira
Jornalista Luís Ribeiro dos Santos
Dr. Wanderlino Arruda


PRESIDENTE DE HONRA Palmyra Santos Oliveira
PRESIDENTE Dário Teixeira Cotrim
1º VICE - PRESIDENTE José Ferreira da Silva
2º VICE - PRESIDENTE Sebastião Abiceu dos Santos Soares
1º DIRETOR-SECRETÁRIO Mara Yanmar Narciso Cruz
2º DIRETOR-SECRETÁRIO Hermildo Rodrigues
1º DIRETOR DE FINANÇAS Lázaro Francisco Sena
2º DIRETOR DE FINANÇAS José Francisco Lima Ornelas
DIRETORA DE PROTOCOLO Wanderlino Arruda
Diretor de Comunicação Social Silvana Mameluque Mota
Diretor de Arquivo, Biblioteca e Museu Amelina Chaves

CONSELHO CONSULTIVO

Membros Efetivos
Maria de Lourdes Chaves
Teófilo Azevedo Filho
Virgínia Abreu de Paula
Membros Suplentes
Juvenal Caldeira Durães
Gessileia Soares Cangussu
Dorislene Alves Araújo

CONSELHO FISCAL

Membros Efetivos
Carlos Renier Azevedo
André Luiz Lopes Oliveira
Alceu Augusto de Medeiros
Membros Suplentes
Maria do Carmo Veloso Durães
Maria da Glória Caxito Mameluque
João Nunes Figueiredo

COMISSÃO DE GEOGRAFIA E ECOLOGIA

Rita de Cássia Oliveira Bichara
José Ponciano Neto
Maria Regina Barroca Peres
Antônio Félix da Silva
Ildeu Soares Caldeira Júnior

COMISSÃO DE HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA

Denilson Meireles Barbosa
José Dirceu Veloso Nogueira
César Henrique Queiroz Porto
Paulo Hermano Soares Ribeiro
Leonardo Alvarez Rodrigues

COMISSÃO DE ANTROPOLOGIA,
ETNOGRAFIA E SOCIOLOGIA

Maria Ângela Figueiredo Braga
Hélio Antônio Maia
Jânio Marques Dias
Frederico Assis Martins
Eliane Maria Fernandes Ribeiro

COMISSÃO DE CLASSIFICAÇÃO E DE
ADMISSÃO DE SÓCIOS

José Francisco Lima de Ornelas
Marilene Veloso Tófolo
Juvenal Caldeira Durães
Zoraide Guerra David
Landulfo Santana Prado Filho

COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO E PUBLICAÇÃO

Marilúcia Rodrigues Maia
Yury Vieira Tupinambá de Léllis Mendes
Ivana Ferrante Rebello e Almeida
Daniel Tupinambá Lélis
Maria Clara Vieira Lage

COMISSÃO DE VISITA E APOIO

João de Jesus Malveira - Coordenador
Edvaldo Aguiar Fróes
José Ferreira da Silva
Manoel Pereira Fernandes Neto
José Geraldo Soares de Souza

COMISSÃO DE PROMOÇÕES E EVENTOS

Ana Valda Xavier Vasconcelos
Josecé Alves dos Santos
Teófilo de Azevedo Filho (Téo Azevedo)
Maria de Lourdes Chaves (Lola Chaves)
Augusta Clarice Guimarães Teixeira (Clarice Sarmento)
Mara Yanmar Narciso da Cruz

COMISSÃO DA LITERATURA DE CORDEL

Carlos Renier Azevedo (coordenador)
Teófilo Azevedo Filho
Josecé Alves dos Santos
João Nunes Figueiredo
Amelina Chaves


LISTA DE SÓCIOS EFETIVOS DO IHGMC


CD
Sócios
Patronos
01
Edvaldo de Aguiar Fróes Alpheu Gonçalves de Quadros
02
Leonardo Alvarez Rodrigues Alfredo de Souza Coutinho
03
Antônio Alvimar Souza Antônio Augusto Teixeira
04
Maria do Carmo Veloso Durães Antônio Augusto Veloso (Desemb.)
05
Dorislene Alves Araújo Antônio Ferreira de Oliveira
06
Marcos Fábio Martins Oliveira Antônio Gonçalves Chaves
07
Maria Aparecida Costa Antônio Gonçalves Figueira
08
Jânio Marques Dias Antônio Jorge
09
Narcíso Gonçalves Dias Antônio Lafetá Rebelo
10
Maria Florinda Ramos Pina Antônio Loureiro Ramos
11
Sebastião Abiceu dos Santos Soares Ary Oliveira
12
Antônio Augusto Pereira Moura Antônio Teixeira de Carvalho
13
Cesar Henrique Queiroz Porto Ângelo Soares Neto
14
Ana Valda Xavier Vasconcelos Arthur Jardim Castro Gomes
15
Magda Ferreira de Souza Ataliba Machado
16

Gilsa Florisbela Alcântara

Athos Braga
17
Samuel Andrade Lopes Auguste de Saint Hillaire
18
Frederico Assis Martins Brasiliano Braz
19
Paulo Hermano Soares Ribeiro Caio Mário Lafetá
20
Felicidade Maria do Patrocínio Oliveira Camilo Prates
21
Terezinha Gomes Pires Cândido Canela
22
Silvana Mameluque Mota Carlos Gomes da Mota
23

Landulfo Santana Prado Neto

Carlos José Versiani
24
José Ponciano Neto Celestino Soares da Cruz
25

Pedro Borges Pimenta Júnior

Corbiniano R Aquino
26
Harlen Soares Veloso Cyro dos Anjos
27
Regina Maria Barroca Peres Dalva Dias de Paula
28
Hélio Antônio Maia Darcy Ribeiro
29

Carlúcio Pereira dos Santos

Demóstenes Rockert
30
Maria Lúcia Becattini Miranda Dona Tirbutina
31
Augusta Clarice Guimarães Teixeira Dulce Sarmento
32
Everaldo Ramos de Oliveira Edgar Martins Pereira
33
Wanderlino Arruda Enéas Mineiro de Souza
34
Geralda Magela de Sena e Souza Eva Bárbara Teixeira de Carvalho
35

Hermildo Rodrigues

Ezequiel Pereira
36
Felicidade Vasconcelos Tupinambá Felicidade Perpétua Tupinambá
37
Evaldo Gener de Fátima Francisco Barbosa Cursino
38
Maria Inês Silveira Carlos Francisco Sá
39
José dos Santos Neto Gentil Gonzaga
40
Maria da Glória Caxito Mameluque Georgino Jorge de Souza
41
Reinine Simões de Souza Geraldo Athayde
42
Kelly Cristine Nery Rocha Gomes Geraldo Tito da Silveira
43
José do Carmo Felício Godofredo Guedes
44
Roberto Carlos M. Santiago Heloisa V. dos Anjos Sarmento
45
Gustavo Mameluque Henrique Oliva Brasil
46
Eliane Maria F Ribeiro Herbert de Souza – Betinho
47
Amelina Fernandes Chaves Hermenegildo Chaves
48
Virgínia Abreu de Paula Hermes Augusto de Paula
49
José Ferreira da Silva Irmã Beata
50
Antônio Félix da Silva Jair Oliveira
51
Osmar Pereira Oliva João Alencar Athayde
52
Maria de Lourdes Chaves João Chaves
53
Wendel Lessa Vilela Xavier João Batista de Paula
54
Cláudio Ribeiro Prates João José Alves
55
Lázaro Francisco Sena João Luiz de Almeida
56
Ivana Ferrante Rebelo João Luiz Lafetá
57
Marilúcia Rodrigues Maia João Novaes Avelins
58
Maria Ângela Figueiredo Braga João Souto
59
Márcio Adriano Silva Moraes João Vale Maurício
60
Manoel Messias Oliveira Jorge Tadeu Guimarães
61
Ildeu Soares Caldeira Jr. José Alves de Macedo
62
José Jarbas Oliveira Silva José Esteves Rodrigues
63
Carlos Renier Azevedo José Gomes Machado
64
Palmyra Santos Oliveira José Gomes de Oliveira
65
Laurindo Mekie Pereira José Gonçalves de Ulhôa
66
Fabiano Lopes de Paula José Lopes de Carvalho
67
Denilson Meireles José Monteiro Fonseca
68
Benjamim Ribeiro Sobrinho José Nunes Mourão
69
Rita de Cássia Oliveira Bichara José (Juca) Rodrigues Prates Júnior
70
José Roberval Pereira José Tomaz Oliveira
71
Manoel Pereira Fernandes Neto Júlio César de Melo Franco
72
Júnia Veloso Rebello Lazinho Pimenta
73
Terezinha de Souza Campos Neves
Lilia Câmara
74
Filomena Alencar Monteiro Prates Luiz Milton Prates
75
Alceu Augusto de Medeiros Manoel Ambrósio
76
Aparecido Pereira Cardoso Manoel Esteves
77
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro Mário Ribeiro da Silveira
78
Américo Martins Filho Mário Versiani Veloso
79
Antônio Pereira Santana Mauro de Araújo Moreira
80
Isau Rodrigues Oliveira Miguel Braga
81
Juvenal Caldeira Durães Nathércio França
82
Josecé Alves dos Santos Nelson Viana
83
Daniel Oliva Tupinambá de Lélis Newton Caetano d’Angelis
84
Itamaury Telles de Oliveira Newton Prates
85
André Luís Lopes Oliveira Armênio Veloso
86
Zoraide Guerra David Patrício Guerra
87
Elzita Ladeia Teixeira Pedro Martins de Sant’Anna
88
João de Jesus Malveira Plínio Ribeiro dos Santos
89
José Francisco Lima Ornelas Robson Costa
90
Teófilo Azevedo Filho (Téo) Romeu Barcelos Costa
91
Wesley Caldeira Sebastião Sobreira Carvalho
92
Renat Nureyev Mendes Tupinambá Sebastião Tupinambá
93
Dário Teixeira Cotrim Simeão Ribeiro Pires
94
Gessileia Soares Cangussu Teófilo Ribeiro Filho
95
Marilene Veloso Tófolo Terezinha Vasquez
96
Yure Vieira Tupinambá de Lelis Mendes Tobias Leal Tupinambá
97
Leonardo Alvares da Silva Campos Urbino Vianna
98
Mara Yanmar Narciso Virgilio Abreu de Paula
99
João Nunes Figueiredo Waldemar Versiani dos Anjos
100
Maria Clara Lage Vieira Wan-dick Dumont

ASSOCIADOS EMÉRITOS

Luiz Pires Filho
Maria das Dores Antunes Câmara
Milene Antonieta Coutinho Maurício
Petrônio Braz
Waldir Sena Batista

ASSOCIADOS HONORÁRIOS

Alberto Gomes Oliveira
Carlos Henrique Gonçalves Maia
Expedito Veloso Barbosa
Irany Telles de Oliveira Antunes
Girleno Alencar Soares
Itamaury Teles de Oliveira
João Carlos Rodrigues Oliveira
José Antônio Corrêa Mourão
José Catarino Rodrigues
José Emídio de Quadros
Luís Ribeiro dos Santos
Mardete Dias Silveira
Newton Carlos do Amaral Figueiredo
Paulo Roberto Xavier da Rocha
Pedro Ribeiro Neto
Raquel Veloso de Mendonça
Waldyr Barbosa de Oliveira

ASSOCIADOS CORRESPONDENTES

Adilson Cézar Sorocaba - SP
Alan José Alcântara Figueiredo Macaúbas - BA
André Kohene Caetité - BA
Avay Miranda Brasília - DF
Carlos Lindemberg Spínola Castro Belo Horizonte - MG
Cândida Correia Cõrtes Carvalho Luz - MG
Célia do Nascimento Coutinho Belo Horizonte - MG
Daniel Antunes Júnior Espinosa - MG
Dêniston Fernandes Diamantino Januária - MG
Eustáquio Wagner Guimarães Gomes Belo Horizonte - MG
Felicíssimo Tiago dos Santos Rio Pardo de Minas - MG
Fernanda de Oliveira Matos Caetité - BA
Fernando Antônio Xavier Brandão Belo Horizonte - MG
Flávio Henrique Ferreira Pinto Belo Horizonte - MG
Honorato Ribeiro dos Santos Carinhanha - BA
Jeremias Macário Vitória da Conquista - BA
João Martins Guanambi - BA
Jorge Ponciano Ribeiro Brasília - DF
José Walter Pires Brumado - BA
Liacélia Pires Leal Feira de Santana - BA
Manoel Hygino dos Santos Belo Horizonte - MG
Maria do Carmo de Oliveira Porteirinha - MG
Moisés Vieira Neto Várzea da Palma - MG
Neide Almeida da Cruz Feira de Santana - BA
Paulo Roberto de Souza Lima São João Del Rei - MG
Pedro Oliveira Várzea da Palma - MG
Reynaldo Veloso Souto Belo Horizonte - MG
Silio Jader Noronha Brito São Paulo - SP
Terezinha Teixeira Santos Guanambi - BA
Wellington Caldeira Gomes Belo Horizonte - MG
Yury Vieira Tupinambá de Lelis Mendes Porto Alegre - RS
Zanoni Eustáquio Roque Neves Belo Horizonte - MG
Zélia Patrocínio Oliveira Seixas Aracajú - SE
Zilda de Souza Brandão (Bim) Belo Horizonte - MG




EPITÁFIO
Para um túmulo de amigo
“A morte vem de manso, em dia incerto e fecha os olhos
dos que têm mais sono...”
(Alphonsus de Guimaraens - ossa mea, I.)



Dário Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires

APRESENTAÇÃO

Durante longos anos nós relatamos, cronologicamente, os acontecimentos acerca do Instituto histórico e da cidade de Montes Claros, procurando sempre aperfeiçoar a nossa história dos tempos de antanho. Entretanto, nunca se viu tanta tristeza por parte de todos os associados como agora, tudo isso devido a partida inesperada de três dos nossos confrades por imposição do COVID-19. Não bastasse essa intolerância do corona vírus, dois outros confrades partiram por motivos diversos. Confesso que não está sendo fácil competir com essa pandemia, entretanto, o Instituto Histórico e Geográfico sempre esteve, em última análise, com as suas portas abertas todos esses dias, cumprindo com as determinações da Secretaria de Saúde, tanto no distanciamento social como, também, no uso do álcool-gel e das máscaras, preservando, assim, a saúde dos nossos associados e evitando com isso o contágio da doença.

Nota-se que, nesta edição há as bem-apessoadas páginas que são dedicadas, in memoriam, à Aldemar Marques da Silva, Harlen Soares Veloso, Leonardo Campos, Américo Martins Filho e, também, a Paulinho Ribeiro. Ademais, o leitor poderá deliciar-se com os textos de Alceu Augusto de Medeiros, André Luiz Lopes Oliveira, Antônio Pereira de Santana Edvaldo de Aguiar Froes, Fabiano Lopes de Paula, Filomena de Alencar Monteiro Prates, Gustavo Mameluque, Landulfo Santana Prado Filho, Manoel Messias Oliveira, Mara Narciso, Glorinha Mameluque e Silvana Mameluque Mota. Num conjunto literário muito bem arquitetado pelos saudosos associados: Harlen Soares Veloso e Leonardo Álvares da Silva Campos, com os portentosos textos (“Sobrado da Fazenda Lambari” e “A Verdadeira Origem do Homem”) é completado com chave de ouro esta edição de número 26, além do que, é importante demonstrar com clareza a influência cultural da nossa terra na formação e no desenvolvimento da sua história antiga, com registros e resgates, na benemerência dos nossos ilustres associados. Boa leitura!



ÁRVORE GENEALÓGICA DE ALCEU

Eu tinha dez anos de idade quando concluir o curso primário, na cidade de Coração de jesus. Naquela época, nas cidades pequena do interior a escolaridade chegava somente até o quarto ano primário. Voltei a morar na fazenda de meus avós que me criavam, porque eu era órfão de pai e mãe. Meu tio Caetano, o mais velho, decidiu não trabalhar mais na fazenda e foi para um garimpo de diamante, em um lugar de nome Buriti Grande, situado no pé da Serra do Cabral perto do povoado do Barreiro, hoje a cidade de Francisco Dumont. Ele casou por lá mesmo, e vinha em casa de vez em quando somente a passeio. Em um destas visitas, pediu aos meus avós, pra me levar com ele, para fazer companhia para sua esposa, porque quando ele saia para trabalhar no garimpo, ela ficava muito sozinha. É que ele saia pela manhã e só voltava ao anoitecer. Meus avós autorizou e eu fui com meu tio para o garimpo de Buriti Grande. A viagem era longa, mas eu aguentei montado no lombo do cavalo. Lá eu conheci muita gente, inclusive o Sr. José Borem que era dono de todas aquelas terras, inclusive as terras do garimpo. Conheci também os outros pequenos fazendeiros que fornecia mantimentos, carnes, leite, queijo, verduras e legumes para os garimpeiros. Entre eles, eu destaco o Sr. José Fernandes que era um dos pequenos fazendeiros. Ele era um senhor de idade bastante avançada, notava isto pela sua cabeleira e barba completamente branca, e um rosto bastante enrugado. Mas era muito simpático, e estava sempre alegre, gostava de contar causos, e sabia de muitos causos, e eu gostava de ouvi-los. Era da casa dele que toda manhã eu buscava o leite para o consumo em casa. Todos me conhecia pelo o apelido de Seu Zinho. Um certo dia, ele me perguntou! Como é seu nome todo meu rapaz! Eu disse! Meu nome é: Alceu Augusto de Medeiros. Onde você nasceu! Eu nasci no Pitinha, hoje o povoado de São João da Lagoa. Ele perguntou! Como chama seus pais! Eu disse: Meu pai, Marinho Niquinho de Medeiros e minha mãe, Maria da Conceição Silva. Perguntou! Como chama sua avó mãe de seu pai! Minha avó mãe de meu pai é Roberta Soares de Medeiros. Ele ficou me olhando de maneira enigmática e me perguntou! Você quer ouvir um causo que começou há muitos anos atrás e terminou na sua avó Roberta! Sim eu quero ouvir! Mas o senhor conhece a minha avó Roberta! Eu não conheço! Quem conheceu foi o meu pai. Ele era tropeiro e viajava por aquelas banda, e pousava lá no Rancho da Pêia, o Pitinha de hoje, é lá que ela mora não é! É Sim sinhô. Venha aqui a tarde eu vou fazer um chá de canela pra nós tomar com queijo fresquinho, depois eu vou conta um causo pra você. Você vem? Venho Sim Sinhô. A tarde quando cheguei, o senhor José Fernandes já estava me esperando sentado em um grande champrão de madeira sob a sombra de uma frondosa mangueira, ao lado sobre o banco havia um bule com chá, duas xícara e um prato com queijo já cortado em pedaços. Quando me aproximei, o senhor José Fernandes com um largo sorriso no rosto disse! Você é bom no trato menino, senta ai vamos comer! Acabamos de tomar o chá acompanhado com queijo, ele limpou a boca com as costa da mão e com começou a contar o causo. No começo do século dezoito, ou seja entre l820 e l825, chegou no povoado do Senhor do Bom Fim, hoje a cidade de Bocaiuva, uma lava de escravo homens e mulheres, comprados por fazendeiros daquela região. Depois de alguns anos, já havia aumentado muito as famílias dos escravos, e uma delas era liderada por um dos integrantes de nome Miguelino Medeiros. Diziam que ele tinha três mulheres e uma delas era branca. Vamos falar somente dele, porque foi dele que surgiu muitas famílias de escravos e não escravos no norte de Minas Gerais. Miguelino Medeiros foi pai de muitos filhos que pela lei do ventre livre, nasceram libertos e esparramou por várias região do sertão do norte de Minas, e outras regiões. Eles eram muito trabalhadores, adquiriram famílias e diziam que alguns casaram com moça branca e tiveram muitos filhos e filhas, e muitos deles chegaram aprender a ler e escrever, como foi o caso de Cipriano de Medeiros, que não saiu da região onde seu pai morava e ainda escravo. Ele ficou muito rico, comprou a alforria do pai e foi dono de muitas fazendas na região. Três deles foi! Um para a região onde é hoje o povoado de Claros dos Poções. Outro lá para os lados de Pirapora. Mas vamos falar daquele que foi para a região do arraial do Santíssimo Coração de Jesus. Dos filhos de Miguelino Medeiros que foram para outras regiões, adquiriram famílias e tiveram muitos filhos e netos. Vou destacar entre eles, o que foi para a região do Santíssimo Coração de Jesus, depois Vila Inconfidência, hoje a cidade de Coração de Jesus. Ele chamava Hermenegildo Soares de Medeiros, o nome era difícil de pronunciar, então ficou conhecido como Miligido. Miligido casou com uma moça branca de nome Anísia Peixoto e tiveram quatro filhos. Não vou falar dos outros três filhos de Miligido. Vou falar somente do filho mais novo de nome Isidoro Medeiros que casou com uma Índia da etnia Tapuia, de nome Jacira e tiveram apenas uma filha que recebeu o nome de Roberta Soares de Medeiros. Isidoro havia adquirido uma fazenda na margem do córrego denominado Barro. A fazenda tinha uma boa gleba de terra, e ficava perto de uma pousada de tropeiros, conhecida como: Rancho da Pêia, depois o povoado do Pitinha, hoje São João da Lagoa. Na fazenda do Barro, trabalhava na labuta, vários negros libertos, filhos e netos libertos, entre eles, o capataz Agostinho Leite da Costa, filho de Camilo Leite da Costa, escravo liberto pela a lei Áurea. Era casado com Tereza Leite e tinham quatro filhos incluindo Agostinho. Camilo era sapateiro e tinha uma oficina de concerto de sapatos no Arraia do Santíssimo Coração de Jesus. Jacira a esposa de Isidoro morreu quando Roberta era uma menina com doze anos de idade. Não havia escolas naquela redondeza, por isto Roberta era analfabeta, mas sabia tudo de fazenda. Daqui para a frente o senhor José Fernandes parou de fazer a narração porque não sabia mais o que aconteceu. Mas eu sabia, e continuei a contar. Quatro anos após o falecimento de Jacira, Isidoro também morreu, ficando a filha Roberta órfã de pai e mãe aos dezesseis anos de idade. Roberta já namorava com Agostinho escondido do pai, agora finado Isidoro. A pedido de Roberta, Agostinho passou a ser o administrador da fazenda. Eles não podia se casar, porque Roberta era menor de dezoito anos, e o padre não celebrava o casamento porque ela era menor de idade. Quando Roberta completou dezoito anos de idade, eles se casaram e tiveram cinco filhos. Pela ordem de idade: Luiz – Sebastião – Tonica, única filha mulher – Marinho Niquinho de Medeiros – e Contijo (Conte). Destaco aqui: Marinho Niquinho de Medeiros, porque daqui para a frente ele tem tudo a ver com minha história. Esta foi a parte da origem de meu pai.

Agora conto a parte da origem de minha mãe. No final do século dezoito ou seja: entre l890 e l895, no arraial do Santíssimo Coração de Jesus, que devido o aumento da população passou a chamar Vila Inconfidência. Nesta época havia chegado no Rio de Janeiro um português de nome Manoel Rosa da Silva, que sonhava em ficar rico no garimpo de diamante, e foi para a região de Diamantina garimpar. Não teve sorte. Soube de um garimpo que estava produzindo muito diamante na região de Grão Mogol. Foi para lá, e conseguiu garimpar algumas pedrinhas de diamante que lhe rendeu um bom dinheiro. E acreditando no ditado popular que dizia! O garimpo dá, o garimpo toma! Resolveu não trabalhar mais no garimpo. Com o dinheiro que ganhou no garimpo, decidiu comprar uma fazendinha, e viver tranquilo. Comprou um cavalo arriado e um burro cargueiro para levar a tralha de cozinha e os mantimentos, e viajou para encontrar o lugar que desejava. Partiu para o rumo de Montes Claros. Em Montes Claros não encontrou o lugar que pretendia comprar. Seguiu em frente até chegar em Vila Inconfidência. Lá foi informado que havia umas terras a venda, perto da cabeceira do córrego denominado Traçado. Ele foi ver, e encontrou a terra que queria. Era realmente uma terra boa, com bastante água para a lavoura e para o gado. Ficava situada doze quilômetros ou seja duas léguas de Vila Inconfidência, e limitava com a fazenda Colodino de propriedade do turco Rachide Atanásio. Comprou a terra e construiu uma boa casa com o material usado na época, que era, adobo, barro e madeira. Conheceu lá uma moça muito bonita, de nome Lídia Gonçalves, filha de um pequeno fazendeiro cuja as terras limitava com ele. Apaixonaram e namoraram por pouco tempo, casaram e tiveram quatro filhos que eram: Sebastião, Aprígio, libânia e Olegário. O português Manoel Rosa, havia chegado depois do turco de nome Rachide Atanásio. Rachide foi mascate ambulante e viajava por toda aquela região vendendo suas mercadorias que eram: cortes de tecidos para confecções de roupas, aviamentos como: carreteis de linha, rendas, colchetes, agulhas, alfinetes, botões, gravatas, suspensórios, meias, curriões, chinelos, pomadas, pó de arroz, perfumes, sabonetes, espelhos, pasta de dente e outros mais. Transportava tudo em malas e sacolas de lona na garupa do cavalo. Depois de passar vários anos viajando e mascateando, Rachide Atanásio havia economizado dinheiro bastante para comprar a fazendinha que tanto sonhava. Encontrou o lugar que queria para formar sua fazendinha, distante duas léguas da Vila Inconfidência. Era uma boa terra de cultura, com bastante água corrente e perene. O lugar chamava Colodino e limitava com o córrego de nome Traçado, que era limite com as terras que mais tarde seria comprada pelo português Manoel Rosa da Silva. Ele construiu a casa, os currais e passou a criar gado bovino que produzia leite para o consumo e também queijo e requeijão e vendia na Vila. Além da produção de cereais, legumes, verduras e frutas. O turco Rachide Atanásio chegou no Brasil e embrenhou pelo sertão de Minas Gerais alguns anos antes do português Manoel Rosa da Silva. Gostou do lugar, e resolveu fincar o pé ali mesmo na Vila Inconfidência, de onde saia para vender suas mercadorias na redondeza. E também foi onde conheceu uma moça de nome Maria Nazaré, mas conhecida por Nazinha. Ela foi o seu grande amor, mas não podia casar ainda, devido a sua condição de viajante, e também não tinha uma casa pra morar, mas ficaram namorando! Agora ele podia casar e a pediu em casamento, ela aceitou. Casaram e tiveram três filhos homens e uma filha mulher. Pela ordem: Aurélio, Antônio, Francisco e Catarina. Os filhos do turco Rachide, e os filhos do português Manoel Rosa, que eram vizinhos e foram sempre amigos fizeram o curso primário juntos, cresceram juntos, e alguns casaram com a irmã dos outros. Os filhos das duas famílias adquiriram cada um, uma gleba de terra na região e fizeram suas fazendas. A maior delas era a fazenda de Olegário que ficava na parte baixa do córrego do Traçado e tinha o nome de Fazenda do Traçado. Aurélio casou-se com Libânia, Francisco casou-se com Tonica, filha de Roberta Medeiros, Antôniocasou-se com Henriqueta prima de Catarina, Sebastião casou-se com Rita também prima de Catarina. Aprígio foi embora para São Paulo e nunca mais apareceu. Olegário casou-se Catarina, e tiveram apenas uma filha que pelo o batismo, recebeu o nome de Maria da Conceição Silva. Três anos depois do casamento, Olegário faleceu e Catarina ficou viúva, com um filha de dois anos de idade. Mas vamos falar de uma outra família, que há muito tempo antes da chegada do turco Rachide Atanásio e do português Manoel Rosa havia chegado naregião do Santíssimo Coração de Jesus, vindo do estado da Bahia, era a família dos Guedes. Composta pelos irmãos: Tonico, Joana, e Felício. Tonico casou-se com uma moça de nome Maria Elpídia e tiveram seis filhos: Josefa (Zefinha), Julho, Cândido, Nazinha, Faustino e Joaquina. Todos tinham o sobrenome Guedes. Joana casou-se também com um rapaz da região e tiveram sete filhos: Pedro, Cátia, Elói, Geraldo, Maurício, Firmino e Juliana. Entre os irmãos Tonico e Joana, Felício era o mais novo e já era tio dos filhos deles. Anos mais tarde Felício Pereira Guedes casou-se com a viúva Catarina e veio a ser o pai adotivo da menina Maria da Conceição Silva. Felício e Catarina tiveram mais cinco filhos: Caetano, Arão, Aristóteles (Tote), Maria Alvina (Lia) e Manoel Venâncio (Tave). Todos com o sobrenome Pereira Guedes. Com o casamento, Catarina passou a ter o nome de Catarina Gonçalves Guedes. A menina Maria da Conceição Silva era carinhosamente aplicada por Negrinha, embora fosse branquinha de cabelos pretos e lisos. Os filhos de Agostinho Leite e Roberta Medeiros e os filhos de Tonico Guedes e dona Maria Elpídia Guedes, eram mais ou menos da mesma idade, como também os filhos de outras famílias que naquela época chegaram na região. Todos eram amigos na infância, e continuaram amigos depois de adultos. A população Medeiros, Guedes, Rosa e Atanásio, cresceu e foi misturando com outras que chegou na redondeza e esparramou para outras região. Marinho Niquinho de Medeiros filho de Agostinho Leite da Costa e Roberta Soares de Medeiros, casou-se com Maria da Conceição Silva, filha de Olegário Rosa da Silva e Catarina Gonçalves dos Guedes (e também filha adotiva de Felício Pereira Guedes, segundo esposo de Catarina). Tiveram cinco filhos: Alceu Augusto de Medeiros, Anemésio Silva Medeiros, Adete Silva Medeiros, Blandino Silva Medeiros e Alaíde Gonçalves de Medeiros. Pesquisei e escrevi, o relato da minha ÁRVORE GENEALÓGICA. Observação! Pertênço a quatro etnia! O NEGRO, ÍNDIO, TURCO E PORTUGUÊS. Meu nome? Alceu Augusto de Medeiros.


DA CADEIA PÚBLICA DE MONTES
CLAROS AO PRESÍDIO: REGISTRO
HISTÓRICO DA TRANSIÇÃO DAS
ESTRUTURAS DE GESTÃO PRISIONAL


“Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.” Cecília Meireles

Do Arraial das Formigas até Montes Claros, muita história foi construída e desde os tempos de arraial, o embrião da cadeia pública, de alguma forma foi fecundado. Passaram-se décadas, e a cidade foi crescendo e da mesma forma a criminalidade também.

Passando para a história mais moderna do antigo arraial, em 1986 a Administração Pública Municipal inaugura a Cadeia Pública da cidade, localizada à Av. Engenheiro Rolando Trindade, nº 140, Jardim Alvorada. A Cadeia de Montes Claros desde aquela data até o dia 1º de março de 2007 foi dirigida pela 8ª Delegacia Regional de Polícia Civil, onde o Diretor da Cadeia era um Delegado de Polícia, e a vigilância externa era feita pelo 10º Batalhão de Polícia Militar por meio do Pelotão de Guardas, quando então o Sistema Carcerário Mineiro passou por transição, transição esta que ainda está em curso.

O governo do Estado de Minas Gerais no ano de 2002 reformulou a Secretaria de Segurança Pública (SSP/MG), e criou um sistema mais moderno, a Secretaria de Estado de Defesa Social (SEDS), dentro desta estrutura foi criada a Subsecretaria de Administração Penitenciária (SUAPE), que em 2007 teve seu nome mudado para Subsecretaria de Administração Prisional (SUAPI) e posteriormente, em 2015 esta Secretaria foi extinta, surgindo assim duas novas Secretarias, sendo elas, a de Administração Prisional – (SEAP) onde os Agentes Penitenciários ficaram lotados e a de Segurança Pública onde os Agentes Socioeducativos foram alocados. Com a chegada do Partido Novo ao Governo do Estado, que possui visão Liberalista e foco no enxugamento da máquina estatal, este que subscreve fez parte de um grupo temático que ajudou a discutir os ajustes iniciais na estrutura inflada dos Sistemas Prisional e Socioeducativo de Minas e deste estudo surgiram ideias e algumas destas ideias se tornaram efetivas, sendo assim, a antiga SEAP, se tornou hoje Departamento Penitenciário do Estado de Minas Gerais – DEPEN-MG e vem recebendo de forma gradual as cadeias públicas e penitenciárias que eram administradas pela Polícia Civil, onde ainda atuam como diretores Delegados de Polícia.

A Cadeia Pública de Montes Claros passou por esta transição em 1º de março de 2007, quando seu último diretor, o Delegado Dr. Saulo Gomes Nogueira entregou a, direção para o Ten. Cel. PM QOR José Afonso Ferreira Filho, que chegou com a árdua missão de coordenar a mudança de paradigmas em se tratando de Sistema Prisional na Região Norte Mineira.

Neste processo de transição, o Diretor trouxe consigo sete Agentes, dentre eles, dois Supervisores de Segurança, Elias Marcos Damasceno que atuou como Supervisor de Segurança Externa que lhe coube criar e comandar a equipe de escolta e Milson Damião Vieira, Supervisor de Segurança Interna, a este coube criar o trânsito interno dos detentos e gerir a vigilância nas muralhas.

Em 13 de novembro de 2007, foi inaugurado na cidade, mais um prédio para custodiar os indivíduos privados de liberdade, sendo ele o Presídio Regional de Montes Claros com cerca de 600 vagas, situado no bairro Jaraguá II, para lá foram transferidos quase 500 presos que viviam na antiga cadeia onde a capacidade era de para 120 custodiados. Com a inauguração do Presídio Regional o Ten. Cel. Afonso estrategicamente deslocou o então Diretor de Atendimento e Ressocialização da Penitenciária de Francisco Sá, o Administrador Geraldo Dias de Carvalho Júnior, mais conhecido por Geraldo Júnior que assumiu a Cadeia como Diretor Adjunto, momento em que totalmente assumida pela SUAPE, a cadeia recebe nova nomenclatura vindo a se chamar Centro de Remanejamento de Segurança Prisional (CERESP).

Com a evolução do Sistema Prisional no Norte de Minas o Ten. Cel. Afonso passa a ser Diretor Regional e o CERESP é elevado a Presídio Alvorada de Montes Claros e o Diretor Adjunto Geraldo Junior é nomeado Diretor Geral do Presídio Alvorada.

O Diretor Geraldo Júnior, desde sua chegada desempenhou um trabalho diferenciado, onde focou em duas vertentes: a primeira foi com relação à gestão dos Recursos Humanos e a segunda foi a ressocialização dos encarcerados. Ao trabalhar estes dois pontos o Diretor Geraldo Júnior elevou o Presídio Alvorada a um grau de excelência e com isso serviu como modelo entre os demais presídios do mesmo porte no Estado, vindo inclusive a receber prêmios de destaque e excelência, Geraldo Júnior deixou o Sistema Prisional no primeiro trimestre do ano de 2015.,

O Presídio Alvorada, após o último Delegado de Polícia Civil a dirigir, teve dois Diretores Gerais nomeados já pelo Sistema Prisional até que este que subscreve, atuando como Diretor Adjunto do Presídio Alvorada de Montes Claros e respondendo pela Direção Geral passou as funções ao primeiro Diretor, agente penitenciário de carreira em maio de 2015. Observa-se que este é um pequeno pedaço da história da gestão prisional no Norte de Minas, história essa que contou com a participação de grades homens que exerceram função de Direção Prisional entre os anos de 2004 quando a Penitenciaria de Segurança Máxima de Francisco Sá foi inaugurada até o ano de 2015 quando os agentes de carreira começaram a assumir as direções das unidades.


NAVE DE PASSAGEM

Quando me buscares, não mais estarei aqui, não quero ser o último a embarcar nessa nave de luz. O vento já vem soprando em busca dos retardatários da vida, a nave não espera por ninguém. A sombra da tarde confunde os rostos dos que ficam e a lua ilumina a face dos que querem ir. Dos que saem pelos caminhos que um dia foi prometido para que não houvesse nenhum lamento nos olhos dos meninos e meninas, dos filhos e filhas do trabalho honroso ou escravo, dos puros e dos delinquentes, dos anjos que não foram para a catequese quando chamados.

Se me olhares nos olhos não verás o brilho que carrego e não entenderás o meu rosto, e jamais verás a luz que trago n’alma. Tenho todos os sonhos adormecidos, que foram escritos em tempos pretéritos. São rabiscos feitos em papeis avulsos que mantenho guardados na mente que ainda está sã e sonhadora, mesmo com esses contratempos de ventos e sombras que sopram em todas as direções, fazendo vítimas, indiscriminadamente: negros, brancos, pardos, europeus, americanos, do norte e do sul, e tantas outras raças por esse mundo afora.

Ainda com tudo isso, a minha mente viaja em devaneios, que são permitidos nas noites quentes de lua cheia, ou mesmo na lua minguante. A lua nos remete a delinquir. Ela sugere pecados que serão perdoados assim que a nave chegar ao ponto final.

Quando voltares, verás que minha mala já não está sobre o guarda-roupas do quarto como de costume. O mesmo quarto onde deitei para dormir à espera da tua companhia, sem contudo ter feito um poema que falasse de amor, ainda que em rimas de dor, como são os mais lindos, e que são lidos as lágrimas pelas criaturas que teimam em amar.

O amor, tão grandioso como é, deveria criar uma luz de felicidade eterna, mas não! Ele está sempre na dor, a espera do fim, seja pela perda do ente querido ou pela traição do hipócrita que existe em cada personagem seja real ou fictícia.

A luz da nave dá o sinal de partida. Não há uma chamada por ordem alfabética, todos devem estar atentos a tudo a sua volta.

Naquela primeira noite da viagem ficamos todos juntos prestando muita atenção ao noticiário. As conversas foram diminuindo a medida que o tempo passava. Na embriaguez do sono eu observei que mesmo a nave estando em alta velocidade algumas pessoas continuavam a entrar e se acomodarem nos bancos. Eu tive uma pequena dúvida se eram de fato pessoas ou simples espíritos que estavam em busca dos seus corpos, e essa preocupação tirou-me o sono: seria eu, também, um espirito?

Saí a andar pelo corredor da nave. Tentei falar com as pessoas ou com os espíritos, mas ninguém me ouvia, ou fingiam não ouvir. Então resolvi voltar ao meu lugar. Não o mais encontrei. Todos os lugares eram iguais, nada identificava onde eu estava anteriormente.

Eu não tinha levado nada para essa viagem, nem a mala eu consegui localizar. Acho que na correria eu a deixei em cima do guarda-roupas, deve ter sido isso mesmo, não me lembro de têla trazido comigo. Recostei em um canto qualquer e esperei o dia clarear para eu poder me orientar direito. O silêncio era quase total, um pequeno zumbido vinha da parte traseira da nave, agora já não sei direito se traseira ou dianteira, tudo era igual. O barulho parou, só eu estava acordado, as janelas continuavam abertas, ninguém mais entrava como antes, parece que as pessoas já estavam cansadas: todas dormiam profundamente. Comecei a me preocupar, o dia não clareava!

Olhando pela janela, eu não via a lua, tão pouco as estrelas. Eu não tinha um relógio de pulso. Como saber as horas? Ao passar a mão pelo pulso notei que batia lento, quase parando. Contei as batidas, não passavam de umas poucas dezenas, acho que menos que quarenta e poucas, saí andando a procura de alguém que pudesse me socorrer, que pudesse medir os meus batimentos cardíacos, quem sabe encontrar ali um médico cardiologista ou mesmo o seu espirito, tomara que ele não tenha esquecido o seu estetoscópio como eu esqueci a minha mala. O desespero foi tomando conta de mim, eu gritei alto, uma, duas, três ou mais vezes, o meu grito não era ouvido, comecei a tossir um cheiro de mofo invadiu o espaço onde eu me encontrava. Eu não via outra saída, a não ser ir pra janela, tentar respirar um ar puro. Porra nenhuma o cheiro de mofo vinha exatamente daquela janela, corri pra outra, o mesmo cheiro a me sufocar, aí não teve outro jeito, gritei novamente desesperado, agora eu clamava a Deus por um pneumologista, ninguém me ouvia, moço, moço meus pulmões estão carregados, nada. Ninguém naquele lugar me ouvia. Num impulso derradeiro me atirei da janela... Graças a Deus era um sonho. Esse coronavírus ainda vai nos deixar loucos!


 

ALDEMAR MARQUES DA SILVA
in memoriam

Em pouco tempo o Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros perdeu, para o COVID-19, três dos seus associados efetivos: Aldemar Marques da Silva, Harlen Soares Veloso e Américo Martins Filho. Em conformidade aos confrades Harlen e Américo, eles revelavam-se as suas preferências como pesquisadores e estudiosos da história regional e da genealogia. Por outro lado, o jovem Aldemar, que era gestor ambiental, foi um defensor aguerrido do meio ambiente da cidade em que nasceu.

Ainda com relação a Adelmar, podemos dizer que em toda parte era ele um vencedor. Por que? Porque possuía ele, na verdade, uma vontade indomável de vencer todos os obstáculos que ousassem lhe atravessar o caminho do sucesso. No Instituto Histórico ele permaneceu por aqui um pouco menos de três meses, mas o suficiente para deixar uma infinita saudade entre os seus pares. Nota-se que Aldemar fazia uso de todos os métodos para compor a sua primeira e única obra literária: o Senhor do Castelo, um livro em que “o leitor tem em mãos uma obra produzida por um escritor novato, mas dotado de uma capacidade incrível de retratar os meandros da vida no sertão-mineiro e goiano do início do século XX, através de muitas histórias de vida que se cruzam,”. Sabemos, ainda, que ele era dotado de uma espiritualidade criativa semelhante às de alguns escritores do Instituto Histórico e Geográfico e, por essa razão, a sua partida tão inesperada causou-nos uma interrogação sem precedentes no mundo da literatura.

No egrégio Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, o escritor Adelmar Marques da Silva ocupava a cadeira número dois, que tem como patrono o saudoso Dr. Alfredo de Souza Coutinho. A sua cadeira será ocupada por força do Estatuto, mas a sua lembrança, esta jamais será esquecida, haja vista que ela já se encontra registrada nos anais do nosso egrégio Instituto Histórico e Geográfico.

Por fim, inesperadamente, o jovem Aldemar passa a ter a sua fala em silêncio, em virtude do COVID-19, onde uma onda de admiradores somente pode lhe aplaudir pela sua vitoriosa carreira de professor universitário, sem ao menos, exibi, para tanto, o seu testemunho de amor e de fé. O nosso Instituto Histórico e Geográfico está de luto. De luto uma, duas e três vezes neste fatídico cenário da pandemia do corona-vírus. No álbum fúnebre do Instituto, onde Alphonsus Guimaraens registrou num epitáfio para o túmulo de um amigo, foi assim gravado: “A morte vem de manso, em dia incerto e fecha os olhos dos que têm mais sono...”. Mas, nada poderá apagar a magnitude de seus sonhos, quando cumpriu tão nobremente a sua missão em prol do desenvolvimento das pesquisas, com a integridade e a dignidade que hoje merecem para sempre a gratidão dos seus amigos e confrades de Instituto.

Aldemar Marques da Silva nasceu no dia 18 de junho de 1976, nesta cidade de Montes Claros. Era filho de Domingos Marques da Silva e de dona Maria Rosa Marques da Silva. Foi casado com Márcia Aparecida Pereira Silva e pai de duas crianças. Desde muito pequenino que a natureza lhe encantava, sobremaneira, com o voo dos pássaros, com o perfume das flores, com a luz do dia e o luar da noite. A sua fé religiosa, que o acompanhava durante as suas orações diárias, fora o motivo de profundo silêncio para a sua bondosa alma.

LEONARDO A. DA SILVA CAMPOS
in memoriam

O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros ficou muito mais pobre com a morte prematura do associado Leonardo Álvares da Silva Campos. Ele nasceu em 3 de junho de 1953, nesta cidade de Montes Claros, era filho de Bento Álvares da Silva Campos e de dona Terezinha Peres Álvares da Silva Campos. Deixou registrado uma vasta e interessante biografia sobre as suas obras e a sua vida, pois era um gênio de múltipla facetas e, que haverá de ser perpetuamente lembrado como sendo um dos mais denodados vultos da história de Montes Claros, pois são os fatores que levam o homem a elevar-se de um simples posse de talento, ou de talentos, à genialidade dos fatos. Leonardo era, verdadeiramente, um gênio!

Foi, pois, Leonardo Campos, desse ponto de vista, um pioneiro da pesquisa, um dos primeiros a ter consciência de que o homem primitivo no Norte de Minas merecia estudos relevantes, mesmo por parte de outros pesquisadores e historiadores, numa época em que ainda os seus trabalhos da antropologia não passavam de divagações filosófico-literários e, sobretudo, na parte que diz respeito às coletas no interior das grutas em nossa região, numa legião de indivíduos sempre liderada por Simeão Ribeiro Pires e José Alves de Macedo. Pois bem, se nenhum outro mérito tivesse o seu livro “O Homem Primitivo no Norte de Minas”, os seus escritos sobre esses mesmos assuntos, publicados em nossa revista, bastariam para justificar uma nova edição do seu livro, isso no mesmo estilo acadêmico e sob a supervisão do egrégio Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. É verdade que os seus livros têm hoje um lugar de relevo na literatura montes-clarense, isso porque o seu valor maior foi, além de incorporar na própria vida do povo sertanejo o conhecimento de suas origens, também o de relatar histórias como a de “Saluzinho”, um camponês que foi acuado pelas forças do poder de mando de pessoas inescrupulosas de nossa sociedade.

Então, a nossa cidade da arte e da cultura, mais uma vez se encontra em completo e lastimoso luto. Luto pela morte abrupta do nosso associado Leonardo Campos. A sua partida para a outra dimensão nos deixará um vazio, sem precedentes, em nossos corações, pois era ele um homem sincero e polêmico nos seus debates; uma pessoa inconstante nos seus afazeres e um forte e integro na defesa de suas teses, as que sempre argumentava, sem constrangimentos, sobre tudo o que lhe valia para a compreensão do universo e da origem do ser humano.

Note bem que, acerca do trabalho que ele realizou durante toda a sua vida, nós assim escrevemos para uma reflexão mais sensata: não sei como o povo da minha terra o julgará no futuro, mas para mim, parece-me que foi um escritor que brincava com as palavras de um texto escrito, uma vez que ele encontrava na crosta terrestre um pedaço de pedra lascada, ou um pequeno osso petrificado, sempre registrava essas descobertas em seus livros e/ou apostilhas, para a construção de nossa história.

Neste mês de abril, o nosso Instituto esteve em pânico! A memória dos que já foram jamais será, por nós, olvidada. O passamento levou-nos para sempre os associados Aldemar Marques da Silva, Harlen Soares Veloso e Américo Martins Filho. E, agora, a morte suprime do nosso convívio de entretenimento, a alegria e a sapiência jovial de Leonardo Álvares da Silva Campos. No Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros ele ocupava com galhardia e competência a cadeira de número noventa e sete, que tem como patrono o saudoso historiador Urbino Vianna. Presentemente, o céu montes-clarense se transformou num crepúsculo carmesim, com a tonalidade da saudade e os traços misturados na infinita dor, numa triste hora de dizer-lhe adeus. Adeus, meu velho amigo e estimado confrade paleontólogo, doutor Leonardo Álvares da Silva Campos! Requiesce in pace!

HARLEN SOARES VELOSO
in memoriam

Pesquisadores houve a quem a história os chamou de grandes porque escreveram documentários que sempre delinearam o progresso de um lugar, a formação de uma família e a fé de um povo nos acontecimentos dos fatos. Outros, porém, sobreviveram na invenção da Internet, ocupando espaço de difícil acesso para a fama literária e sem se dá conta da tecnologia avançada no mundo. Entretanto, o investigante Harlen Soares Veloso, na sua vocação de historiador, catalogou em suas pesquisas, sem muita preocupação com a fama e nem com a modernidade da história, o que sempre desejou fazer, visitando in loco os lugares que verdadeiramente lhe inspirava numa doce paixão. Era, por assim dizer: uma paixão pela história e pela genealogia, baseada nos velhos documentos que antes pouco interesse havia despertado nas pessoas, aquando da sua inaugural inspeção.

Desde os seus primeiros escritos que ele se sentia invadido por uma curiosidade contundente dos fatos, em razão as descobertas de registros sobre os templos e os casarões abandonados no coração da sua terra natal. Tudo lhe fascinava com encanto. Tão árdua era o seu esforço que, numa simples expedição pelas prenhas elevadas das Sete Passagens, ele revelava todos os caminhos do decamão que levaram os
baianeiros à conquista das terras neste sertão verdejante do Juramento, no Norte de Minas.

Todos esses dotes e o espirito ambicioso arrastaram-no para o Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, com a promessa de resgatar a memória de sua terra. Além disso, Harlen sabia mais (mais do que alguns escritores que dedicaram a vida inteira a esses assuntos) de como iniciar a sua arrojada pesquisa e dela tirar o maior proveito para o conhecimento da narrativa dos acontecimentos.

Harlen escreveu crônicas a respeito das origens dos Veloso no Norte de Minas, na figura do coronel Gregório José Veloso, “como relata Rui Veloso Versiani dos Anjos na obra A História da Família Versiani”. Também teceu comentários sobre o bicentenário do Dr. Carlos Versiani, ainda sobre a igrejinha de Catarina e no que concerne ao sobrado da fazenda Lambari e da família dos Maurício ele fez constar nos anais da Revista do Instituto todo o enredo de suas existências. Assim como as tradições e os costumes do povo de antigamente - As Festas de Agosto e a Cavalhada – que foram sempre assuntos de seus estudos preferidos. Sobre a igreja de Catarina, anotamos abaixa um registro que ilustra muito bem a importância do templo. Vejamos:

“Uma igreja formada de quatro esteios, paredes caiadas, um galinho de madeira no alto do telhado, dentro um altar lacrado protegendo uma imagem preciosa. Em volta, mata virgem através da qual. no tempo da escravidão, fugiu a escrava Catirina, que, de fome e cansaço, morreu alí, onde foi erguido um cruzeirinho pequeno e onde a fé do povo testemunhou milagres”. (Carolina Pereira Durães Maia - Loura)

Os apreciadores da história de Minas Gerais procuram, em vão, descobrir o segredo da paixão pela arte de historiar, assim como fez o nosso saudoso confrade Harlen Soares Veloso. O seu trabalho de resgate histórico sempre será lembrado por todos os seus pares, em qualquer tempo, do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, haja vista a sua importância em documentar, com fundamento autêntico dos fatos ocorridos no passado, para o conhecimento de uma nova geração. Harlen ocupava a cadeira de número 26, que tem como patrono o ilustre escritor montes-clarense Cyro dos Anjos, e que certamente será destinada para um membro de sua família com o objetivo de preservar a sua memória imperecível.

AMÉRICO MARTINS FILHO
in memoriam

 

Ainda agora se pode contemplar, no Trevo dos Tropeiros, a belíssima escultura de ferro dedicado aos tropeiros do Norte de Minas, que foi oferecida por Américo Martins Filho ao povo de Montes Claros. Entretanto, o seu idealizador foi acometido pela COVID-19 e, infelizmente, perdeu a sua última batalha. Este moço, valente, trabalhador, visionário desde muito cedo, se interessou pela defesa ambientalista de nossa terra e pelo resgate memorial do nosso povo. Ele era filho de Américo Martins e de dona Rudofida Soares Coutinho, nasceu em Montes Claros no dia 26 de setembro de 1939, cidade que ele amava de coração.

No Sítio da Rocinha, onde ele morava, era Américo um autêntico benemérito do tempo, como demonstrou, particularmente, no caso do apego aos cachorros abandonados pelas ruas da cidade. Será que as suas notáveis realizações, no sentido estritamente humano, nos apresentam um mistério insondável onde tentamos penetrar? Sim, mas isso não é tudo. Das centenas de benfeitorias realizadas por ele, podemos ainda destacar a sua coleção de jornais antigos, um legado imprescindível para o resgate da história de nossa cidade em conformidade com os fatos acontecidos. Na verdade, o confrade Américo Martins Filho era diferente de todos, abastado financeiramente,
nunca se isolou dos amigos e nem se contaminou da mosca azul pela riqueza de teres e haveres. Era ele dotado de uma espiritualidade semelhante às de alguns dos mais dignos dos seres humanos, pleno de visões sublimes e de paixão moral. Esta concepção de nobreza, que o acompanhou por toda a sua vida, teve grande influência no seu espírito
de homem temente a Deus.

Por outro lado podemos dizer que era um mecenas na cultura. Contribuía de todas as formas para as belas-artes de sua comunidade. Não seria por acaso que o seu espirito de colecionador lhe permitiu a reunião de vários carros antigos em sua Casa de Festas. A glória alcançada por este grande homem foi motivo de muita alegria, tanto no seio de sua família, como no meio dos seus amigos. Hoje, a cidade de Montes Claros lhe deve continências pelos seus atos de coragem e determinação na condução vitoriosa de seus projetos para minimizar o sofrimento de seus semelhantes e dos animais abandonados aleatoriamente.

Mas, a sua obra não desaparecerá com a sua morte. Isso acontece por ele tê-la feito em alicerces fortemente armados com pedras e cimento. Sem dúvida que os seus filhos haverão de encontrar uma maneira de reunir fatos determinantes para compor a sua belíssima biografia. O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros tem a obrigação de iniciar uma pesquisa, junto com a família, para catalogar os feitos mais relevantes num documentário e fazê-lo incontinentemente. Assim, no julgar dos relatos de suas ações, é nosso dever, como também de outros, sustentar obstinadamente o direito de se fazer o seu sonho realizado.

Faleceu Américo Martins Filho na mesma cidade onde nasceu, no dia 12 de abril de 2021. Ainda agora se pode contemplar, no Trevo dos Tropeiros, a belíssima escultura de ferro dedicada aos tropeiros do Norte de Minas, na saudade imorredoura do seu doador Américo Martins Filho!


A MUDANÇA PARA UM CENTRO MAIOR: MONTES CLAROS

Depois de quase seis anos naquela pequena cidade, Jansen tomou uma importante decisão: clinicar e operar num Centro Médico maior, de maiores recursos propedêuticos e hospitalares.

Durante 06 meses ficou prestando seus Serviços, uma vez por semana, no Hospital, onde iniciara sua atividade profissional.

Bem sabia, que novos desafios surgiriam, exigindo atualizações frequentes e dedicação total à sua profissão!

Nos próximos capítulos, novos casos serão contados, ora rotineiros, ora raros, com resultados variados: ótimos, bons e maus, pois o antigo aforismo bem conhecido por todos nós afirmava: “Em Medicina não existem doenças, existem doentes”.

Cada paciente reage de maneira peculiar à mesma doença, ou seja, cada caso é um caso.

E aquele outro aforismo em francês, repetido pelos seus mestres: “La Medicin c’est come la mour, ni jamais, ni toujour”.

E mais, em Medicina o que é comum é comuníssimo e o que é raro é raríssimo! Assim, o Médico deve se atualizar durante toda a Vida Profissional, pois somente fará o diagnóstico das patologias que conhece!

OUTRO CASO DE FERIMENTO POR ARMA BRANCA
PENETRANTE NO ABDOMEN

Deu entrada no Hospital um paciente, proveniente da zona rural, apresentando um ferimento por arma branca (faca) ao nível do mesogastro, próximo ao umbigo, com exteriorização de parte do grande epiploon (tecido gorduroso que proteje as vísceras abdominais).

Após o exame clínico minucioso, coleta de sangue e urina para exames, venopunção para injeção de medicamentos e soroterapia, dissecção de veia no braço para maior segurança e jejum absoluto, Jansen telefonou para o Anestesista da cidade vizinha, chamando-o para a cirurgia de urgência: Laparotomia Exploradora.

Tudo foi devidamente preparado na pequena Sala Cirúrgica pela competente Enfermeira e suas auxiliares e assim que o Anestesista chegou acompanhado do auxiliar de cirurgia, iniciou-se o ato operatório.

Constatou-se uma perfuração na alça intestinal do delgado (jejuno), procedendo-se a enterorrafia em dois planos, após desbridamento local, limpeza da cavidade com solução fisiológica, colocação de um dreno de Penrose no local com exteriorização do mesmo em abertura contra lateral, seguida do fechamento da parede abdominal.

Pós operatório rotineiro, com hidratação, antibióticos, analgésicos e jejum até o retorno dos movimentos peristálticos: em torno de 03 dias, além do anatox tetânico I.M.

Tudo transcorria normalmente quando, após uma semana, instalou-se um quadro de Obstrução Intestinal (vômitos frequentes, distensão abdominal progressiva, com timpanismo aumentado e parada de eliminação de gases e fezes).

Um RX Simples do Abdomen em ortostatismo (paciente de pé) mostrou níveis hidroaéreos, selando o diagnóstico.

Uma reintervenção foi marcada imediatamente, com o mesmo Anestesista e auxiliar, jejum e sonda nasogástrica.

Na Laparotomia constatou-se a presença de numerosas bridas (aderências) levando a angulações de alças do delgado, muita distensão e início de “sofrimento das mesmas”.

Feitas as secções cuidadosa das bridas, usando soro fisiológico morno umidecendo as compressas e conferindo as posições adequadas das alças, procedeu-se a drenagem da cavidade abdominal e fechamento da parede.

Porém, surgiu no 5° dia do pós operatório mais uma temível complicação: uma fístula do intestino delgado, com saída do seu conteúdo através do dreno (líquido amarelado).

Adotou-se o tratamento conservador, com proteção da pele em torno da fístula com pomadas e troca dos curativos frequentes para evitar a autodigestão, hidratação, antibióticos, analgésicos, manutenção da sonda nasogástrica para aspiração, transfusão de sangue total para melhora do estado geral, inclusive a proteinemia.

Assim que voltaram os movimentos peristálticos, com eliminação de gases e as condições gerais foram melhorando, a vazão da fístula foi diminuindo e o paciente voltou a alimentar-se por via oral e a deambular na Enfermaria.

Permaneceu internado por um mês, mas se recuperou!

Foi realmente um caso complicado que serviu de mais experiência para o jovem cirurgião!

OUTRO CASO DE PERÍCIA NA ZONA RURAL: SUICÍDIO

Outro fazendeiro amigo, da região de Vaca Brava, procurou o médico para acompanhá-lo, juntamente com o Delegado Municipal e seus dois policiais, até a sede de sua fazenda, à noite, em torno das 20:00 horas.

Tratava-se de um lamentável caso de morte devido ao ferimento penetrante no ouvido direito, por arma de fogo, revólver calibre 38.

Era uma mulher de 55 anos de idade, que morava na sede da fazenda e fora criada pelos pais do fazendeiro, tendo sido, inclusive babá dele e de seus irmãos, sendo assim admirada e querida por todos os familiares.

Adentrando ao quarto, onde se encontrava a moribunda, Jansen observou, com redobrada atenção, todo o ambiente, notando a arma de fogo caída ao seu lado, com sinais nítidos de chamuscamento pela pólvora na mão e na orelha direitas, sem outros sinais que denunciassem luta corporal prévia. Um fio de sangue coagulado havia
escorrido do conduto auditivo externo.

Concluiu, assim, que se tratava de um caso de suicídio e prontificou-se a preencher o Laudo Pericial e o Atestado de óbito.

Era mais um caso da área da Medicina Legal, bem desempenhado!

UM CASO DE ENVENENAMENTO COM ARSÊNICO


Um chamado urgente para o Dr. Jansen atender um idoso fazendeiro, morador na própria fazenda a 02 KM da cidade, apresentando quadro súbito de vômitos e diarreia, seguida de sangramento retal. O quadro clínico era dramático: desidratação intensa, sudorese profusa, palidez, agitação, taquicardia, pulso fino, hipotensão arterial: estava instalado o “ estado de choque hipovolêmico”.

Uma anamnese rápida revelou, através dos familiares, que o paciente ingerira um pedaço de bolo por ele preparado com uso de

uma substância branca confundida com bicarbonato de sódio que, na realidade, tratava-se de arsênico. O seu antídoto natural é o leite, mas
ele não deglutia, devido a agitação intensa e os vômitos.

Foi transferido imediatamente para o Hospital, bem perto dali e iniciado o tratamento com soroterapia, através de dissecção de veia do braço, antiemético, oxigenioterapia por catéter nasal, coleta de sangue para classificação e prova cruzada para transfusão de sangue total e sonda nasogástrica para injeção de leite.

Infelizmente, o paciente não respondeu à terapêutica instituída e veio a falecer horas depois, com o preenchimento do Atestado de Óbito, como ”causa mortis” de envenenamento com arsênico!

São os ossos do ofício, bem sabia o jovem Médico!

 

UM CASO DE TENTATIVA DE AUTOEXTERMÍNIO

De repente, adentram à sala de espera do Hospital, dois policiais destacados na cidade, conduzindo um fazendeiro local que havia disparado um tiro no seu peito esquerdo, com o próprio revólver, calibre 38!

Os familiares que o acompanhavam relataram que tal desatino ocorrera por conta de dívidas com agiota bastante conhecido por todos, levando-o ao desespero total.

O exame minucioso do paciente demonstrou agitação intensa, mucosas descoradas, sudorese fria, pulso filiforme, taquicardia, ou seja, estado de choque hipovolêmico de causa hemorrágica.

O orifício de entrada do projétil encontrava-se na altura do 5° espaço intercostal esquerdo e o orifício de saída do lado direito do dorso.

As bulhas cardíacas estavam audíveis, com frequência elevada, demonstrando que, por sorte, a bala não atingira o coração!

A eficiente Enfermeira conseguiu puncionar uma veia periférica e iniciou-se a infusão de soro fisiológico, rapidamente, com coleta de sangue para classificação ABO-Rh e prova cruzada em lâmina e, no caso, os doadores foram os próprios policiais já cadastrados no Hospital.

Após as duas transfusões e soroterapia o choque foi revertido, sendo feito um RX de Tórax, com o paciente deitado, apenas para orientação imediata, pois as condições técnicas foram ruins, com provável derrame pleural.

Em seguida, o paciente apresentou vômitos escuros e o Jansen pensou na hipótese de lesão de esôfago ou fundo gástrico, além da necessidade de melhor avaliação da cavidade torácica (hemopneumotórax)?

Decidiu-se, assim transportar o paciente para um Centro de maior recurso, distante 50 Km.

Lá chegando, foi realizado outro RX de tórax e um exame contrastado do Esôfago- estômago, constando-se apenas hemopneumotórax volumoso à esquerda.

O paciente foi internado na Santa Casa, onde o próprio Jansen realizou a drenagem em selo d’água do hemitórax esquerdo, com saída de grande quantidade de sangue e ar, com nítida melhora da respiração, além de nova hemoterapia e hidratação venosa e exames de rotina para avaliação.

Um colega do Hospital, passou a cuidar daquele caso até a sua alta, com bom estado geral, enquanto Jansen retornara à cidade onde trabalhava, fazendo os controles ambulatoriais naquele paciente, com apoio psicológico e dos seus familiares.

Aquele ato de desespero total, felizmente, terminou bem!


A ARTE DA FOTOGRAFIA, SUA
INFLUÊNCIA NAS ARTES PLÁSTICAS
E O TRABALHO DE FOTÓGRAFOS DO
SÉC. XX NO NORTE DE MINAS

Resumo: Representar ideias, emoções e sentimentos por meio de formas e cores tem sido, desde a pré-história, habilidade do homem. Sempre associados à observação. Das mais remotas pinturas rupestres às pinturas dos tempos egípcios e nos séculos seguintes, as artes passaram por grande evolução até que surgiu a objetiva fotográfica para auxiliar o lápis e o pincel. O desenvolvimento da técnica e da arte fotográfica aconteceu rápido em todo o mundo. O Norte de Minas conheceu esse invento através de fotógrafos viajantes que passaram por aqui e ensinaram seus conhecimentos aos que deles se interessaram.

Unitermos: Fotografia, história, artes plásticas, documento, Norte de Minas.

Abstract: Representing ideas, emotions and feelings through colors and shapes has been since prehistoric times, man’s ability. Always associated with the observation. The most remote cave paintings to paintings of Egyptian times and during the following centuries, the arts have undergone great evolution until it emerged photographic objective to assist the pencil and paintbrush. The development of technique and art happened fast worldwide. The North of Minas met this invention by photographers travelers who passed through here and taught his knowledge to them that interested.

Key Words: Photography, history, fine arts, document, North of Minas.

 

INTRODUÇÃO

O invento da fotografia foi, na verdade, tentativas de aperfeiçoamento dos métodos de impressão sobre o papel, dominados pelos chineses no século VI e difundidos na Europa e no resto do mundo nos séculos XVIII e XIX. Posteriormente, esse invento chegou ao Brasil e teve no Imperador Dom Pedro II um dos seus incentivadores, se tornando também um apaixonado fotógrafo amador. São famosos os registros que ele fez da família imperial em Petrópolis-RJ. Em Campinas-SP, o ítalo-brasileiro Hércules Florence desenvolveu a técnica com maestria e se tivesse feito o registro da mesma poderia ter sido considerado o seu inventor, porque só pouco tempo depois a patente foi dada a Louis Daguerre, na França. A descoberta e exploração do ouro e pedras preciosas em Minas Gerais, trouxe na leva dos aventureiros também alguns fotógrafos que documentaram essa corrida pelo ouro e seguiram rumo ao interior do Estado. No Norte de Minas, fotógrafos amadores e profissionais cumpriram o papel de documentar a sociedade em vários aspectos, tanto da vida privada, quanto da vida pública além do cotidiano das cidades, vilas e fazendas.

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Historiador e Doutor em Arqueologia/Quaternário, Materiais e Cultura – Universidade Trás dos Montes de Alto Douro – Portugal/PT. Servidor do IEPHA-MG
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O PASSO A PASSO DO DESENVOLVIMENTO TÉCNICO

O Francês Joseph N. Niépce (1765 – 1833), que antes de dedicar-se à fotografia, trabalhou muitos anos para aperfeiçoas a arte da litografia, em 1826, conseguiu registrar em uma folha de papel tratada quimicamente a imagem de uma mesa num jardim. Já Louis Jacques M. Daguerre, pintor e cenógrafo parisiense, conseguiu em seguida reduzir o tempo de exposição, chegando a criação dos “daguerreótipos”, que em pouco se tornaram famosos na Europa. Outras pesquisas conseguiram grandes avanços nos processos fotográficos, não só das câmeras, mas também dos químicos, filmes de gelatina e dos químicos para a revelação. Com a técnica aperfeiçoada, um número cada vez maior de pessoas começou a fotografar. Nesse sentido, ninguém colaborou tanto para a popularização da fotografia como George Eastman Kodak (1854 – 1932), fabricante norte-americano que revolucionou a fotografia ao comercializar a câmera Kodak. A partir daí, “Kodak” passou a ser sinônimo de fotografia. A fábrica de Eastman recebia a câmera ainda com o filme dentro, revelava e devolvia a máquina com
o novo filme. O sucesso foi imediato. O slogan que o consagrou foi: “Aperte o botão que nós faremos o resto”. Claro que a empresa Kodak só devolvia as fotos que se salvavam com alguma qualidade, fazendo com que os clientes se sentissem ótimos na nova tecnologia que encantou o mundo. A fotografia passou de um modo rápido, prático e barato a substituir a representação até então realizada somente pelos pintores.

Inventores responsáveis pela difusão da fotografia na França.
Fonte: MOLECULAR EXPRESSIONS, s/d.

O DESENVOLVIMENTO DA FOTOGRAFIA NA EUROPA

No final do século XIX e início do século XX, foi grande a influência da fotografia sobre quase todos os artistas plásticos que se renderam à mágica desse grande invento. Os impressionistas, na França, principalmente Paul Cézanne, certa vez, disse: “Ao pintar figuras humanas exigia uma imobilidade quase absoluta e que tinha dificuldade em lidar com modelos de nus”. Suas telas de banhistas foram pintadas com o auxílio de fotografias. Edgar Degas, ao pintar “A Orquestra da Ópera”, o fez numa perspectiva inusitada, o quadro lembra um instantâneo fotográfico, ninguém está posando e no palco as bailarinas estão fragmentadas, como se, atento à figura central, o fotógrafo não as tivesse considerado.

Também o grande Toulouse-Lautrec foi muito influenciado pela fotografia e muitos outros grandes artistas. No caso de Lautrec, chegou a fazer caricaturas bem humoradas em que pousou como artista e como modelo numa truncagem fotográfica.

Primeiras experiências de truncagem fotográfica realizadas por Toulouse-Lautrec.
Fonte: EDITORA NOVA CULTURAL, 1991.

Estudiosos, artistas e fotógrafos criaram, porém, uma grande polêmica: seria a fotografia considerada uma arte, como a pintura e a escultura, onde entravam diretamente a criação humana? A resposta a esta questão veio com o artista-fotógrafo Man Ray, que não se limitou a técnica e em seus experimentos de laboratório criou efeitos especiais e técnicas de distorção da imagem largamente utilizadas até hoje. Criou também o fotograma, ou seja, a fotografia sem câmera, sintetizada diretamente no laboratório, levando assim a fotografia para o abstracionismo e para o surrealismo. Brincando com luz e sombra, forma e volume, criou arte pura. Mais tarde, essas inovações foram utilizadas pelo professor de fotografia da Escola alemã Bauhaus, Moholy Nagy, no desenho industrial, gráfico e têxtil, depois disso foi e ainda é largamente utilizado pela indústria em geral.

Outra inovação veio com o fotógrafo francês Henry Cartier Bresson, que fez da fotografia uma séria arma de denúncia e influenciou enormemente a criação do fotojornalismo. Cartier, que foi um artista plástico mal sucedido, encontrou na fotografia tudo o que precisava e, nesse sentido disse, certa vez: “O aventureiro que em mim habitava se sentiu compelido a testemunhar as cicatrizes do mundo com um instrumento mais rápido que o pincel”. Cartier Bresson com amigos criou ainda a primeira agência para distribuição de fotografias para a imprensa, a Magnum, que revolucionou e enriqueceu as publicações no mundo todo. Essa agência ainda existe em Paris e as fotos de Cartier se tornaram sinônimo de documento e arte ao mesmo tempo. Considerado um dos mais fotógrafos mais importantes do século XX, Cartier Bresson influenciou as obras de Robert Doisneau, Willy Ronis e Edouard Boubat. Além disso, teve suas fotografias colorindo revistas de renome como “Life”, “Vogue” e “Harper’s Bazaar”.

Henry Cartier Bresson é o criador do conceito do instante fotográfico. Foto: Cartier
Bresson. Fonte: GARÓFALO, 2013.

Do acervo documental de Cartier Bresson, que mais do que ninguém usou de arte para fazer um trabalho impecável, com fotos que ainda emocionam, passando por uma série de outros grandes artistas, a fotografia evoluiu até que hoje, através da construção de imagens, se tornou desobrigada de retratar informações visuais, pausterizadas pela mídia e partiu para criações através de manipulações químicas, eletrônicas ou simplesmente a interferência manual do fotógrafo artista, que buscará sempre a liberdade à invenção, o estilo e a arte.


Fotomontagem. Foto: Elliot Erwitt (1989). Fonte: SOUZA, 2013.

A FOTOGRAFIA CHEGA AO BRASIL

O primeiro fotógrafo a desenvolver esses conhecimentos no Brasil foi Hércule Florence, que na cidade de Campinas/SP, como já dito, inovou a técnica e poderia até ter patenteado seu invento, mas isso não aconteceu, ficando a glória para o francês Louis Daguerre. Dom Pedro II foi outra personalidade a se encantar pelo invento da
fotografia. É trabalho dele grande acervo de retratos da família im
perial, que hoje se encontra no Museu do Palácio Quitandinha em Petrópolis/RJ. A fotografia teve também um grande desenvolvimento em São Paulo, principalmente as fotos de famílias italianas e imigrantes de outros países que as enviavam para suas famílias que ficaram em outros plagas. Os famosos lambe-lambes ou fotógrafos de praça documentaram o desenrolar do século XX, cumprindo assim um papel social.

Segundo Kossoy (2012, p. 34):

É óbvio que as pesquisas históricas de um país – nas quais fontes fotográficas são empregadas como meios de informação visual para a recuperação dos fatos passados – não podem prescindir dos conhecimentos advindos das histórias da técnica fotográfica e dos fotógrafos, aqui entendidos enquanto autores daquelas fontes que no país autuaram em diferentes períodos.

Belo Horizonte/MG, por exemplo, desde a sua origem importou artistas europeus para edificar os seus palácios na Praça Sete e seu entorno. Essas famílias também já conheciam e praticavam a arte da fotografia, sendo todos os passos da construção da capital documentados e guardados em acervos públicos e particulares.

Em Diamantina/MG, um filho de Bocaiúva/MG, se tornou o responsável por retratar a sociedade da época, Francisco Augusto Alkimin (1886-1978), Chichico Alkimin, como era conhecido, somente nesse início do século XXI teve seu trabalho publicado, numa iniciativa de sua filha Bernadeth Alkimim. Chichico, praticamente sem escola, sem acesso a informação e distante das novidades dos grandes centros, produziu retratos que surpreendem pela qualidade técnica,
beleza e leveza, escreveu Flander de Souza (2005) ao apresentar a rica
obra: “O olhar eterno de Chichico Alkimin”. Para Verônica Alkimim França, neta do fotógrafo, seu avô fez um registro único e incomparável da vida, população, arquitetura e paisagem de Diamantina, no início do século XX. Chichico abraçou seu tempo, congelou instantes que não se repetem e que transcendem o olhar.

Alunas e Freiras em frente ao Colégio Nossa Senhora das Dores – Diamantina/MG,
1922. Foto: Chichico Alkimin. Fonte: SOUZA; FRANÇA, 2005.

 

A FOTOGRAFIA NOS CAMINHOS DO NORTE

Em Montes Claros/MG, muitas pessoas se interessaram pela fotografia e com o passar do tempo, alguns fizeram dessa técnica sua forma de ganhar a vida. Destacamos, porém a família Facella, tendo o patriarca vindo da cidade italiana, berço do renascimento, Florença. No início do século XX, aqui aportou e começou a documentar, através de sua câmara, a vida da então pacata cidade, ainda usando a técnica do daguereótipo, ou seja, fotografando em placa de vidro sensibilizadas com sais de prata, era o famoso fotógrafo lambe-lambe, porque ainda usava a saliva como fixador da imagem fotografada. Esse material ainda existe e poderia ser doado a um museu ou centro de documentação, resultando, depois de pesquisado, em um livro tão importante quanto o de Chichico Alkimim. O patriarca da família Facella retornou a Itália, depois de prestar relevantes serviços à história local. Todo trabalho de pesquisa sobre a história de Montes Claros que usar fotografia, certamente contará com um ou mais trabalhos assinados por Facella. Sua família ainda reside com Montes Claros, inclusive num povoado que leva o nome da família, um dos filhos seguiu a profissão ensinada pelo pai, e por falta de ter esse material devidamente classificado e organizado em coleções, alguma confusão se faz entre os trabalhos do pai e do filho aprendiz, já que assinavam do mesmo jeito. Todo esse acervo fotográfico muito interessa a pesquisa histórica, é patrimônio material de relevante valor e merece ser reunido, antes que se perca, como já aconteceu com tantos outros.

Portanto, a fotografia, em sua essência, tem o mérito de reviver, perpetuar momentos e de fixar a memória em seu tempo, seja ele distante, instantâneo, ou mais próximo. É essa busca, indistinta e anônima, que também se revela na foto.

Montes Claros tinha seus fotógrafos, ou os chamados retratistas. Fizeram a arte de eternizar pessoas, lugares, movimentos, figuras, cujas objetivas nos transportam a flagrantes distantes e nos fazem íntimos de paisagens perdidas, de olhares focados e de poses ensaiadas, em papel cartonado.

Antônio de Souza Quirino, do famoso “Photo Quirino”, o grande artista, um dos pioneiros desse ofício, conheceu a magia de captar fatos, momentos, que, trazidos para o presente, têm a possibilidade de reacender lembranças e sentimentos guardados, detalhes esquecidos. Era filho de Vítor Quirino, que fora Prefeito de Montes Claros nos idos de 1890, e pai de Vítor Quirino Neto, que também sabia fotografar. Exerceu esse oficio por muito tempo, desde os primeiro anos do século XX até meados dos anos 40. Em seu estúdio, havia um cenário que serviu de pano de fundo para inúmeras fotos das famílias montesclarenses. Esse cenário trazia um bucolismo europeu, galante, bem característico da verve romântica, idealizada em seus padrões estéticos, diferentes das nossas árvores retorcidas, do nosso cerrado. Ser fotografado naquele contexto fazia bem àqueles que o procuravam. Talvez fosse esse cenário a única forma de quebrar a singeleza das velhas paredes, dos velhos quintais, conhecidos e acostumados pela vivência e pelo tempo. Das fotos no quintal, muitas vezes, fazia parte um lençol, uma colcha, ou uma toalha, como um literal pano de fundo, para fantasiar a visão do cotidiano. Esse estúdio esteve ativo por muitos anos. Após sua morte, Vitor Quirino Neto, o popular “Vitrim”, exerceu o ofício da fotografia, aprendido com seu pai. Especializou-se, sobretudo, em fotos de eventos políticos pelos rincões desse município. Vitrim, também mago de sua arte, era uma figura ímpar, com suas gigantes e espessas sobrancelhas, que serviam de marquise para seus olhos e suas calças com suspensórios, que mais ainda se destacavam em sua baixa estatura. Figura inesquecível. Era também professor primário em escolas rurais.

Outros fotógrafos passaram por Montes Claros e pela região norte mineira. Muitos deles eram ambulantes: vendiam e disseminavam sua arte pelo sertão mineiro, prática que perdurou até os anos 60. Exerciam seu trabalho, numa efêmera estada, por longínquos lugares, tal qual seus flashes. Percorriam o sertão, onde deixavam seus registros e de lá também os traziam. Pouco se sabe sobre eles, mas suas obras persistem e podem ser, ainda, admiradas. Destacam-se Francisco Árabe e C. Guedes, que, por aqui passaram, no final do século XIX e início do XX.

Verso de fotografias com carimbos e assinaturas de próprio punho dos fotógrafos – Montes Claros/MG, Década de 40. Fonte: PAULA, Fabiano Lopes.

As fotografias autorais tinham a certificação dos fotógrafos em carimbos impressos, ou mesmo em assinaturas de próprio punho, que geralmente vinham no verso da foto, como no caso do Quirino, Foto Rex, C. Gomes. Unicamente Facella colocava a sua assinatura em seus trabalhos na parte frontal, geralmente no alto. Francisco Árabe tinha um carimbo impresso para estampar sua assinatura na foto, também, na parte frontal.

Antigo prédio do Colégio Imaculada Conceição, já demolido – Montes Claros/MG.
Foto: Facella. Fonte: VASCONCELOS, Marta Verônica Vasconcelos Leite.

Essas fotografias autorais chegaram aos anos 50 e, aos poucos, cederam lugar aos fotógrafos amadores, com suas “Kodaks”, com suas poses descontraídas, motivadas pelo cinema e pela acessibilidade dos produtos americanos que chegavam no pós-guerra. Atualmente, o fotógrafo profissional está restrito a eventos. Hoje todo mundo pode tirar fotos com aparelhos telefônicos e a fotografia segue o modismo dos “selfies”(¹) .

Fotógrafos que atuaram em Montes Claros: Antônio Quirino, Vítor Quirino, Cândido Gomes, Antônio Quirino de Souza e “Pilgo”, Foto REX de C. Guedes, Francisco Árabe e Facella. Na segunda metade do século XX, os mais recentes: Foto Pinto, Rilson, Waldevi, Foto Baby, Foto Alfi, Foto Gury, que se especializou em retratar crianças nos grupos escolares e com personagens da Disney. Essas imagens tornaram-se recorrentes e bastante populares na década de 60. Depois
Tony foto foi quem passou a fazer o mesmo trabalho mas com fotos envelhecidas e com cenário e indumentárias de época. Como a criação dos cursos de Design e de publicidade uma nova geração de fotógrafos vem ocupando esse mercado com competência.

Atualmente, na cidade de Montes Claros, o emprego de acervos fotográficos tem sido bastante utilizado pelos acadêmicos das várias áreas do conhecimento, que deparam com dificuldades na medida em que os acervos se encontram espalhados e nem sempre organizados dentro das novas técnicas arquivísticas.

O reconhecimento do valor documental da fotografia é importante para áreas especificas, como arquitetura, antropologia, etnologia, história social e demais ramos do saber, pois representam um meio direto de conhecimento de cenas passadas, possibilitando um resgate da memória visual como fonte de pesquisa.

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(¹) - Selfie - junção do substantivo self (em inglês “eu”, “a própria pessoa”) e o sufixo ie - ou selfy é um tipo de fotografia de autorretrato, normalmente tomada com uma câmera digital de mão ou celular com câmera.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante séculos o homem utilizou-se da câmera fotográfica para registrar momentos, paisagens, conflitos e manipular cenas fotográficas, transformando seus objetivos em imagens. A evolução da técnica, aliada a informática tem levado a fotografia cada vez mais distante daqueles primeiros e honestos registros, porém a mágica de ver um instante eternizado é imutável e continua a emocionar, documentar e a registrar a vida em todo o mundo.

O Norte de Minas possui importantes coleções fotográficas, quase todas em acervos particulares, acreditamos que instituições públicas e privadas poderão propor um trabalho conjunto no sentido de reunir e dar visibilidade a todo esse acervo documental. Cabe aos historiadores e pesquisadores a tarefa de definir critérios para organização de bancos de dados, que deem oportunidade de pesquisar, valorizar fotógrafos ou autores e divulgar a própria história por meio da comunicação e expressão no tempo e no espaço.

Fabiano Lopes de Paula
Marta Verônica Vasconcelos Leite

FONTES
Arquivo DDI- UNIMONTES (Diretoria de Documentação e Informação).
Arquivos dos autores:Fabiano Lopes de Paula e Marta Verônica Vasconcelos Leite

REFERÊNCIAS
BORGES, Maria Eliza Linhares. História e fotografia. Belo Horizonte: Autêntica,
2003.

EDITORA NOVA CULTURAL. Os Grandes Artistas: Degas - Toulouse Lautrec –Monet.
Coleção Os Grandes Artistas – Romantismo e Impressionismo. São Paulo: Nova
Cultural, 1991.

FLANDER de Souza.Verônica Alkimin, (Org). O olhar de Chichico Alkimim. Belo
Horizonte: Ed. B., 2006.

GARÓFALO, Camila. Confira um acervo com 300 fotos de Henri Cartier-Bresson. 2013. Disponível em: <https://catracalivre.com.br/geral/dica-digital/indicacao/confira-um-acervo-com-300-fotos-de-henri-cartier-bresson/>. Acesso em: 23/07/2014.

HEDGECOE, John. O Manual do fotógrafo. Porto. Ed. Porto, 1997.
KOETZLE, Hans-Michael. Photo Icons – The story behind the pictures 1827-1991. Taschen, 2005.

KOSSOY, Boris. Fotografia & História. 4ª Ed. São Paulo: Ateiê Editorial, 2012.
MOLECULAR EXPRESSIONS. Joseph Nicéphore Niepce. Disponível em: <http://micro. magnet.fsu.edu/optics/timeline/people/niepce.html>. Acesso em: 23/07/2014.

MOLECULAR EXPRESSIONS. Louis-Jacques-Mandé Daguerre Disponível em:
<http://micro.magnet.fsu.edu/optics/timeline/people/daguerre.html>. Acesso em: 23/07/2014.

SOUZA, Flander de; FRANÇA, Verônica Alkmin (Orgs). O Eterno Olhar de Chichico Alkimin. Belo Horizonte: Editora B, 2005.

SOUZA, Guto. Beijos e Guarda-Chuvas. 2013. In: Revista Clichê. Disponível em:
<http://www.revistacliche.com.br/2013/03/beijos-e-guarda-chuvas/>. Acesso em: 23/07/2014.


 

MEU GURI

Olha aí, olha aí, olha aí o meu Guri!

Nestas palavras o cantor e compositor Chico Buarque de Holanda nos fala de uma mãe favelada que se orgulha de um filho menor de idade, que se levanta cedo e vai pra rua, dizendo para a mãe que “vai trabalhar”. Ela na sua santa ignorância acredita e sente-se feliz ao constatar que o filho chega em casa trazendo, rádio gravador, baterias, pneus, colares e correntes de ouro, que “haja pescoço para pendurar”. Nem por sonho, essa mãe desconfia que seu filho é um bandido ainda em formação. Que os objetos trazidos por ele são produtos de furtos e que aquele filho de quem tanto ela se orgulha é um ladrão que a escola da bandidagem já o consagrou PHD no mundo do tráfico, do crime e da corrupção na sua curta infância.

Foi chocante o documentário que o Fantástico exibiu no último domingo. Acredito que o Brasil inteiro ficou estarrecido com as cenas e depoimentos mostrados. É a dura do que se passa no nosso país. A falta de emprego, escolas, alimentação, enfim de uma vida digna para

esses brasileirinhos que muitas vezes não chegam aos dezoito anos de idade, mas que muitos desses têm um título de eleitor para servir de escada para os políticos sem escrúpulos.

Assisto religiosamente as sessões da TV Senado e posso constatar que, apenas meia dúzia de gatos pingados se preocupa com o menor abandonado.

Viajando para a Europa pude observar em Madrid a criança que for encontrada no horário escolar, fora de aula, é conduzida a um abrigo e seus pais são obrigados a pagar, ou melhor, prestar serviços ao Estado.

E no Brasil, essas crianças tem pais? Muitos não conhecem a mãe, e alguns deles apenas fala de uma tia como coisa muito remota.

É o retrato vivo de um Brasil jogado para o escanteio, onde o dinheiro “sujo” fala mais alto, onde as autoridades pouco se preocupam com o futuro das nossas crianças.

A mãe do “Guri” de quem falei no início, um dia encontra-o estendido no chão com a boca cheia de formigas e os olhos arregalados para o céu como se estivesse a pedir justiça para os que ficaram.

É isso aí!


A ESCRAVIDÃO REMEMORADA

Acabo de ler o primeiro livro da trilogia: Escravidão, do jornalista e historiador Laurentino Gomes. Autor dos best sellers 1808, 1822 e 1889. “O Brasil tem seu corpo na América e sua alma na África”, afirmava no final do século XVII o padre jesuíta Antônio Vieira”. Essa é uma frase profética que se torna cada vez mais verdadeira. Maior território escravocrata do hemisfério ocidental, o Brasil recebeu aproximadamente 5 milhões de escravos cativos africanos, 40% do total de 12,5 milhões embarcados como animais de carga para a América ao longo de três séculos e meio. Como resultado desta agressão histórica ao povo africano, o nosso país tem hoje a maior população negra do planeta, com exceção apenas da Nigéria. Foi também, entre os países do novo mundo, o que mais tempo resistiu a acabar com o tráfico lucrativo de pessoas e o último a abolir o cativeiro, por meio da Lei Áurea de 1888- quinze anos depois de Porto Rico e dois depois de Cuba. Experiência mais determinante na história brasileira, a escravidão teve um impacto profundo na sociedade, na cultura e no sistema político-econômico que deu origem ao país após a independência. Nenhum assunto é tão importante e tão definidor da nossa identidade nacional. Ao estuda-lo Laurentino Gomes anos ajuda a explicar o que fomos no passado, o que somos hoje e também o que seremos daqui para a frente. Recordo que o antropólogo montes-clarense afirma que somos uma Nova Roma, fruto da alma do negro, do branco e do índio, que transformou o Povo Brasileiro em uma miscigenação de força e acolhimento.

“Escravidão” atingirá 1.500 páginas (toda a trilogia). O segundo volume está agendado para 2021 e trata do auge do tráfico, motivado pela febre do ouro em Minas Gerais com ênfase em Vila Rica e Diamantina. O terceiro e último vai tratar do tráfico ilegal, o movimento abolicionista brasileiro e o encerramento da escravatura. “O Brasil tem de enfrentar o racismo a sério se quiser se tornar um país decente”, diz. “Até hoje, fechou os olhos para a escravidão para esconder a culpa dos governantes e da Igreja”. Por isso, outro mito que cai é o da benevolência da escravidão no Brasil, o país que “acolheu” o maior número de escravos de 1535 a 1867: mais de 5 milhões. Daí deriva outro mito, divulgado pelos historiadores de que houve confrontos entre escravos e senhores de engenho. Segundo Laurentino “Houve mobilidade social por meio de alforria e sexo inter-racial muito maior que nos Estados Unidos”, afirma Gomes. Mais uma lenda diz respeito ao heroísmo de Zumbi dos Palmares. “Há três versões sobre Zumbi: o nacionalista, o líder revolucionário e o filho gay de Ganga Zumba”. Para batizar os africanos cativos “desalmados” e lucrar com a sua” venda, os jesuítas mantinham feitorias em Angola, de onde partiam o maior número de escravos negreiros. Os cativos eram batizados por “José, Francisco e João” apenas o primeiro nome, sem sobrenome e sem memória. Nascia portanto um novo escravo a sustentar a nova nação no novo mundo. Em carta à Companhia de Jesus, em 1549, o padre Manuel da Nóbrega, fundador de São Paulo, solicita o envio de mais escravas ao colégio, “porque as fêmeas fazem a farinha, e todos os principais serviços e trabalhos delas”. Padre Antônio Vieira proferiu um sermão na Bahia, em 1633, para catequizar os africanos cativos sobre a beatitutde e necessidade dos trabalhos forçados exercidos pelos escravos: “Oh, se a gente preta atirada das brenhas da sua Etiópia, e passada ao Brasil, conhecera bem quanto deve a Deus, e a sua Santíssima Mãe, por este que pode parecer desterro, cativeiro e desgraça, e não é senão milagre, e grande milagre!”. Não há notícia de que os escravos presentes se convenceram. Afinal, naquele tempo, os novos fiéis convertidos iam a missa acorrentados com manilhas de cobre e correntes de ferro, como se participassem de um cortejo rumo ao inferno. Por este motivo Santo João Paulo II pediu publicamente “Perdão” pela postura de parte da igreja durante a escravidão, a inquisição e o silêncio durante o Nazismo na Segunda Grande Guerra. A Igreja em boa hora fez a sua autocrítica.

Outro ponto marcante na obra de Laurentino foi o total desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana o qual os escravos que aqui chegavam eram tratados: humilhações, trabalhos pesados, punições exageradas. Apenas a título de exemplo: “Um escravo foi chicoteado com 200 chibatadas, ficando à carne viva, por ter furtado um quilo de açúcar de seu Senhor”.

Reafirmamos que reler e tentar compreender a história recente da formação da nossa Nação é papel importante na formação da cidadania. Neste ponto a obra do Jornalista Laurentino Gomes em muito
contribui.


 

SOBRADO DA FAZENDA LAMBARI
E A FAMÍLIA MAURÍCIO

Na região de Juramento, chama a atenção um belo sobrado à margem da estrada vicinal que leva à região da Prata, rumo a Francisco Sá. Ali viveu meu trisavô Euzébio Ferreira Godinho (1848-1929), mas eu não tinha certeza se foi ele o construtor.

A dúvida é sanada por Hermes de Paula, que registrou em sua obra “Montes Claros, sua História, sua Gente, seus Costumes” a origem da bela construção.

Segundo o historiador, o Sr. João Alves Maurício, patriarca da família Maurício nesta região, vindo de Paracatu, “acomodou-se inicialmente no Lambari (Juramento); ali construiu a residência, um sobrado ainda hoje em bom estado, talvez o primeiro sobrado como sede de fazenda no município. Em 1860 passou a residir na cidade, dedicando-se ao comércio (...)” (pág. 110).

Outro ícone da história local, Nelson Viana registra em suas Efemérides Montes-clarenses a nota do óbito do Sr. João Alves Maurício: “29 de agosto de 1864 - Falece o cel. João Alves Maurício.

Nasceu em Paracatu de Seis Dedos, onde foi fazendeiro transferindo-se
para Lambari, no município de Montes Claros de Formigas onde se afazendou. Mudando-se para a sede do município dedicou-se ao comércio, tendo construído o sobrado nº 9 da praça Dr. Chaves, nesta cidade, em 1853. Foi vereador à Câmara Municipal de Montes Claros, de 1853 a 1861, e vice-Presidente da mesma Câmara, empossado a 18 de janeiro de 1861. Casou-se, em primeiras núpcias, com dona Carlota Maria Cardoso de Sousa, e, em segundas com dona Firmiana Versiani”, com quem teve dois filhos: João Alves Maurício Versiani e
Altina Firmiana Augusta Versiani.

Apurei em fontes primárias que a data correta do óbito é 9 de agosto de 1864 e a idade na ocasião era de 48 anos (portanto, nasceu em 1816).

Atualmente, a propriedade é de descendentes de Euzébio Godinho.


O QUE É O SOM?

O som veio silencioso sob a forma de uma carícia e finalmente uma história. Passo a comentar sumariamente no formato contextualizado no caso que venho de reproduzir a expressão som, sensível no sentimento delicado da vida é uma bela canção.

Este artigo se volta para as relações da música com o corpo e com o espaço, sugere-se aqui em linhas gerais para um projeto de observação da história e contempla alguns momentos no desenrolar da produção musical.

Som: palavra que vem do latim sonus, é a propagação de uma frente de compressão mecânica ou uma onda mecânica e significa literalmente a vibração de um corpo percebida pelos ouvidos, ou energia sob a forma de vibrações chamadas ondas sonoras. É a matéria prima da música. Para várias religiões, ou filosofias, o som é a fonte de toda a criação. Para cristãos “a palavra” é o começo: – “Disse” Deus: Haja luz, e houve luz.

Quando ele fala um potente estado de canto explode dos corações angélicos e esparge sua ressonância pôr todas as graduadas ordens de seus grupos, os anjos a música nada mais é do que incorporações do verbo criativo de Deus, expressões de sua voz. Se quiserdes apelar para os deuses da música, tendes que vos elevar até o nível do Eu, em que a energia e o poder criativos se encontram entesourados.

Para os Hindus o Om é considerado o corpo sonoro do Absoluto, Shabda Brahman é o som do Universo, a semente que fecunda todos os outros mantras. Para os Egípcios, assim como várias tribos aborígenes “músicas sagradas” também representam o começo.

Em diversas culturas o “Som” seria a principal fonte de tudo que existe dentro do que chamamos de “Criação”. Os chineses também possuíam uma crença de algo imensamente fundamental na música. Um trecho de uma música era considerado uma fórmula de energia.

A música encerraria, em seus tons, elementos de ordem celestial, assim como a matemática da música englobaria proporções e princípios sagrados, sendo a “vibração cósmica” a base de toda matéria e energia.

Sons naturais são, na sua maior parte, combinações de sinais, ou frequências, sendo um som puro representando por uma senoide pura, a forma mais simples de uma onda. Possuem uma velocidade de oscilação, ou frequência, que se mede em Hertz, ou ciclos por segundo, e uma amplitude, ou energia, que se mede em decibéis.

Sons audíveis pelo ouvido humano têm uma frequência que varia entre 20Hz e 20.000Hz. Abaixo de 20Hz temos os infrassons e acima de 20.0000Hz os ultrassons.

Mas como é feito o som?

Quando vibramos uma corda de aço esticada, por exemplo, produzem-se oscilações no ar que, por sua vez, entram na parte externa dos nossos ouvidos conduzindo as ondas sonoras em direção ao tímpano que vibra.

Essas vibrações que são captadas pelos nossos tímpanos, passam por uma espécie de caracol -chamado clóquea- que há dentro dos nossos ouvidos e são enviadas, através do nervo auditivo, para o nosso cérebro.

O cérebro interpreta esses sons e assim se forma a música dentro da nossa cabeça.

As ondas sonoras ou oscilações podem ser registradas por um instrumento chamado osciloscópio.

É a velocidade da onda sonora quem determina a altura ou afinação do som, e é a amplitude quem determina o volume do som.

O Concorde, único avião supersônico comercial do mundo, é um exemplo da força do som: se ficarmos perto de um avião desses, o ruído de suas turbinas pode facilmente romper nossos tímpanos. O som que o Concorde produz é classificado como ruído ou barulho, palavras que estão sempre separadas da ideia de som musical e ligadas à ideia ou noção de desordem.

O Grego Pitágoras (570-495 a.C.) ficou conhecido não somente pelo Teorema que leva seu nome, mas também pela introdução do conceito de “Música Universalis” e a “Harmonia das Esferas”. Para Pitágoras a natureza seria sempre harmoniosa: plantas movem-se seguindo equações matemáticas, que correspondem a notas musicais, produzindo uma espécie de sinfonia.

Como consequência surgiu o conceito de “Música Humana”, segundo os quais operariam com acordes, produzidos pelos nossos sistemas e subsistemas orgânicos. O que entendemos como doenças seria o equivalente a uma orquestra desafinada.

O filosofo chinês Confúcio (551-479 a.C.) dizia que “se desejamos conhecer se um reino é bem governado, se sua moral é boa ou ruim, a qualidade de sua música irá fornecer a resposta”.

Nos dias de hoje, porém, podemos afirmar que quase todo som pode ser transformado em música. Muitos são os músicos que através de algumas experiências tentam colocar sons de coisas como serras elétricas dentro de estruturas musicais.

A música, segundo várias culturas, teria o poder de harmonizar o organismo. Ondas atravessando um meio físico, e nós somos um meio físico, produzem efeito direto sobre as nossas estruturas orgânicas.

Sendo assim o som, ou a música, podem afetar não somente nosso corpo, como também nossos pensamentos e nossa mente. A linguagem também é fruto do som. Nossa fala ou nossa capacidade de se comunicar através da voz é o resultado de sons produzidos pelas cordas vocais, as quais servem de veículo sonoro a uma ideia na formação das palavras. Esses sons emitidos através da vibração das cordas vocais recebem o nome de fonemas. Assim, todo fonema é som, mas nem todo som é fonema.

Todo som sempre traz junto de si a ideia de harmonia. Como já disse o filósofo Cícero: “unus sonus est totius orations” (todo o discurso tem um tom uniforme).

A região dos Campos das Vertentes é um celeiro de sons. As cidades de São João Del Rey e Prados compartilham o apelido de “Cidade da Música”. Tiradentes também traz em sua gênese a musicalidade que vem das igrejas e das construções barrocas. As influências dessa cultura na formação de seus habitantes e seus desdobramentos históricos estão documentadas em “Uma História de Amor à Música (BEI Editora), com texto dos Jornalistas Marília Scalzo e Celso Nucci”.

Pré-História - A palavra música, do grego mousikê, que quer dizer “arte das musas”, é uma referência à mitologia grega e sua origem não é clara. Muitos acreditam que a música já existia na pré-história e se apresentava com um caráter religioso, ritualístico em agradecimento aos deuses ou como forma de pedidos pela proteção, boa caça, entre outros.

Antiguidade - Muitos historiadores apontam à música na antiguidade impregnada de sentido ritualístico e como instrumento mais utilizado a voz, pois por meio dela se dava a comunicação e nessa época o sentido da música era esse, comunicar-se com os deuses e com o povo.

Idade Média - Na Idade das Trevas ou Idade Média a Igreja tinha forte influência sobre os costumes e culturas dos povos em toda a Europa. Muitas restrições eram impostas e, por essa razão, observamos o predomínio do canto gregoriano ou cantochão, porém houve um grande desenvolvimento da música mesmo com o direcionamento da igreja nas produções culturais e nessa fase a música popular também merece destaque com o surgimento dos trovadores e menestréis.

Renascimento - Nesse período, na Europa, cresce o interesse pela música profana (que não era religiosa). A música também é trabalhada em várias melodias, porém ainda as melhores composições musicais dessa época foram feitas para as igrejas.

Barroco - A música barroca foi assim designada para delimitar o período da história da música que vai do aparecimento da ópera e do oratório até a morte do compositor, maestro e instrumentista Johann Sebastian Bach.

Classicismo - Nesse período, a música instrumental passa a ter maior destaque, adquirindo “porte”, elegância e sofisticação. São sons suaves e equilibrados. Nesse período criou-se, ainda, a sonata, e os espetáculos de ópera passam a ter um brilho maior, bem como as orquestras se desenham e passam a ter grande relevância.

Romantismo - Diferente da música no classicismo, que buscava o equilíbrio, no romantismo a música buscava uma liberdade maior da estrutura clássica e uma expressão mais densa e viva, carregada de emoções e sentimentos. Os músicos, nessa fase, se libertam e visam, por meio da música, exprimir toda sua alma.


Música no século XX - Podemos dizer que, esse período, para a música, foi uma verdadeira REVOLUÇÃO. O entusiasmo foi grande, inovações, criações, novidades, tendências, gêneros musicais apareceram. Foi um período rico para a música, impulsionado pela rádio, e pelo surgimento de tecnologias para gravar, reproduzir e distribuir essa arte.

No início do século XX, o interesse por novos sons fez os compositores incorporarem uma grande quantidade de instrumentos e objetos sonoros à música. O Compositor norte americano como Leroy Andersen, que compôs uma obra para máquina de escrever e orquestra, o compositor brasileiro Hermeto Pascoal que criou músicas com sons produzidos por garrafas, ferramentas, conversas e grunhidos de porcos e o compositor italiano Ottorino Respighi, que escreveu uma obra para orquestra e rouxinol intitulada “Pinheiros de Roma”.

Todos os sons podem ser aproveitados em música, pois oferecem muitas possibilidades de enriquecer uma composição.

Para realizar essa narrativa, é preciso, outrossim, atentar para os ruídos que cercam a produção oficial de música. Urge perceber os cantares divergentes, dar voz à sua existência marginal, determinar seus elos com a política dos discursos e descobrir até que ponto seus timbres estranhos surgem como resposta às abstenções determinadas pela Igreja. Faz-se necessário indagar os cantores do mundano, das ruas, dos espaços sem regras (ou com outras diferentes daquelas infundidas pela Igreja, regras baseadas nos desejos, nos apetites, na gravitação da pele junto a outra) – os troveiros e trovadores do norte e sul da Provença; os minnesinger da Alemanha; os goliardos, clérigos errantes que faziam das tavernas sua pátria, das estradas seu itinerário; os jograis e menestréis, cantadores das gestas seculares, das histórias populares; interessam escrever a paixão (e o prazer) com que cada um deles cantava, à sua maneira, o amor, a lascívia, os sentidos. Não raro, estes músicos do grotesco ajudaram a construir os rumos do fazer musical ocidental. Suas passagens pelo bizarro da experiência humana, as práticas pervertidas, as falas obscenas, os gostos desvirtuados pela desmesura, pela embriaguez, trouxeram ao mundo da música, da arte, o imensurável, os espaços proibidos, as imagens da sordície, os sons da algazarra, a face de Dionísio, Deus dos ciclos vitais, das festas, do vinho, da insânia, do teatro e dos ritos religiosos, e coloriram a vivência musical para além das notas dadas pela Igreja, inspiradas em Apolo, a mais célebre representação de Deus.

Desse modo toda agitação produz ondas, uma frase que emitimos ou um instrumento que vibra criam ondas sonoras.

As ondas ou oscilações eletromagnéticas são sempre da mesma substância, diferenciando-se, porém, na pauta do seu comprimento ou distância que se segue do penacho ou crista de uma onda à crista da onda seguinte, em vibrações mais ou menos rápidas, conforme as leis de ritmo em que se lhes identifica a frequência diversa. Neste contexto, iniciaria por uma canção, uma mistura de letra e melodia percorrendo uma linha reta entre quem cante e que escuta; um ajunta de mensagem e som, quando aquele que enuncia é também afetado; uma música onde pudessem escorregar livremente os conceitos, os saberes, o sensível. De falar do não escrito, das pequenas ressonâncias, dos ruídos interditos, dos silêncios que revelam; dos espaços instaurados pelo ressoar de uma nota, um sussurro. Uma amostra sem letra, sem o traço, o desenho de um mapa, territórios de pertença e de recusa, feitos de ar (como as fazendas de Drummond)1, mas também de outras coisas, como o sopro do cantor. Fontes das altas e sãs inspirações das lições tradicionais da música, que nos levam em direção às serenas alturas da arte, chegam um momento, na história do pensamento, onde a palavra e o gesto não são mais suficientes para traduzir as emoções da alma. É então que o senso musical desperta e entra em jogo na própria literatura, que deve ser como um reflexo da harmonia superior.

A música na história dos seres e dos mundos, um imenso círculo, que permite todos os sonhos, todos os voos da imaginação; abre novos caminhos, em tudo o que faz o poder, a grandeza, a beleza do universo. Na medida em que horizontes se ampliam e que a humanidade se comunica com a vida universal, formas mais perfeita de expressão e de sensação tornam-se necessários para responderem ao estado vibratório, às crescentes radiações da alma.

A antiguidade, criadora do gênero, havia compreender isso. O poeta antigo era, ao mesmo tempo, cantor e compositor. Porém, atualmente, a poesia não é mais do que uma das formas da literatura.

A música, nós sabemos, representa grande papel na inspiração profética e religiosa; considerada como meio de transmissão de pensamento artístico, traduz em vibrações harmônicas, sons de infinita delicadeza; vibrações melodiosas, harmonia musical com seus maravilhosos efeitos. O canto e a música em sua íntima união podem produzir a mais alta impressão. Quando ela é sustentada por nobres palavras a harmonia musical pode elevar as almas às regiões celestes. É o que se realiza com a música religiosa, com o canto sacro.

Resultado que os termos pobres de nossa língua humana são impróprias para traduzir todas as belezas da obra divina. (linguagem comum às regras e as leis da grande sinfonia eterna).

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1 – Referência ao poema de Carlos Drummond de Andrade intitulado Fazendeiro do ar.
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Sirvo-me dos mais simples termos e imagens para a compreensão dos fenômenos do espaço e a sensibilidade musical, resultando sensações maravilhosas de sonoridades, percebidas por todo o ser.

A harmonia da música, imaginamos a impressão experimentada pelo ser espontâneo; não se trata mais de sensação de bem estar, de contentamento, mas de uma espécie de acalento, de ondulações acompanhadas de uma sensação especial porque determina um estado emotivo, uma espécie de êxtase. As vibrações sentidas nesse estado formam o que nós chamamos de tonalidades; eles são produzidos por atritos de camadas espontâneas entre si.

O canto e a música em sua íntima união podem produzir a mais alta impressão. O cântico produz uma dilatação salutar da alma divina, uma emissão fluídica que facilita a ação das forças invisíveis. Não há cerimônia religiosa verdadeiramente eficaz e completa sem o cântico. Quando a voz pura das crianças e dos jovens ressoa pela abóboda dos templos, desprende-se com que uma sensação de suavidade angélica.

Porém, unida a palavras malsãs, a música é mais do que um instrumento de perversão, um veículo de torpeza que precipita a alma divina nas baixas sensualidades, e aí encontra uma das causas da corrupção dos costumes na época atual.

O fenômeno sonoro desenvolve-se de círculo em círculo, de esfera em esfera, e amplia-se até o infinito. Ele leva a alma, o espírito, em suas grandes ondas, sempre mais longe, sempre mais alto, no mundo do ideal, e nela desperta sensações tão delicado quanto profundo, que a preparam para os júbilos e os êxtases da vida superior.

O poder misterioso e soberano estende-se sobre todos os seres, sobre toda a natureza. Com efeito, a lei das vibrações harmônicas rege toda a vida universal, todas as formas da arte, todas as criações do pensamento. Ela introduz equilíbrio e ritmo em todas as coisas. Ela influi até sobre a saúde física por sua ação sobre os fluidos humanos. Sabe-se que Saul, em suas crises nervosas, chamava Davi, que através dos sons de sua harpa acalmava a irritação do monarca. Em todos os tempos, e ainda nos dias atuais, a arte musical foi aplicada à terapêutica, e com resultado. Poder-se-iam multiplicar os exemplos.

A harpa, através de seus sons eólios, dissipa nossos pesares, acalma nossas dores e embala-nos deliciosamente o espírito, o meio mais seguro de elevar o pensamento às alturas sublimes, onde reside o talento inspirados elemento indispensável à vida intelectual. No livro Espiritismo na Arte dita O código de Hoël diz, com efeito: “Há três coisas inalienáveis em um homem livre: o livro, a harpa e a espada”.

A voz humana possui também, quando é verdadeiramente bela, entonações de uma flexibilidade e de uma variedade que a tornam superior a todos os instrumentos. Ainda melhor que isto, ela pode expressar todos os estados de espírito, todas as sensações da alegria e da dor, desde a invocação de amor até as entonações mais trágicas do desespero. É por isso que a introdução dos coros nas músicas orquestradas e na sinfonia enriqueceu a arte de um elemento de encanto e de beleza.

A percepção do som, como se formam as vibrações. Na parte imaterial do ser humano, transportado na esfera vibratória, encontra-se envolvido por uma rede de ondas sonoras do qual os elementos são constituídos por seres responsáveis pela nossa existência. O que ele experimenta? Experimenta uma impressão comparável à que vocês sentem quando ouvem em música uma nota tônica. Quanto mais as ondas do campo vibratório se desenvolvem em velocidade e comprimento, mais a impressão experimentada pelo espírito é viva, penetrante e comparável em termos humanos, à que os sons agudos nos fornecem.

Portanto temos, de um lado, a nota tônica, e de outro, o som agudo. Se no campo vibratório as ondas variam em velocidade e em intensidade, a amplitude do som varia, e esse som parte de um ponto inicial, comparável à nota tônica. Esse ponto inicial compreende uma certa onda vibratória que não pode medir. Eis uma comparação: os fonógrafos, aparelhos de gravação e reprodução de sons emitem sons onde, além da sonoridade produzida pelo instrumento, se aproximarmos o ouvido do pavilhão, experimentamos um calor mais ou menos intenso de acordo com a elevação do tom. Ora, a alma divina não sente calor, mas sensações mais ou menos deliciosas, segundo a velocidade, maior ou menor, e segundo a onda, de maior ou menor comprimento. As radiações que tocam a alma são coloridas de tons incrivelmente variados. Cada cor possui uma propriedade particular, que confere uma sensação de bem estar, de satisfação, que difere de acordo com a pureza, a homogeneidade de cada tom. É preciso, portanto, levar em consideração, de um lado, a qualidade das ondas, isto é, sua coloração, e de outro lado, sua velocidade, seu comprimento, as diversas fases de seus meandros. Tudo isso provoca, na alma divina, incomparáveis e excessivamente variados fenômenos, pois, quanto mais evoluído é o espírito, mais as ondas que ele percebe são diversas, assim como as cores, que exprimem os sentimentos. A gama de sons, tal como a concebemos, não é senão uma relação de sensibilidade que não possui nada de absoluto. Concebe-se muito bem que existe uma relação entre as ondas sonoras e as ondas luminosas, porém tal relação escapa a muitos observadores e sensitivos porque as percepções são bastante diversas em seus graus de intensidade, sendo as vibrações luminosas incomparavelmente mais rápidas do que as vibrações sonoras. Temos exemplos na diferença que se estabelece entre as notas mais
baixas, que correspondem às cores mais escuras, e aos sons agudos, que respondem às intensidades luminosas mais vivas. Todos nós possuímos o mesmo órgão auditivo, e, no entanto diferença de sensações experimentam os ouvintes de uma sinfonia, de acordo com seu grau de cultura e sua elevação psíquica!

As notas musicais, a sonoridade, som resultante de uma vibração que impressiona nossos órgãos físicos e produz, em consequência, um fenômeno virtual, sensação que acarreta uma satisfação de bem estar moral e espiritual. O músico, compositor sendo transportado à esfera musical, isto é, ao campo vibratório animado pelo encantamento do belo, recebe vibrações que, chocando-se com seus próprios eflúvios, produzem sensações de júbilo em sua alma. Assim disse um dos compositores, músicos: A melodia é para a luz o que a harmonia é para as cores do prisma, isto é, uma mesma coisa sob dois aspectos
diferentes: melódico e harmônico.

Platão2 nos diz: A música é uma lei moral. Dá alma ao universo, asas ao pensamento, saída à imaginação, encanto à tristeza, alegria e vida a todas as coisas. A lei das notações musicais regula todas as coisas, e seu ritmo acalenta a vida universal.

O compositor musical chega a executar sua melodia pessoal sobre as mil oitavas do imenso teclado do universo; ela é invadida pela harmonia sublime que sintetiza a ação de viver e a interpreta de acordo com seu próprio talento, prova cada vez mais as felicidades que a posse do belo e do verdadeiro proporciona, felicidades que os verdadeiros artistas podem entrever deste mundo. O que se chega a uma concepção elevada da lei das notações musicais, e de suas aplicações, deve auxiliar todos aqueles que, abaixo dele, transpõem a grandiosa escala das ascensões. E todas as ascensões da vida à perfeição eterna, todo esplendor das leis universais, resumem-se em três palavras: beleza, sabedoria e amor!

Entre os séculos XIX e XX, avanço tecnológico, naquele tempo aconteceu à invenção da transmissão do som, pelo cientista brasileiro,

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2 – Platão; célebre filósofo grego (Atenas, 428 ou 429 - id., 348 ou 347 a.C.)
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gaúcho Padre Roberto Landell de Moura, 21/01/1861 a 30/06/1928, também abordado pelo viés da ciência, demonstrou paralelamente interesse pelo espiritismo, psicologia e homeopatia. Um dos pioneiros em nível mundial, a conseguir a transmissão do som e sinais telegráficos (transmissão de sinais) sem fio por meio de ondas eletromagnéticas, o que daria a origem ao telefone e ao rádio, ondas de rádio e luz. Relacionamos aqui o fenômeno físico, ocorrência observável relativa à matéria à energia sonora ou ao espaço-tempo (som – ondas acústicas). Movimento vibratório tão extenso quanto à distância que nos separa desse outros mundos que rolam nossa cabeça, ou sob nossos pés, chega
então a voz e faz ouvir o som articulado ou instrumental.


A VERDADEIRA ORIGEM DO HOMEM
(ADEUS, LUCY!)


O primeiro crânio é de um Australopithecus afarensis, sendo os dois ao seu lado do Homo habilis. O do centro é o famoso 1470.

“No entanto, a ciência tem um caráter de autocorreção. Nenhuma
grande falácia pode persistir por muito tempo diante do aumento progressivo
de conhecimentos.” (Francis S. Collins).


Um esqueleto de hominídeo quase completo foi descoberto pelo paleoantropólogo norte-americano Donald Johanson em Hadar, na região de Danakil, Norte da Etiópia, em 1974. Lucy, o nome que recebeu, acabou classificada como um Australopithecus, que viveu há 3,18 milhões de anos, de uma espécie inteiramente nova, apelidada afarensis, com baixa estatura e aspecto mais simiesco do que humano: testa baixa, nariz achatado e grandes mandíbulas.

Duas espécies de australopitecos surgiram concomitantemente com o homem: os Australopithecus robustus (a forma sul-africana do Australopithecus boisei) e os Australopithecus africanus, que viveram entre 3,7 milhões de anos e 1,5 milhão de anos. Os primeiros, maiores e mais atarracados, e os segundos, tipos mais esguios, contemporâneos do Homo habilis e também do Homo erectus, acabaram extintos diante de sua incapacidade de enfrentar o meio adverso.

Para o paleoantropólogo inglês naturalizado queniano, Richard E. Leakey, “Lucy, com 3 milhões de anos de idade, é tida agora como um precursor do Australopithecus africanus, e, em 1979, Johanson denominou esse fóssil de A. afarensis” (“O Homem na Pré-História do Norte de Minas”, deste mesmo autor, Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1983, págs. 15/16 e 18). O Australopithecus africanus descenderia do Australopithecus afarensis pelas significativas semelhanças entre ambos. Há quem assegure que ambos não passariam de um mesmo ser.

Em um sítio arqueológico da África do Sul, denominado Sterkfontein, foi encontrado o Australopithecus africanus (R. Leakey e Roger Lewin, em “Origens”, pág. 11). É considerável a distância separando Lucy desse A. africanus, entre a Etiópia e a África do Sul. Mas o tipo africanus surgiu especialmente na região considerada berço da humanidade, como um exemplar que apareceu perto do Lago Turkana, e ocupou quase o mesmo nicho ecológico dos babuínos modernos (Leakey e Lewin, idem, págs. 110 e 116, respectivamente).

Estudiosos e mais estudiosos vêm se debruçando sobre Lucy, o qual, se teria hábitos bípedes, ou mesmo, e mais provavelmente, semibípedes, também demonstrou viver confortavelmente balançando por entre as árvores. Em outras palavras, sem suas mãos inteiramente livres, a espiral evolutiva responsável por cérebros maiores dotados de inteligência humana não deslanchou, parecendo não mais que os afarensis deram origem tão somente aos atuais chimpanzés e bonobos, também chamados de chimpanzés pigmeus. Parece-nos hoje ser quase
incompreensível existirem pessoas que ainda acreditam no Criacionismo bíblico, em detrimento das provas reais da evolução, achando a ideia da ascendência ou parentesco com símios do homem como um acinte ao seu brio ou sua nobreza.

Apesar de opinar por uma postura bípede do A. afarensis, mas não crendo ter sido a espécie antepassada ou ascendente do homem, pela contemporaneidade entre ambos, Richard E. Leakey, em seu livro “O Povo do Lago”, Editora UnB/Melhoramentos, 1988, pág. 67 (obra que tem como coautor Roger Lewin, a quem parece pertencer somente o texto, conclusão que vale também para outro livro bem mais famoso de Leakey, “Origens”), revela que, como os grandes macacos de hoje, Lucy possuía braços compridos em relação às pernas, indicativo de subir em árvores, além de outros detalhes que, bem sopesados, não tornam críveis para nós as presenças desses afarensis na linhagem do homem:

“O importante é que, nesse indivíduo, os braços eram longos de forma incomum em relação às pernas, um detalhe que indicava que, por mais que fizesse, o hominídeo antigo provavelmente subia em árvores.

Igualmente importante era a natureza do hominídeo. Ele era, sem dúvida, “avançado”, pois já andava ereto. Todavia, o maxilar tinha algumas características indubitavelmente primitivas, que fazem lembrar o Ramapithecus. O maxilar tem nitidamente o formato em V; os molares, relativamente grandes, são achatados; e o primeiro pré-molar tem uma cúspide única, uma característica muito primitiva, semelhante à do antropoide.

O formato da pelve sugere que era uma fêmea, e as proporções gerais apresentam-se, de fato, como muito pequena, não ultrapassando 91 cm de altura, conforme nos demonstram seus dentes.”

A propósito do Ramapithecus, o mesmo está presentemente totalmente afastado da linha evolutiva do homem ao ser reconstituído um seu crânio completo descoberto na China. Assim feito, constatouse que o mesmo não passava de um ancestral dos orangotangos. Outros restos de Ramapithecus surgiram no Quênia e no Paquistão, mas de um ramo diferente. Estudos outros concluíram que dois outros seres que seriam descendentes desse Ramapithecus, o Oreopithecus e o Gigantopithecus, tidos como gêneros de australopitecos, são na verdade fósseis de símios, agora extintos. Um crânio de oito milhões de anos achado no Paquistão, que recebeu o nome de Sivapithecus, combina alguns traços com o Ramapithecus e outros, com o orangotango, como órbitas oculares muito juntas. E um único molar descoberto em Lukeino, em Tugen Hilss, de 6,5 milhões de anos, foi associado como representante do último antecessor comum do homem e do chimpanzé.

Os primeiros símios reconhecidos como tal apareceram nos registros fósseis há 30 milhões de anos, mas pelo menos há seis milhões de anos houve a sua separação dos nossos antecessores. Ou seja, é ainda por demais incerta a história daqueles símios e de sua separação da também difusa família Hominidae.

Continua (“O Povo do Lago”, pág. 78):

“Infelizmente, não há número suficiente de joelhos bem preservados no arquivo fóssil para permitir que cada tipo de hominídeo seja testado separadamente. Em contrapartida, podemos examinar a parte superior do osso da coxa e da pelve. Não há dúvida, no momento, de que esses ossos, nos australopitecíneos, são diferentes daqueles do Homo e dos humanos modernos: nos australopitecíneos a pelve é mais estreita e mais comprida, a cabeça do fêmur é menor, e o colo do fêmur, que liga a cabeça à diáfise do osso da coxa, é estranhamente achatado. Antigamente, muitas pessoas interpretavam essas diferenças como indicativas de um modo de andar recurvado nos australopitecíneos sem nenhuma justificativa, apenas porque esse ossos são diferentes dos do Homo, segundo mais uma colocação chauvinista do Homo.”

A evolução dos dentes dos hominídeos, com atenção para a redução dos caninos e o aumento da espessura do esmalte, vem sendo objeto de interpretações. A conclusão correta é que o fenômeno está relacionado com a dieta. O nosso esmalte nos dentes é bem mais grosso que nos primatas africanos, cuja dentição apresenta vãos, e estes não são registrados entre humanos. A redução nos caninos do homem fez com que esses pequenos espaços desaparecessem entre seus dentes. Os caninos nos símios têm esses vãos. Os maxilares do Australopithecus afarensis mostram irrefutavelmente este espacejamento entre os caninos e os dentes adjacentes. No homem, os caninos são menores quando comparados aos dos macacos, sugerindo uma menor competição e maior cooperação para a vida social em nossa espécie.

O maxilar superior do Australopithecus afarensis mostra claramente o vão entre os dentes caninos e os adjacentes, o que é peculiar aos símios, e não ao homem.

Arcada dentária inferior de um Homo habilis mostrando uma dentição basicamente humana, notadamente diferente da dos australopitecos.

Os humanos, após a primeira dentição (dentição de leite), mostram uma segunda e definitiva composta de 28 a 32 dentes. Os dianteiros, incisivos, se prestam ao corte de alimentos, os caninos são perfurantes e os pré-molares e os molares são empregados para triturar e moer alimentos.

Acontece que preteritamente os hábitos alimentares de mastigação não seriam uma exclusividade humana. “É possível que os antepassados dos hominídeos se tivessem especializado em comer sementes e frutos duros, que eram difíceis de abrir e requeriam mais mastigação. Estes traços aparecem cedo demais para relacioná-los com a fabricação de utensílios e com a elaboração dos alimentos. Também evoluíram nos mandris Theropithecus, que comem sementes duras”, segundo John Gowlett, no livro “Arqueologia das Primeiras Culturas (A Alvorada da Humanidade)”, Ediciones Folio S.A., Barcelona, 2007, págs. 16/17.

Seus fortes caninos e adjacentes e o vão presente entre tal dentição revela que o Australopithecus afarensis era portador de bons músculos maxilares para facilitar sua mastigação, o que é típico de símios, não sendo inerente ao homem. Para Francis S. Collins, diretor do Projeto Genoma (“A Linguagem de Deus”, 4ª. edição, Editora Gente, págs. 144/145), mesmo frisando tratar-se de uma hipótese, escreveu que a presença desse maxilar mais fraco no homem facilitou, paradoxalmente, seu crescimento craniano para cima na acomodação de um cérebro maior:

“Agora podemos também começar a explicar as origens de uma fração ínfima de diferenças mais mecânicas entre nós e nossos parentes mais próximos, algumas das quais podem desempenhar funções de destaque em nossa natureza humana. Por exemplo, um gene para a proteína dos músculos maxilares (MYH16) parece ter sofrido uma mutação para um pseudogene nos humanos, mas continua desempenhando um papel importante no desenvolvimento e na força dos músculos maxilares em outros primatas. Percebe-se que a desativação desse gene leva a uma redução na massa desses músculos nos humanos. A maior parte dos macacos tem mandíbulas relativamente maiores e mais fortes que as nossas. Crânios de humanos e de macacos devem, entre outras coisas, servir de sustentação a esses músculos maxilares. É possível que o desenvolvimento de um maxilar mais fraco permita, paradoxalmente, que nosso crânio cresça para cima, para acomodar nosso cérebro maior. Trata-se de uma especulação, é claro, e outras alterações genéticas seriam necessárias para responsabilizar o córtex cerebral muito maior que representa um componente essencial na diferença entre homens e chimpanzés.”

De mais a mais, refrisando, há quem considere que o Australopithecus afarensis de Hadar nada mais seria do que uma variedade do Australopithecus africanus. Mas existe um detalhe muito importante e inquestionável na anatomia de Lucy: sua pélvis não evoluiu a lhe permitir dar à luz uma criatura com a cabeça grande. Dali nunca sairia um feto Homo, por absoluta falta de espaço para vir ao mundo.

Giro outro, existem cientistas que não creem que os afarensis tenham deixado sequer descendência, não passando de um ramo seco dos hominídeos, no que acreditamos. É que inúmeros fósseis da espécie foram achados com a mesma idade do Homo habilis. Afinal chegaram a ser contemporâneos e até do segundo homem, o Homo erectus, que surgiu há 1,6 milhões de anos. E, se ambos conviveram há 2 milhões de anos no mesmo espaço, aquele tipo de australopiteco, mais propriamente levando uma vida arbórea e que desapareceu há 1,5 milhão de anos, não poderia ser elo encadeador da linha evolutiva do homem.

A todas as luzes, é impossível que nossos ancestrais remotos tenham descendido de outros animais que existiram simultaneamente com eles. Nossa espécie seguiu sozinha em sua escalada evolutiva, a partir do Homo habilis, sendo que este não é ancestral do Homo sapiens, e sim o primeiro homem, cuja evolução redundou no Homo erectus e, por fim, em nós.

Os hominídeos evoluíram muito mais cedo do que se imaginava. Em Laetoli, na Tanzânia, foi achada uma série de pegadas preservadas em cinzas vulcânicas pulverizadas e molhadas pela chuva, tratando-se de icnofósseis na rocha. Outra camada de cinzas oriunda do vulcanismo cobriu a seguir essas marcas, após virando rochas duras, datadas de 3,5 milhões de anos atrás, isto em 1976. A todas as luzes, depreende-se que esses indivíduos abandonavam apressadamente o lugar em busca de outro distante daquele vulcão então ativo, percorrendo um caminho sobre a larva morna de dias anteriores. Um desses animais chegou a dar uma ligeira parada e se virou em direção ao leste, provavelmente olhando para o vulcão ativo, prosseguindo com os seus a seguir.

Conclui-se daí que pelo menos os três indivíduos dessas pegadas, atribuídas aos Australopithecus afarensis, passaram pelo lugar sobre dois pés, estando do lado direito dos mesmos a cratera do perigoso vulcão Sadiman. Essas pegadas revelam pés chatos e um ângulo bem maior entre o dedão e os demais dedos dos pés.

Aqui é forçoso imaginar, em análise meticulosa, uma anatomia apropriada para subir e descer árvores. Esses pés indicavam que ainda agarravam o chão, e não que habitualmente o pisavam. Não foi possível imaginar como um pé mais parecido com o de macaco pudesse vir a desenvolver-se para uma versão moderna de pés humanos. Richard Leakey formula esta pergunta, que ele mesmo responde (obra citada, pág. 71):

“Essas criaturas seriam formas primitivas do Homo? É difícil imaginar como essa pergunta pode algum dia ser respondida com certeza.”

As impressões em Laetoli, de 17 cm de comprimento por 11 de largura, descobertas a uma profundidade de 5 metros, foram recebidas com desdém por parte dos pesquisadores. Kevin Hatala, da Universidade de Chatham, na Pensilvânia (EUA), concluiu que aquela marcha de afarensis se apresentava bastante estranha aos olhos modernos, pois eles deviam curvar os joelhos quando cada pé tocasse o chão, como fazem os humanos.

Em outras palavras, poderia ter ocorrido em Laetoli um raro bipedismo em andar gingado, forçado ao que parece pelo temor daqueles seres ao meio ambiente então hostil. Como diz o ditado, necessidade faz sapo pular. Pequena nota na revista “Visão”, de 27 de novembro de 1978, diz que “há muito tempo – 3,5 milhões de anos – a criatura queimou a sola dos pés ao caminhar sobre as cinzas ainda quentes de um vulcão, deixando sobre elas suas marcas. Estas se fossilizaram e agora voltam à luz, após uma escavação dirigida pela paleontóloga
britânica Mary Leakey financiada pela Nacional Geografic, associação americana que estimula e patrocina esse tipo de pesquisa.”

A corrente simpática ao afarensis como nosso ancestral argumenta, porém, conforme já dissemos antes, que o lugar estaria úmido no momento, sendo uma segunda erupção a lançar mais cinzas sobre as pegadas, preservando-as afinal. Pingos possivelmente de uma chuva momentânea também ficaram preservados, ao lado daquela marcha animal.

“A cratera fumegante do Sadiman encontrava-se à sua direita”, conforme Richard E. Leakey (filho de Mary e Louis Leakey) e Lewin (idem, pág. 71), que procuraram explicar este andar gingado com os chimpanzés (ibidem, pág. 76):

“Os outros músculos nos permitem andar equilibradamente em vez de gingarmos, como acontece com os patos ou os chimpanzés em suas breves incursões no bipedismo. (...). Se, no entanto, você fosse um chimpanzé, formar-se-iam duas linhas de pegadas: o chimpanzé coloca o peso do corpo sobre o pé direito, por exemplo, movendo seu corpo naquela direção e depois sobre o esquerdo, mudando outra vez o movimento; daí o andar gingado. Os humanos certificam-se de que os pés estão no centro antes de começar a andar.”

O antropólogo francês André Leroi-Gouhan concorda que esse australopiteco já apresentava sinais de artelhos voltados para fora e apoiando-se sobre a parte externa dos pés, mais ou menos como os patos.

O Dr. Russel Tuttle, professor de antropologia da Universidade de Chicago, acredita que a estrutura do pé e do joelho de Lucy poderia ser inteiramente esticada (“The New York Times”). Como dissemos antes, uma perna inteiramente esticada trazia então e traz a condição de um ser não poder dobrar os joelhos quando cada pé tocasse no chão. O homem, no seu andar, dobra os joelhos – simples assim. Conforme ainda o Dr. Russel Tuttle, a bacia e os pés de Lucy ainda conservam traços de habitantes de árvores, mas indicando uma recente transição para a vida terrestre. Isto, refrisando, não procede porque o afarensis era basicamente arbóreo. E, como quer que seja, tendo sido contemporâneo tanto do Homo habilis como do Homo erectus, impossível afirmar ter o mesmo evoluído para o que nós somos hoje.

Em análise posterior do terreno, por determinação das autoridades da Tanzânia, que queriam construir um museu em Laetoli, o pesquisador Fidelis Masao, da universidade local Dar es Salaam, e seus colegas encontraram outras pegadas de mais dois indivíduos. As primeiras pegadas foram atribuídas a uma família de dois adultos e um jovem. Com a identificação de pegadas de mais dois indivíduos, estudiosos da matéria propuseram uma nova teoria sobre a ordem social do grupo, de aplicação inimaginável à espécie humana. “Ao ver que mais dois adultos estavam presentes, podemos supor que eles eram semelhantes aos gorilas: um único macho dominante, acompanhado por suas fêmeas e seus descendentes”, afirmou Giorgio Manzi, da Universidade Sapienza, em Roma.

A descoberta de um fóssil de um hominídeo do sexo feminino, com três anos de idade, foi descrita na revista científica inglesa “Nature”, de 21 de setembro de 2006. A criatura estava num sítio arqueológico de Dikika, situado na margem direita do Rio Aonache, na Etiópia. A localidade é bem próxima de Hadar, onde em 1974 foi encontrada Lucy.

O novo achado, em bom estado de conservação, coube a uma equipe internacional liderada pelo pesquisador etíope Zaresenay Aleniseged, que trabalha no Instituto Max Planck de Leipzig, Alemanha. Como era da mesma espécie da famosa Lucy, recebeu o nome de “filha”
desta.

O estudioso chileno René Bobe, da Universidade de Geórgia (EUA), frisou sobre o fóssil da “filha de Lucy”:

“O espécime é muito frágil, mas de diversas maneiras está mais para um chimpanzé do que para um ser humano. Ficou tão bem preservado, porque foi enterrado logo depois de morrer, talvez em uma inundação. Com três anos, essa garota provavelmente ainda era muito dependente de sua mãe. Mas já devia estar explorando a paisagem sozinha, por períodos curtos.”

Para Bernard Wood, da Universidade de George Washington, “o bebê de A. afarensis tinha braços capazes de subir em árvores, como o macaco. Era mais independente, como um chimpanzé.”

Retomando o tema da origem africana de hominídeos, ainda vem sendo procurado um suposto candidato para ancestral comum das espécies de Australopithecus posteriores e a corrente humana da evolução. Como mais ossadas de australopitecos se revelaram no Danakil, muitos paleoantropólogos observaram destacada divergência em seus crânios e tamanhos corporais.

Vale dizer que não uma, mas várias espécies de Australopithecus existiram em Danakil. E mais, qualquer uma delas - ou nenhuma delas, mais acertadamente – poderia ser ancestral do primeiro homem, o Homo habilis, nosso antepassado direto. Se bem observado comparativamente, o afarensis, não passou de um antropoide arbóreo, quiçá um grande símio, com raros hábitos semibípedes em descidas ligeiras até o solo. Detinha um cérebro cerca de 50 por cento menor do que o do homem moderno (650 cc contra 1.350 cc), do que se deduz uma inteligência limitada.

Achamos, todavia, que este seu referido bipedismo, badalado em reiteradas publicações científicas, não se sustenta. Haja vista que não lhe seria possível manter-se ereto por percursos médios e longos, carregando obviamente sobre suas inábeis pernas curtas um tronco pesado e braços enormes, além da cabeça. A relação do osso do seu braço superior (úmero) para o osso da perna superior ((fêmur) é próxima da de um chimpanzé em 95 por cento, sendo parecida com a do homem moderno somente em 70 por cento. A seu turno, o Homo habilis era dotado de bipedalismo a lhe proporcionar um melhor ângulo de visão, olhando as savanas por cima, e inteligência. Era também inteiramente divorciado da vida arbórea.

Essas primeiras criaturas humanas no parque natural da Terra deixaram provas de uso de ferramentas, como pedras afiadas para separar a carne da caça do osso, marcando o início do que chamamos de pedra lascada. Esses instrumentos líticos foram associados à tradição Oldowan, ou Olduvaiense, em referência à Garganta de Olduvai, na Tanzânia, onde foram primeiramente identificados, ou seja, sua localidade típica, que também precedeu as descobertas de Homo habilis.

O termo Olduvaiense, que se refere às primeiras indústrias líticas de hominídeos no Paleolítico Inferior africano, equivale ao que fora da África se denominou de Pré-Acheulense, Paleolítico Inferior Arcaico ou Cultura dos Seixos Trabalhados. Necessário destacar que os líticos africanos são mais antigos. O mesmo tipo de trabalho manual surgiu em Kada Gona, na Etiópia, com aproximadamente 2,6 milhões de anos atrás, e, um pouco mais tarde, no território de Hadar e novamente no Norte do Quênia, perto do Lago Turcana.

Lascas empoeiradas provenientes de lugar a Oeste do citado Lago Turcana, confeccionadas há 3,3 milhões de anos, não foram identificadas num primeiro momento como ferramentas. O interessante dessas lascas é sua datação, antecedendo o Homo habilis e coincidindo com o afarensis, que não produzia e nem manuseava líticos. Mais prudente seria frisar que o material não representou ferramenta nenhuma. O seu aspecto decorre de atritos naturais, como tantos e tantos fragmentos rochosos existentes no fundo de rios e lagos, em cascalheiras e até mesmo dentro de cavernas. Ademais, o primeiro homem foi datado de 2 milhões de anos atrás (o 1470), seguindo-se a descoberta da mandíbula de outro elemento de 2,8 milhões de anos passados, na Etiópia, sendo mais acertado, caso aquelas lascas, evidente pobres criativamente falado, sejam mesmo utensílios elaborados por alguma inteligência, atribuí-los ao primeiro homem mesmo, com elementos fósseis até presentemente não descobertos nas imediações da muito provavelmente inútil pedraria em questão.

A Garganta de Olduvai obteve notoriedade mundial no início dos anos 60, quando Louis e Mary Leakey trouxeram à tona um número expressivo de fósseis estudados à luz da evolução humana. Outros espécimes de hominídeos, provenientes do Quênia, demonstraram que eles se espalharam pelo Leste da África pelo Vale do Rift.

O mais famoso fóssil de um Homo habilis, de 2 milhões de anos, foi achado às margens leste do Lago Turkana. Recebeu o número de 1470 e acabou ficando assim conhecido. Foi exaustivamente estudado por Richard Leakey, sendo uma sua fotografia a capa do seu livro “Origens”. Esse antropólogo apontou como sua principal característica o cérebro grande, “com cerca de 800 cc (mais da metade do de um homem moderno)”, calculando sua idade entre 2 milhões e 2,5 milhões de anos.

Um achado que permitiu novas análises desse hominoide se deu em 1994, quando a primeira ossada completa de um Australopithecus afarensis masculino apareceu a menos de 10 quilômetros do local da morte de Lucy (que era uma fêmea de 1,1m e 29 quilos). No seu período de existência, o clima era seco, com as savanas substituindo as florestas anteriores.

Restaram visíveis as diferenças entre machos e fêmeas afarensis. O macho apresentava quase duas vezes o peso e o tamanho de uma fêmea, obviamente com massa muscular sobremodo destacada. É o que hoje chamamos de dimorfismo sexual, que serve para diferenciar os indivíduos de sexos distintos. Nos mamíferos o dimorfismo sexual se liga ao comportamento sexual, mas é difícil afirmar muito sobre o comportamento social dos afarensis. Assim examinado, quando comparado com a fêmea, depreende-se ter sido o macho bem mais esbelto, o mesmo provavelmente valendo em confronto com os demais
tipos de australopitecos africanos do mesmo sexo. Enquanto existiu, o afarensis foi também melhor sucedido em relação aos demais da família Hominidae, ao que tudo indica, com exceção do gênero Homo.

A seleção sexual e o comportamento animal são dois fatores intimamente relacionados. Quando do ciclo reprodutor, animais do sexo masculino exibem características ornamentais raramente vistas nas fêmeas. Conforme registrou Charles Darwin, antes do acasalamento, a fêmea pode escolher um macho apenas entre seus inúmeros pretendentes. Ela opta por aquele portador de determinadas diferenças favoráveis em relação aos demais, que podem estar na coloração, na forma das penas e outros detalhes. Os caracteres do macho escolhido são transmitidos, pelos genes, para os descendentes machos. Consequentemente, os animais providos de cores vivas e atraentes, comportamentos sofisticados e estruturas bem desenvolvidas cruzam com maior frequência e deixam maior número de descendentes.

Podemos citar outro exemplo: o Australopithecus robustus macho tinha crânio maior que era dotado de uma crista dorsal proeminente. Este detalhe a mais lhe foi importante na competição com outros machos por uma fêmea para a cópula. A fêmea robustus era menor e não dotada da referida crista dorsal proeminente. Se bem que essa crista óssea no alto do crânio era uma inserção aos resistentes músculos mastigadores, estando presente em grande parte dos australopitecos, mas é ausente no A. afarensis. Os pré-molares e molares eram dentes grandes em relação aos incisivos.

O comportamento seletivo sempre definiu o comportamento sexual entre os humanos. Exemplificativamente, as fêmeas têm relações menos frequentes do que os machos, por lhe incumbir conceber e criar a prole, o que demanda tempo. Pelas ideias darwinianas, ela pode avaliar as características de um possível parceiro, tanto suas qualidades genéticas quanto a sua capacidade de sustentar os filhos. Para o homem, a cópula chega a ser uma atividade frequente e de baixo custo. Com um número significativo de parceiras disponíveis, ele tem probabilidade maior de disseminação dos seus genes, sendo, assim, menos exigente em suas escolhas no meio do universo feminino.

Segundo Marco Aurélio Baggio, presidente emérito do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, no seu livro “69 Etapas Evolucionistas”, Santa Clara Editora, 2007, “a evolução quis destacar dois tipos distintos de conformação física, criando o papel específico do macho e da fêmea para se complementarem ao reproduzir um novo ser da espécie. A separação dos sexos foi uma esperta estratégia evolutiva para aumentar a diversidade das espécies, permitindo maior segurança contra a consanguinidade. A masculinidade produz milhões de gametas nadadores – os espermatozoides. As fêmeas produzem um único enorme gameta por vez – o óvulo. Sua fecundação por anisogamia – heterogamia – constitui um entre muitos outros sistemas naturais de reprodução. (...). A sexualidade é extremamente vantajosa para a ampliação do número de espécies de fungos, de plantas e de animais. O preço a pagar pela sexualização é o envelhecimento e a morte. Esta se dá mediante o desgaste interno do ser vivo, ao longo do seu ciclo vital, por apoptose ou tanose. A morte é a primeira e principal “doença” sexualmente transmissível.” Heterogamia é o tipo de reprodução sexuada com gametas diferentes, podendo ser do tipo anisogamia, na qual os gametas diferem no aspecto morfológico. O feminino é maior que o masculino. A apoptose é um tipo de morte celular programada, também sendo chamada de “suicídio celular”.

A subordem Anthropoidea é considerada a mais evoluída dos primatas e se subdivide em três superfamílias: dos Ceboidea, que são os macacos do Novo Mundo; os Cercopithecoidea, macacos do Velo Mundo; e os Hominoidea, que abrangem os pongídeos (gibões, chimpanzés, gorilas e homens). Estas três grandes famílias estrearam no cenário da Terra no Oligoceno (38 milhões de anos). Em épocas anteriores (Paleoceno e Eoceno), os prossímios arbóreos, como lêmures, társios, lóris e aiais (lêmure noturno de Madagascar), são os únicos fósseis. Restos de pongídeos são mais encontradiços que os dos demais macacos. Esses primatas sem cauda são tidos como os mais evoluídos do mundo animal, e podemos frisar que os ancestrais dos homens se ligam aos mesmos.

O homem não descende de nenhum macaco, sendo apenas primo deste. Os primatas atuais mais próximos do homem são os monos, compreendendo chimpanzé, gorila, gibão e orangotango. Mono é designação comum a antropoides primatas em geral, particularmente aos não dotados de cauda e detentores de longos braços. Todos possuem esqueleto, fisiologia, susceptibilidade aos parasitas, grupos sanguíneos e outros caracteres muito semelhantes aos Homo, porém sem ser nossos ancestrais. Nossa evolução foi separada da desses símios, que hoje vivem nas matas.

O gibão, por exemplo, um primata superior como os homens, tem uma curiosa aparência que o distingue de nós: quando abandona os galhos, nos quais se locomove em braquiação (balanceamento dos braços), em busca do chão, o faz de maneira bípede, ao contrário dos outros seus três congêneres (gorila, chimpanzé e o orangotango), que o fazem com os quatro membros. Porém, para andar a céu aberto, em busca de um equilíbrio, o gibão estica os braços para trás, assim sem liberar propriamente as mãos. A liberação das mãos foi essencial
à hominização.

A bipedia no homem é perfeita, tendo a sua bacia pélvica como suporte do tronco. A coluna vertebral, com as quatro curvas que se opõem simultaneamente, cria, ao lado da bipedia, a verticalidade completa em nossa espécie. Esta mesma coluna vertebral mantém o crânio no topo, em posição de equilíbrio. Duas consequências resultam desta postura: a liberação das mãos e a possibilidade do desenvolvimento do crânio com relação à diminuição do tamanho da face e dos maxilares. Estes fatores essenciais à hominização não estão presentes nos demais primatas. O desenvolvimento do crânio e aprimoramento da face e dos maxilares estão implícitos na bipedia, sem serem isoladamente causas da hominização.

O aumento do volume do crânio e a diminuição do tamanho da face e dos maxilares são consequências da posição de equilíbrio do crânio humano sobre a coluna vertebral. Esta, nos símios, não sustenta o crânio por baixo, mas vem encontrar o buraco occipital por trás. No homem, o buraco occipital encontra-se exatamente no centro inferior. A cabeça do símio teria assim tendência a cair para a frente, se não fosse a poderosa musculatura que, partindo em feixe do pescoço e da nuca, vem retê-la sobre a coluna vertebral.

Os seres humanos, ao contrário de outros primatas, têm pouco pelo no corpo, o que se explica por ele ser dotado de um sistema de refrigeração próprio, ausente em qualquer outro primata: a transpiração pelos poros do seu corpo. Acreditamos que todos os diversos tipos de australopitecos eram inteiramente cobertos de pelos, porque nunca foram propriamente pertencentes ao puro gênero Homo. O afarensis, em particular, para nós um hominoide traduzido em um grande símio, a exemplo daqueles seus congêneres, se mostrava revestido de pelos, o que é uma conclusão nossa.

Para sobreviver debaixo do sol equatorial africano, a pele assim desnuda do homem teria de ser (como era) protegida por uma quantidade considerável de melanina, pigmento escuro que protege o tecido da luz ultravioleta. Esta é a razão de o homem ser originariamente negro. Quando ele migrou para regiões ao norte da Terra, nas quais os raios solares são bem mais escassos, há cerca de 45 mil anos, tempo este relativamente recente, sua cor foi clareando porque a referida pigmentação, proteção natural contra possíveis queimaduras e doenças
como câncer de pele, foi perdendo sua importância e permitindo uma melhor absorção da luz ultravioleta, fonte vital de vitamina D.

Acresce notar, a propósito, que estudos em um esqueleto de 10 mil anos, batizado de homem de Cheddar, encontrado em Cheddar, no Reino Unido, especialmente com a reconstituição do seu rosto em um scanner de alta tecnologia, revelou um fenótipo totalmente oposto à pele branca de muitos britânicos. Era um tipo negro de olhos azuis. “A combinação de uma pele muito escura com olhos azuis não é o que normalmente imaginamos, mas essa era a aparência real dessas pessoas”, disse Chris Stringer, do Museu de Ciências Naturais de Londres, onde a imagem do homem de Cheddar foi exposta.

O Homo habilis (“pessoa habilidosa”) era onívoro, alimentando-se tanto de animais como de vegetais, podendo colher seus alimentos e levá-los para comer tranquilamente longe de competidores, desenvolvendo também destreza artesanal. A seu turno, o Australopithecus afarensis, que cientificamente não é classificada no gênero Homo, sendo apenas da família Hominidae, tinha uma dieta suave voltada para lagartos, ovos, pequenos mamíferos e frutas. Seus dentes eram pequenos e sem especialização. E nem seria conveniente se pensar
de forma diferente, uma vez que a cabeça de um afarensis comportava um cérebro que não era muito maior que o de um chimpanzé, indicativo de uma inteligência rudimentar, sem ter sequer produzido ferramentas e não fazendo uso do fogo.

Se bem que a inteligência não é apenas uma conquista humana. Ela é notada em outros animais, mesmo em proporções diminutas, que possuem algum grau de reconhecimento, capacidade de elaboração de instrumentos de trabalho e tendo soluções simples para buscar alimentos. Cientistas da atualidade concluíram por vários graus de complexidade inteligente em mamíferos, como golfinhos, elefantes e principalmente entre primatas. Constataram que o homem compartilha com eles algumas características, que antes se achava exclusividade nossa. A linguagem simbólica é um desses exemplos, sendo compartilhada entre primatas como o chimpanzé. Também a caça cooperativa, comum entre os homens pré-históricos, sempre foi praticada entre inúmeros mamíferos.

Por outro lado, o desaparecimento de determinadas espécies nunca foi fato incomum na pré-história. Tomemos como melhor exemplo o próprio Australopithecus afarensis, que, quanto mais estudamos, percebemos tratar-se de um aborígene com alguma capacidade de descer até o solo. O Homo habilis, o Homo erectus e o Homo sapiens nunca levaram a vida, ou mesmo parte dela, em árvores, chegando a escalá-las em ocasiões específicas, como fugindo de um predador, em busca de frutas ou para verificação de um território propício a caçadas, por exemplo.

Conhecemos uma reconstituição do seu fóssil mais famoso, Lucy, no Museu de História Natural dos Estados Unidos, em Nova Yorque, em 2017. Se muitos a querem como um ser bípede, estudos recentes mostraram que Lucy passava grande parte do seu dia em árvores, possuindo braços fortes o suficiente para subidas regulares em suas ramagens superiores, ao passo que suas pernas eram relativamente fracas, não utilizadas na escalada e ineficazes para caminhar.

Outra pesquisa, publicada em setembro de 2016, na revista “Nature”, concluiu que esse A. afarensis morreu ao cair de uma árvore particularmente alta, ao pular de um galho para outro, conclusão a que se chegou ao se analisar uma fratura óssea nos restos fossilizados desse hominídeo.

“WASHINGTON, EUA. Lucy, a famosa Australopithecus que viveu há 3,18 milhões de anos, provavelmente passava ao menos um terço do seu dia em árvores, de acordo com uma pesquisa divulgada na última quarta-feira. Nossa antiga ancestral (sic), cujo esqueleto parcial fossilizado foi descoberto na Etiópia em 1974, provavelmente se movia tanto como um chimpanzé moderno quanto como um homem moderno, de acordo com um novo estudo publicado na revista científica “Plos One” por pesquisadores da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, Maryland, e da Universidade do Texas, em Austin. Esse exemplar de Australopithecus afarensis, de cerca de um metro de altura, vem confundindo os paleontólogos há anos. Eles debatem se o hominídeo bípede de 27 quilos passava a maior parte do tempo no chão, como os seres humanos modernos, ou nas árvores, como os chimpanzés. O estudo concluiu que Lucy tinha braços fortes, sugerindo que ela subia em árvores regularmente, e pernas relativamente fracas, que não eram utilizadas na escalada e que eram ineficazes para caminhar. A combinação das duas descobertas levou os pesquisadores a concluírem que Lucy provavelmente se aninhava em galhos de árvores durante a noite, a fim de evitar predadores, usava seus braços para se locomover entre as árvores e possivelmente procurava alimentos entre os
ramos. Os pesquisadores analisaram os ossos de Lucy combinando 35 mil imagens individuais tomadas por um poderoso scanner capaz de penetrar nas camadas de minerais em seus restos fossilizados e de produzir imagens de alta definição. Eles estudaram as estruturas internas dos ossos superiores dos dois braços de Lucy e do fêmur de sua perna esquerda e descobriram que seus membros superiores eram altamente desenvolvidos – sugerindo que eles tinham músculos fortes, semelhantes aos dos chimpanzés modernos que escalam árvores. “É um fato bem estabelecido que o esqueleto responde às cargas durante a vida, adicionando ossos para resistir a forças elevadas e subtraindo ossos quando as forças são reduzidas”, disse John Kappelman, professor de antropologia da Universidade do Texas e um dos principais autores da pesquisa. Robustez. Os esqueletos de chimpanzés têm membros superiores mais robustos, porque usam os braços para escalar, enquanto os humanos têm membros inferiores mais desenvolvidos devido à caminhada, de acordo com Christophe Ruff, professor de anatomia da Universidade Johns Hopkins e coautor do estudo. “Os resultados sobre Lucy são convincentes”, disse. Outro estudo divulgado em setembro concluiu que Lucy provavelmente morreu ao cair de uma árvore particularmente alta. A pesquisa, publicada na revista britânica “Nature”, chegou a essa conclusão após a análise de uma fratura óssea nos restos fossilizados do hominídeo. Mas os cientistas tiveram dificuldades para determinar exatamente quanto tempo Lucy passava fora do chão. O novo estudo sugere que, se ela dormisse cerca de oito horas por dia, teria passado pelo menos um terço de seu tempo entre os galhos. Outras comparações sugerem que, mesmo quando Lucy caminhava sobre suas duas pernas, ela fazia isso de forma menos eficiente do que os humanos modernos, com uma capacidade limitada de se mover por longas distâncias a pé.” (Jornal
“O Tempo”, Belo Horizonte, 03/12/2016).



Este autor ao lado da reprodução do fóssil de Lucy, no Museu de História Natural dos EUA, em Nova York. (Foto de Lorena Campos).

A razão do surgimento do bipedalismo continua sendo estudada, mas sem nada conclusivo, e tal assunto por certo permanerá inconclusivo por todo o sempre. Uma entre tantas especulações pode ser encontrada no livro “Os Primeiros Americanos”, de J. M. Adovasio e Jake Page (Editora Record, Rio de Janeior e São Paulo, 2011, págs. 100/101):

“Na verdade, a postura ereta e a locomoção bípede foram as adaptações mais radicais levadas a cabo pelos nossos ancestrais naqueles tempos remotos. Provavelmente nunca saberemos quais as características do meio ambiente ou outros fatores que estimularam aquela adaptação revolucionária e fundamental, mas é possível que um surto de temperaturas frias em algum momento do Plioceno, entre 6,5 milhões de anos e 5 milhões de anos atrás, tenha desempenhado um papel. De acordo com essa hipótese, a expansão da camada de gelo no Antártico fez baixar o nível do mar no mundo inteiro, incluindo o Mediterrâneo. Isso, por sua vez, alterou o esquema de precipitação pluvial nas florestas da África e acabou por fazer com que se retraíssem. Em consequência da redução da cobertura florestal, numerosas espécies arbóreas de primatas sumiram, enquanto outras se tornaram, pelo menos em parte, terrestres.

“Para alguns desses novos animais terrestres, o andar ereto ofereceu certas vantagens. Eles poderiam, por exemplo, percorrer longas distâncias com menor dispêndio de energia. A vida nas árvores pode parecer simples, a julgar pelo comportamento dos macacos de hoje: basta deslocar-se sem precipitação e acompanhar o ciclo regular de frutificação das árvores da floresta. Já os que caminhavam no solo precisavam explorar áreas mais vastas a fim de encontrar o que comer. Do mesmo modo, o bipedalismo liberava os membros superiores para poderem carregar o alimento coletado, e também para manejar objetos (varas, por exemplo), os quais por sua vez, podiam facilitar o achado da comida. Com os membros superiores livres, o bípede era capaz também de carregar os filhos para onde quisesse.”

Os mesmos autores são de opinião que numerosos episódios de esfriamento e secagem ocorreram nas latitudes médias do planeta, entre 3 milhões e 2 milhões de anos atrás, sendo que “como resultado, a cobertura florestal na África voltou a diminuir, a savana aberta cresceu, e a transferência de espécies adaptadas à floresta para a savana continuou”.

Ora, como já consignado, a postura bípede existia há cerca de 3 milhões de anos, portanto aqueles novos fenêmenos ambientais registrados entre 3 milhões e 2 milhões de anos atrás poderiam ter representando pouco para a bipedia humana, lembrando ainda que o A. afarensis tinha pelo menos um andar bastante precário no solo, há 3,18 milhões de anos. Ademais, há as pegadas de criaturas que caminharam em pé em cinzas vulcânicas pulverizadas com 3,5 milhões de anos atrás, em Laetoli, na Tanzânia. Queremos crer que pelo menos o processo de diminuição do ciclo de águas, que deu lugar aos campos abertos na África, teve início há mais de três milhões de anos, talvez se iniciando há cerca de quatro milhões de anos, não mais, lembrando que os mesmos autores mencionam temperaturas frias em algum momento do Plioceno, entre 6,5 milhões de anos e 5 milhões de anos atrás, quando as florestas dominavam o cenário.

Enfim, o homem surgiu ali pelas planícies das atuais nações africanas Quênia, Tanzânia e Etiópia (situadas numa linha denominada de Vale da Grande Fenda, uma decorrência de falha na crosta terrestre), há 2,8 milhões de anos. Era o supramencionado Homo habilis, o pai da nossa espécie, estreando no parque natural da Terra.

Esta sua idade novamente se comprovou com a descoberta, por um estudante, de um fragmento de sua mandíbula com cinco dentes, em 2013, em uma região de rastreamento em Ledi-Geraru, na Etiópia, o que levou a comunidade científica a proclamar tratar-se do mais antigo resto do indivíduo Homo, ou seja, o Homo habilis, que inaugurou nossa linhagem. O extraordinário achado, antecipando em 400 mil anos a origem do homem, logo ocupou as revistas científicas especializadas no tema e a mídia internacional:

“Encontrados há apenas dois anos na árida região de Ledi-Geraru, no Estado de Afar da atual Etiópia, fragmentos de uma mandíbula datados de 2,8 milhões de anos podem ser os mais antigos restos de um indivíduo do gênero Homo conhecidos, anteriores em 400 mil anos aos mais velhos que já tinham sido achados.

Com dentes menores que os vistos nos australopitecos e um formato
mais proporcional e peculiar, os pesquisadores acreditam que a mandíbula
reconstituída pertenceria a um representante da espécie Homo habilis
(...). Além disso, a idade do fóssil e o local onde foi encontrado o coloca
perto do tempo e no espaço ao fóssil da famosa Lucy, que está entre os mais
bem preservados e antigos restos de um indivíduo da espécie Autralopithecus
afarensis, encontrados em 1974 no sítio de Hadar e datados em pouco
mais de três milhões de anos.

- O registro fóssil no Leste da África, entre dois milhões e três milhões de anos atrás, é muito pobre, e existem relativamente poucos fósseis que podem nos dar informações sobre as origens do gênero Homo – lembrou Brian Villmoare, paleoantropólogo da Univerisade de Nevada, nos EUA, e um dos líderes da pesquisa, publicada na edição desta semana da revista “Science”, em teleconferência ontem. – Este, porém, é um dos períodos mais importantes da evolução humana, já que, nesta época pouco conhecida, os humanos fizeram a transição dos mais símios autralopitecos para os padrões adaptativos modernos vistos nos Homo. Assim, o que há de tão especial nessa mandíbula não é só sua idade, muito mais velha que qualquer exemplar de Homo conhecido até agora, mas também sua combinação única de traços, da altura da mandíbula ao formato dos dentes, que a faz uma clara transição entre os australopítecos e os Homo. O fato de ter características tão claras alinhadas com as dos Homo há 2,8 milhões de anos nos ajuda a restringir o tempo dessa transição e sugere que ela foi relativamente rápida. Em outro artigo também publicado na “Science” desta semana e que acompanha o estudo sobre o fóssil, os cientistas procuraram descrever o contexto geológico e ambiental onde ele foi encontrado.
Há tempos os especialistas desconfiam que mudanças climáticas ocorridas nesta época na África, com exuberantes selvas dando lugar a uma paisagem mais árida, parecida com as atuais savanas, estimularam um processo de adaptação que foi responsável pelo fim dos australopitecos e emergência dos Homo. Na mesma área onde a mandíbula foi encontrada, os pesquisadores acharam fósseis de espécies pré-históricas de antílopes, elefantes, hipopótamos e outros animais relacionados com habitats mais abertos, dominado por grama alta e arbustos e com árvores mais espaçadas.

- Podemos observar esse sinal de maior aridez há 2,8 milhões de anos na fauna comunal de Ledi-Geraru – disse Kaye Reed, professor da Universidade do Estado do Arizona, outro integrante da equipe responsável pela descoberta, que participou da teleconferência da Etiópia. – Ainda é cedo para dizer que isso significa que as mudanças climáticas foram responsáveis pela origem do gênero Homo. Para isso, precisamos de uma amostragem maior de fósseis de hominídeos e é por isso que continuamos a vir para a região de Ledi-Geraru em busca deles. O que sabemos é que esses Homo antigos conseguiram viver neste habitat razoavelmente extremo e que, aparentemente, a espécie de Lucy, os Australopithecus afarensis, não.

Já um terceiro estudo relacionado ao tema, também publicado ontem, mas na revista “Nature”, revisitou o fóssil original que permitiu a identificação pela primeira vez do Homo habilis há pouco mais de 50 anos e revelou que, entre 2,1 milhões e 1,6 milhões de anos atrás, pelo menos três espécies representantes do gênero conviveram na África: além do H. Habilis, o H. Erectus e o H. rudolfensis. Encontrados nos anos 1960 pelo respeitado e já falecido Louis Leakey na região de Olduvai, na Tanzânia – e que, por isso, recebeu o apelido de “Berço da Humanidade”

-, os restos fragmentados de crânio e mandíbula serviram de base
para uma reconstrução em 3D de como seria a cabeça completa de um
representante da espécie, evidenciando características que antes não puderam
ser notadas pelos especialistas.” (“O Globo”, globo.com, Cesar Baima,
04/03/2015).

A propósito deste Homo rudolfensis, pesquisas diversas o consideraram tão somente uma variação do Homo habilis, com uma coexistência há dois milhões de anos e compartilhando muitas semelhanças, sendo ambos, por conseguinte, uma única espécie. Estudos outros mostraram que seriam grandes as diferenças entre os dois. Esta a razão para não serem inseridos dentro de uma mesma espécie. Esse elemento chegou a ser considerado habilis e rudolfensis, isto é, dois tipos raciais coexistindo, quando é certo ser a raça humana uma só, não comportando nenhuma exceção.

Condições ambientais diversas buscadas para habitação e sobrevivência hominídea e também isolamentos geográficos acabam por vezes mostrando pequenas mutações numa mesma raça. O isolamento genético de um grupo social acaba trazendo tais alterações. Os genes mutados se misturam nos seres de cada grupo populacional, e cada um desses grupos tem alterado seu genótipo e mesmo o fenótipo, pela incorporação ao seu patrimônio hereditário dos genes que sofreram mudanças. Confinamentos de tal ordem chegam mesmo a redundar no aparecimento de subespécies ou variedades de uma mesma espécie.

Todavia, esse H. rudolfensis chegou a também ser contemporâneo do Homo erectus, tendo este último vivido entre 1,8 milhões de anos ou 1,6 milhões de anos atrás e 100-200 mil anos atrás. A coincidência da igualdade temporal dos dois não é um bom sinal para tentarmos colocar o homem de Rudolf como o primeiro homem, em detrimento do Homo habilis. Para ser o primeiro homem, o mesmo teria de vir antes do Homo erectus, e nunca ter sido seu contemporâneo.

Através de trabalhos com moldes do interior de crânios fósseis que fez, o antropólogo americano Ralph L. Holloway, da Universidade Colúmbia, localizou indícios da área de Broca (um dos vários centros da região cerebral imprescindíveis à fala) num fóssil de Homo habilis de mais de dois milhões de anos, do que se conclui que o desenvolvimento da linguagem pode ter começado ao lado já das primeiras indústrias líticas (no caso, uma linguagem onomatopaica), conforme é possível ler no antes citado livro “O Homem na Pré-História do Norte de Minas”, pág. 17. Cérebros humanos modernos têm uma protuberância que corresponde à área de Broca, que, refrisando, é importante centro da fala.

Acresce notar ainda que o Homo habilis difere do A. afarensis na base do crânio. O buraco occipital, que é a abertura para a medula espinhal, é mais próximo da média do crânio. O rosto desse primeiro homem diminuiu em largura e sua abertura nasal é mais bem definida, sendo seus dentes postcaninos menores do que em australopitecos.

Ostentava um cérebro que poderíamos considerar pequeno para os padrões atuais, mas que se destacou a seu tempo se comparado com o de seus predecesssores: entre 650 e 700 centímetros cúbicos (e não 800 centímetros cúbicos, “o dobro do tamanho do de Lucy”, como sugeriu R. Leakey). Seu sucessor, o Homo erectus, possuía 900 centímetros cúbicos, vindo após o Homo sapiens, os homens modernos que somos nós, com cerca de 1.300/1.400 centímetros cúbicos de cérebro (no homem de Neanderthal o cérebro chegava a 1.500 cc).

Se não somos propriamente velocistas quando nos comparamos aos quadrúpedes, somos os únicos primatas e um dos poucos mamíferos a praticar corridas de resistência, como cavalos e cães: “Pensa-se que a corrida de resistência evoluiu com o gênero Homo, uma vez que algumas das especializações que permitem resistência em execução (como dedos curtos, um dedão do pé aduzido, uma cabeça mais equilibrada, ligamentos do pescoço e um cacâneo alargado) evoluiu no Homo habilis. Outras características (tais como canais ampliados semicirculares, antebraços mais curtos e maior quadril, perna e locais de fixação muscular nas costas, pernas mais longas e uma articulação sacro-ilíaca mais forte) evoluíram em Homo erectus. E vários outros recursos (a cabeça que era mais independente a partir do ombro, uma estreita pleve, um pé arqueado e um longo tendão calcâneo) evoluíram cedo na linhagem Homo, embora o ponto exato seja desconhecido” (Bramble, 2004).

A hominização, que é a evolução física e intelectual do homem, de sua origem até hoje, se mostrou diferente em relação aos antropoides, mormente pelo tamanho do seu encéfalo e mandíbula, por sua postura ereta e constituição de relações sociais complexas. O nosso desenvolvimento e morfologia se resumem na genética. O DNA, que traz o código genético de um organismo, é que mostra as diferenças registradas entre nós e os demais animais. Os cromossomos, que estão em cada uma das células, é que constituem o DNA. A célula é a unidade vital dos organismos complexos, sendo a vida resultante das funções de todas as células. Os organismos vivos podem ser manipulados pelo homem pela engenharia genética, o que já acontece.

Incursões pelo genoma ainda são tímidas, quando o ideal seria seu manejo com mais coragem e acuidade. Infelizmente, desde o nascedouro do Projeto Genoma, descortinando novas perspectivas alvissareiras para a humanidade e com o condão de abrir muitas cortinas sobre nossas origens, este marco, talvez o passo mais avançado da ciência moderna, encontra-se hoje praticamente estagnado.

Como se pode perceber raciocinando mesmo razoavelmente, uma parte considerável dos pesquisadores envolvidos mostra-se temerosa diante do pensamento e julgamento conservador de terceiros, com suporte especialmente em princípios religiosos, como sempre, proclamando estar o homem “brincando de Deus”. Ou seja, levado novamente adiante, o genoma nos proporcionará horizontes mais amplos sobre passado, presente e futuro, ao lado de aguardadas novas descobertas no campo da arqueologia.


“O conjunto de evidências indica que nossa evolução não foi nem especial nem atípica com relação à de outros animais. Assim, seria de esperar que aquilo que sabemos sobre a evolução de outras formas de animais também deve servir, de modo geral, aos humanos. De fato, nossa extrema proximidade genética dos chimpanzés, bem como as semelhanças genetícas entre primatas e outros mamíferos, apontam para um tema familiar. Os conjuntos de genes para a formação desses animais e dos seres humanos são bastante parecidos. As diferenças na morfologia final – tanto as grandes quanto as pequenas – devem, portanto, estar relacionadas ao modo como esses genes são utilizados – ou (...) como deixam de ser usados.

A causa essencial das alterações evolutivas no desenvolvimento e na morfologia dos seres humanos é a genética. Em algum lugar de nosso DNA residem as diferenças entre nós, os grandes primatas e os primeiros hominídeos. (...) A boa notícia é que já conhecemos a sequência completa dos genomas de um ser humano, um chimpanzé e um camundongo. A má notícia envolve um pouco de aritmética. A sequência do DNA humano é composta por três bilhões de pares de bases. A do chimpanzé é cerca de 98,8% igual à nossa. É uma dirença total de apenas 1,2% a menor entre qualquer outro animal do planeta. (...)

...mudanças nos interruptores genéticos são responsáveis por muitas diferenças na morfologia animal. Como a evolução humana se dá essencialmente pela alteração do tamanho, forma e anatomia detalhada das estruturas e do momento em que são geradas ao longo da enbriogênese, é natural que a evolução dos interruptores tenha um papel relevante. Cada aspecto de nosso corpo é uma variação do modelo geral dos mamíferos ou primatas. Isto nos permite acreditar que os indícios genéricos nos mostram a evolução dos primatas e humanos devendo-se mais a alterações no controle dos genes que nas proteínas que condificam.” (Sean B. Carrol, professor e biólogo, em “Infinitas formas de grande beleza”).

Giro outro, os pouquíssimos fósseis humanos conhecidos da sua aurora surgiram em pontos ínfimos da Terra, ao contrário de restos de organismos mais remotos, tipo plantas e animais como trilobites e amonites. Fósseis marinhos pulularam por uma diversidade de locais em que surgiram e viveram, ao que se soma um tempo sobremodo maior de vida naqueles ambientes bastante favoráveis à fossilização.

Os homens são tardios na escala do tempo biológico e sequer surgiram em grande número. Inteligentes, ocuparam terras firmes, evitando por inteiro charcos, proximidades de areias movediças, atoleiros, lugares pantanosos e barreiros (os cinco últimos apropriados à fossilização), ao contrário de uma gama de outros animais muito bem documentados no registro fóssil ocupantes desses lugares inconvenientes ao Homo. Mesmo caçadores/coletores, aqueles nossos antepassados ainda buscavam caminhos mais seguros em suas andanças
e mudanças.

Portanto, quando morriam, de um modo geral, os seus ossos eram facilmente triturados por animais predadores ou carniceiros, sendo também roídos por roedores e mesmo corroídos ou raspados por diversas espécies de formigas. Esta a razão do escasso registro fóssil dos primeiros homens, e mesmo seu verdadeiro ancestral sequer foi encontrado até presentemente. É uma balela querer inferir verdade em estudos pífios e apressados tentando dar o Australopithecus afarenis como esse ancentral. Tudo bem sopesado, refriso ser Lucy e congêneres, contemporâneos do primeiro e do segundo homens, tão somente grandes símios peludos, de vida basicamente em cima de árvores e inteiramente fracassados evolutivamente.

Somente quando o homem mais evoluído e, por conseguinte, portador de uma cultura mais acurada passou a ter domínio do fogo e a enterrar seus mortos – Homo erectus e o Homem de Neanderthal -, é que esses restos e muitos dos seus materiais, como líticos e adornos, se tornaram abundantes à coleta arqueológica, em escavações nas moradias pré-históricas, mormente em cavernas da Europa, Oriente Médio, Índia e China.

Essa escassez de registros fósseis da aurora da humanidade é que tem levado uns poucos cientistas a repreender um número até exagerado de colegas entusiasmados que, de posse de um fragmento fóssil qualquer, principalmente se for de procedência africana, partem para a publicação de artigos em revistas especializadas prometendo revolucionar a história da nossa origem.

Na verdade, creio que uma parte considerável desses achados absolutamente nada têm a ver com o homem ou, quando muito, seriam de seus primos distantes. Para mim, é o caso, por exemplo, do Australopithecus afarensis.

Vejamos.
“Cientistas questionam fósseis de hominídeos. (...) “Não me leve a mal, todas essas descobertas são muito importantes”, disse a Nature o coator do artigo Bernard Wood, professsor de origens humanas e evolução anatômica da Universidade George Washington, além de diretor do Centro de Estudos Avançados de Paleontobiologia Hominídea da instituição. “Mas também não podemos dizer que qualquer coisa encontrada daquela época tem de ser um ancestral humano”, podera.

O artigo The evolutionary context of the first hominins (O contexto evolutivo dos primeiros hominídeos) reconsidera a relação evolutiva de fósseis batizados de Orrorin, Saelantropus e Ardipithecus, que datam de sete milhões de anos atrás e foram aclamados como os mais antigos ancestrais do homem moderno. O Ardipitecus, mais conhecido como Ardi, foi descoberto na Etiópia e, segundo os autores, é radicalmente diferente do que muitos pesquisadores esperavam de um primeiro ancestral humano. Ainda assim, os cientistas que acharam o fóssil insistiram que Ardi era uma espécie de Adão.

“Não estamos dizendo que os fósseis não são ancestrais humanos. Mas temos de levar em conta interpretações alternativas. Acreditamos que esses fósseis são mais provavelmente de primatas que, na árvore da vida, estão situados muito próximos ao ancestral comum dos grandes símios e dos humanos”, explicou outro autor do artigo, Terry Harrison, professor do Departamento de Antropologia e diretor do Centro para Estudo de Origens Humanas da Universidade de Nova York. Os autores confessam que são céticos quanto às interpretações e descobertas da última década e defendem uma nova abordagem para a classificação dos fósseis. Harrison e Wood argumentam ser precoce assumir que todos os ossos escavados são ancestrais de criaturas que vivem no mundo moderno.

A comunidade científica concluiu, há tempos, que a linhagem humana divergiu daquela que deu origem aos chimpanzés entre 6 e 8 milhões de anos atrás. É fácil diferenciar, hoje, o fóssil de um chimpanzé moderno dos ossos de um homem moderno. Porém, a tarefa fica mais árdua quando as espécies em questão são muito antigas. Quanto mais próximas do ancestral comum, mais difícil é diferenciá-las. Em seu artigo, os antropólogos dizem que os cientistas têm sido pouco críticos nesse quesito, o que pode levar a conclusões erradas sobre as relações evolutivas.” (PO – jornal “Estado de Minas”, 17/02/2011).

Ou seja, o processo de hominização, através do qual o homem evoluiu física e intelectualmente desde sua origem primata ao que representa hoje, com sua diferenciação dos antropoides pelo andar perfeitamente ereto, cérebro e arcadas dentárias maiores, crescimento craniano paralelamente com a remodelagem da pelve, permitindo o nascimento de crias de cérebros avantajados, seu modus vivendi com relações sociais complexas, etc., com certeza, foi muito mais rápido do que se pensa. Creio mesmo que esse elo perdido, digamos assim, nosso verdadeiro ancestral, surgiu não entre 6 e 8 milhões de anos atrás, mas em época mais próxima do Homo habilis com seus aproximadamente 3 milhões de anos. Não se conhece muita coisa no período compreendido entre 4 milhões de 12 milhões de anos atrás.

Dissemos que mudanças climáticas vinham destruindo as florestas habitadas pelos grandes símios. Uma drástica redução nas precipitações pluviais naquela vasta extensão de terreno coberta de grandes árvores com suas copas se tocando acabou por retraí-las. Inúmeros primatas arbóreos se extinguiram, dando lugar a outras criaturas, entre elas diversas que se arriscavam pelo chão, pelo menos em parte, porque sua evolução compreendeu também uma convivência em campos abertos.

Alfred Russel Wallace (1823 – 1913) concluiu que “as espécies são compostas por diversas variedades e que mudanças ambientais podem levar à perda de variedades pior adaptadas e ao sucesso e sobrevivência das mais favorecidas. Em outras palavras, ele chegou, em paralelo, às mesmas conclusões de Darwin sobre um aspecto-chave da teoria evolucionista” (“Evolução – A História da Vida”, de Douglas Palmer, Larousse, edição brasileira de 2009).

Os seres readaptados deparavam-se frequentemente com predadores como tigres e hienas, numa evidente pressão seletiva rumo a criaturas mais parecidas com a espécie humana. A alteração do clima no berço da humanidade – Quênia, Tanzânia e Etiópia – constituiuse, pois, na mola propulsora rumo à hominização. Foi ela, com certeza, fator preponderante, como pressão seletiva, para o surgimento do elemento inteligente para, por exemplo, produzir artefatos de defesa e de caça de sobrevivência.

Ante deduções precipitadas acerca da diferenciação de uma espécie de outra, ademais quando tratamos de seres próximos nesta escala de tempo, é indubitável que conclusões errôneas se multipliquem entre os afobados na remontagem do início da história humana. Isto é, qualquer fóssil, mesmo o mais insignificante, é abraçado pela corrente dos apressados na descoberta do ser que efetivamente redundou na nossa família. Grosso modo, interpretações alternativas vêm sendo deixadas de lado, esquecendo-se do que realmente temos hoje: fósseis, muitos dos quais evidentemente mais próximos dos grandes símios, sendo avocados como pré-humanos.

Por exemplo, foi descoberto em 2001, no Chade, no deserto do Saara, um pedaço de crânio, nada mais, o qual combinaria traços entre chimpanzés e hominídeos. Com idade de 7 milhões de anos, foi batizado de Saheanthropus tchadensis, portanto seria o mais primitivo hominídeo. Mas diante da ausência de outros ossos, a não ser o pedaço de crânio, sequer foi possível saber qual a postura desse indivíduo, hoje sem grande importância.

Ora, os novos campos abertos, como as savanas, surgidos pelos novos tempos de aridez, em grande parte, eram inapropriados à fossilização, principalmente quando tratamos dos homens, originariamente pouco numerosos e tardios na escala do tempo biológico. Como já registramos, na nossa aurora, vivemos em solo firme, evitando charcos, proximidades de areias movediças, atoleiros, lugares pantanosos e barreiros, cuja lama, ou aluvião, deles oriunda, uma vez revestindo um animal morto, assegurava a sua fossilização e uma descoberta arqueológica posterior relativamente fácil.

É o que ficou frequentemente registrado nas cavernas geralmente úmidas, muitas invadidas por águas de enxurrada, sendo comuns nessas cavidades, que serviram de moradia ao nosso troglodita, o encontro de restos humanos.

Os cientistas são de opinião que a origem dos hominídeos ocorreu há 10 milhões de anos. Foi quando eles se afastaram dos demais primatas. O chimpanzé, o primata mais próximo geneticamente do homem, não passa de nosso primo, e não de nosso avô. O ancestral comum e de tronco único é o fóssil ainda não encontrado, sendo bastante incerta a sua descoberta.

As regiões úmidas de determinadas coberturas vegetais africanas anteriores às mudanças climáticas seriam propícias à fossilização das espécies. Mas nada temos de concreto ou de palpável oriundo dessas extintas florestas. O mais certo seria achar o elo perdido na quelas áreas que substituíram as grandes coberturas florestais, apesar dos seus predadores e também outros fatores adversos. Todavia, esta sorte não foi dada a ninguém até este momento, e um achado de tamanha importância só se daria em caso extremamente fortuito. Se a evolução é descendência com modificação, segundo Charles Darwin, a descendência está atrelada às antigas florestas africanas, sendo que as modificações levando ao Homo habilis aconteceram mercê da nossa adaptação às savanas.

Em nosso referido livro, “O Homem na Pré-História do Norte de Minas”, que é de 1983, na página 18/19, quando se encontrava estabelecida uma idade de 2 milhões de anos para o crânio 1470, depois de novas avaliações, e não entre 2 milhões e 2,5 milhões de anos atrás, como queria Richard Leakey, já deixávamos consignado que, com o prosseguimento do estudo da Pré-História humana, o mais certo é ser aumentada a sua antiguidade, que poderia ficar situada em torno de 4 a 5 milhões de anos, desaparecendo, evidentemente, a polêmica advinda de Lucy e ganhando o Homo habilis.

Observamos mais que, em qualquer circunstância, é pretensão demais alguém anunciar ter descoberto o primeiro representante de uma espécie. De mais a mais, é relativamente inexpressiva a diferença de idade entre o Australopithecus afarensis e o Homo habilis, este contemporâneo de uma infinidade de seres afins com aquele, quando sabemos que o grande e belo livro da evolução trata fatos e evidências em milhões de anos.

E acertamos, pois, exatos 30 anos depois da edição do nosso livro, os fragmentos de uma mandíbula da árida região de Ledi-Geraru, no Estado etíope de Afar, em 2013, receberam uma datação de 2,8 milhões de anos passados, o que deixa o primeiro homem com uma idade bem próxima do afarensis do mesmo sítio de Afar, que existiu há pouco mais de 3 milhões de anos. A precipitação da nossa parte foi achar que a idade primeva da real transição de um verdadeiro pré-homem para um homem poderia ficar situada em torno de 4 a 5 milhões de anos atrás. Hoje já pensamos que a nossa história na Terra, quando muito, poderia se estender a 4 milhões de anos atrás, se tanto.

Um fóssil de representante humano com aquela idade provavelmente não será encontrado. E muito menos do nosso ancestral direto, o verdadeiro pré-homem, que ocupou seu espaço evolutivo em área de preservação fossilífera extremamente difícil, quando muito há 4 milhões, 4,5 milhões de anos. Então, como dúvidas não restam sobre a extrema pobreza de fósseis da própria linhagem do homem, este fato recomenda uma cautela extremada diante de ossos que sequer dizem respeito aos nossos primórdios.

E, basicamente por sabermos que se nada se compara à inteligência humana, descortinando-se no palco da vida há poucos milhões de anos, tal maravilha corresponde a uns poucos décimos de um por cento da idade do planeta, o que nos remonta ao fim de dezembro, pelo calendário cósmico, conforme cálculo de Carl Sagan.

Também Francis S. Collins (obra citada, pág. 154/155) chama a atenção para os espaços de tempo da evolução colocando o homem nos últimos segundos da vida na Terra:

“Uma parte essencial do problema de aceitar a teoria da evolução é que esta exige que se compreenda a importância de espaços de tempo extremamente extensos envolvidos no processo. Tais períodos acham-se além da experiência individual de uma maneira inimaginável. Um modo de reduzir os éons” (espaço de tempo muito grande, como uma era ou a eternidade, conforme nota de tradução da editora) “num formato mais compreensível é imaginar o que aconteceria se os 4,5 bilhões de existência do planeta, desde sua formação inicial até hoje, fossem comprimidos num dia de 24 horas. (...). A diferenciação de ramificações que levariam a chimpanzés e humanos ocorreria em apenas um minuto e dezessete segundos restantes do dia e os humanos anatomicamente modernos apareceriam três segundos depois. A vida de um ser humano de meia-idade na Terra hoje tomaria somente o último milissegundo (um milésimo de segundo). Não é de se admirar que muitos de nós tenhamos tanta dificuldade em considerar o tempo evolucionário.”

Enfim, podemos asseverar que, em nossa tão decantada sapiência, sabemos quase o ínfimo do nada. O verdadeiro indivíduo pensante é, invariavelmente, humilde e sabedor que o livro da vida nunca foi nem é inteiramente aprendido, inclusive por nossa exiguidade de tempo, e, quando muito, conseguimos preencher algumas das imensuráveis lacunas que carregamos vida afora também no acréscimo do aprendizado e experiência de terceiros.


(Março/dezembro de 2020).


ANCESTRALIDADE FOLCLÓRICA E
OS CATOPÊS DE MONTFES CLAROS

No Brasil o ano todo é considerado de festas e divertimentos. O carnaval é uma festa pública com origem no cristianismo ocidental. Teve origem no Egito, há mais de 2000 a.C.. Cuja comemoração foi inspirada em rituais das festas de Ísis e do boi Ápis, deuses egípcios. A festa combina música e desfile, danças, fantasias e máscaras.

Em 1641, os colonizadores portugueses introduziram o carnaval no nosso País e, atualmente, representa a maior festividade folclórica comemorada em todo o Brasil. Acontece em fevereiro ou em março, nos três dias precedentes a Quarta-Feira de Cinzas, antes do período litúrgico.

O Carnaval brasileiro é oriundo do entrudo português. No século XVII os foliões se armavam de baldes e latas cheias de água, e todos acabavam molhados. D. Pedro II, o Imperador, também se divertia jogando água nos nobres. As comemorações duravam três dias, ou seja, do domingo até a “Terça-Feira Gorda”. O carnaval moderno é produto da sociedade vitoriana do século XX. Paris foi o principal modelo exportador da festa carnavalesca para o mundo. Cidades como Nice, Santa Cruz de Tenerife, Nova Orleans, Toronto e Rio de Janeiro se inspiraram no carnaval parisiense para implantar suas novas festas carnavalescas. Mas o Rio de Janeiro criou e exportou o estilo de fazer carnaval com desfiles de escolas de samba para outras cidades do mundo, como São Paulo, Tóquio e Helsinque. O carnaval brasileiro tem samba, axé e frevo e, claro, muita alegria nas ruas, clubes e sambódromos.

Entre as tradições populares mais bonitas estão os festejos juninos, especialmente no nordeste brasileiro. São João, Santo Antônio e São Pedro são muito referenciados e homenageados com fogueiras desde a colonização do Brasil; as fogueiras além de espantar o frio, assar batata e milho, relembram Isabel, mãe de João Batista, avisando sua prima Maria do seu nascimento. As homenagens começaram pelos jesuítas, e coincidiam com a colheita do milho, que foram incorporadas elementos das culturas indígenas e africanas. Mas a dança da quadrilha relembra antigos bailes da aristocracia francesa, onde alguns
“casamentos na roça” eram considerados validos, mas precisavam que o sacerdote os confirmasse.

As festividades juninas acontecem durante o mês de junho; dia 13 em honra a Santo Antônio; dia 24 em honra a São João; dia 29 em honra a São Pedro. Cada região celebra os santos à sua maneira, adaptando as tradições juninas aos costumes locais e misturando elementos religiosos, populares e folclóricos. Realizados nas casas, nas ruas das cidades ou em sítios e chácaras; os arraiais possuem alguns elementos essenciais que os identificam como a alegria, a euforia, a dança e a música.

As festividades populares conhecidas como Folias de Reis, Santos Reis ou Reisados, festejos também de origem portugueses, são uma das mais expressivas tradições religiosas e populares do Brasil ligadas às comemorações de Natal, quando relembram a peregrinação dos Reis Magos até a cidade de Belém para adorar o Menino–Deus. Em Portugal, as folias de reis tinham como principal finalidade divertir o povo.

No Brasil, a partir do século XVIII, essas festividades passaram a ter um caráter mais religioso com características próprias, em que nas igrejas católicas e em muitas casas residenciais são armados presépios representando o local onde nasceu o Menino Jesus em Belém, quando os três Reis Magos foram em peregrinação e levaram presentes: ouro, incenso e mirra. Pelo costume o ouro era oferecido aos reis; o incenso a Deus e a mirra resina de uma planta pequena e espinhosa, da qual se fazia um perfume especial para embalsamar os corpos dos mortos. Esses presentes significavam que Jesus era Rei, Deus e Homem, e haveria um dia de descansar no túmulo entre perfumes.

A Folia de Reis é manifestação popular de rara beleza, comemorada em cidades do interior do Nordeste, Sul e Sudeste e nas periferias de grandes cidades, e podem durar do Natal até o Carnaval.

Na cidade de Montes Claros, no Norte de Minas Gerais, as festas populares folclóricas de maior expressão, na maioria, estão relacionadas aos cultos religiosos católicos. As festas são realizadas no mês de agosto com missas, bênçãos e levantamento dos mastros, representadas pelos grupos de Catopês, Marujos e Caboclinhos em homenagem a Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e o Divino Espírito Santo, com as peculiaridades locais e com participação popular, que percorrem as ruas cantando, dançando e louvando seus santos de devoção.

O Catopê de Montes Claros, embora da mesma origem dos Congados, Moçambiques e outros similares de outras regiões, com o tempo foi adquirindo características próprias, talvez por ter ficado isolado; a começar pelo próprio nome, Catopê e não “Catopé”, do original, que seria o nome da dança ou do ritmo, como o batuque.

Durante os dias de festa são realizadas práticas religiosas como missas, bênçãos e levantamento dos mastros, acompanhadas das festividades dos grupos tradicionais dos Catopês, das Marujadas e Caboclinhos, além dos cortejos com jovens da comunidade caracterizados como príncipes e princesas.

Não se sabe precisar quando começaram. A mais antiga notícia data de 23 de maio de 1838, quando Marcelino Alves requereu à Câmara Municipal “licença para tirar esmolas para as festas de Nossa Senhora do Rosário e do Divino Espírito Santo, que pretendia fazer nessa freguesia”.

Com o deferimento da licença a iniciativa pegou e caiu nas graças do povo simples e festeiro. Até os presentes dias, sempre no mês de agosto, os Catopês, Marujos e Caboclinhos percorrem as ruas de Montes Claros, seguindo seus reis, rainhas, imperadores, imperatrizes, príncipes, princesas etc., cantando, dançando e louvando os santos de devoção.

Os Catopês, Marujos e Caboclinhos representam as três raças que originaram o brasileiro, a branca, a negra e a indígena.

No início, em Montes Claros no Estado de Minas Gerais, o terno de Catopês era composto apenas por integrantes da raça negra, mas hoje em dia, não existe mais essa exclusividade, participam pessoas de todas as raças e condições sociais.

O Catopê, cuja palavra em sua originalidade seja “catopé”, do folclore de Moçambique, e que, no Brasil, com o passar do tempo foi adquirindo características próprias é uma dança, ou ritmo, como o batuque; assim como a Congada, que também é de origem africana.

A música do Catopê é muito pobre, o que predomina é o ritmo, tanto que o seu instrumental é rústico e de percussão: tamborins, pandeiros e caixas; fabricado pelos próprios foliões com couro de bode.


Chico Ornelas

Os negros quando vieram escravizados, trouxeram consigo suas crenças e tradições, homenageando seus reis e cultuando os seus deuses. Um desses reis foi “Chico Rei”, escravo na região de Ouro Preto em Minas Gerais, mas que era príncipe em sua tribo africana. Aqui, os seus súditos e companheiros de escravidão o fizeram rei; e, conforme a tradição comandava as festas de culto a seus deuses. E como aconteceu com a macumba, o candomblé e a umbanda, os negros relacionaram seus deuses aos santos da Igreja Católica e passaram a
cultuar Nossa Senhora do Rosário e São Benedito.

Conta-se que Chico Rei, juntando aos poucos, ouro em pó que trazia das minas misturado aos cabelos, conseguiu comprar sua própria liberdade. Para cumprir um velho costume, na falta de um rei verdadeiro, os negros elegiam alguém, entre eles, para que os representasse e assim fizeram o cerimonial de coroação de Chico Rei, que uma vez livre, ainda conseguiu comprar a liberdade de vários companheiros de infortúnio.

Os grupos chamados de ternos, em geral, usam roupas brancas adornadas com fitas multicoloridas, principalmente rosas, azuis e brancas, que partem das coroas dos foliões. Na cabeça usam capacetes, enfeitados com espelho e miçangas repletas de penas de aves como emas e outras penas exóticas matizadas de cores vivas. O capacete dos chefes, além desses enfeites, traz no topo, penas de pavão e de ema.

Como geralmente o capacete é feito pelo próprio fulião, a sua aparência vai depender inteiramente do gosto de cada um e do poder aquisitivo para comprar os adornos, que na maioria é baixo.

Atualmente, temos em Montes Claros três ternos de Catopés. Dois de Nossa Senhora do Rosário e um de São Benedito. Essas danças são muito apreciadas no Brasil nas regiões de grandes concentrações de negros que vivem em quilombos, fazendas e cidades. O congado norte-mineiro expressa essa tradição comemorativa, sempre no mês de agosto.

Os Marujos e os Caboclinhos são comemorados conjuntamente com os Catopês e Congadas; festejam e louvam Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e o Divino Espírito Santo. As Marujadas têm inspiração nas tradições luso-espanholas, representando os grandes feitos náuticos dos cristãos. Os grupos de Marujos, como também são conhecidos, usam roupa branca, ou vermelha e azul; de origem européia narram as aventuras dos marinheiros descobridores do Brasil.

Os Caboclinhos de origem indígena representam o índio brasileiro com penas e cocares de capacetes, uma referência àqueles grupos étnicos; o grupo é formado em sua maioria por crianças e falam das brincadeiras dos curumins da selva. Os meninos apresentam com o busto nu, e as meninas com blusas vermelhas e azuis.


EU SOU O RIO SÃO FRANCISCO
E O CERRADO

Depois das prosopopéias criadas por Ivo das Chagas, metamorfoseando-se no Rio São Francisco e no Cerrado, incorporando-os, dando-lhes a palavra com ciência e sentimento, é preciso conhecer essas obras antes de se falar em Cerrado e Bacia do Rio São Francisco. O Grande Ivo das Chagas, Mestre em Geografia pela Universidade de Bordeaux, França, e bacharel em Geografia pela UFMG, escreveu de forma poética em primeira pessoa, as enfermidades do Rio São Francisco e do Cerrado, explicando, filosoficamente e degrau por degrau como se instala e se alastra o mal, num livro que, na verdade são dois, na ida, para um lado e com a capa “Eu sou o Rio São Francisco” e do outro “Eu sou o cerrado”, de ponta cabeça. Nos dois papéis pede socorro, mostrando uma verve de profundo conhecedor teórico que viveu a prática, morando no cerrado do norte de Minas e alhures, navegando nos barcos a vapor, conhecendo cada metro daquele bioma, as profundezas do seu subsolo, as suas águas superficiais e subterrâneas.

A largueza dos seus conhecimentos teóricos e os livros citados numa extensa bibliografia são poucas coisas diante da paixão amorosa que Ivo das Chagas teve pelo Rio da Integração Nacional. Sobe na Serra da Canastra e lá do alto, conta a emoção do salto que o rio nascente dá. E segue rio abaixo, Brasil acima, citando características geológicas, geográficas, flora e fauna no entorno, a ação do homem, e tudo o mais que encontra pelo caminho. Desfazendo um crochê, vai explicando os destroços da presença humana, desde 1501 (Américo
Vespúcio), quando o rio foi avistado pelos “civilizados”, até a facada de morte, que foi a transposição sem a revitalização. Informa que a barragem de Três Marias foi um acontecimento fatal para o rio, matas ciliares e calha navegável. A eletrificação trouxe fábricas e seus terríveis poluentes, matando ferozmente a fauna aquática. As interferências humanas são desastres anunciados que avançam feito fogo. Os impactos ambientais são experimentados no transcorrer dos fatos, numa macabra descoberta. Então, vão se instalando as doenças da bacia hídrica mais importante do país. Desmatamento, poluição fabril, erosão, assoreamento, baixa dos níveis dos lençóis freáticos, secagem das veredas, morte dos buritis - a vegetação tipo oásis, e sumiço animal. A Represa de Sobradinho, catastrófica, inundou cinco cidades: Remanso, Casanova, Sento Sé, Pilão Arcado e Sobradinho. O prejuízo ambiental foi dramático.

Da mesma forma, personificando o cerrado e dando-lhe voz e importância, Ivo das Chagas explica a dimensão da variedade da vegetação, e, ao contrário do que pregam sobre a pobreza desse ecossistema, evoca suas riquezas, fala da beleza e variedade das flores, dos frutos – em especial o pequi e dos animais terrestres, como lobo-guará, tamanduá, tatu, seriema, gambá, raposa, anta, veado, onça que “desapareceram dos lugares mais aviltados”. Lamenta a chegada dos exploradores sedentos por carvão para a siderurgia. Em 50 anos, o
cerrado virou cinzas e cascalho. Até as raízes das árvores, que pode riam, em tese, recuperar parte daquilo que tinham sido, foram arrancadas por tratores, deixando uma terra arrasada, para desespero do aficionado Ivo das Chagas. Tudo já ia muito mal, quando da chegada da onipresente monocultura de pinho e eucalipto e sua consequência de fim dos tempos. Desde então, o resultado está à vista de todos. Instalou-se a desertificação em nome do capital. A ganância ignora o conhecimento, e acelera a destruição. As riquezas são levadas, deixando para trás a voçoroca, cruel, profunda e incontrolável erosão.
O escoamento da água predomina sobre a infiltração, reduzindo as coletas naturais, instalando-se a sequidão. As ações predatórias como um todo rebaixam o nível dos aquíferos, inviabilizando a formação das veredas.

Ivo das Chagas escreveu algo espetacular nos seus dois aparentemente singelos, mas importantíssimos livros. Os trechos sobre o Rio São Francisco, que me tocaram fundo, cito entre aspas. “Tudo começou com a construção de um barramento de minhas águas, numa região chamada Três Marias” [...] “Essa tal barragem acarretou um desequilíbrio total da minha hidráulica, de meus seres vivos aquáticos e de meus barranqueiros, sem cumprir totalmente sua função de reguladora de minhas águas” [...] “Meus peixes não puderam mais realizar o ritmo anual da piracema até o meu alto curso e, por outro lado, minhas lagoas marginais, em grande parte, perderam sua função de berçário de minha ictiofauna...” [...] “Diminuída ou anulada aquela ida e vinda de minhas águas sobre os barrancos e as lagoas, o beiradeiro perdeu parte substancial de sua disponibilidade alimentar, pois houve uma redução do pescado e a lavoura de vazante, praticamente desapareceu” [...] “O desnudamento de minhas beiradas provocou uma erosão generalizada e, consequentemente, processos radicais de
assoreamento...”

Além de mostrar a “ação perturbadora dos humanos”, despertando emoção nos mais sensíveis, o autor quer desencadear ações para reduzir o processo destruidor do Rio São Francisco. Eis os objetivos de Ivo das Chagas.


MAJOR SAINT-CLAIR FERNANDES
VALADARES E A EMANCIPAÇÃO
POLÍTICA DE SÃO ROMÃO

QUEM FOI O MAJOR SAINT-CLAI
R

Saint-Clair Fernandes Valadares era filho de Francisco José Fernandes Capanema e de Maria Cordeiro Valladares. Nasceu no dia 26 de setembro de 1871, na Fazenda Capão Grosso, Distrito de Conceição dos Morrinhos, Município de Paracatu (hoje Município de Arinos). Pouco depois seu pai construiu uma fazenda no lugar denominado Pesqueiro, e para ali se mudaram.

Estudou na terra natal. Seu pai contratou um professor particular e com seis meses de aulas, ele ensinava o professor. Casou-se com Emília Pereira de Araújo, filha de Félix Pereira de Araújo e de Maria Joana Teixeira de Araújo. Tiveram doze filhos: Aristóteles, Veridiano, Garibaldina, Saint-clair, Antônia, Francisco, Félix, Israel, Maria, Pedro, Diomedes e José.

Em 1906 mudou-se do Pesqueiro para o Tamboril, onde construiu uma bela residência, uma Fazenda avançadíssima para aquela época, que recebeu o nome de Fazenda Escola do Tamboril. Funcionava ali uma máquina a vapor que movia um engenho de cana, uma serraria de madeira, uma turbina de açúcar, uma fábrica de rapadura, outra de cachaça, um descaroçador de algodão e um moinho de milho. A velha caldeira encontra-se até hoje na Fazenda Tamboril. Ali
está fincado o marco do progresso.

Abastadíssimo fazendeiro, o major Saint-Clair gostava muito da Agricultura, mas sua dedicação toda especial era pela farmácia. Tinha no Tamboril a sua pequena farmácia para atender a numerosa família e os vizinhos de 15 a 30 léguas.

Em 1922 construiu uma lancha de tamboril, que recebeu o nome de Valladares e uma canoa com capacidade de três toneladas. A lancha rebocava a canoa e fazia o percurso do Porto da Ponte Alta à foz do Urucuia no São Francisco, passando por São Romão e indo até Pirapora (75 léguas) e enfrentava as seguintes corridas e cachoeiras: Corrida da Taboquinha, Cachoeira Poço fundo, Poço Raso, Caidinha, Escaramuça, Dois Irmãos, Estrema de Maria Joana, buritizinho, Suçuarana, Capão da Cinza, São Paulo e Corrida das Pedrinhas (18 km de extensão).

A lancha era movida por um motor Humber e depois por um Chevrolet. Tinha como mecânico o irmão João Fernandes Pitangui e como práticos Januário Alves e João da Silveira. Trouxe de Januária para o Urucuia o professor Benevides Doro de quadros para lecionar no povoado de Morrinhos e depois na Fazenda Tamboril.

Possuiu naquela época um automóvel Ford 1924, um caminhão Chevrolet 1928 e uma camioneta Chevrolet 1941. Seus motoristas eram o irmão Francisco Fernandes Pitangui e o filho José Fernandes Valladares (Juquinha).

Mantinha as melhores relações com seus correligionários e amigos de Paracatu, como o embaixador Afrânio de Melo Franco, José Soter Gonzaga, Lindolfo Garcia Adjuto, Luiz de Santana Júnior, Major Jefferson Martins e outros vultos daquela cidade, berço da instrução.

SEU IMPORTANTE PAPEL NA EMANCIPAÇÃO
DO MUNICÍPIO DE SÃO ROMÃO

Numa de suas passagens por São Francisco com destino a Pirapora, em 1923, encontrou-se com o farmacêutico Manuel Simões da Silva Caxito e, em conversa, ventilaram a criação do Município de São Romão, com o desmembramento dos distritos de Conceição dos Morrinhos, Buritis, São João do Pinduca (Joanópolis, hoje Serra bonita) e Formoso, pertencentes ao município de Paracatu; e São Romão e Capão Redondo, distritos de São Francisco.

Enviou a Belo Horizonte nesse mesmo ano, uma comissão composta pelos cidadãos: Manuel Simões da Silva Caxito, Dr.Euclides Gonçalves de Mendonça e o estudante de Engenharia Saint-Clair Valladares Júnior, levando uma carta sua ao Presidente do Estado de Minas Gerais, Dr.Raul Soares de Moura, apresentando a Comissão e pedindo a criação do Município de São Romão. A Comissão voltou do Palácio da Liberdade com a seguinte resposta do Presidente do Estado: “Digam ao Major Saint-Clair que o município de São Romão está criado.”

A 10 de fevereiro de 1924 mudou-se com sua família para São Romão, para instalar o Município. No dia 02 de março, instalou-se o Município de São Romão, tendo sido eleito Presidente da Câmara o Major Saint-Clair e Vice-presidente Manuel Simões da Silva Caxito ( não havia o cargo de prefeito).

Vereadores: Altino Alves da Silva, João José Caxito, Manuel Agapito de Souza e Francisco de Salles Peixoto. Distrito de Capão Redondo: José Pereira da Silva Lameirão; distrito de Arinos: Benevides borges Carneiro; distrito de Buritis: Lindolfo Gonçalves Sobrinho; distrito de Formoso: Minervino Gomes de Ornellas; distrito de Joanópolis: José da Silva Porto.

Esses representantes de distritos faziam um percurso a cavalo de 180, 270, 360 e 370 km para comparecerem às sessões da Câmara Municipal. Por ocasião da divisão geodésica da Fazenda Ipueira, em 1929, o Major Saint-Clair doou à Câmara Municipal de São Romão, em local de bela topografia e excelente salubridade, a área de48,40 hectares de terras, destinadas à sede do Distrito de Arinos. O nome de Arinos é uma homenagem especial ao escritor Afonso Arinos (1868-1916), seu amigo.

Em 1930 fez uma parceria com seus amigos do Urucuia para a construção de uma rodovia de São Romão a Formosa-Go, construindo em junho daquele ano um porto no Rio Urucuia, ao qual deu o nome de Porto Novo, com um calçamento de achas de aroeira, da parte superior do barranco até a água, instalando um sarilho com cabo de aço para puxar os veículos do barco para o calçamento. Não conseguiu realizar esse ideal de progresso.

Em 1932, o Presidente do Estado, Olegário Dias Maciel mandou construir essa estrada, que só chegou até as proximidades do Ribeirão da Areia. A morte súbita do Presidente Olegário motivou mais uma vez a paralisação dos serviços.

O Major Saint-Clair governou eleito o Município de São Romão de 1924 a 1936. De 1936 a 1937 foi Prefeito o Major Efigênio de Brito Bezerra. Com o Estado Novo de 1937, o Major Saint-Clair foi nomeado Prefeito do Município de São Romão, cargo que exerceu até o dia 16 de novembro de 1946 quando seguiu para Belo Horizonte, para submeter-se a tratamento de saúde, passando o cargo ao genro Henrique Meireles. Esteve internado no Hospital São Lucas até sua morte, em 02 de abril de 1948.

NOTA: apesar de muitos anos de pesquisa para a elaboração do livro “De Vila Risonha a São Romão”, esses fatos não vieram a lume, como aqui estão narrados. No entanto datas e nomes estão confirmados.

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Referências:
Jornal do Urucuia – 4ª Edição – Março de 1985 . Escritores: Napoleão Valadares e Xico Mendes
Pesquisa feita por Jefferson Bispo.
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O RADIOAMADOR

O Radioamadorismo é um hobby técnico-científico e um serviço de telecomunicação. É praticado em quase todos os países do mundo, por pessoas habilitadas e licenciadas pelas autoridades de telecomunicações para a intercomunicação e estudos técnicos, sem motivo de lucro.

E foi assim que, durante a época em que serviu o Exército Brasileiro, Marcelo Mameluque Mota encantou-se pelo radioamadorismo. E dele fez o seu principal hobby. Na época do exército, recebeu os treinamentos, e desde então, nunca deixou de operar o rádio. Todos os dias, 7 dias por semana, 365 dias por ano.
Radioamador dedicado, prestador de serviços à comunidade, o fazia com prazer e alegria. Colocava famílias em contato, salvava vidas obtendo socorro aéreo, conectando pessoas. Quando o Brasil não dispunha de meios modernos de comunicação, o Radioamadorismo era a única forma de contato. Na nossa região, então, foi de extrema importância. Outros radioamadores também formavam essa rede de comunicação, e todos entusiastas da mesma causa: Servir a todos.

De 1942 até o dia da sua morte, 9 de setembro de 2009, Marcelo Mameluque Mota sempre foi um radioamador que se destacou pelo amor à causa. Incansável. Conhecido inicialmente pelo prefixo PY-4- AGB (América Guatemala Brasil), e nos últimos 15 anos pelo prefixo de PY-4-MMM, as iniciais do seu próprio nome, Marcelo Mameluque Mota, homenagem essa que lhe foi prestada pela LABRE

– Liga Brasileira de Estações de Rádio.

Os tempos mudaram, as comunicações se modernizaram, a internet aproximou ainda mais as pessoas, mas até hoje, o radioamadorismo mantém a sua importância e a sua função de serviço reserva de comunicações do Estado Brasileiro, pois, para quem não sabe, em caso de guerra, se todos os nossos sistemas de comunicações falharem, basta uma bateria de automóvel, um rádio e uma pequena antena para levar as comunicações adiante.

Bacana, né?

Todo esse acervo de equipamentos, fotos e imagens refletem esse período, e são uma contribuição dessa exposição para as futuras gerações.


Athos Mameluque Mota / PY-4-NI


PAULINHO RIBEIRO

“O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim:
esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.”

Guimarães Rosa

Notícia inesperada a da grande viagem de Paulinho Ribeiro para o Mundo Maior. Uma separação lamentada não só pelos familiares, não só pelos amigos e companheiros de trabalho, mas de toda a cidade de Montes Claros, que o amava muito e o respeitava com todos os louvores. Paulinho Ribeiro foi sempre um jovem de tempo integral no trabalho e na dedicação à Natureza, haja vista sua atuação, com apenas vinte anos, como o catalizador da luta pelo tombamento de todas as praias do estado do Rio de Janeiro, contra a especulação imobiliária e pela a preservação da mata nativa, dos animais e pássaros da mata atlântica.

Para cumprimento de tudo o que foi sua existência útil, o maravilhoso serviço prestado a Montes Claros no cargo de Secretário de Meio Ambiente, construindo parques, mudando mentalidades, afirmando sempre que a Natureza é tudo e está sempre acima de nós.

Pensamento e ação com o máximo de brilho. Importante filho de Mário Ribeiro e D. Maria Jacy, companheiro e amigo dos muitos irmãos, casa sempre cheia de vida; dedicado sobrinho de Darcy Ribeiro, acredito a pessoa que mais o conheceu e o admirou. Paulinho, um universo de ideias realizadas.

Importante lembrar aqui, por ser recente, a outorga da Câmara Municipal de Montes Claros, em 18 de março, da Medalha Ivan José Lopes de Honra a Montes Claros pelo seu trabalho como Secretário Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento.

Em homenagem a Paulinho Ribeiro, parcelas de alguns dos muitos textos publicados logo após ele nos ter deixado em 23 de abril deste 2021. Foram dezenas de manifestações. Não publicamos todas em vista da exiguidade de espaço nesta Revista IHGMC, janelas de muitos confrades e confreiras.

EDMILSON GUIMARÃES

Como eu sou grato por ter tido a oportunidade de ter convivido e de ter sido amigo de Paulino Ribeiro! Quanta coisa eu aprendi com ele! Quantas pequenas revoluções nós sonhamos em realizar tendo sempre como estandarte nossa crença socialista de um mundo melhor, mais justo, solidário e fraterno. Com ele, tenho medo de estar indo embora grande parte da minha capacidade de sonhar!

Tive o raro prazer de conhecer seu segundo pai e mentor intelectual, o gênio Darcy Ribeiro, e de conviver com o pai dele, o não menos encantador Mário Ribeiro, o que me ajudou a compreender de onde vinham todo o senso de justiça, a consciência social, a inteligência incomum e o amor pela vida que marcaram a passagem de Paulinho por toda sua existência!

É uma perda que vai me marcar pelo resto da vida, mas não vou ficar triste, obedecendo um conselho que ele certamente me daria se ainda estivesse entre nós! Incrível que o forte abraço que ele me deu e o que ele me disse quando perdi minha mãe, há uma década, estejam me consolando no dia de hoje. Paulinho era assim, de um nada falava coisas e tecia teorias que só lá na frente a gente conseguia compreender! Ele sempre pensava à frente de nós, estava sempre à frente de todos.

Foi brilhante em tudo que fez, seja como presidente do Diretório Central dos Estudantes de Montes Claros, assessor do vice-governador do Rio Darcy Ribeiro, presidente da Fundação Darcy Ribeiro, presidente da Fundação Roquete Pinto (onde criou a TV Brasil e o Projeto TV Escola) e da Rede Minas, e atualmente numa brilhante gestão na Secretaria Municipal de Meio Ambiente, onde comandou o início de uma verdadeira revolução verde, que tem de ser mantida
em sua homenagem.

TINO GOMES

Paulinho Ribeiro se encantou. Voltou para a Pátria Espiritual levado com amor por nossos amigos de Luz. Choram o cerrado, as veredas, o sertão, a caatinga, choram os buritis, os umbuzeiros, os pés de pequi esparramados na imensidão da terra do povo catrumano. O silêncio impera nas nossas matas sertanejas em respeito a partida de seu maior defensor, aqui e ali, um ou outro passarinho arrisca um canto de despedida cheio de tristeza. Aquele furacão chamado Paulinho, agora vai verdejar as planuras da Pátria Espiritual. Aqui no plano da matéria ficamos nós, tentando entender os planos do Criador. Somos pequenos para entender a grandeza da criação, mas passo a passo, entenderemos que “sem o amor, não há salvação “.

Paulinho querido, siga sua jornada... agora em busca dessa Luz Maior, Luz que te conduziu aqui neste plano terrestre. Te conhecendo bem como te conheci, você já deve estar pensando aí onde plantar uma árvore e fazer uma praça ou um parque, com ajuda dos anjos. Siga na Luz. Com todo nosso amor. Requiescat in pace!

EDUARDO GOMES

Ele se foi. Meu amigo e quase irmão Paulo Ribeiro, o Paulinho. Louco de pedra, visionário, manso, bruto, humilde, arrogante, inquieto, menino, carrancudo, sonhador, e mais um sem número de adjetivos, tudo junto e misturado como um vulcão em erupção. Fomos companheiros de movimento estudantil no final da década de 1970, depois colegas no Jornal do Norte, onde iniciei no jornalismo, apoiados por Ameriquin e Tone Santos. Nos reencontramos 10 anos depois na Prefeitura, na administração do pai Marão, e pioneiros como Simeão Ribeiro sonhamos com um futuro parque na Lapa Grande. Depois, mais maduros, participamos dessa verdadeira revolução ambiental em Montes Claros que foi a criação efetiva da Semma, coroada com a criação do Parque da Lapa Grande e de outros projetos lindos como a Expedição Caminhos dos Geraes, o Ecocrédito, o Sagarana e em especial para ele a RPPN RAIZ.

De lá para cá, muitas parcerias e muitas outras conquistas para o meio ambiente e para a coletividade. Fica para sempre o nosso carinho e meu agradecimento eterno ao nos apoiar firmemente nos projetos dos parques da Lapa Grande e de Botumirim, herança preciosa para a coletividade e para nossas filhas e filhos.

No dia daquela homenagem linda da Câmara Municipal, me confidenciou com a voz fraca, mas com uma lucidez heroica, de que não se arrependia de nada, mas que ia a contragosto, por não realizar mais projetos e sonhos. Eternamente inconformado, para ele nada era impossível. Será sempre uma inspiração para todos nós. Obrigado Paulinho. Seguiremos com a batalha.

MÁRCIA PRATES

Obrigada, Paulinho, em tempo, sei que vai escutar de mim o quanto sou grata a sua postura de respeito à minha escolha na arte, de deixar registradas com terras, pigmentos minerais as minhas emoções e as minhas pesquisas dos desenhos da pré história, nossa Arte rupestre. Muito honrada e grata a você, amigo, quando por inúmeras vezes, um telefonema seu me fazia enorme... seus convites para que fizesse parte de alguma reunião para também opinar... elevava me deixando-me cheia de orgulho.... pois é grande amigo, na efemeridade da vida, muitas coisas não têm tempo de serem encerradas.... mas você fez, com sua capacidade, amor, lealdade ao berço, muito por Montes Claros.... vamos chorar sim, a sua ausência física, mas a sua essência nos acompanhará, ensinando sutilmente a tratar o que Deus nos deu na palma de cada mão.!!! Obrigada, Paulinho, ordenar palavras, para falar com você que era tão simples, só mesmo com a força do amor fraterno! Até um dia, meu amigo do dedo Verde e do coração de todas as cores e formas!

WAGNER GOMES

Ele, agora, está em outro plano. Paulinho Ribeiro cometeu a suprema imprudência de partir para sempre. E foi um bravo ao dizer adeus. Ele, em vida, me cativou pelo entusiasmo com que falava das coisas que amava. Sinto a sua morte com a tristeza de quem perde uma pessoa próxima e muito querida. Sempre o vi como um ser iluminado a construir nexos entre sua tênue trajetória e a obra que pretendia nos legar, ao cabo de sua vida. É como se, ao tentar cooptar alguém para uma grande ação, propusesse a quem pretendia convencer: causa comigo? Ao ser influenciado pelo pensamento de seu tio Darcy Ribeiro, e assim como ele, começou a perceber que sua agilidade de raciocínio atropelava a velocidade com que o exprimia através da fala. Brilhante,
polêmico e combativo, como seu tio Darcy, abominava o Pacto da Mediocridade e fugia, como o diabo foge da cruz, daquela dispersão provocada pelos que se omitem e não incomodam para, também, não serem incomodados.

Como um pensador iluminado, não tinha tempo nem paciência para os penduricalhos, concentrando-se no que realmente importava, para fazer a diferença. Falava initerruptamente lembrando datas, lugares e personagens, interligando-os, com tal desenvoltura, de forma veloz e cativante. Nos últimos tempos, mais reflexivo por conta da doença, permanecia, no entanto, com tanta fé na vida, a ponto de reviver um grande amor e sentir sua amada a ele dedicar-se. Creio que se pedíssemos a Darcy Ribeiro, uma frase sobre o sobrinho querido, ele nos teria dito: ele foi uma amostra fiel da inteligência brasileira. Descanse em paz, meu amigo. Que Deus o receba em sua glória, e que lhe permita viver feliz na eternidade. Meus sentimentos a todos que, como eu, tiveram o prazer de conviver contigo.

E, por fim, o irmão e amigo

UCHO RIBEIRO

Paulinho nasceu a fórceps, contrariado, queria permanecer no protegido útero de Dona Jacy. Seguramente sabia que sua vida seria uma sucessão de combates e confrontos e tentou adiar a sua entrada no campo de batalha.

Suas contendas principiaram já na infância com os seus irmãos mais velhos. Embora fosse o caçula queria competir e ganhar de todos, nas brincadeiras, nos esportes, nos argumentos e, se preciso fosse, na porrada. Nunca correu de um arranca-rabo, adora uma rinha, seja ela cerebral, política ou futebolística e até mesmo no trato das amenidades, volta e meia, supita e dispara uma verborreia caliente, lúcida e visionária. Uma, duas horas de conversa é agradável, abre nossa cabeça, nos faz enxergar além da mesmice, mas aguentar o dia todo o vulcão de ideias, a quantidade de projetos que quer levar adiante, é exaustivo. Passar um dia inteiro em sua companhia, estropia nossas cacholas, nos deixa exauridos, fora os afazeres que ele põe a gente para providenciar: “é pra re-sol-ver.”

Nos primeiros anos do primário, não adaptou em nenhum colégio, repugnava o ambiente autoritário e anti-democrático. Acabou sendo alfabetizado por uma professora particular, contratada exclusivamente para dar aulas para ele na nossa casa.

A trancos e arrancos foi refugando os colégios por onde passou, até entrar na política estudantil, quando foi eleito presidente do Diretório dos Estudantes Secundaristas de Montes Claros. Em plena ditadura organizou o primeiro ato publico em frente à Catedral, pelas liberdades democráticas. No palanque sentou a lenha no governo, mesmo com a praça cercada por um destacamento do exército. Audácia nunca lhe faltou para as coisas que acredita.

Nos fins de 79, foi para o Rio de Janeiro estudar sociologia e trabalhar com o tio. Lá juntou a fome com a vontade de comer. Participou e futricou em todos os projetos do governo Brizola/Darcy: Cieps, Sambódromo, Monumento de Zumbi, Universidade de Campos, Centros Culturais, Casa de Cultura Laura Alvim,... Creio
que aquele ambiente criativo de proliferação de ideias e de afoiteza para concretizar projetos lapidaram Paulo Ribeiro a ser um sujeito sonhador e realizador.

Quase ninguém sabe que Paulinho, com apenas 20 anos, foi o catalizador da luta pelo tombamento de todas as praias do estado do Rio de Janeiro, contra a especulação imobiliária e pela preservação da mata nativa, dos animais e pássaros da mata atlântica. A extensão do tombamento vai da Praia de Grumari até Paraty e Trindade, pelo litoral sul; e por Búzios, Cabo Frio, manguezais de Campos, pelo litoral norte.

No começo da década de 90, Paulo Ribeiro reativou a TV Minas transformando-a na Rede Minas, com mais de 60 emissoras e, posteriormente, pelo seu êxito no meio televisivo, foi convidado para ser o presidente da Fundação Roquette Pinto, gestora da TVE, quando foi criada a “TV Brasil e Projeto TV Escola”.

Aqui em Montes Claros e no norte de Minas, é um grande defensor do meio ambiente e criador de vários parques ambientais.

Mas existe um outro Paulo Ribeiro, conhecido por poucos, de uma ternura imensa, de uma generosidade desmedida, de um desprendimento absoluto pelos valores pecuniários, que sempre está em defesa dos mais humildes e em luta pelo bem comum. Este Paulinho que nós mais amamos, e está e estará sempre em nossos corações.


Impresso na oficina da
GRÁFICA EDITORA MILLENNIUM LTDA.
Rua Pires e Albuquerque, 173 - Centro | 39.400-057 - Montes Claros /MG
mileniograf@hotmail.com | (38) 3221-6790

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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